D.E. Publicado em 12/03/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, Dar provimento ao recurso interposto por MARIA VERONICA DE ALENCAR, para condenar o INSS na implantação do benefício de prestação continuada desde a data do requerimento administrativo, fixando os honorários advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação do acórdão, com juros e correção monetária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juíza Federal Convocada
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | GISELLE DE AMARO E FRANCA:10185 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217031740FE39 |
Data e Hora: | 28/02/2018 19:39:21 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020174-88.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A EXMA SENHORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA GISELLE FRANÇA (Relatora): Trata-se de apelação interposta por MARIA VERONICA DE ALENCAR, em face da r.sentença que julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de prestação Continuada previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, diante da não comprovação de sua incapacidade, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor atualizado da causa, observando-se a concessão da Justiça Gratuita.
A parte autora requer a reforma da sentença, para que o benefício assistencial lhe seja concedido, a partir da data do requerimento administrativo, diante da comprovação de todos os requisitos necessários, bem como, que a verba honorária seja fixada em 20% sobre o valor da condenação até a data do acórdão.
Sem contrarrazões, os autos subiram para este Tribunal.
A Procuradoria Regional da República manifestou-se pelo não provimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
A EXMA SENHORA JUÍZA FEDERAL CONVOCADA GISELLE FRANÇA (Relatora): O benefício Assistencial requerido está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelas atuais disposições contidas nos artigos 20, 21 e 21-A, todos da Lei 8.742/1993.
Em resumo, o benefício da prestação Continuada (BPC) é a garantia de um salário mínimo mensal ao idoso com 65 anos ou mais ou pessoa com deficiência de qualquer idade com impedimentos de natureza física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo (que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 anos), que o impossibilite de participar, em igualdade de condições, com as demais pessoas da vida em sociedade de forma plena e efetiva. Tratando-se de benefício assistencial, não há período de carência, tampouco é necessário que o requerente seja segurado do INSS ou desenvolva alguma atividade laboral, sendo imprescindível, porém, a comprovação da hipossuficiência própria e/ou familiar.
O artigo 203, inciso V, da Constituição Federal garante o benefício em comento às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à sua própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
O §2º do artigo 20 da Lei 8742/1993, atualmente, define o conceito de pessoa com deficiência como aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Vale ressaltar que a atual legislação, na redação da Lei 13.146/2015 - que ampliou ainda mais o conceito de pessoa com deficiência, ao preceituar que as barreiras limitadoras não precisam ser "diversas", bastando "uma" -, está em harmonia com o conceito adotado pela ONU na Convenção Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, a qual foi ratificada pelo Brasil e promulgada pelo Decreto nº 6.949/2009.
Verifica-se que as limitações de que trata a Lei atual vão além de um conceito simplista de incapacidade pura e simples para o trabalho e para a vida independente, eis que devem ser considerados, também, para uma perfeita análise da situação de vulnerabilidade do requerente, fatores sociais e o meio em que a pessoa com deficiência vive, isto é, um conjunto de circunstâncias capazes de impedir a integração justa, plena e igualitária na sociedade daquele que necessita de proteção social.
Nesse sentido, as avaliações de que trata o §6º do artigo 20, que sujeita a concessão do benefício às avaliações médica e social, devendo a primeira considerar as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo do requerente, e, a segunda, os fatores ambientais, sociais e pessoais a que está sujeito.
Insta saliente, ainda, que o fato de a incapacidade ser temporária não impede a concessão do benefício , nos termos da Súmula 48 da TNU:
Dito isso, no caso dos autos, o laudo pericial, realizado em 12/05/2016, atestou que a autora é portadora de sequelas de traumatismo na cabeça (T90), fratura de costela, esterno e coluna torácica (S22), osteoporose sem fratura patológica (M81), escoliose não especificada (M41.9) e osteoporose não especificada (M81.9). Embora não tenha defeito físico ou mental, possui lesões irreversíveis, progressivas e agravadas pelo tempo, adquiridas a partir de 23/12/2013, oriundas das sequelas do traumatismo da cabeça e fratura de costela, esterno e coluna torácica. Atestou que a autora possui incapacidade parcial e temporária para o trabalho, para qualquer atividade que exija grandes esforços físicos, devido ao quadro clínico apresentado (dorsalgia intensa, sem melhora mesmo ao uso de medicações). Afirmou que não há como precisar exatamente o prazo de sua incapacidade, pois isto dependerá do tratamento a ser realizado corretamente e como o organismo responderá a ele. No entanto, acredita que a autora necessita de pelo menos de 06 meses para que possa surgir melhora clínica e reabilitação.
Não há dúvidas, portanto, que a autora apresenta limitações, que potencialmente podem impedir ou dificultar sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras pessoas. Trata-se de pessoa com quase 60 anos de idade, semianalfabeta, que sofre com fortes dores na coluna, circunstâncias que naturalmente dificultam seu ingresso ao trabalho, mormente porque não pode executar atividades que necessitam de esforço físico, ao menos enquanto não conseguir ter acesso a tratamentos adequados, que permitam sua readaptação ou reabilitação. Precedente (RESP 201303107383, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:03/08/2017 ..DTPB:.).
