
| D.E. Publicado em 01/09/2016 |
EMENTA
| PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS COMPROVADOS. LEI 8.742/93, ART. 20, §3º. DEFICIÊNCIA. INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO E. STF. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. COMPROVAÇÃO POR OUTROS MEIOS. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. |
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004350-26.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Desembargador Sergio Nascimento (Relator): Trata-se de apelação de sentença pela qual foi julgado improcedente o pedido do autor em ação em que pleiteia a concessão de amparo assistencial ao deficiente, sob o fundamento de que não teria sido comprovado o requisito relativo à miserabilidade, necessário à concessão do benefício. Pela sucumbência, a parte autora foi condenada ao pagamento de custas e despesas processuais, bem como de honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00, ficando a exigência de tais valores condicionada ao disposto no art. 12 da Lei n. 1.060/50.
Em sua apelação, a parte autora sustenta que comprovou o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício, a saber, é portadora de deficiência e não possui meios para prover sua manutenção ou tê-la provida por sua família. Requer a fixação da data de início do benefício na data do requerimento administrativo.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
Em parecer de fls. 261/263, o i. representante do Parquet Federal, Dr. Paulo Eduardo Bueno, opinou pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004350-26.2016.4.03.9999/SP
VOTO
O benefício pretendido pela parte autora está previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, que dispõe:
A regulamentação legislativa do dispositivo constitucional restou materializada com o advento da Lei 8.742/93, que dispõe na redação atualizada do caput do seu artigo 20:
Assim, para fazer jus ao amparo constitucional, o postulante deve ser portador de deficiência ou ser idoso (65 anos ou mais) e ser incapaz de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Quanto ao requisito relativo à deficiência, a Lei 8.742/93, que regulamentou a concessão do dispositivo constitucional acima, dispunha no § 2º do seu artigo 20, em sua redação original:
Nesse ponto, cumpre salientar que o texto constitucional garante o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência, sem exigir, como fez a norma regulamentadora, em sua redação original, a existência de incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
Nota-se, portanto, que ao definir os contornos da expressão pessoa portadora de deficiência constante do dispositivo constitucional, a norma infraconstitucional reduziu a sua abrangência, limitando o seu alcance aos casos em que a deficiência é geradora de incapacidade laborativa.
Todavia, observa-se que, em 10.07.2008, o Congresso Nacional promulgou o Decreto Legislativo 186/2008, aprovando, pelo rito previsto no artigo 5º, § 3º, da Constituição da República, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, e conferindo à referida Convenção status normativo equivalente ao das emendas constitucionais.
A Convenção, aprovada pelo Decreto Legislativo 186/2008, já no seu Artigo 1, cuidou de tratar do conceito de "pessoa com deficiência", definição ora constitucionalizada pela adoção do rito do artigo 5º, § 3º, da Carta, a saber:
Em coerência à alteração promovida em sede constitucional, o artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, viria a ser alterado pela Lei 12.470/11, passando a reproduzir em seu texto a definição de "pessoa com deficiência" constante da norma superior. Dispõe a LOAS, em sua redação atualizada:
Não há dúvida, portanto, de que o conceito de 'deficiência' atualmente albergado é mais extenso do que aquele outrora estabelecido, vez que considera como tal qualquer impedimento, inclusive de natureza sensorial, que tenha potencialidade para a obstrução da participação social do indivíduo em condições de igualdade.
Coerente com esta nova definição de 'deficiência' para fins de concessão do benefício constitucional, a mencionada Lei 12.470/11 acrescentou à Lei 8.742/93 o artigo 21-A, com a seguinte redação:
Verifica-se, portanto, que a legislação ordinária, em deferência às alterações promovidas em sede constitucional, não apenas deixou de identificar os conceitos de 'incapacidade laborativa' e 'deficiência', como passou a autorizar expressamente que a pessoa com deficiência elegível à concessão do amparo assistencial venha a exercer atividade laborativa - seja como empregada, seja como microempreendedora - sem que tenha sua condição descaracterizada pelo trabalho, ressalvada tão somente a suspensão do benefício enquanto este for exercido.
Observados estes parâmetros para a aferição da deficiência, no caso dos autos, a perícia médica realizada em 20.08.2012 (fl. 48/50) constatou que o autor, atualmente com 36 anos de idade, é portador esquizofrenia paranóide, doença esta de natureza grave, sendo incapaz para o trabalho, de forma total e permanente.
Portanto, a parte autora fará jus ao benefício assistencial caso preencha o requisito socioeconômico, haja vista possuir 'impedimentos de longo prazo', com potencialidade para 'obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com outras pessoas'.
