Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5059573-97.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
27/10/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 03/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. ART. 20, DA
LEI Nº 8.742/93. REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. O benefício de prestação continuada, regulamentado Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência
Social - LOAS), é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso
com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. Laudo médico pericial atesta que a autoria é portadora de Epilepsia e outras doenças a serem
investigadas e conclui que há incapacidade total e temporária para o exercício de atividade
laborativa, recomendando nova avaliação em dois anos.
3. Nos termos da Súmula 48 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais
Federais (TNU) “Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o
conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de
incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração
mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a data
prevista para a sua cessação.”
4. Analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que a autoria preenche o requisito da
deficiência para usufruir do benefício assistencial, à luz do Art. 20, § 2º da Lei 8.742/93.
5. Demonstrado, pelo conjunto probatório, que não possui meios de prover a própria manutenção
ou de tê-la provida por sua família, faz jus a autoria à percepção do benefício de prestação
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
continuada, correspondente a 1 (um) salário mínimo, desde a data do requerimento
administrativo.
6. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
7. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante nº
17.
8. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do
Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
9. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da
Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e
do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
10. Apelação provida em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5059573-97.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: LEANDRO ALBUQUERQUE MORATO
Advogado do(a) APELANTE: DAIANE BARROS SPINA - SP226103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5059573-97.2021.4.03.9999
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em face da sentença proferida em ação de conhecimento, em
que se busca a concessão do benefício de prestação continuada, previsto no Art. 203, da CF/88
e regulado pelo Art. 20, da Lei nº 8.742/93, a pessoa deficiente.
O MM. Juízo a quo, fundamentado na conclusão do laudo médico pericial, julgou improcedente
o pedido, condenando a parte autora ao pagamento de custas, despesas processuais e
honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, observada a
gratuidade da justiça.
Em seu recurso a parte autora pleiteia a reforma da sentença, sustentando que preenche os
requisitos legais para a concessão do benefício assistencial.
Subiram os autos, sem contrarrazões.
O Ministério Público Federal ofertou parecer, opinando pelo provimento do recurso.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5059573-97.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: LEANDRO ALBUQUERQUE MORATO
Advogado do(a) APELANTE: DAIANE BARROS SPINA - SP226103-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De acordo com o Art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, a assistência social será
prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social,
tendo por objetivos a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de
deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Sua regulamentação deu-se pela Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS),
que, no Art. 20, caput e § 3º, estabeleceu que o benefício é devido à pessoa deficiente e ao
idoso maior de sessenta e cinco anos cuja renda familiar per capita seja inferior a ¼ (um quarto)
do salário mínimo. In verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à
pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem
não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos
solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo
teto.
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a
família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
No julgamento da ADI 1.232-1/DF, em 27.08.1998, o Tribunal Pleno do Egrégio Supremo
Tribunal Federal, por maioria (três votos a dois), entendeu que o § 3º do Art. 20 da Lei 8.742/93
estabelece critério objetivo para a concessão do benefício assistencial, vencidos, parcialmente,
os ministros Ilmar Galvão e Néri da Silveira, que, embora igualmente reconhecessem sua
constitucionalidade, conferiam-lhe interpretação extensiva, por concluir que o dispositivo apenas
instituiu hipótese em que a condição de miserabilidade da família é presumida (presunção iuris
et iure), sem, no entanto, afastar a possibilidade de utilização de outros meios para sua
comprovação.
Ao apreciar o REsp 1.112.557/MG, em 28.10.2009, sob o regime do Art. 543-C do CPC, a
Terceira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou posição na linha do voto
minoritário do E. STF, por compreender que "a limitação do valor da renda per capita familiar
não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros
meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um
elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a
miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo",
consoante a ementa que ora colaciono:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO
SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98,
dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas
portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja
família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para
o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de
se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade,
ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita
inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)".