No que diz respeito ao requisito socioeconômico, o §3º do artigo 20 da Lei 8742/1993, em linhas gerais, considera como hipossuficiente para consecução deste benefício, pessoa cuja renda por pessoa do grupo familiar seja inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo.
Andou bem o legislador, ao incluir o §11 no artigo 20, com a publicação da Lei 13.146/2015, normatizando expressamente que a comprovação da miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade do requerente possa ser comprovada por outros elementos probatórios, além da limitação da renda per capita familiar.
Com efeito, cabe ao julgador avaliar o estado de necessidade daquele que pleiteia o benefício , consideradas suas especificidades, não devendo se ater à presunção absoluta de miserabilidade que a renda per capita sugere (AGARESP 201301166404, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:03/02/2017 ..DTPB:.; AGRESP 201500259775, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:24/05/2016 ..DTPB:.; RESP 200800142128, MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, STJ - SEXTA TURMA, DJE DATA:29/09/2008 ..DTPB:.).
Para efeitos da mensuração da renda per capita, o Decreto nº 6.214/2007, em seu artigo 4º, regulamentou o que se entende por Grupo Familiar, assim dispondo:
Art. 4o Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício , considera-se:
Por fim, cabe uma última ponderação, que é a consideração feita ao artigo 19, mencionado no inciso VI do artigo supra citado:
De acordo com esse artigo, se algum dos membros do Grupo Familiar receber igual benefício assistencial, referido benefício deve ser excluído da renda per capita familiar.
O STJ, em sede de Recurso Repetitivo já sedimentou o entendimento de que a mesma regra deve ser aplicada, por analogia, também para quando houver benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo.
Vejamos:
Nesse sentido, os julgados desta C. Corte Regional (TRF3ªRegião, AC 30993.55.2015.04.03.9999, Des Fed Carlos Delgado, DJ 24/10/2016; TRF3ª Região, AC 2014.03.00.013459-1, Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 27/04/2017; APELREEX 00015662120134036139, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, TRF3 - OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/09/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.).
No presente caso, o estudo social (datado de 10/08/2016) constatou que a autora reside com seu filho, Adelson Rufino Alves (pintor, desempregado), em casa cedida em um conjunto habitacional da Cohab, localizado na periferia da cidade. A residência tem 05 cômodos de alvenaria, piso no contra piso e telhados de telhas francesas. Os móveis são básicos e o local da residência possui infraestrutura básica. A autora não tem renda própria e não está incluída em nenhum programa do Governo, vivendo do auxílio esporádico do seu filho, quando está empregado. Consultando o CNIS de Adelson Rufino Alves (CPF 282.065.678-10), não consta qualquer rendimento atual.
Do cotejo do estudo social, do laudo pericial, da idade e baixa escolaridade da autora, para mim, está caracterizado seu quadro de pobreza e extrema necessidade.
A autora já tem idade relativamente alta, se considerarmos a atividade laborativa que desempenhava (lavradora) e suas limitações de saúde, notadamente, impossibilidade de exercer atividades que exigem esforço físico, que tendem a se agravar com o passar dos anos, sem tratamento adequado.
Assim, sem perder de vista que o benefício em questão deve ser revisto a cada dois anos, entendo que a autora demonstrou preencher os requisitos legais, fazendo jus ao benefício assistencial requerido, notadamente, os que dizem respeito à deficiência e hipossuficiência econômica, comprovando estar em situação de vulnerabilidade.
Fixo o termo inicial do benefício (DIB) a data do requerimento administrativo (26/03/2015 - fls. 09), uma vez que foi neste momento que a autarquia teve ciência da pretensão da parte autora.
Nesse sentido:
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/PE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, quais sejam: juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009; e correção monetária segundo o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-E.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data do presente julgamento (Súmula nº 111/STJ).
Por fim, havendo pedido expresso na inicial, concedo a tutela antecipada, considerando as evidências coligidas nos autos, nos termos supra fundamentado, bem como o caráter alimentar e assistencial do benefício, que está relacionado à sobrevivência de quem o pleiteia.
Assim, independentemente do trânsito em julgado, determino, com base no artigo 497 do CPC/2015, a expedição de e-mail ao INSS, instruído com cópia dos documentos de MARIA VERONICA DE ALENCAR, para que cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata implantação do benefício de prestação Continuada, com data de início (DIB) em 26/03/2015 (data do requerimento administrativo), no valor correspondente a 01 salário mínimo mensal.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso interposto por MARIA VERONICA DE ALENCAR, para condenar o INSS na implantação do benefício de prestação continuada desde a data do requerimento administrativo, fixando os honorários advocatícios na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação do acórdão, com juros e correção monetária fixados nos termos fundamentados acima.
Junte-se, aos autos, extrato CNIS em anexo, como parte integrante desta decisão.
É o voto.
Juíza Federal Convocada
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 28/02/2018 19:39:18 |