Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5009760-45.2017.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
15/07/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/07/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CONCEDIDO INDEVIDAMENTE. EXISTÊNCIA DE FRAUDE.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES. VIABILIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Nos termos da Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal, "administração pode anular seus
próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque dêles não se originam
direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.".
2. Tendo sido comprovada a adulteração das informações referentes ao benefício concedido à
parte autora, caracterizando a existência de fraude, possível a anulação da concessão pela
autarquia, bem como a cobrança dos valores indevidamente pagos.
3. O ressarcimento das quantias indevidamente recebidas pela parte autora é legal e legítimo,
encontrando respaldo no art. 115, II e parágrafo único, da Lei 8.213/91 e 3º do artigo 154 do
Decreto nº 3048/99.
4. Apelação desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5009760-45.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: ANTONIO SPROVIERI LARANJEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ELENICE JACOMO VIEIRA VISCONTE - SP141372-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5009760-45.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: ANTONIO SPROVIERI LARANJEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ELENICE JACOMO VIEIRA VISCONTE - SP141372-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator):Trata-se de ação declaratória de
inexistência de débito ajuizada por ANTONIOSPROVIERI LARANJEIRA em face do Instituto
Nacional do Seguro Social (INSS), pelo qual busca a cessação dos descontos de seu atual
benefício previdenciário de aposentadoria por idade NB146.369.965-1, oriundos do débito,
apurado em razão do indevido recebimento do benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição NB 079.394.202-0, no período de 04/1985 a 10/1996.
Os benefícios da gratuidade da justiça foram deferidos (ID 66457686).
O pedido de tutela de urgência foi deferido para determinar ao INSS que suspenda a
exigibilidade da cobrança do valor constante no documento id 3949709 - Pág. 11/12, assim como
suspenda eventuais descontos decorrentes da revisão, até a decisão definitiva na presente ação
(ID 66457687).
Em contestação o INSS sustenta, em síntese, a legalidade do ressarcimento do benefício,
postulando, ao final, a improcedência do pedido (ID 66457688).
Réplica (ID 66457696).
Sentença pela improcedência do pedido (ID 66457697), revogando-se a tutela anteriormente
concedida.
Apelação da parte autora, na qual requer, em síntese, a reforma da sentença com a procedência
total do pedido (ID 66457699).
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5009760-45.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: ANTONIO SPROVIERI LARANJEIRA
Advogado do(a) APELANTE: ELENICE JACOMO VIEIRA VISCONTE - SP141372-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): O apelante foi beneficiário de
aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/079.394.202-0,no período de 02.04.1985 a
31.10.1996.
Segundo consta dos autos, porém, após verificada a existência de fraude em sua concessão
através de regular processo administrativo, o INSS procedeu à cobrança de todo o valor
indevidamente pago no referido período.
Analiso a decadência.
O C. Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, pacificou o entendimento de que
o prazo decadencial para a administração Pública rever os atos que acarretem vantagem aos
segurados é disciplinado pelo artigo 103-A da Lei 8.213/91, descontado o prazo já transcorrido
antes do advento da Medida Provisória nº 138/2003. Assim, em relação aos atos concessivos de
benefício anteriores à Lei nº 9.784/99, o prazo decadencial de 10 (dez) anos estabelecido no
artigo 103-A tem como termo inicial o dia 01/02/1999, data da entrada em vigor da Lei nº
9.784/99:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO.
DECADÊNCIA . ART. 103-A DA LEI N. 8.213/91. MATÉRIA SUBMETIDA AO RITO DOS
RECURSOS REPETITIVOS. DECADÊNCIA NÃO CARACTERIZADA. ANÁLISE DE VIOLAÇÃO
DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF.
1. A Terceira Seção desta Corte, sob o regime do art. 543-C do CPC (recursos repetitivos),
consolidou o entendimento segundo o qual o prazo decadencial para a administração Pública
rever os atos que gerem vantagem aos segurados será disciplinado pelo art. 103-A da Lei n.
8.213/91, descontado o prazo já transcorrido antes do advento da MP 138/2003; ou seja,
relativamente aos atos concessivos de benefício anteriores à Lei n. 9.784/99, o prazo decadencial
decenal estabelecido no art. 103-A da Lei n. 8.213/91 tem como termo inicial 1º/2/1999, data da
entrada em vigor da Lei n. 9.784/99.