Nesse sentido pacificou-se a jurisprudência daquela Corte. Confiram-se: AgRg no Ag
1394664/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, 5ª Turma, DJe 03/05/2012; AgRg no Ag
1394595/SP, Relator Ministro Og Fernandes, 6ª Turma, DJe 09/05/2012; AgRg no Ag
1425746/SP, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 19/12/2011; AgRg no Ag
1394683/SP, Relator Ministro Gilson Dipp, 5ª Turma, DJe 01/12/2011; AgRg no REsp
1247868/RS, Relator Ministro Jorge Mussi, 5ª Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no REsp
1265039/RS, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe 28/09/2011;
AgRg no REsp 1229103/PR, Relator Ministro Adilson Vieira Macabu (Desembargador
convocado do TJ/RJ), 5ª Turma, DJe 03/05/2011; AgRg no Ag 1164852/RS, Relator Ministro
Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP), 5ª Turma, DJe
16/11/2010.
Assim, é de se observar que não obstante vários julgados tenham se baseado no entendimento
firmado na ADI 1.232/DF, aquele precedente cedeu espaço à interpretação inaugurada pelo
Ministro Ilmar Galvão, no sentido de que é possível a aferição da condição de hipossuficiência
econômica do idoso ou do portador de deficiência por outros meios que não apenas a
comprovação da renda familiar mensal per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
Mesmo no E. STF, que havia firmado entendimento diverso, a posição findou por ser revista
recentemente, em 18.04.2013, nos julgamentos do RE 567985/MT, pelo sistema da
repercussão geral, e da Reclamação (RCL) 4374, ocasião em que a Suprema Corte declarou
incidenter tantum a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, do Art. 20,
da Lei nº 8.742/1993.
Nestes termos:
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203,
V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um
salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, §
3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal
Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-se incapaz de
prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal
per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O requisito financeiro estabelecido
pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações
de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial
previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o
Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões
judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização
dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto,
não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per
capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de
se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram
editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios
assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa
Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a
Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever
anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a
ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas
(políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios
assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se
nega provimento.”
(RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR
MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG
02-10-2013 PUBLIC 03-10-2013)
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203,
V, da Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um
salário mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem
não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art.
20, § 3º da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo
Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-se
incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja
renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O requisito financeiro
estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria
que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do
benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de
Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do
art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão
proferida em controle de constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da
reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963 e 567.985, o
Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O STF, no exercício da competência
geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a
Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como
fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na reclamação. Isso decorre da própria
competência atribuída ao STF para exercer o denominado controle difuso da
constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A oportunidade de reapreciação das
decisões tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com mais
naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo hermenêutico
típico da reclamação – no “balançar de olhos” entre objeto e parâmetro da reclamação – que
surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle de
constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do STF, o
Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E,
inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro da reclamação,
se entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a
interpretação atual da Constituição. 4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos
preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei
8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia
quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS.
Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e
único estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com
entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios
mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004,
que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder
Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de
renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões
monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do
critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente
de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas
modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de
outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 5. Declaração de
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6.
Reclamação constitucional julgada improcedente.”
(Rcl 4374, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-173 DIVULG 03-09-2013 PUBLIC 04-09-2013)
Naquela mesma ocasião, julgou-se ainda o RE 580.963/PR, também submetido ao regime da
repercussão geral, em que o Pretório Excelso declarou igualmente inconstitucional o parágrafo
único do Art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso).
A ementa restou assim redigida:
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203,
V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um
salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, §
3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal
Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que: “considera-se incapaz de
prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal
per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O requisito financeiro estabelecido
pela Lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que
situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício
assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade
1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da
LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo
Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do
critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a Lei permaneceu
inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único estipulado pela
LOAS e de avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou
deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para
concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa
Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei
10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder
apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima
associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas,
passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. A inconstitucionalidade por omissão
parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34,
parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido a qualquer membro da família não
será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não
exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de
até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para
discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos
beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários
no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei
10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento.”