No que toca ao requisito socioeconômico, cumpre observar que o §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 estabeleceu para a sua aferição o critério de renda familiar per capita, observado o limite de um quarto do salário mínimo, que restou mantido na redação dada pela Lei 12.435/11, acima transcrita.
A questão relativa à constitucionalidade do critério de renda per capita não excedente a um quarto do salário mínimo para que se considerasse o idoso ou pessoa com deficiência aptos à concessão do benefício assistencial, foi analisada pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, por acórdão que recebeu a seguinte ementa:
Todavia, conquanto reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelecia situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impedia o exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Tal interpretação seria consolidada pelo E. Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil (STJ - REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28.10.2009; DJ 20.11.2009).
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade dos postulantes ao benefício assistencial e o entendimento assentado por ocasião do julgamento da ADI 1.232-DF levaria a Corte Suprema a voltar ao enfrentamento da questão, após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18.04.2013.
Naquela ocasião, prevaleceu o entendimento de que "ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização". Com efeito, as significativas alterações no contexto socioeconômico desde então e o reflexo destas nas políticas públicas de assistência social, teriam criado um distanciamento entre os critérios para aferição da miserabilidade previstos na Lei 8.742/93 e aqueles constantes no sistema de proteção social que veio a se consolidar. Verifique-se:
Destarte, é de se reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza dos males que a assolam, do seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades. Não há, pois, que se enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar e entender que somente aqueles que contam com menos de um quarto do salário-mínimo possam fazer jus ao benefício assistencial.
No caso dos autos, o estudo social realizado em 10.11.2014 (fl. 182/190) e complementado em 18.03.2015 (fls. 212/228), constatou que o autor reside em um quarto e banheiro (com infraestrutura abalada e rachaduras na parede - fotos fls. 189/190), separado da casa onde moram sua irmã, Rute de Morais e suas sobrinhas, Evelin e Ester de Morais Wanot. Assim foi organizado para preservar a privacidade de todos, tendo em vista os surtos psicóticos frequentes do autor. Evelin trabalha na Empresa Datamétrica, recebendo o valor bruto de R$ 868,77 e Ester recebe R$ 928,00 de pensão em razão da morte do pai, não podendo as referidas remunerações entrar no cômputo da renda familiar do requerente em razão das sobrinhas não integrarem o seu núcleo familiar para efeito do disposto no §1º do art. 20 da Lei nº 8.742/93. A irmã do requerente, Rute de Morais, recebe amparo social ao portador de deficiência. O seu irmão e curador, Reinaldo de Morais, é casado, e reside em outro endereço. Concluiu a assistente social ser a condição socioeconômica do autor de vulnerabilidade social, não possuindo nenhuma renda e vivendo com a ajuda dos irmãos.
Portanto, o conjunto probatório existente nos autos demonstra que a parte autora preenche o requisito referente à deficiência e comprovou sua hipossuficiência econômica, fazendo jus à concessão do benefício assistencial.
Fixo o termo inicial do benefício na data da citação, em 29.03.2012 (fl. 17), quando o réu tomou conhecimento da pretensão do autor, tendo em vista que o requerimento administrativo de fls. 13 refere-se a auxílio-doença.
Os juros de mora e a correção monetária deverão ser calculados pela lei de regência.
Fixo os honorários advocatícios em 15% do valor das prestações vencidas até a presente data, uma vez que o pedido foi julgado improcedente no Juízo "a quo", nos termos da Súmula 111 do STJ e de acordo com entendimento firmado por esta 10ª Turma, a teor do disposto no Enunciado 7 das diretrizes para aplicação do Novo CPC aos processos em trâmite, elaboradas pelo STJ na sessão plenária de 09.03.2016.
Diante do exposto, nos termos do artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, dou parcial provimento à apelação da parte autora para julgar parcialmente procedente o seu pedido e condenar o réu a conceder-lhe o benefício de prestação continuada previsto no artigo 203, V, da Constituição da República, no valor de um salário mínimo, com termo inicial na data da citação (29.03.2012).
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS instruído com os devidos documentos da parte autora EDSON DE MORAES, representado por Reinaldo de Moraes, para que o benefício de prestação continuada seja implantado de imediato, com data de início (DIB) em 29.03.2012, no valor mensal de um salário mínimo, conforme artigo 497, caput, do Novo Código de Processo Civil.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal Relator
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| Data e Hora: | 23/08/2016 17:33:49 |
