D.E. Publicado em 30/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013675-54.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação em ação de conhecimento, protocolada em 07/01/2014, que tem por objeto condenar o réu a conceder o benefício de prestação continuada, previsto no Art. 203, da CF/88 e regulado pelo Art. 20, da Lei nº 8.742/93, a pessoa idosa.
O MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido, condenando a autoria no pagamento das custas e honorários advocatícios arbitrados em R$1.500,00, observada a gratuidade da justiça.
Apela a autoria, pleiteando a reforma da r. sentença, sustentando em apertada síntese, que preenche os requisitos legais para a concessão do benefício assistencial.
Subiram os autos, sem contrarrazões.
O Ministério Público Federal O Ministério Público Federal, no parecer exarado às fls. 158/182, informou o falecimento da parte autora em 18/08/2015 e requereu a restituição dos autos ao Juízo de origem, para que seja procedida a intimação dos seus herdeiros para se manifestarem acerca de eventual interesse na sucessão processual.
É o relatório.
VOTO
No que concerne ao parecer do douto custos legis, impende destacar que o falecimento da parte autora somente foi noticiado nesta instância, e em observância aos princípios da celeridade e economia processual, entendo que a habilitação dos herdeiros poderá ser regulamentada conforme o entendimento do Juízo de origem, sendo possível o conhecimento do recurso interposto.
Nesse sentido já decidiu esta Corte Regional:
De outra parte, ressalto que A despeito do caráter personalíssimo do benefício assistencial, que apenas pode ser requerido pelo portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, o entendimento firmado pelas Turmas que integram a 3ª Seção desta Corte, é no sentido de que os sucessores fazem jus ao recebimento dos valores que o titular teria direito em vida.
Confira-se:
Passo ao exame da matéria de fundo.
De acordo com o Art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, tendo por objetivos a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Sua regulamentação deu-se pela Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), que, no Art. 20, caput e § 3º, estabeleceu que o benefício é devido à pessoa deficiente e ao idoso maior de sessenta e cinco anos cuja renda familiar per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. In verbis:
No julgamento da ADI 1.232-1/DF, em 27.08.1998, o Tribunal Pleno do e. Supremo Tribunal Federal, por maioria (três votos a dois), entendeu que o § 3º do Art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece critério objetivo para a concessão do benefício assistencial, vencidos, parcialmente, os ministros Ilmar Galvão e Néri da Silveira, que, embora igualmente reconhecessem sua constitucionalidade, conferiam-lhe interpretação extensiva, por concluir que o dispositivo apenas instituiu hipótese em que a condição de miserabilidade da família é presumida (presunção iuris et iure), sem, no entanto, afastar a possibilidade de utilização de outros meios para sua comprovação.
Ao apreciar o REsp 1.112.557/MG, em 28.10.2009, sob o regime do Art. 543-C do CPC, a Terceira Seção do c. Superior Tribunal de Justiça firmou posição na linha do voto minoritário do e. STF, por compreender que "a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo", consoante a ementa que ora colaciono:
Nesse sentido pacificou-se a jurisprudência daquela Corte. Confiram-se: AgRg no Ag 1394664/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, 5ª Turma, DJe 03/05/2012; AgRg no Ag 1394595/SP, Relator Ministro Og Fernandes, 6ª Turma, DJe 09/05/2012; AgRg no Ag 1425746/SP, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, 6ª Turma, DJe 19/12/2011; AgRg no Ag 1394683/SP, Relator Ministro Gilson Dipp, 5ª Turma, DJe 01/12/2011; AgRg no REsp 1247868/RS, Relator Ministro Jorge Mussi, 5ª Turma, DJe 13/10/2011; AgRg no REsp 1265039/RS, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, DJe 28/09/2011; AgRg no REsp 1229103/PR, Relator Ministro Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ), 5ª Turma, DJe 03/05/2011; AgRg no Ag 1164852/RS, Relator Ministro Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ/AP), 5ª Turma, DJe 16/11/2010.
Observa-se que, não obstante vários julgados tenham se baseado no entendimento firmado na ADI 1.232/DF, aquele precedente cedeu espaço à interpretação inaugurada pelo Ministro Ilmar Galvão, no sentido de que é possível a aferição da condição de hipossuficiência econômica do idoso ou do portador de deficiência por outros meios que não apenas a comprovação da renda familiar mensal per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
Mesmo no e. STF, que havia firmado entendimento diverso, a posição findou por ser revista recentemente, em 18.04.2013, no julgamento do RE 567985/MT, pelo sistema da repercussão geral, bem como na apreciação da Reclamação (RCL) 4374, ocasião em que a Suprema Corte, declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, do Art. 20, da Lei nº 8.742/1993.
Nestes termos:
Naquela mesma ocasião, julgou-se ainda o RE 580.963/PR, também submetido ao regime da repercussão geral, em que o Pretório Excelso declarou igualmente inconstitucional o parágrafo único do Art. 34 da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso).
A ementa restou assim redigida:
Bem explicado, trata-se, em ambos os casos, de inconstitucionalidade parcial por omissão.
No que se refere ao § 3º, do Art. 20, da Lei 8.742/93, considerou-se, segundo o Relator, Ministro Gilmar Mendes, que "era insuficiente para cumprir integralmente o comando constitucional do art. 203, V, Constituição da República", por não contemplar outras hipóteses caracterizadoras da absoluta incapacidade de manutenção do idoso ou o deficiente físico.
Com relação ao Art. 34, Parágrafo único, da Lei 10.741/03, a omissão decorre da violação ao princípio da isonomia, por se afastar do cálculo da renda per capita familiar apenas o benefício assistencial já concedido a outro membro da família, excluindo-se do mesmo tratamento o deficiente também titular de benefício assistencial, bem como o idoso titular de benefício previdenciário de valor mínimo.
