Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5611603-23.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
01/04/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 03/04/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO ASSISTENCIAL AO IDOSO. ART. 20, DA LEI Nº
8.742/93. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA.
1. O benefício de prestação continuada, regulamentado Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência
Social - LOAS), é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso
com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. Em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também estender a interpretação do Parágrafo
único, do Art. 34, do Estatuto do Idoso, para excluir do cálculo da renda per capita familiar
também o benefício de valor mínimo recebido por deficiente ou outro idoso.
3. O critério da renda per capita do núcleo familiar não é o único a ser considerado para se
comprovar a condição de necessitado do idoso ou do deficiente que pleiteia o benefício.
4. Analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que não está configurada a situação de
vulnerabilidade ou risco social a autorizar a concessão do benefício assistencial.
5. Ausente um dos requisitos legais, a autoria não faz jus ao benefício assistencial. Precedentes
desta Corte.
6. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado dado à causa, observando-se
o disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita, ficando a cargo do
Juízo de execução verificar se restou ou não inexequível a condenação em honorários.
7. Remessa oficial e apelação providas.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5611603-23.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HELENA MARIA BENATI DE PAULA MELO
Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO BARBOSA DE OLIVEIRA - SP250484-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5611603-23.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HELENA MARIA BENATI DE PAULA MELO
Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO BARBOSA DE OLIVEIRA - SP250484-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de remessa oficial e apelação interposta em ação de conhecimento, com pedido de
tutela antecipada, distribuída em 04/05/2017, em que se busca a concessão do benefício de
prestação continuada, previsto no Art. 203, da CF/88 e regulado pelo Art. 20, da Lei nº 8.742/93,
a pessoa idosa.
O MM. Juízo a quo julgou procedente o pedido, condenando o réu a conceder o benefício
assistencial em favor da autoria, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data do
requerimento administrativo (22/02/2017), pagar as prestações vencidas acrescidas de correção
monetária e juros de mora, e honorários advocatícios de 10% do valor condenação, observada a
Súmula 111 do STJ. Tutela antecipada deferida, para determinar a implantação do benefício no
prazo de 10 (dez) dias.
Apela o réu, pleiteando a reforma da r. sentença, sustentando que não restou comprovada a
situação de miserabilidade para a concessão do benefício assistencial. Assevera, ainda, que na
data do requerimento administrativo a autora ainda não preenchia o requisito etário para fins de
BPC Idoso. Subsidiariamente, requer a alteração da DIB na data do laudo social e que seja
observado o disposto na Lei 11.960/09, no que tange aos juros de mora e correção monetária.
Subiram os autos, com contrarrazões.
O Ministério Público Federal ofertou seu parecer, opinando pelo desprovimento da apelação
interposta.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5611603-23.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: HELENA MARIA BENATI DE PAULA MELO
Advogado do(a) APELADO: MARCO ANTONIO BARBOSA DE OLIVEIRA - SP250484-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De acordo com o Art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, a assistência social será prestada
a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, tendo por
objetivos a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência
e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
Sua regulamentação deu-se pela Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), que,
no Art. 20, caput e § 3º, estabeleceu que o benefício é devido à pessoa deficiente e ao idoso
maior de sessenta e cinco anos cuja renda familiar per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do
salário mínimo. In verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa
com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros,
os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família
cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
O benefício assistencial requer, portanto, o preenchimento de dois pressupostos para a sua
concessão, de um lado sob o aspecto subjetivo, a deficiência e de outro lado, sob o aspecto
objetivo, a hipossuficiência.
No que concerne ao requisito da deficiência, malgrado conste dos autos que na data do pedido
administrativo formulado em 22/02/2017 (ID 58997444) e na data do ajuizamento da ação em
04/05/2017, a autora Helena Maria Benati de Paula Melo, nascida aos 20/05/1952, ainda não
havia atingido a idade de 65 anos, para os efeitos do Art. 20, da Lei 8.742/93 e do Art. 34, da Lei
10.741/03, esse requisito foi preenchido no curso do processo, de modo que resta analisar se
também preenchia o requisito da hipossuficiência econômica a partir desse evento.
