
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5071499-41.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: KLEBER HEBERSON PEREIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO FABIANO MIALICHI - SP391762-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, KLEBER HEBERSON PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO FABIANO MIALICHI - SP391762-N
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5071499-41.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: KLEBER HEBERSON PEREIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO FABIANO MIALICHI - SP391762-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, KLEBER HEBERSON PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO FABIANO MIALICHI - SP391762-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR:
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em face do Instituto Nacional Do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão de benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença e subsidiariamente amparo social ao deficiente.
A r. sentença julgou improcedente o pedido, condenando a autora ao pagamento das custas processuais e aos honorários de advogado fixados em R$ 700,00, ressalvando-se, contudo, os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Inconformado, o autor ofertou apelação alegando que faz jus ao benefício pleiteado, pugna ainda pela realização de perícia por medico especialista. Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. O Órgão do Ministério Público Federal opinou pela decretação de nulidade do feito a partir do momento em que o órgão ministerial deveria ter sido intimado em primeira instância.
Subiram os autos a esta E. Corte, para intervenção do Ministério Público Federal.
Acórdão deste Tribunal anulando a r. sentença.
Laudo pericial.
Sobreveio sentença, prolatada em 27.07.2023, que julgou procedente o pedido, condenando a autarquia a conceder o benefício assistencial, conforme dispositivo que ora transcrevo: “JULGO PROCEDENTE a ação e concedo à autora o benefício assistencial desde o requerimento administrativo. 1 O STF já decidiu que é possível adotar os fundamentos de parecer do Ministério Público para decidir, assim o tendo feito recentemente nas decisões proferidas nos RE 591.797 e 626.307, em 26.08.2010, em que assenta, textualmente: "Acompanho na íntegra o parecer da douta Procuradoria-Geral da República, adotando-o como fundamento desta decisão, ao estilo do que é praxe na Corte, quando a qualidade das razões permitem sejam subministradas pelo relator” (ACO 804/RR, Relator Ministro Carlos Brito, DJ 16/06/2006; AO 24/RS, Relator Ministro Maurício Corrêa, DJ 23/03/2000; REÍ 271771/SP, Relator Ministro Néri da Silveira, DJ 01/08/2000). Os atrasados serão pagos com correção e juros de mora desde o vencimento, observados os temas 810 do STF e 905 do STJ, até o advento da EC 113 de 2021, e taxa selic, depois desta. Presentes os requisitos legais, antecipo a tutela para imediata implantação do benefício. Oficie-se. Ante a sucumbência, condeno o réu a pagar os honorários do advogado do autor, que fixo em 10% sobre o total da condenação, observada a Súmula 111 do STJ. Sentença sujeita a reexame necessário. Oportunamente, remetam-se os autos ao E. Tribunal Regional Federal da 3 ª Região. Oportunamente, ao arquivo. P.I.C. C.”.
Em suas razões, o INSS requer a anulação da sentença e extinção do processo sem resolução de mérito, por falta de interesse de agir, em razão da ausência de prévio requerimento administrativo. Prequestiona a matéria para fins recursais.
A parte autora, pede o benefício por incapacidade.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Juntada de documentos.
Parecer do Ministério Público pelo desprovimento das apelações.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5071499-41.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: KLEBER HEBERSON PEREIRA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO FABIANO MIALICHI - SP391762-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, KLEBER HEBERSON PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO FABIANO MIALICHI - SP391762-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR:
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
Consoante o artigo 496, § 3º, I, do CPC, afasta-se a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
Com efeito, a questão da necessidade de prévio requerimento administrativo como condição para o regular exercício do direito de ação - objeto de muita discussão no passado - foi definitivamente dirimida pelo Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE n. 631.240, em 3/9/2014 (ementa publicada em 10/11/2014), sob o regime de repercussão geral.
Sem margem a dúvidas, o Colendo Supremo Tribunal Federal: (i) considerou constitucional a exigência de requerimento administrativo prévio como condição da ação; (ii) fixou regras transitórias para as ações judiciais em trâmite até a data da conclusão do julgamento (3/9/2014), sem precedência de processo administrativo.
Configurada a falta de interesse processual, impõe-se a extinção do processo sem resolução do mérito. quanto ao BCP/LOAS.