2. Hipótese em que embora o benefício da ora agravada tenha sido concedido em momento
anterior a entrada em vigor da Lei n. 9784/99, o prazo decadencial somente teve início em
1º.2.1999, e como o procedimento de revisão administrativa iniciou-se em outubro de 2008,
evidente que não restou consumada a decadência para revisão do ato administrativo.
3. Não cabe ao STJ, em recurso especial, a análise de dispositivos constitucionais, mesmo com a
finalidade de prequestionamento, sob pena de usurpação da competência do STF. Agravo
regimental improvido." (STJ, 2ª Turma, AgRg no REsp 1367552/SC, Rel. Ministro HUMBERTO
MARTINS, j. em 02/04/2013, DJe 12/04/2013).
No caso, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição 42/079.394.202-0 recebido pela
parte autora foi deferido em 02.05.1985, com DIB em 02.04.1985 enquanto o ofício da Inspetoria
da Previdência Social informando a revisão do benefício data de 1996, inclusive com a oitiva da
parte autora, em 16.10.1996 (66457691 - Pág. 98).
Com efeito, como o prazo decadencial teve início em 01/02/1999, não ocorreu a decadência do
direito da autarquia de rever o ato concessório.
Cabe ressaltar, ademais, que em que pese o benefício da parte autora tenha sido suspenso em
1996 e a cobrança sido efetuada apenas em 2016 (ID 66457691 - Pág. 185), constata-se dos
autos que tal demora não se deu em razão da inércia da autarquia, mas sim devido ao longo
período em que tramitou o processo administrativo.
A respeito da suspensão do prazo prescricional, dispõe o artigo 4º do Decreto 20.910/32:
"Art. 4º Não corre a prescrição durante a demora que, no estudo, ao reconhecimento ou no
pagamento da dívida, considerada líquida, tiverem as repartições ou funcionários encarregados
de estudar e apurá-la.
Parágrafo único. A suspensão da prescrição, neste caso, verificar-se-á pela entrada do
requerimento do titular do direito ou do credor nos livros ou protocolos das repartições públicas,
com designação do dia, mês e ano."
Da leitura do referido dispositivo, extrai-se que o requerimento administrativo tem o condão de
suspender o curso do prazo prescricional, que só se reinicia após a comunicação da decisão final
da Administração Pública.
Neste sentido é o entendimento da Décima Turma deste E. Tribunal:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. REVISÃO DE
APOSENTADORIA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO
DESPROVIDO.
1. Nos presentes autos, aplica-se o regramento do Decreto nº 20.910/32, que regula a prescrição
quinquenal.
2. O requerimento administrativo tem o condão de suspender o curso do prazo prescricional, que
só se reinicia após a comunicação da decisão final da Administração. Precedentes do STJ e das
Cortes Regionais.
3. Entre a data do requerimento administrativo em 16/10/2003 e da comunicação da decisão de
indeferimento do recurso administrativo à parte autora datada de 06/07/2005, o prazo
prescricional restou suspenso, nos termos do Art. 4º do Decreto 20.910/32.
4. O ajuizamento desta ação ocorreu em 22/10/2007, tendo o prazo suspenso pelo processo
administrativo, e não ultrapassando o prazo prescricional de cinco anos.
5. Agravo desprovido." (TRF 3ª Região - Décima Turma - Ag. Legal em AC nº
2007.61.83.006989-2/SP, Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, DJU 07/05/2015).
Passo à análise da matéria de fundo.
Nos termos da Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal:
"A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais,
porque dêles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou
oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação
judicial."
No caso dos autos, após regular investigação, restou comprovada a irregularidade na concessão
do primeiro benefício da parte autora, mediante a inclusão do período de 01/03/57 a 30/12/62,
com base em documento falsificado, caracterizando a existência de fraude.
Cumpre salientar, outrossim, que a própria parte autora reconheceu a irregularidade existente no
deferimento do referido benefício, o que, nos termos da Súmula supracitada, possibilita à
autarquia a anulação de sua concessão.
Registre-se, por oportuno, que o fato de a parte autora ter sido absolvida no âmbito criminal não é
óbice à atuação do INSS, pois, ainda que o segurado não seja o responsável pela fraude , uma
vez verificada a ilegalidade, a revisão da concessão do benefício pela autarquia, com a
consequente cobrança dos valores indevidamente pagos, é medida que se impõe.