Extrai-se do laudo social elaborado em 30/11/2017, que a autora Helena Maria Benati de Paula
Melo, nascida aos 20/05/1952, residia com seu cônjuge Benedito Cardoso de Melo, 66 anos,
aposentado, com a filha Camila de Paula Melo, 34 anos, solteira (arrimo de família), ensino
médio, desempregada, e com o neto Miguel de Paula Melo, filho de Camila, 09 anos de idade,
estudante, que não recebia pensão alimentícia.
A família residia em imóvel próprio, uma casa térrea situada na Rua Miguel Jacob, 56, Jardim
América, em Ituverava/SP, construída em alvenaria, composta por três dormitórios, sala, cozinha
e banheiro, em regulares condições de uso e habitabilidade, guarnecida com mobiliário básico.
A renda familiar era proveniente da aposentadoria do cônjuge, no valor de um salário mínimo
(R$937,00).
A autora declarou que as despesas mensais totalizam R$2.840,00, distribuída entrealimentação
(R$2.000,00), energia elétrica (R$220,00), água e esgoto (R$200,00) e farmácia (R$400,00), não
tendo mencionado outras despesas ou dívidas vencidas.
Concluiu a Assistente Social que o grupo familiar da autora atendia ao critério da renda familiar
para a concessão do benefício, porquanto existia situação de dependência econômica de apenas
um membro da família, já idoso, e que havia “outros integrantes do grupo familiar em idade e
condições laborais que se encontra fora do mercado de trabalho formal ou informal” (ID
58997464).
Em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também estender a interpretação do Parágrafo
único, do Art. 34, do Estatuto do Idoso, para excluir do cálculo da renda per capita familiar
também o benefício de valor mínimo recebido por deficiente ou outro idoso.
Nesse sentido, confira-se:
"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição da República, estabeleceu os critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo seja concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º, da Lei
8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na
ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que: "considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela Lei teve
sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto
constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais
contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e processo de inconstitucionalização dos
critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não
pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita
estabelecido pela LOAS. Como a Lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de
contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas
leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais,
tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o
Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei
9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que
instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O
Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência
do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas,
econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares
econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte
do Estado brasileiro). 4. A inconstitucionalidade por omissão parcial do art. 34, parágrafo único,
da Lei 10.741/2003. O Estatuto do Idoso dispõe, no art. 34, parágrafo único, que o benefício
assistencial já concedido a qualquer membro da família não será computado para fins do cálculo
da renda familiar per capita a que se refere a LOAS. Não exclusão dos benefícios assistenciais
recebidos por deficientes e de previdenciários, no valor de até um salário mínimo, percebido por
idosos. Inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em
relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos
idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo. Omissão parcial
inconstitucional. 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do
art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003. 6. Recurso extraordinário a que se nega
provimento."
(STF, RE 580963, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013,
PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-225 DIVULG 13-11-2013
PUBLIC 14-11-2013) e
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008."
(STJ, REsp 1355052/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Data da
Publicação/Fonte DJe 05/11/2015).
Entretanto, no caso dos autos, mesmo que seja excluído o benefício de aposentadoria auferido
pelo cônjuge da autora, no valor de um salário mínimo, o conjunto probatório não comprova, de
maneira inequívoca, que a autora encontra-se em situação de penúria.
Com efeito, como se vê dos autos, diante da discrepância entre a renda familiar (um salário
mínimo), e as despesas declaradas, o Juízo determinou a complementação do estudo social (ID
58997481), nesses termos:
“Vistos.
Considerando o mencionado no estudo social de fls.88, referente aos gastos; água R$ 200,00,
energia R$ 220,00, alimentação R$ 2.000,00 e farmácia R$ 400,00, - bem ainda a renda
mencionada de 01 salário recebido por Benedito, tornem os autos ao expert para que esclareça
se a família recebe ajuda de terceiros, ou de qual forma providencia para cobrir os custos
mencionados, inclusive consignando se o salário recebido pelo Sr Benedito, refere-se ao salário
mínimo.
Após os esclarecimentos, vista às partes.
Int.”
Malgrado a determinação judicial, a experta quedou-se silente e após a vista dos autos às partes
e ao Ministério Público, foi encerrada a instrução processual.
Acresça-se que consta da petição inicial que a autora era residente e domiciliada na Rua Miguel
Jacob, 142, no Bairro Jardim América, no Município de Ituverava/SP, entretanto, o estudo social
foi realizado na mesma rua, porém no imóvel situado no nº 56.
