Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0008645-94.2015.4.03.6102
Relator(a)
Desembargador Federal GISELLE DE AMARO E FRANCA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
01/07/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 05/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. PEDIDO DE
RESTABELECIMENTO C/C DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. FALECIMENTO
DO AUTOR NO CURSO DO PROCESSO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO
DEMONSTRADA NO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO E O
ÓBITO DO TITULAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR ERRO DA
ADMINISTRAÇÃO. BOA FÉ. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS.
1. O benefício de prestação continuada, regulamentado Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência
Social - LOAS), é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso
com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. Não comprovada a situação de risco e vulnerabilidade social desde a data da cessação do
benefício em 01/09/2015, até o óbito do titular em 28/03/2017, não há falar-se em pagamento das
parcelas do benefício assistencial aos sucessores habilitados nos autos, no período
correspondente.
3. 1. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal, ser desnecessária a restituição dos
valores recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da
irrepetibilidade dos alimentos (MS 26085, Relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno; RE
587371, Relator Ministro Teori Zavascki, Tribunal Pleno; RE 638115, RE 638115, Relator Ministro
Gilmar Mendes, Tribunal Pleno).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4. Tendo a autoria decaído de parte do pedido, devem ser observadas as disposições contidas
nos §§ 2º, 3º, I, e 4º do Art. 85, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e
emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A, da Lei 9.028/95, com a
redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte autora,
por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas,
emolumentos e despesas processuais.
5. Apelação provida em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0008645-94.2015.4.03.6102
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: SUELI APARECIDA NUNES BATISTA, NAGILA NUNES BATISTA, LUCAS
NUNES BATISTA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0008645-94.2015.4.03.6102
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: SUELI APARECIDA NUNES BATISTA, NAGILA NUNES BATISTA, LUCAS
NUNES BATISTA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em face da sentença proferida em ação de ação de
conhecimento, com pedido de declaração de inexigibilidade de débito, em que se busca o
restabelecimento do benefício de amparo assistencial ao deficiente, concedido em 05/05/2005,
que foi cessado em 09/2015, por ter sido constatado na revisão administrativa renda
incompatível com a manutenção do benefício, cumulado com pedido de declaração de
inexigibilidade do valor deR$55.073,25, que está sendo cobrado a título de recebimento
indevido do benefício nos períodos de 04/2008 a 10/2008, 07/2009 a 02/2012 e a partir de
06/2012.
No curso do processo a Defensoria Pública atravessou petição noticiandoo falecimento do autor
José Roberto Batista em 28/03/2017, e requereu a habilitação de sua esposa e filhos, tendo
sido deferido opedido.
Após o regular processamento do feito o MM. Juízo a quo julgou improcedentes os pedidos,
condenando a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% do
valor da causa, observada a gratuidade da justiça.
Em seu recurso a parte autora pleiteia a reforma da r. sentença.
Subiram os autos, com contrarrazões.
O Ministério Público Federal ofertou parecer, opinando pelo parcial provimento do recurso, para
impedir a devolução dos valores auferidos no período indevido.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0008645-94.2015.4.03.6102
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: SUELI APARECIDA NUNES BATISTA, NAGILA NUNES BATISTA, LUCAS
NUNES BATISTA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Como se vê dos autos, José Roberto Batista, nascido em 10/04/1957 e falecido em 28/03/2017,
requereu o benefício de amparo assistencial ao deficiente no âmbito administrativo em
05/05/2005(NB 87/502.492.371) , tendo sido deferido o pedido.
Realizada a revisão administrativa, constatou-se indício de irregularidade quanto à renda
familiar nos períodos 4/2008 a 10/2008, 07/2009 a 02/2012 e a partir de 06/2012, em face dos
rendimentos auferidos por seus filhos Lucas Nunes Batista e Nagila Nunes Batista nos períodos
em questão, contrariando o § 3º do art. 20 da Lei n0 8.742, de 1993 e alterações posteriores,
originando a cobrança do valor de R$55.073,25.
Extrai-se das cópias do processo administrativo juntado aos autos, que não foi imputada má-fé
ao beneficiário.
Nesse sentido é o parecer do douto custos legis a seguir transcrito:
“Compulsando-se os autos, verifica-se que não existem elementos a demonstrar que o
apelante, com consciência e vontade, teria fraudado documentos ou ludibriou a autarquia para
obter de maneira irregular a tutela; pelo contrário, o apelante realizou todas as perícias
necessárias, bem como apresentou documentos legítimos.
Assim, com a devida vênia, é de prevalecer o entendimento do Supremo Tribunal Federal a
respeito, no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em
decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu
caráter alimentar. (...)