(RE 580963, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013,
PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-225 DIVULG 13-11-2013
PUBLIC 14-11-2013)
Bem explicado, trata-se, em ambos os casos, de inconstitucionalidade parcial por omissão.
No que se refere ao § 3º do Art. 20 da Lei 8.742/93, considerou-se, segundo o voto do Relator,
Ministro Gilmar Mendes, que o dispositivo "era insuficiente para cumprir integralmente o
comando constitucional do art. 203, V, Constituição da República", por não contemplar outras
hipóteses caracterizadoras da absoluta incapacidade de manutenção do idoso ou o deficiente
físico.
Já com relação ao Art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/03, a omissão implica em violação ao
princípio da isonomia, que, conquanto afaste do cálculo da renda per capita familiar o benefício
assistencial já concedido a outro membro da família, contempla apenas o idoso, excluindo do
mesmo tratamento o deficiente, assim como o idoso que conviva com familiar titular de
benefício previdenciário de valor mínimo.
Nesse quadro, com base na orientação recém firmada pela Corte Suprema, forçoso concluir
que se deve dar interpretação extensiva ao § 3º, do Art. 20, da Lei nº 8.742/93, a fim de
abranger outras situações em que comprovada a condição de miserabilidade do postulante ao
benefício assistencial. Ademais, em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também
estender a interpretação do parágrafo único do Art. 34 do Estatuto do Idoso, para excluir do
cálculo da renda per capita familiar o benefício de valor mínimo recebido por outro membro da
família, independentemente se de natureza assistencial ou previdenciária, aplicando-se a
mesma disposição ao deficiente.
No mesmo sentido, é a jurisprudência uniformizada pela Primeira Seção do e. Superior Tribunal
de Justiça, no julgamento do recurso representativo de controvérsia, sob o Tema nº 640, in
verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO,
NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no
valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do
benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do
Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código
de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.”
(REsp 1355052/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Data da
Publicação/Fonte DJe 05/11/2015).
Tecidas essas considerações, resta analisar se a parte autora implementa os requisitos legais
para a concessão do benefício pleiteado.
Cabe relembrar que o benefício assistencial requer o preenchimento de dois pressupostos para
a sua concessão, de um lado, sob o aspecto subjetivo, a deficiência e de outro lado, sob o
aspecto objetivo, a hipossuficiência.
No que concerne ao requisito da deficiência, o laudo, referente à perícia médica realizada em
09/08/2019, atesta que Leandro Albuquerque Morato, nascido em 31/12/1997, é portador de
Epilepsia e conclui que está temporariamente incapacitado para exercer alguma atividade
laborativa para que possa garantir a sua subsistência, nesses termos:
“Análise e Conclusão: O periciando é portador de Epilepsia, estando em uso de medicamento
anticonvulsivante de primeira linha e em baixa dose (100 mg 1 vez/dia).
Tem ainda cifose torácica, mas a queixa de dor local é lombar. A tomografia dessa área
revelou-se sem alterações.
Apresenta-se com excessiva timidez e indiferença, falta de iniciativa e disposição: depressivo?
Não consta avaliação psiquiátrica. Não há relato referente a uso de drogas ou outro fator. Cabe
melhor investigação.
Completou os estudos com dificuldades, tampouco consta avaliação da escola no âmbito
pedagógico.
Avalio, portanto, que se faz estritamente necessário e urgente submeter-se a avaliações
médicas especializadas, para emissão de relatório pormenorizado, nas áreas: Ortopedia e
Psiquiatria – além de Psicologia.
Tais relatórios devem conter diagnósticos, indicação de tratamento e prognóstico.
Com base nos elementos expostos e analisados, concluo: está temporariamente incapacitado
para exercer alguma atividade laboral que possa lhe garantir a subsistência.”