De outro norte, ainda que a filha e o netonão integrem o núcleo familiar da autora, para os fins do
Art. 20, § 1º, da Lei 8.742/93, como residem sob o mesmo teto, compartilham as despesas em
comum e mesmo que ela não estivesse empregada formalmente quando do estudo social, consta
que era “arrimo de família” e os documentos que instruíram a inicial dão conta que ela é habilitada
para dirigir veículos(ID 58997436 – pág. 5). Além disso, consta da apelação que a filha da autora
residia em imóvel distinto do endereço da genitora, conforme informações colhidas dos registros
da Receita Federal, de modo que a situação narrada no estudo social não condiz com a alegada
condição de miserabilidade.
Como cediço, o critério da renda per capita do núcleo familiar não é o único a ser considerado
para se comprovar a condição de necessitado do idoso ou do deficiente que pleiteia o benefício.
Analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que não restou demonstrada a condição de
vulnerabilidade ou risco social a ensejar a concessão do benefício assistencial.
Destarte, ausente um dos requisitos legais, decerto que, ao menos nesse momento, a parte
autora não faz jus ao benefício assistencial de prestação continuada do Art. 20, da Lei nº
8.742/93.
Nessa esteira, traz-se a lume jurisprudência desta Corte Regional:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO
CONTINUADA. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E DE CARÊNCIA DE AÇÃO.
VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. ART. 20, §3º, DA LEI N. 8.742/93. PROCESSO
DE INCONSTITUCIONALIZAÇÃO. VALORAÇÃO DE TODO CONJUNTO PROBATÓRIO.
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE NÃO COMPROVADA. INCAPACIDADE PARA O LABOR.
REEXAME DE PROVAS. BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA.
I - A preliminar de inépcia da inicial deve ser rejeitada, uma vez que, não obstante a singeleza de
seu termos, é possível deduzir de seu contexto a alegação de suposta violação ao art. 20 da Lei
n. 8.742/93, a embasar a rescisão com fundamento no inciso V do art. 485 do CPC.
II - A preliminar de carência de ação confunde-se com o mérito e com este será apreciada.
III - A possibilidade de se eleger mais de uma interpretação à norma regente, em que uma das
vias eleitas viabiliza o devido enquadramento dos fatos à hipótese legal descrita, desautoriza a
propositura da ação rescisória, a teor da Súmula n. 343 do STF.
IV - A r. decisão rescindenda, sopesando as provas constantes dos autos (laudo médico pericial,
laudo social e CNIS), concluiu pelo não preenchimento dos requisitos legais necessários para a
concessão do benefícios assistencial (comprovação de incapacidade total para o labor e
demonstração de miserabilidade).
V - Conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93(ADI
1.232/DF), a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva
pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações
subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família.
Tal interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial
julgado pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-
MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
VI - O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da
miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião
do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão,
após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 -
PE, julgada em 18.04.2013. Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de
vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de
inconstitucionalização ". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico
desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um
distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e
aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar.
VII - É de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação
específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência
é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão
ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um
mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do
salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
VIII - Não obstante a r. decisão rescindenda tenha destacado como prova da ausência de
miserabilidade a renda familiar per capita superior a ¼ de salário mínimo, outros elementos
probatórios foram também considerados para apreciação da condição econômico-financeira da
parte autora, notadamente o laudo social, que faz referência ao imóvel em que a autora e sua
família residiam (...Residem em casa própria, composta por 2 quartos, sala, despensa, cozinha e
banheiro, guarnecida com mobiliário e utensílios necessários para o conforto da família..).
IX - Na apreciação de eventual violação de lei, há que ser considerada a situação fática existente
por ocasião do ajuizamento da ação subjacente. No caso em tela, a r. decisão rescindenda se
ateve ao laudo social (07.06.2011), ao laudo médico (30.08.2011) e ao CNIS referente ao
companheiro da autora, o Sr. Luciano dos Santos, no ano de 2011, para concluir pela ausência
de miserabilidade. Alterações posteriores em sua situação econômico-financeira, que poderiam,
em tese, colocá-la na condição de hipossuficiência econômica, ensejariam a propositura de nova
ação objetivando a concessão do benefício assistencial, todavia, em sede de rescisória, não é
possível considerar fatos posteriores ao feito subjacente.