Considerando que a parte autora, sem preencher os requisitos legais, recebeu o benefício
durante mais de dez anos, o reconhecimento da impossibilidade de devolução dos valores
indevidamente auferidos geraria evidente enriquecimento sem causa, além de causar enorme
prejuízo aos cofres públicos.
Deve-se observar, entretanto, que em se tratando de manifestação do seu poder de autotutela,
torna-se imprescindível que o INSS obedeça aos princípios que norteiam a atuação da
administração pública.
Com efeito, da análise dos autos, nota-se que a autarquia respeitou todos esses princípios,
oportunizando à parte autora o exercício do contraditório durante todo o procedimento, e
procedendo à cobrança dos valores somente após o fim do processo administrativo.
Cabe destacar, ainda, que o procedimento realizado pelo INSS no sentido de adotar as
providências para o ressarcimento das quantias pagas indevidamente à parte autora, mediante
descontos nos seus proventos, mostra-se legal e legítimo, encontrando respaldo no art. 115, II e
parágrafo único, da Lei 8.213/91 e 3º do artigo 154 do Decreto nº 3048/99, que dispõem:
"Art. 115 . Podem ser descontados dos benefícios:
(....)
II - pagamento do benefício além do devido
(.....)
Parágrafo único. Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o
regulamento, salvo má-fé."
"Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício:
I - contribuições devidas pelo segurado à previdência social;
II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º;
(...)
§ 3º Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de
benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos
moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do
benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do
débito.
(...)"
Contudo, nota-se que referidos dispositivos preveem apenas que os descontos não poderão ser
superiores a 30% do valor do benefício, ou seja, fixa tão somente o valor máximo, não
determinando que o abatimento seja efetuado obrigatoriamente neste patamar.
De tal modo, por força do caráter alimentar do benefício, bem como considerando tratar-se de
pessoa de idade avançada e afastada das atividades profissionais, mostra-se desarrazoada a
fixação do desconto no valor máximo.
Assim sendo, mostra-se razoável a redução dos descontos efetuados pelo INSS na renda mensal
do benefício recebido pela parte autora. Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO (ART. 557, §1º, DO CPC). AGRAVO DE
INSTRUMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE COM
APOSENTADORIA POSTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.528/97. DEVOLUÇÃO DE
VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE. REDUÇÃO DO DESCONTO.
I - O parágrafo 2º do artigo 86 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97,
impede a cumulação do auxílio-acidente com qualquer aposentadoria. Nesse sentido, o C.
Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a legislação em vigor impede que o benefício do
auxílio-acidente seja pago em conjunto com a aposentadoria, caso um desses benefícios tenha
sido concedido após a entrada em vigor da Lei 9.528/97, como ocorre no caso dos autos, em que
a aposentadoria por invalidez foi concedida em 25.09.1998.
II - O ressarcimento dos valores indevidamente pagos não está eivado de qualquer ilegalidade,
encontrando abrigo nos artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91, e 154, § 3º, do Decreto
3.048/99.
III - Possibilidade de redução do desconto ao percentual de 10% (dez por cento) do valor do
benefício, com base no poder geral de cautela atribuído ao Magistrado e em razão de sua
natureza alimentar, bem como por se tratar de segurado idoso, a fim de não comprometer demais
a sua subsistência.
IV - Agravo do autor improvido (art. 557, §1º, do CPC)." (TRF3, 10ª Turma, AI 0012547-
33.2012.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento, j. em 24.07.2012, DJe 08.01.2012)
De rigor, portanto, a manutenção da r. sentença.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO CONCEDIDO INDEVIDAMENTE. EXISTÊNCIA DE FRAUDE.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES. VIABILIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Nos termos da Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal, "administração pode anular seus
próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque dêles não se originam
direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.".
2. Tendo sido comprovada a adulteração das informações referentes ao benefício concedido à
parte autora, caracterizando a existência de fraude, possível a anulação da concessão pela
autarquia, bem como a cobrança dos valores indevidamente pagos.
3. O ressarcimento das quantias indevidamente recebidas pela parte autora é legal e legítimo,
encontrando respaldo no art. 115, II e parágrafo único, da Lei 8.213/91 e 3º do artigo 154 do
Decreto nº 3048/99.
4. Apelação desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento a apelacao, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