Em resposta ao quesito nº 11 formulado pelo réu, se “Caso haja incapacidade, qual o prazo de
afastamento necessário à recuperação da capacidade laborativa por parte do autor? Por quê?”,
afirmou a perita judicial que “Avalio razoável reavaliação em até 2 anos. Porque é necessário
ter acesso a avaliações especializadas e possivelmente tratamentos com a consequente
reavaliação.”.
Em que pese a incapacidade tenha sido classificada como total e temporária, como se vê dos
documentos médicos juntados aos autos, sendo o mais antigo datado em 06/03/2018, o autor
está em tratamento médico por ser portador de epilepsia refratária e outras patologias.
Considerando que foi recomendado pela perita judicial o prazo de 2 anos para o tratamento
pertinente e nova avaliação, é de se reconhecer que os impedimentos causados pelas doenças
são de longa data.
Dispõe o Decreto nº 6.214/2007, que regulamenta o benefício assistencial, in verbis:
Art. 4º Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
I - idoso: aquele com idade de sessenta e cinco anos ou mais;
II - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas;
II - incapacidade: fenômeno multidimensional que abrange limitação do desempenho de
atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de
inclusão social, em correspondência à interação entre a pessoa com deficiência e seu ambiente
físico e social;
(...)
§ 3º Considera-se impedimento de longo prazo aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo
de dois anos.
Impende destacar que nos termos da Súmula 48 da Turma Nacional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais (TNU): “Para fins de concessão do benefício assistencial de
prestação continuada, o conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde
necessariamente com situação de incapacidade laborativa, exige a configuração de
impedimento de longo prazo com duração mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso
concreto, desde o início do impedimento até a data prevista para a sua cessação.”
Como dito, o autor é portador de quadro de epilepsia refratária, ou seja, de difícil controle e está
excluído do mercado de trabalho frente a esse quadro. Ademais, o estudo social informa que o
autor “possui déficit de aprendizagem e esquecimentos, e dificuldades para se expressar e
realizar atividades básicas da vida cotidiana” e que ele e a família vivem em situação de risco e
vulnerabilidade social.
Assim, analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que o autor preenche o requisito
da deficiência para usufruir do benefício assistencial, à luz do Art. 20, § 2º da Lei 8.742/93.
Nesse sentido, a jurisprudência da Colenda Corte Superior:
“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
REVALORAÇÃO DE PROVAS. POSSIBILIDADE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. A LOAS, EM
SUA REDAÇÃO ORIGINAL, NÃO FEZ DISTINÇÃO QUANTO À NATUREZA DA
INCAPACIDADE, SE PERMANENTE OU TEMPORÁRIA, TOTAL OU PARCIAL. ASSIM NÃO É
POSSÍVEL AO INTÉRPRETE ACRESCER REQUISITOS NÃO PREVISTOS EM LEI PARA A
CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO INTERNO DO INSS A QUE SE NEGA
PROVIMENTO.
1. O STJ tem entendimento consolidado de que a errônea valoração da prova permite a esta
Corte Superior a revaloração dos critérios jurídicos utilizados pelo Tribunal de origem na
apreciação dos fatos incontroversos.
2. A Constituição Federal/1988 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário
mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa com
deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de
tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
3. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/1993, em seu art. 20, § 2o., em sua
redação original dispunha que a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a
vida independente e para o trabalho.
4. Em sua redação atual, dada pela Lei 13.146/2015, considera-se pessoa com deficiência
aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva
na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
5. Verifica-se que em nenhuma de suas edições a Lei impôs como requisito ao benefício
assistencial a incapacidade absoluta.
6. Não cabe ao intérprete a imposição de requisitos mais rígidos do que aqueles previstos na
legislação para a concessão do benefício.
7. Agravo Interno do INSS a que se nega provimento.”
(STJ, AgInt no AREsp 1263382/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA
TURMA, Data da Publicação/Fonte DJe 19/12/2018 RSTP vol. 357 p. 148);
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS. REEXAME.
PROVA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. CONCLUSÃO PERICIAL NÃO VINCULA O
JULGADOR. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO.