X - Em relação à ocorrência ou não de incapacidade para o labor, cabe assinalar que tal análise
implicaria a reapreciação de provas, o que é vedado na ação rescisória.
XI - Em face de a autora ser beneficiária da Justiça Gratuita, não há condenação em ônus de
sucumbência.
XII - Preliminares rejeitadas. Ação rescisória cujo pedido se julga improcedente.
(TRF3, AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0018333-24.2013.4.03.0000/SP, Relator Desembargador Federal
Sergio Nascimento Terceira Seção, publicado no D.E. em 09/10/2014);
CONSTITUCIONAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS NÃO
COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. VERBAS DE
SUCUMBÊNCIA.
I - Não obstante o implemento do requisito etário, verifica-se que não restou comprovada a
miserabilidade da parte autora.
II - Observo que não se olvida que o entendimento predominante na jurisprudência é o de que o
limite de renda per capita de um quarto do salário mínimo, previsto no artigo 20, §3º, da Lei
8.742/93, à luz do sistema de proteção social ora consolidado, se mostra inconstitucional,
devendo a análise da miserabilidade levar em conta a situação específica do postulante ao
benefício assistencial .
III - Não há condenação da apelante em verbas de sucumbência, por se tratar de beneficiária da
assistência judiciária gratuita.
IV - Apelação da parte autora improvida.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 0044063-42.2015.4.03.9999/SP, Rel. Desembargador Federal Sergio
Nascimento, 10ª Turma, D.E. 30/05/2016); e
PREVIDENCIÁRIO. ART. 543-C, §7º, INC. II, DO CPC. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA.
I- O Colendo Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que a
miserabilidade alegada pela parte autora deve ser analisada pelo magistrado, em cada caso
concreto, de acordo com todas as provas apresentadas nos autos, não devendo ser adotado o
critério objetivo de renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo, bem como que benefício
previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não deve ser computado no
cálculo da renda per capita.
II- Não ficou comprovada a miserabilidade, requisito indispensável para a concessão do benefício
assistencial previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal, regulamentado pela Lei n.º
8.742/93.
III- Aplicação do art. 543-C, §7º, inc. II, do CPC.
IV- Agravo improvido. Acórdão mantido.
(APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011300-03.2006.4.03.9999/SP, Proc. 2006.03.99.011300-0/SP, Rel.
Desembargador Federal David Dantas, 8ª Turma, D.E. 21/03/2016)".
Cabe relembrar que o escopo da assistência social é prover as necessidades básicas das
pessoas, sem as quais não sobreviveriam.
Consigno que, com a eventual alteração das condições descritas, a parte autora poderá formular
novamente seu pedido.
Destarte, é de se reformar a r. sentença, cassando expressamente a tutela concedida, havendo
pela improcedência do pedido, arcando a autoria com honorários advocatícios de 10% sobre o
valor atualizado dado à causa, observando-se o disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser
beneficiária da justiça gratuita, ficando a cargo do Juízo de execução verificar se restou ou não
inexequível a condenação em honorários.
Comunique-se ao INSS.
Ante o exposto, dou provimento à remessa oficial e à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO ASSISTENCIAL AO IDOSO. ART. 20, DA LEI Nº
8.742/93. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA.
1. O benefício de prestação continuada, regulamentado Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência
Social - LOAS), é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso
com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção nem de tê-la provida por sua família.
2. Em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também estender a interpretação do Parágrafo
único, do Art. 34, do Estatuto do Idoso, para excluir do cálculo da renda per capita familiar
também o benefício de valor mínimo recebido por deficiente ou outro idoso.
3. O critério da renda per capita do núcleo familiar não é o único a ser considerado para se
comprovar a condição de necessitado do idoso ou do deficiente que pleiteia o benefício.
4. Analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que não está configurada a situação de
vulnerabilidade ou risco social a autorizar a concessão do benefício assistencial.
5. Ausente um dos requisitos legais, a autoria não faz jus ao benefício assistencial. Precedentes
desta Corte.
6. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado dado à causa, observando-se
o disposto no § 3º, do Art. 98, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita, ficando a cargo do
Juízo de execução verificar se restou ou não inexequível a condenação em honorários.
7. Remessa oficial e apelação providas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento a remessa oficial e a apelacao, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
