
| D.E. Publicado em 30/06/2016 |
EMENTA
| PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. INTERVENÇÃO DO MPF. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR OUTROS MEIOS. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANIFESTAÇÃO DO MPF. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida pelo MPF e, no mérito, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0042590-21.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Leonel Ferreira (Relator): Trata-se de apelação de sentença pela qual foi julgado improcedente o pedido da parte autora em ação em que pleiteia o restabelecimento do benefício de amparo assistencial ao deficiente, sob o fundamento de que não teriam sido comprovados os requisitos necessários à concessão do benefício. Sem condenação em sucumbência, pois a parte autora é beneficiária da justiça gratuita e o réu é isento de custas processuais e nada desembolsou.
Em sua apelação, a parte autora sustenta que comprovou o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício, a saber, é portadora de deficiência e não possui meios para prover sua manutenção ou tê-la provida por sua família. Requer seja o INSS condenado ao pagamento das prestações devidas desde 01.11.2014, bem como sejam os honorários advocatícios fixados em 20% sobre o valor da condenação, que incidirá sobre a soma das prestações vencidas mais doze vincendas, nos termos do art. 20, §5º do CPC de 1973.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
Em parecer de fls. 101/107, o i. representante do Parquet Federal, Dr. Carlos Fernando dos Santos Lima, manifestou-se preliminarmente pela nulidade da sentença proferida pelo juiz a quo por ausência de intervenção do Ministério Público, e, no mérito, opinou pelo provimento do apelo.
Dispensada a revisão, nos termos regimentais.
É o relatório.
LEONEL FERREIRA
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0042590-21.2015.4.03.9999/SP
VOTO
Da intervenção do ministério Público Federal
A ausência de manifestação do Ministério Público em primeira instância não implica necessariamente a nulidade da sentença se, no caso, a demandante obtiver pronunciamento jurisdicional favorável em segunda instância. Nesse sentido, confira-se jurisprudência:
Assim sendo, a apreciação acerca de eventual prejuízo a ser suportado pela autora deve ser realizada após o exame do mérito.
Do mérito
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, que dispõe:
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso em comento, a perícia médica realizada em 12.12.2014 (fl. 40/49) constatou que o autor é portador de deformidade congênita no joelho direito e apresenta constituição física excepcional, pois possui um metro e quarenta e seis centímetros de altura, características que o impedem de forma definitiva de carregar peso, trabalhar em pé ou caminhando. Concluiu o perito que o requerente é jovem, tem cognição normal e pode realizar trabalho administrativo como atendente de telemarketing por exemplo.
Cumpre consignar que o autor nunca trabalhou, pois a deformidade no joelho direito o acompanha desde o nascimento. Ademais, é pessoa humilde, tendo estudado até a 7ª série do ensino fundamental, o que dificultaria sua inserção no mercado de trabalho, já que as atividades que demandam maior esforço físico, incompatíveis com o seu quadro de saúde, são realizadas por pessoas de baixo nível de escolaridade.
Vale consignar, ainda, ter o autor recebido o benefício de amparo ao portador de deficiência durante mais de 10 anos, de 12.05.2004 a 01.11.2014 (fl. 64), tendo sido cessado pela autarquia que, ao realizar a avaliação da deficiência e do grau de impedimento de logo prazo concluiu indevidamente que o autor não preenche os requisitos do art. 20, §2º da Lei 8.742/93.
Contudo, entendo que a parte autora fará jus ao benefício assistencial caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras pessoas', pelos motivos acima expostos.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão que recebeu a seguinte ementa:
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 10.01.2015 (fl. 54/56) constatou que o núcleo familiar do autor é formado por ele e sua mãe. Residem em casa própria, edificada em alvenaria, composta por sala, quarto, cozinha e banheiro. O requerente dorme na sala. A referida moradia está guarnecida com móveis simples e necessita de melhorias no acabamento. Relata o demandante que em razão da sua deformidade não consegue se locomover utilizando transporte público, fazendo uso de uma bicicleta, que ele mesmo adaptou, para deslocar-se. Relata, ainda, quadro de dores cotidianas na região do joelho e das costas, não conseguindo percorrer longas distâncias. Faz tratamento e acompanhamento por meios do Sistema Único de Saúde e utiliza diversas medicações. Informa que também possui hipertensão arterial. Sobrevivem com um salário mínimo auferido pela sua mãe idosa, que recebe aposentadoria por invalidez e sofre com dores na coluna e hipertensão arterial.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora preenche o requisito referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.
O termo inicial do restabelecimento do benefício deve ser fixado a partir de 01.11.2014 (fl. 64), quando foi cessado, conforme requerido pelo autor na petição inicial.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados pela lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% do valor das prestações vencidas até a presente data, uma vez que o pedido foi julgado improcedente no Juízo "a quo", nos termos da Súmula 111 do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma.
Diante do exposto, nos termos do artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, rejeito a preliminar arguida pelo MPF e, no mérito, dou provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o seu pedido e condenar o réu a lhe restabelecer o benefício de prestação continuada previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, no valor de um salário mínimo, com termo inicial na data da sua cessação (01.11.2014). Honorários advocatícios fixados em 15% sobre as prestações vencidas até a presente data. As verbas acessórias e os honorários advocatícios serão calculados na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS instruído com os devidos documentos da parte autora RENATO COSTA DE CARVALHO, para que o benefício de prestação continuada seja implantado de imediato, com data de início (DIB) em 01.11.2014, no valor mensal de um salário mínimo, conforme artigo 497, caput, do Novo Código de Processo Civil.
É como voto.
LEONEL FERREIRA
Juiz Federal Convocado
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| Signatário (a): | JOSE EDUARDO DE ALMEIDA LEONEL FERREIRA:10210 |
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| Data e Hora: | 22/06/2016 19:30:54 |