1. A tese defendida demanda o revolvimento do contexto fático dos autos e desafia a Súmula
7/STJ.
2. O quadro clínico apresentado pelo agravado denota o preenchimento dos requisitos para
concessão do benefício pleiteado, com base em documentos médicos, não obstante a perícia
judicial ter sido desfavorável. O acórdão acrescentou à situação de saúde do agravado a sua
conjuntura sócio-econômica, e concluiu pela condição de risco social.
3. As conclusões da perícia não vinculam o julgador, o qual pronuncia sua decisão de acordo
com o princípio do livre convencimento motivado. 4. A jurisprudência desta Corte admite a
concessão do benefício que ora se pleiteia, mesmo diante de laudo pericial que ateste a
capacidade para a vida independente.
5. Agravo regimental improvido."
(STJ, AgRg no REsp 1084550/PB, Rel. Ministro JORGE MUSSI, DJe 23/03/2009); e
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO PELA INCAPACIDADE PARCIAL DO
SEGURADO. NÃO VINCULAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA SÓCIO-ECONÔMICA, PROFISSIONAL
E CULTURAL FAVORÁVEL À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
1. Os pleitos previdenciários possuem relevante valor social de proteção ao Trabalhador
Segurado da Previdência Social, devendo ser, portanto, julgados sob tal orientação exegética.
2. Para a concessão de aposentadoria por invalidez devem ser considerados outros aspectos
relevantes, além dos elencados no art. 42 da Lei 8.213/91, tais como, a condição sócio-
econômica, profissional e cultural do segurado.
3. Embora tenha o laudo pericial concluído pela incapacidade parcial do segurado, o Magistrado
não fica vincula do à prova pericial, podendo decidir contrário a ela quando houver nos autos
outros elementos que assim o convençam, como no presente caso.
4. Em face das limitações impostas pela avançada idade, bem como pelo baixo grau de
escolaridade, seria utopia defender a inserção do segurado no concorrido mercado de trabalho,
para iniciar uma nova atividade profissional, motivo pelo faz jus à concessão de aposentadoria
por invalidez .
5. Agravo Regimental do INSS desprovido.
(STJ, AgRg no REsp 1055886/PB, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA
TURMA, julgado em 01/10/2009, DJe 09/11/2009).
Cabe frisar que o Art. 21 do mesmo diploma legal assegura à Autarquia o direito à revisão
periódica do benefício, a cada dois anos, a fim de aferir a persistência das condições que
autorizaram a sua concessão.
Por sua vez, foi comprovado que a parte autora não possui meios de prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Extrai do laudo social elaborado em 28/08/2019, que Leandro Albuquerque Morato, 21 anos,
solteiro, vivia com sua genitora Verginia Cavalcante de Albuquerque, 57 anos, desempregada,
com as irmãs Dariana C. Morato, 28 anos, desempregada, Jessica Albuquerque Morato, 22
anos, desempregada, e com os sobrinhos Ellen Eduarda A. Pereira, 04 anos, Gabriel A. Morato,
03 anos e Lohena A. Morato, 01 ano de idade.
A família residia em uma casa cedida, composta por cinco cômodos, com acabamentos internos
e externos, coberta com telha Brasilit e piso vermelhão.
A renda familiar era proveniente da pensão paga pelo ex-marido à genitora, no valor de
R$600,00 e do Programa Bolsa Família, que repassava R$220,00 à genitora e R$ R$80,00 à
irmã Denise, totalizando R$900,00.
Foram informadas despesas com alimentação, energia elétrica e água, no montante de
R$778,00.
Relatou a Assistente Social que a família sobrevivia com extrema dificuldade, com renda abaixo
da linha de extrema pobreza e que o autor o autor fazia acompanhamento médico com
neurologista e psiquiatra, utilizava medicamentos de uso contínuo fornecidos pela rede pública
de saúde,que muitas vezes era interrompido pela falta de medicamentos e a impossibilidade de
aquisição, devidos às condições financeiras da família, concluindo que o requerente se
enquadrava no perfil do BPC/Deficiente.