Nesse quadro, com base na orientação da Corte Suprema, forçoso concluir que se deve dar interpretação extensiva ao § 3º, do Art. 20, da Lei nº 8.742/99, a fim de abranger outras situações em que comprovada a condição de miserabilidade do postulante ao benefício assistencial. Assim, em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também estender a interpretação do Parágrafo único, do Art. 34, do Estatuto do Idoso, para excluir do cálculo da renda per capita familiar também os benefícios de valor mínimo recebidos por deficiente ou outro idoso.
No mesmo sentido, é a jurisprudência uniformizada pela Primeira Seção do e. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso representativo de controvérsia, sob o Tema nº 640, in verbis:
Cabe relembrar que o benefício assistencial requer o preenchimento de dois pressupostos para a sua concessão, de um lado, sob o aspecto subjetivo, a deficiência e de outro lado, sob o aspecto objetivo, a hipossuficiência.
Como se vê dos autos, a autora Laide Gonçalves Domingues, nascida aos 11/01/1943, ajuizou a presente demanda em 07/01/2014, objetivando a concessão do benefício assistencial ao idoso, todavia, faleceu no curso do processo, em 18/08/2015, conforme certidão de óbito acostada à fl. 166.
Assim, resta analisar se no período anterior ao seu falecimento, a parte autora implementava os requisitos legais para a concessão do benefício assistencial.
A autora cumpriu o requisito etário, para os efeitos do Art. 20, da Lei 8.742/93 e do Art. 34, da Lei 10.741/03, pois havia atingido a idade de 70 anos na data do ajuizamento da ação.
Quanto ao requisito objetivo, extrai-se do laudo social firmado em 14/07/2014, que a autora vivia com seu esposo José Dominges, nascido aos 28/09/1940, aposentado, o filho Reginaldo Aparecido Domingues, nascido aos 07/01/1969, separado, que estava empregado exercendo a função de torneiro mecânico, e o neto Mateus Domingues, nascido aos 25/04/1997, estudante.
A família residia em imóvel próprio, simples, conservado, composto por dois quartos, sendo um deles suíte, sala, copa/cozinha, banheiro, lavanderia no corredor, quintal e garagem coberta.
Os cômodos estavam guarnecidos com móveis e eletrodomésticos necessários ao conforto dos seus habitantes, tendo sido constatado que também possuíam um computador e um veículo marca Chevrolet, modelo ONIX, de propriedade do filho.
A família contava com renda mensal de R$2.524,00, proveniente da aposentadoria do cônjuge e do salário do filho.
Foram informadas despesas no montante aproximado de R$334,64, incluindo os gastos com alimentação, energia elétrica, água e telefone fixo.
A autora relatou que recebia duas cestas básicas doadas por seus dois filhos, que os medicamentos utilizados eram fornecidos pela rede pública e adquiridos com recursos próprios e que fazia uso de táxi para locomoção, pois, segundo a perita, a autora deambulava lentamente e fazia uso de bengala.
Concluiu a Assistente Social que as condições socioeconômicas da requerente estavam sendo supridas, pois residia em imóvel próprio e contava com a aposentadoria do seu esposo e com o auxílio dos filhos, possuindo renda per capita de R$631,00 (fls. 41/43).
Como cediço, o critério da renda per capita do núcleo familiar não é o único a ser utilizado para se comprovar a condição de miserabilidade do idoso ou do deficiente que pleiteia o benefício.
Malgrado não tenha sido individualizado o valor da renda do esposo e do filho, os extratos do CNIS juntados aos autos (fls. 35/38), dão conta que o cônjuge da autora era titular de aposentadoria por invalidez previdenciária, no valor de um salário mínimo, R$724,00, de modo que subtraído esse valor da renda familiar, apura-se que o salário do filho, quando realizado o estudo social, importava em R$1.800,00.
Em respeito ao princípio da isonomia, deve-se também estender a interpretação do Parágrafo único, do Art. 34, do Estatuto do Idoso, para excluir do cálculo da renda per capita familiar também os benefícios de valor mínimo recebidos por deficiente ou outro idoso.
Todavia, ainda que se reservasse o valor de um salário mínimo da renda familiar para a manutenção do cônjuge idoso, o valor remanescente, somado à ajuda prestada por seus familiares e as condições narradas no estudo social, denotam que a autora não se encontrava em situação de penúria ou risco social, ainda que se considerasse que sua família vivia em condições econômicas modestas.
Com efeito, como se vê do estudo social, a renda da família (R$2.524,00), era suficiente para custear as despesas informadas (R$334,64), de modo que ainda restava um valor considerável para outras despesas extraordinárias não mencionadas pela autora.
Assim, analisando o conjunto probatório, é de se reconhecer que a autora não preenchia o requisito da miserabilidade para a concessão do benefício assistencial.
Nessa esteira, traz-se a lume jurisprudência desta Corte Regional:
Desse modo, ausente um dos requisitos legais à concessão da benesse, é de se reconhecer que a autoria não fazia jus ao benefício assistencial de prestação continuada do Art. 20, da Lei nº 8.742/93.
Cabe relembrar que o escopo da assistência social é prover as necessidades básicas das pessoas, sem as quais não sobreviveriam e que o benefício não se destina à complementação de renda.
Ante o exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
BAPTISTA PEREIRA
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA:10021 |
Nº de Série do Certificado: | 10A516070472901B |
Data e Hora: | 22/08/2018 15:16:50 |