Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5396337-77.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/07/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 01/08/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS.
- A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12
(doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a
subsistência e a condição de segurado.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove
não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- No caso dos autos, a incapacidade laborativa é preexistente ao início das contribuições ao
sistema. Improcedência do pedido de aposentadoria por invalidez.
- No tocante aos requisitos para concessão do benefício assistencial, o autor não comprovou sua
miserabilidade.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS provida.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5396337-77.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PRISCILA DA SILVA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: IVO ALVES - SP150543-N, BRUNO SANDOVAL ALVES -
SP261565-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5396337-77.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PRISCILA DA SILVA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: IVO ALVES - SP150543-N, BRUNO SANDOVAL ALVES -
SP261565-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez,
auxílio-doença ou benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal.
A r. sentença (id 42939411) julgou procedente o pedido e condenou o INSS a conceder à parte
autora o benefício de aposentadoria por invalidez, com os consectários que especifica.
Em suas razões de apelação (id 42939416), argui o INSS a existência de coisa julgada.
No mérito, requer a reforma da r. sentença, com a improcedência do pedido inicial, pela
preexistência das moléstias incapacitantes.
No caso de manutenção da r. sentença, requer a alteração do termo inicial do benefício e dos
critérios de fixação dos consectários legais.
Com contrarrazões da parte autora.
Parecer do Ministério Público Federal (id 63025302) pelo improvimento do apelo interposto.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5396337-77.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PRISCILA DA SILVA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: IVO ALVES - SP150543-N, BRUNO SANDOVAL ALVES -
SP261565-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade
recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
COISA JULGADA
A preliminar de ocorrência de coisa julgada merece rejeição.
Conforme se verifica dos autos, a parte autora ajuizou anterior demanda (0002312-
72.2012.8.26.0213) na qual pretendeu a concessão de benefício previdenciário, decorrente de
requerimento administrativo de 15/05/2012, que restou indeferido administrativamente.
Nos presentes autos, a autora pretende a concessão dos benefícios de auxílio-doença,
aposentadoria por invalidez ou assistencial, com fundamento em pedido administrativo formulado
em 17/07/2015 e na existência de novos documentos médicos.
Desta forma, as causas de pedir são distintas, sendo de rigor a rejeição da preliminar de coisa
julgada.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12
(doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a
subsistência e a condição de segurado.
Independe, porém, de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer
natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após
filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, for acometido das doenças relacionadas no art.
151 da Lei de Benefícios.
Cumpre salientar que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social não impede a concessão do benefício na hipótese em que a
incapacidade tenha decorrido de progressão ou agravamento da moléstia.
Acerca da matéria, há de se observar o disposto na seguinte ementa:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CARÊNCIA E QUALIDADE DE
SEGURADO NÃO COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. REFILIAÇÃO.
1- Não é devida a aposentadoria por invalidez à parte Autora que não cumpriu a carência, bem
como não demonstrou a manutenção da qualidade de segurado no momento em sobreveio a
incapacidade para o trabalho.
2- Incapacidade constatada em perícia médica realizada pelo INSS no procedimento
administrativo originado do requerimento de auxílio-doença.
3- Ainda que se considerasse a refiliação da Autora à Previdência pelo período necessário de 1/3
do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a
ser requerido, esta se deu posteriormente à sua incapacidade.
4- A doença preexistente não legitima o deferimento de aposentadoria por invalidez ou auxílio-
doença, à exceção de quando a incapacidade laborativa resulte progressão ou agravamento do
mal incapacitante.
5- A Autora quando reingressou no sistema previdenciário, logrando cumprir a carência exigida e
recuperando sua qualidade de segurada, já era portadora da doença e da incapacidade, o que
impede a concessão do benefício pretendido, segundo vedação expressa do art. 42, § 2º, da Lei
nº 8.213/91.
6- Apelação da parte Autora improvida. Sentença mantida."
(TRF3, 9a Turma, AC nº 2005.03.99.032325-7, Des. Fed. Rel. Santos Neves, DJU de 13/12/2007,
p. 614).
É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria
depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a
cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de
que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada
por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando
inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da
universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social.
É que, para efeitos previdenciários, basta a incapacidade permanente que impeça o exercício da
atividade laborativa nos moldes ditados pelo mercado de trabalho, evidenciando, dessa forma,
padecer o periciando de incapacidade total.
Nesse sentido, destaco acórdão desta Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS: PREENCHIMENTO.
NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO PERICIAL. INVIABILIDADE DE EXERCÍCIO DAS
ATIVIDADES HABITUAIS E DE READAPTAÇÃO A OUTRAS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO.
(...)
II - O laudo pericial concluiu pela incapacidade parcial da autora. Porém, o Juiz não está adstrito
unicamente às suas conclusões, devendo valer-se de outros elementos para a formação de sua
convicção. No caso, corretamente considerada a falta de condições da autora para exercer suas
funções habituais de cozinheira, em razão de tenossinovite no punho e problemas de coluna, que
levaram-na a perder as forças das mãos, bem como sua idade avançada e as dificuldades
financeiras e físicas para exercer outra profissão ou aprender novo ofício. Mantida a sentença que
deferiu o benefício da aposentadoria por invalidez à autora.