Após a manifestação das partes e do Ministério Público acerca das provas produzidas, o
julgamento foi convertido em diligência para determinar a complementação do estudo social, a
fim de responder aos quesitos formulados pelo Juízo.
Na diligência realizada, constatou a Assistente Social que o autor residia no mesmo local com
sua mãe, a irmã Jessica, desempregada, e com 3 sobrinhos e que a família continuava
sobrevivendo em condições de extrema vulnerabilidade, pois a renda auferida era insuficiente
para suprir suas necessidades básicas.
Foram juntados aos autos pelo INSS os extratos do CNIS em que consta que a irmã do autor,
Jessica Albuquerque Morato, está empregada desde 02/01/2020, com salário inicial de
R$1.081,69, bem como os extratos dos genitores, dando conta que Dario Morato aposentado e
recebe um salário mínimo, que a mãe efetua recolhimentos como contribuinte individual sobre o
valor do mínimo legal e, quanto à irmã Dariani Cristina Morato, que ela está desempregada
desde o ano de 2014.
Restou esclarecido nos autos que o genitor do autor não mais residia com a família há muitos
anos, devido à separação do casal e que ele pagava pensão alimentícia à família do autor, no
valor de R$600,00. Que a irmã Jessica deixou de integrar o núcleo familiar do autor, vez que ela
havia se mudado para o Estado do Rio de Janeiro e tinha sido admitida por uma empresa em
02/01/2000, no referido Estado, tendo sido informado o endereço da empresa, bem como o
endereço residencial da irmã.
Nesse passo, a renda auferida pela irmã, que não mais integra o núcleo familiar do autor, não
deve ser computada para se apurar a condição de hipossuficiência do grupo. Assim, resta
apenas o valor da pensão alimentícia que é paga à genitora e aquele repassado pelo Programa
Bolsa Família, insuficiente para suprir as necessidades básicas do núcleo familiar.
Cabe anotar que os valores oriundos dos programas de transferência de renda não devem ser
computados para aferição do critério da hipossuficiência econômica, conforme disposto no
Decreto 6.214, de 26 de setembro de 2007, que regulamenta o benefício de prestação
continuada, com redação dada pelo Decreto nº 7.617, de 2011 e o Decreto n° 8.805, de 2016,
in verbis:
"Art. 4º Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos
membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias,
benefícios de previdência pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pro-labore,
outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou
autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de
Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 19.
§ 2º Para fins do disposto no inciso VI do caput, não serão computados como renda mensal
bruta familiar:
I - benefícios e auxílios assistenciais de natureza eventual e temporária;
II - valores oriundos de programas sociais de transferência de renda;
III - bolsas de estágio supervisionado;
IV - pensão especial de natureza indenizatória e benefícios de assistência médica, conforme
disposto no art. 5º;
V - rendas de natureza eventual ou sazonal, a serem regulamentadas em ato conjunto do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do INSS; e
VI - rendimentos decorrentes de contrato de aprendizagem.
Destarte, analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que o autor encontra-se em
situação de vulnerabilidade e risco social e que preenche os requisitos legais para usufruir do
benefício de prestação continuada, correspondente a 1 (um) salário mínimo, nos termos do
caput, do Art. 20, da Lei 8.742/93.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo apresentado
em 03/09/2018, em conformidade com o entendimento assente no c. Superior Tribunal de
Justiça, in verbis:
“PREVIDENCIÁRIO. APLICABILIDADE DO ART. 557 DO CPC. ASSISTÊNCIA SOCIAL.
BENEFÍCIO PREVISTO NO ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TERMO INICIAL.
DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO QUANDO JÁ PREENCHIDOS OS
REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
I - O presente feito decorre de ação de concessão de benefício de prestação continuada
objetivando a concessão do benefício previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988,
sob o fundamento de ser pessoa portadora de deficiência e não possuir meios de prover a
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Na sentença, julgou-se improcedente o
pedido. No Tribunal Regional Federal da 3ª Região, a sentença foi reformada.