Dessa forma, não há que se falar em devolução dos valores pagos a título de benefício
assistencial, por se tratar de recebimento de boa fé e porque são valores indispensáveis para a
manutenção de uma vida digna, objetivando equilibrar a situação de desigualdade em face das
demais pessoas.
Como se sabe, a má-fé da apelada não pode ser presumida, devendo estar amparada em
robusta prova acostada aos autos, o que, in casu, não ocorreu. Não há nos autos quaisquer
informações de que tenha havido má-fé do autor no recebimento do o benefício ou que ele
tenha fraudado informações fornecidas a autarquia previdenciária.
Assim, deixa-se assentado que é descabida a devolução dos valores recebidos pela parte
autora, em razão do princípio da irrepetibilidade ou da não-devolução dos alimentos,
sistematicamente adotado pela jurisprudência.”
Nesse passo, em razão da boa-fé do autore da natureza alimentar do benefício, não há que se
falar em restituição dos valores indevidamente recebidos.
O e. Supremo Tribunal Federal ao analisar a questão da devolução de valores recebidos a título
de benefício, pacificou a questão no sentido de ser desnecessária a restituição dos valores
recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade
dos alimentos.
Confira-se:
"MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO QUE
CONSIDEROU ILEGAL APOSENTADORIA E DETERMINOU A RESTITUIÇÃO DE VALORES.
ACUMULAÇÃO ILEGAL DE CARGOS DE PROFESSOR. AUSÊNCIA DE COMPATIBILIDADE
DE HORÁRIOS. UTILIZAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA OBTENÇÃO DE VANTAGENS
EM DUPLICIDADE (ARTS. 62 E 193 DA LEI N. 8.112/90). MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADA.
DESNECESSIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES PERCEBIDOS. INOCORRÊNCIA DE
DESRESPEITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL E AO DIREITO ADQUIRIDO.
1. A compatibilidade de horários é requisito indispensável para o reconhecimento da licitude da
acumulação de cargos públicos. É ilegal a acumulação dos cargos quando ambos estão
submetidos ao regime de 40 horas semanais e um deles exige dedicação exclusiva.
2. O § 2ºdo art. 193 da Lei n. 8.112/1990 veda a utilização cumulativa do tempo de exercício de
função ou cargo comissionado para assegurar a incorporação de quintos nos proventos do
servidor (art. 62 da Lei n. 8.112/1990) e para viabilizar a percepção da gratificação de função
em sua aposentadoria (art. 193, caput, da Lei n. 8.112/1990). É inadmissível a incorporação de
vantagens sob o mesmo fundamento, ainda que em cargos públicos diversos.
3. O reconhecimento da ilegalidade da cumulação de vantagens não determina,
automaticamente, a restituição ao erário dos valores recebidos, salvo se comprovada a má-fé
do servidor, o que não foi demonstrado nos autos.
4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federaltem-se firmado no sentido de que, no exercício
da competência que lhe foi atribuída pelo art. 71, inc. III, da Constituição da República, o
Tribunal de Contas da União cumpre os princípios do contraditório, da ampla defesa e do
devido processo legal quando garante ao interessado - como se deu na espécie - os recursos
inerentes à sua defesa plena.
5. Ato administrativo complexo, a aposentadoria do servidor, somente se torna ato perfeito e
acabado após seu exame e registro pelo Tribunal de Contas da União.
6. Segurança parcialmente concedida.
(STF , MS 26085, Relatora Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 07/04/2008, DJe-107
divulg 12-06-2008 public 13-06-2008 ement vol
-02323-02 PP-00269 RTJ VOL-00204-03 PP-01165)".
Ainda, no julgamento do RE 587.371, o Pleno do STF ressaltou, conforme excerto do voto do
Ministro Relator: "... 2) preservados, no entanto, os valores da incorporação já percebidos pelo
recorrido, em respeito ao princípio da boa-fé , (...)" ( STF , RE 587371, Relator: Min. Teori
Zavascki, Tribunal Pleno, julgado em 14/11/2013, acórdão eletrônico Repercussão Geral-Mérito,
DJe-122 divulg 23.06.2014, public 24.06.2014).