(...)
IV - Apelações improvidas."
(9a Turma, AC nº 1997.03.007667-0, Des. Fed. Rel. Marisa Santos, v.u., DJU de 04.09.2003, p.
327).
É necessário, também, para a concessão da aposentadoria por invalidez o preenchimento do
requisito da qualidade de segurado. Mantém essa qualidade aquele que, mesmo sem recolher as
contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período
variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua
situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o §1º do supracitado artigo prorroga por 24 meses tal período de
graça aos que contribuíram por mais de 120 meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 meses.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no §4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o
art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade do direito pretendido.
O benefício de auxílio-doença, por sua vez, é devido ao segurado que tiver cumprido o período de
carência exigido de 12 contribuições mensais e for considerado temporariamente incapacitado
para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos e possuir a
condição de segurado (arts. 59 a 63 da Lei de Benefícios).
Cumpre salientar, ainda, que o benefício acima referido é um minus em relação à aposentadoria
por invalidez, a qual sendo concedida não gera cumulação, mas sim cessação daquele.
DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
A República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição Federal, tem
como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José Afonso da
Silva, consiste em:
"um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o
direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos
fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa
humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-
constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido
da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de
direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade individual,
ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem
econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a
realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo
para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como
indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.'"
(Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 106-107).
Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração da
Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas como
moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social
e o art. 203, IV, que instituiu o benefício do amparo social.
A Lei nº 6.179/74 instituiu, em nosso ordenamento jurídico, a renda mensal vitalícia, passando a
ser amparados pela Previdência Social os maiores de 70 anos e os inválidos, definitivamente
incapacitados para o trabalho, desde que não exercessem atividades remuneradas ou não
auferissem rendimentos. O valor do benefício correspondia à metade do maior salário-mínimo
vigente no país, arredondada para a unidade de cruzeiro imediatamente superior, não podendo
ultrapassar 60% do valor do salário-mínimo do local de pagamento.
Com a promulgação da Carta Magna, em 05 de outubro de 1988, o valor do benefício foi
aumentado para 1 (um) salário-mínimo, pelo art. 203, inciso V:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei."
Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada, dependia
da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos.
O art. 139 da Lei n.º 8.213/91 dispunha que a renda mensal vitalícia continuaria integrando o
elenco de benefícios da Previdência Social, até que o artigo constitucional fosse regulamentado.
A Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, deu eficácia ao inciso V do art. 203 da Constituição
Federal e extinguiu a renda mensal vitalícia em seu art. 40, resguardando, entretanto, o direito
daqueles que o requeressem até o dia 31 de dezembro de 1995, desde que preenchidos os
requisitos previstos na Lei Previdenciária.
A Lei de Assistência foi regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995,
posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.
O art. 20 da Lei Assistencial e o art. 1º de seu decreto regulamentar estabeleceram os requisitos
para a concessão do benefício, quais sejam: ser o requerente portador de deficiência ou idoso,
com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem
tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos foi reduzida para 67 anos, a partir de 1º
de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, posteriormente, para 65 anos, através do art.
34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003, mantida, inclusive, por ocasião da edição da Lei nº
12.435, de 6 de julho de 2011.
Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa portadora de
deficiência, família e ausência de condições de se manter ou de ser provido pela sua família.
Pessoa portadora de deficiência é a incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em
decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na redação dada pela Lei nº
12.470, de 31 de agosto de 2011.
O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo mínimo
de 2 (dois) anos (§10º).
A incapacidade para a vida independente, por sua vez, não há que ser entendida como aquela
que impeça a execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o
auxílio permanente de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento sem o amparo
de alguém.
Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do Ministro
Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377),
oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida
laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da
ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do
benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação
continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de
locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
No que se refere à hipossuficiência econômica, de acordo com a Medida Provisória nº 1.473-34,
de 11.08.97, transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, definiu-se o conceito de família como o
conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo
teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/2011, fora estabelecido, expressamente para os fins
do art. 20, caput, da Lei Assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros,
os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art.
20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo, anoto
que fora ajuizada a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, pelo Procurador-Geral da
República, julgada improcedente pelo Supremo Tribunal Federal, que declarou a
constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93.
Os debates, entretanto, não cessaram, por ser tormentosa a questão e envolver princípios
fundamentais contidos na Carta da República, situação que culminou, inclusive, com o
reconhecimento, pelo mesmo STF, da ocorrência de repercussão geral.
A Suprema Corte acabou por declarar a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal,
inclusive por considerar defasada essa forma meramente aritmética de se apreciar a situação de
miserabilidade dos idosos ou deficientes que visam a concessão do benefício assistencial
(Plenário, RCL 4374, j. 18.04.2013, DJE de 04/09/2013).
No entanto, é preciso que se tenha a possibilidade de ao menos entrever, a partir da renda
informada, eventual quadro de pobreza em função da situação específica de quem pleiteia o
benefício, até que o Poder Legislativo estabeleça novas regras.