II - Esta Corte consolidou o entendimento de que havendo requerimento administrativo, como
no caso, este é o marco inicial dos efeitos financeiros do benefício assistencial. Nesse sentido:
REsp n. 1610554/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em
18/4/2017, DJe 2/5/2017; REsp n. 1615494/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, julgado em 1/9/2016, DJe 6/10/2016 e Pet n. 9.582/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes
Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 26/8/2015, DJe 16/9/2015.
III - Correta, portanto, a decisão que deu provimento ao recurso especial do Ministério Público
Federal.
IV - Agravo interno improvido.”
(AgInt no REsp 1662313 / SP, AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL, Rel. Ministro
FRANCISCO FALCÃO, 2ª TURMA, Data do Julgamento 21/03/2019, Data da Publicação/Fonte
DJe 27/03/2019).
Reconhecido o direito ao benefício assistencial, desde a data do requerimento administrativo,
com reavaliação no prazo legal, passo a dispor sobre os consectários incidentes sobre as
parcelas vencidas e a sucumbência.
A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante
nº 17.
Convém alertar que das prestações vencidas devem ser descontadas aquelas pagas
administrativamente ou por força de liminar, e insuscetíveis de cumulação com o benefício
concedido, na forma do Art. 20, § 4º, da Lei nº 8.742/93.
Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do Art.
85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da
Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01,
e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
Independentemente do trânsito, determino seja comunicado ao INSS a fim de que se adotem as
providências cabíveis ao imediato cumprimento deste julgado, conforme os dados do tópico
síntese do julgado abaixo transcrito.
Tópico síntese:
a) nome do beneficiário: Leandro Albuquerque Morato;
b) benefício: benefício assistencial (LOAS);
c) renda mensal: RMI - um salário mínimo;
d) DIB: 03/09/2018– data do requerimento administrativo;
e) número do benefício: indicação do INSS.
Por todo o exposto, dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. ART. 20, DA
LEI Nº 8.742/93. REQUISITOS PREENCHIDOS.
1. O benefício de prestação continuada, regulamentado Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da
Assistência Social - LOAS), é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência
e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de
prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. Laudo médico pericial atesta que a autoria é portadora de Epilepsia e outras doenças a
serem investigadas e conclui que há incapacidade total e temporária para o exercício de
atividade laborativa, recomendando nova avaliação em dois anos.
3. Nos termos da Súmula 48 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais
Federais (TNU) “Para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, o
conceito de pessoa com deficiência, que não se confunde necessariamente com situação de
incapacidade laborativa, exige a configuração de impedimento de longo prazo com duração
mínima de 2 (dois) anos, a ser aferido no caso concreto, desde o início do impedimento até a
data prevista para a sua cessação.”
4. Analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que a autoria preenche o requisito da
deficiência para usufruir do benefício assistencial, à luz do Art. 20, § 2º da Lei 8.742/93.
5. Demonstrado, pelo conjunto probatório, que não possui meios de prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, faz jus a autoria à percepção do benefício de
prestação continuada, correspondente a 1 (um) salário mínimo, desde a data do requerimento
administrativo.
6. A correção monetária, que incide sobre as prestações em atraso desde as respectivas
competências, e os juros de mora devem ser aplicados de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
7. Os juros de mora incidirão até a data da expedição do precatório/RPV, conforme decidido em
19.04.2017 pelo Pleno do e. Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579431,
com repercussão geral reconhecida. A partir de então deve ser observada a Súmula Vinculante
nº 17.
8. Os honorários advocatícios devem observar as disposições contidas no inciso II, do § 4º, do
Art. 85, do CPC, e a Súmula 111, do e. STJ.
9. A autarquia previdenciária está isenta das custas e emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da
Lei 9.289/96, do Art. 24-A da Lei 9.028/95, com a redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01,
e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93.
10. Apelação provida em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