O Pleno do STF, ao julgar o RE 638115, novamente decidiu pela irrepetibilidade dos valores
recebidos de boa-fé, conforme a ata de julgamento de 23.03.2015, abaixo transcrita:
"Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, apreciando o tema 395 da repercussão
geral, conheceu do recurso extraordinário, vencidos os Ministros Rosa Weber, Luiz Fux,
Cármen Lúcia e Celso de Mello. Em seguida, o Tribunal, por maioria, deu provimento ao
recurso extraordinário, vencidos os Ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello. O
Tribunal, por maioria, modulou os efeitos da decisão para desobrigar a devolução dos valores
recebidos deboa-fé pelos servidores até esta data, nos termos do voto do relator, cessada a
ultra-atividade das incorporações concedidas indevidamente, vencido o Ministro Marco Aurélio,
que não modulava os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Roberto Barroso. Presidiu o
julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 19.03.2015.
(RE 638115, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 19/03/2015, processo
eletrônico Repercussão Geral-Mérito DJe-151 divulg 31-07-2015 public 03-08-2015)".
Cito, ainda, o seguinte precedente:
“DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO
COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR . RECEBIMENTO
DEBOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA
REVOGADA. DEVOLUÇÃO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que
o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão
judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar .
Precedentes. 2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores
indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art.
115 da Lei nº8.213/1991. Precedentes. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, ARE 734242 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em
04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICODJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015);
AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE
DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE
1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO
JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE
BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA
LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A jurisprudência desta
Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição de valores percebidos
indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o servidor público está de
boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 13/6/2008; AI
490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010) 2. A boa-fé na percepção de
valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos afastam o dever de sua
restituição. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, MS 25921 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 01/12/2015,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-060 DIVULG 01-04-2016 PUBLIC 04-04-2016).”
Nesse sentido decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça ao julgar o REsp 1381734/RN,
submetido ao rito dos recursos repetitivos – TEMA 979 - Devolução ou não de valores
recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má
aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social (data do julgamento 10/03/21,
publicado DJe 23/04/21.
Confira-se:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991.
DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E
MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO.
POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS
ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA
PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada
ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à
hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio
também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou
assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e
similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à
suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n.
8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte
tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por
força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência
Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má
aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má
aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque
também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser
aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a
sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução
dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível
que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a
presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela
administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum
compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração
previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos
objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale
dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro,
necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n.
3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou
indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de
erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o
devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com
desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o
seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal,
ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé
objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento
indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste
representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável
interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a
centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os
processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste
acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a
cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se
estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de
simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na
exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos
benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da
vedação ao princípio do enriquecimento sem causa.
Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos
dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
10/03/2021, DJe 23/04/2021)”.
No que concerne ao pedido de recebimento das prestações vencidas desde a data da cessação
do benefício em 09/2015, até a data do óbito do autor em 28/03/2017, melhor sorte não assiste
aos apelantes.
Como cediço, o benefício de amparo assistencial regulamentado pela Lei 8.742/93 (Lei
Orgânica da Assistência Social - LOAS), dispõe em seu Art. 20, caput e § 3º, que o benefício é
devido à pessoa deficiente e ao idoso maior de sessenta e cinco anos cuja renda familiar per
capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
O benefício assistencial requer, portanto, o preenchimento de dois pressupostos para a sua
concessão, de um lado sob o aspecto subjetivo, a deficiência e de outro lado, sob o aspecto
objetivo, a hipossuficiência.
Não há controvérsia acerca do primeiro requisito, tendo sido reconhecido pela autarquia que o
autor apresentava incapacidade para a vida independe e para o trabalho, sendo portador de
Miastenia Gravis – CID G70.0 e Traumatismo Intracraniano – CID S06, cabendo destacar que o
autor encontrava-se internado em um hospital e também havia sido interditado.
Além disso, cumpria à parte autora demonstrar que não possuía meios de prover a própria
manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Na avaliação social realizada administrativamente em 16/09/2014, constatou-se que o autor
José Roberto Batista, residia com sua esposa e curadora Sueli Aparecida Nunes Batista, titular
de benefício de amparo assistencial à pessoa portadora de deficiência desde 2006, e com os
filhos Lucas, 24 anos, solteiro, ensino médio completo, profissão soldador, empregado
formalmente, e Nágila, 20 anos, solteira, ensino médio completo, empregada formalmente como
operadora de telemarketing.
A família residia em casa própria, composta por 5 cômodos, que contava com rede de
infraestrutura básica, mas necessitava de acabamentos e adaptação para locomoção do autor e
sua esposa.
Em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também estender a interpretação do Parágrafo
único, do Art. 34, do Estatuto do Idoso, para excluir do cálculo da renda per capita familiar
também o benefício de valor mínimo recebido por deficiente ou outro idoso.