Para tanto, faz-se necessário o revolvimento de todo o conjunto probatório, através do qual se
possa aferir eventual miserabilidade. E assim o é diante do princípio constitucional da dignidade
da pessoa humana, já mencionado no início desta decisão, com vistas à garantia de suas
necessidades básicas de subsistência, o que leva o julgador a interpretar a normação legal de
sorte a conceder proteção social ao cidadão economicamente vulnerável, tal como assentado no
REsp 1112557 julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/73.
Confira-se:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Por outro lado, observo que a Lei nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, passou a considerar como
de "baixa renda" a família inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal
cuja renda mensal seja de até 2 (dois) salários mínimos, ainda que para os fins específicos de
custeio ali limitado. Na mesma trilha, as Leis que criaram o Bolsa Família (10.836/04), Programa
Nacional de Acesso à Alimentação (10.689/03) e o Bolsa Escola (10.219/01) estabeleceram
parâmetros mais coerentes de renda familiar mínima quanto em cotejo com aquele estabelecido
de ¼ do salário mínimo, agora declarado inconstitucional.
Por fim, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 580.963/PR (DJe 14.11.2013),
assentou a inconstitucionalidade por omissão do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso,
considerando a "inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de
deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em
relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo."
Assim, entendo que deve ser excluído do cômputo da renda per capita o valor decorrente de
benefício de valor mínimo recebido por idoso ou inválido, pertencente ao núcleo familiar.
Nesse sentido, o C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1355052, submetido ao
regimento do art. 543-C do CPC, assentou que não se computa o valor de um salário mínimo
percebido por idoso a título de beneficio assistencial ou previdenciário para aferição de
hipossuficiência de núcleo familiar.
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(REsp 1355052 /SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
25/02/2015, DJe 05/11/2015)
DO CASO DOS AUTOS
Em consulta ao extrato do CNIS (id 4293920), verifica-se que a parte autora verteu contribuições
ao sistema, na qualidade de segurado facultativo, nos períodos de 01/01/2011 a 31/01/2011, de
08/2011 a 01/2012 e de 02/2014 a 07/2015.
O laudo da perícia (id 42939365) concluiu que a parte autora, portadora de “cegueira bilateral,
diabetes mellitus, hipotireoidismo e perda auditiva leve”, padece de incapacidade “total e
permanentemente”, fixando seu início em 13/07/2015 (data do laudo oftalmológico – id
42939329).
Verifico que as moléstias incapacitantes que acometem a parte autora tiveram início quando esta
contava com 14 anos de idade (glaucoma – documento médico id 42939329), a seguir, no ano de
2011, esta passou a verter contribuições ao sistema e, após, em 15/05/2012, requereu a
concessão de benefício junto ao INSS, restando indeferido.
Tendo ocorrido o indeferimento de tal requerimento, a parte autora ajuizou ação judicial que
resultou em sentença de improcedência, por preexistência da incapacidade, não comprovação de
agravamento e ausência de qualidade de segurado (autos nº 0002312-72.2012.8.26.0213).
Em que pese o fato de restar constatada a incapacidade laborativa, verifico que as moléstias que
acometem a parte autora, ainda que tenham sofrido agravamento, são anteriores ao seu ingresso
no sistema contributivo, fato, inclusive, registrado nos autos supracitados, cujo laudo produzido já
havia identificado a existência de incapacidade.
Assim sendo, diante do conteúdo probatório constante dos autos, ainda que tenha ocorrido
progressão das moléstias incapacitantes, patente está que a parte autora passou a recolher
contribuições já portadora de incapacidade laborativa, evidenciado o intuito de se filiar ao sistema
tão somente para perceber benefício, o que, efetivamente, não encontra lastro de licitude, à luz
dos princípios contributivo e solidário inerentes ao sistema previdenciário.
Quanto ao pedido subsidiário de benefício assistencial, realizada perícia (42939427), constatou-
se que reside a parte autora em casa própria, “em condições de habitabilidade”, havendo “um
carro ford Versailles em regular estado de conservação e uma moto cg 125 em regular estado de
conservação” e eletrodomésticos, consistindo a renda familiar em R$ 2.570,00, advinda dos
salários de seus genitores, assalariados.
Assim, a parte autora não demonstrou a ausência de condições de prover o seu sustento ou tê-lo
provido pela família.
Desta forma, do conjunto probatório dos autos, verifico que o autor não demonstrou situação de
miserabilidade, de modo a amparar a concessão do benefício assistencial, sendo de rigor a
rejeição também deste pedido.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00, a teor
do disposto no art. 85, §8, do CPC/2015, mas suspendo a sua exigibilidade, por ser beneficiária
da assistência judiciária gratuita, nos termos do artigo 98, § 3º, do novo Código de Processo Civil.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou provimento à apelação do INSS,
para julgar improcedente o pedido, observados os honorários advocatícios, na forma acima
fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS.
- A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12
(doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado
incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a
subsistência e a condição de segurado.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove
não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- No caso dos autos, a incapacidade laborativa é preexistente ao início das contribuições ao
sistema. Improcedência do pedido de aposentadoria por invalidez.
- No tocante aos requisitos para concessão do benefício assistencial, o autor não comprovou sua
miserabilidade.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação do
INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