Nesse sentido, confira-se:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203,
V, da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um
salário mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não
possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, §
3º, da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal
Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que: "considera-se incapaz de
prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal
per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido
pela Lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que
situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício
assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade
1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da
LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo
Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do
critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a Lei permaneceu
inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único estipulado pela
LOAS e de avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou
deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para
concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa
Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei
10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder
apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima
associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas,
passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações
legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros
benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. A inconstitucionalidade por omissão
parcial do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34,
parágrafo único, que o benefício assistencial já concedido a qualquer membro da família não
será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não
exclusão dos benefícios assistenciais recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de
até um salário mínimo, percebido por idosos. Inexistência de justificativa plausível para
discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos
beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários
no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial inconstitucional. 5. Declaração de
inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei
10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega provimento."
(STF, RE 580963, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013,
PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-225 DIVULG 13-11-2013
PUBLIC 14-11-2013) e
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO,
NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no
valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do
benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do
Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código
de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008."
(STJ, REsp 1355052/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Data da
Publicação/Fonte DJe 05/11/2015).
Entretanto,mesmo que seja excluído o valor de um salário mínimo da renda familiar,
proveniente do benefício assistencial concedido a esposa portadora de deficiência, o conjunto
probatório denota que o autor não vivia em situação de penúria.
Com efeito, os extratos do CNIS juntados aos autos comprovam que Nagila Nunes Batista
laborou formalmente nos períodos de 01/06/2012 a 01/09/2016, e de 27/03/2017 a 24/05/2018,
com salário superior ao mínimo legal, e quanto ao filho Lucas Nunes Batista, que trabalhou nos
períodos 09/02/2015 a 30/09/2015 e a partir de 18/04/2017, e seu salário também ultrapassava
o valor de um salário mínimo, como se vê dos valores discriminados nos extratos
previdenciários.
Como cediço, o critério da renda per capita familiar não é o único a ser considerado para se
comprovar a condição de necessitado da pessoa idosa ou deficiente que pleiteia o benefício.
Todavia, no caso dos autos, analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que no
período em que foi cessado o benefício (01/09/2015), até o falecimento do autor em
28/03/2017, não estava caracterizada a situação de vulnerabilidade e risco social a ensejar a
concessão do benefício assistencial.
Destarte, é de se reformar a r. sentença, para declarar a inexigibilidade dos valores que estão
sendo cobrados pela autarquiaa título de benefício assistencial usufruído pelo autor nos
períodos indicados no voto, relativos ao NB 87/502.492.371-1, e julgar improcedente o pedido
de restabelecimento do benefício assistencial e o pagamento aos sucessores das parcelas
vencidas desde a data da cessação do benefício até o falecimento do titular.
Tendo a autoria decaído de parte do pedido, devem ser observadas as disposições contidas
nos §§ 2º, 3º, I, e 4º do Art. 85, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e
emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A, da Lei 9.028/95, com a
redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte
autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas,
emolumentos e despesas processuais.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. PEDIDO DE
RESTABELECIMENTO C/C DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO.
FALECIMENTO DO AUTOR NO CURSO DO PROCESSO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA
NÃO DEMONSTRADA NO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A CESSAÇÃO DO
BENEFÍCIO E O ÓBITO DO TITULAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR ERRO
DA ADMINISTRAÇÃO. BOA FÉ. PRINCÍPIO DA IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS.
1. O benefício de prestação continuada, regulamentado Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da
Assistência Social - LOAS), é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência
e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de
prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. Não comprovada a situação de risco e vulnerabilidade social desde a data da cessação do
benefício em 01/09/2015, até o óbito do titular em 28/03/2017, não há falar-se em pagamento
das parcelas do benefício assistencial aos sucessores habilitados nos autos, no período
correspondente.
3. 1. Restou pacificado pelo e. Supremo Tribunal Federal, ser desnecessária a restituição dos
valores recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do princípio da
irrepetibilidade dos alimentos (MS 26085, Relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno; RE
587371, Relator Ministro Teori Zavascki, Tribunal Pleno; RE 638115, RE 638115, Relator
Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno).
4. Tendo a autoria decaído de parte do pedido, devem ser observadas as disposições contidas
nos §§ 2º, 3º, I, e 4º do Art. 85, do CPC. A autarquia previdenciária está isenta das custas e
emolumentos, nos termos do Art. 4º, I, da Lei 9.289/96, do Art. 24-A, da Lei 9.028/95, com a
redação dada pelo Art. 3º da MP 2.180-35/01, e do Art. 8º, § 1º, da Lei 8.620/93 e a parte
autora, por ser beneficiária da assistência judiciária integral e gratuita, está isenta de custas,
emolumentos e despesas processuais.
5. Apelação provida em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