Prejudicado o prequestionamento suscitado pelo INSS.
Auxílio-doença.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária, se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo), requisito para a concessão dos benefícios por incapacidade, decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Confira-se:
“Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social."
A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que não flui o período de graça, não perdendo a qualidade de segurado o trabalhador que deixou de contribuir para o RGPS por se encontrar impossibilitado de exercer atividades laborativas em decorrência da sua condição de saúde, e que teve seu benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez cessado indevidamente, ou ainda negada a sua concessão, quando comprovadamente se encontrava incapacitado.
No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
No caso dos autos, a carência restou incontroversa.
O laudo pericial afirma ser a parte autora, ajudante, servente, porteiro e atualmente desempregado, é portador de transtorno classificado como Síndrome da dependência de múltiplas drogas, o que gera uma incapacidade total e permanente para o labor. Aduz, ainda, que iniciou o quadro psicótico há 08 (oito anos), e sua incapacidade decorre de agravamento.
Diante do conjunto probatório, considerado o princípio do livre convencimento motivado, é de se concluir que o segurado faz jus ao benefício de aposentadoria por invalidez.
Em realidade, o segurado não desfruta de saúde para realizar seu trabalho, tendo em vista que encontra-se em tratamento.
Na espécie, conforme consulta ao CNIS, o autor possui vínculo trabalhista até 05 de setembro de 2017. Deixando de contribuir em razão das enfermidades apresentadas.
Por outro lado, não perde a condição aquele que deixa de contribuir em virtude dos males incapacitantes.
Neste sentido, a orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça:
“AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. AUSÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO POR MAIS DE 12 MESES. MALES INCAPACITANTES. POSSIBILIDADE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. MATÉRIA PACIFICADA.
A Egrégia 3ª Seção desta Corte, firmou o entendimento no sentido de que o segurado que deixa de contribuir por período superior a doze meses, em virtude de males incapacitantes, não perde a qualidade de segurado; Impossibilidade conhecimento do recurso especial pela divergência, quando os arestos dissidentes, trazidos aos autos, não guardam similitude fática com a questão debatida nos autos; Agravo não provido.” (AGREsp 494.190 PE, Min. Paulo Medina; AGREsp 435.876 SP, Min. Hamilton Carvalhido; REsp 409.400 SC, Min. Edson Vidigal; Resp 233.639 PR, Min. Gilson Dipp; REsp 217.727 SP, Min. Felix Fischer)
Assim, não há que se falar em perda da qualidade de segurada.
Desta sorte, comprovada a incapacidade para o trabalho, e preenchidos os demais requisitos, a parte autora faz jus ao benefício de aposentadoria por invalidez.
Quanto ao termo inicial do benefício de aposentadoria por invalidez, deve ser fixado no dia do requerimento administrativo (22.05.2019), desde referida data a parte autora já sofria da doença incapacitante, conforme relatado no laudo pericial, motivo pelo qual o indeferimento do benefício pela autarquia foi indevido.
As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
Diante do exposto, não conheço da remessa oficial, acolho a preliminar do INSS para julgar extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no artigo 485, VI e § 3º, do novo CPC, quanto ao BCP/LOAS e, dou provimento à apelação, para determinar a concessão da aposentadoria por invalidez, nos termos da fundamentação exposta, nos moldes da fundamentação desta decisão.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE E BCP/LOAS. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. REPERCUSSÃO GERAL. RE 631.240. PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E PERMANENTE. INCAPACIDADE DEFINITIVA PARA A ATIVIDADE HABITUAL. CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO DO DÉBITO. MANUAL DE CÁLCULOS DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
- Restou definida pelo Supremo Tribunal Federal a questão relativa à necessidade de requerimento administrativo para os processos judiciais envolvendo a concessão, a revisão ou o restabelecimento de benefício previdenciário, estabelecendo-se, ainda, regras de transição para as ações distribuídas até 03/09/2014 (RE n. 631.240).
- Configurada a falta de interesse processual, impõe-se a extinção do processo sem resolução do mérito, quanto ao BCP/LOAS.
- O conjunto probatório indica a existência de incapacidade laboral total e permanente, que enseja a concessão de aposentadoria por invalidez. Parte autora refere labor braçal e, considerando as condições socioeconômicas narradas nestes autos, certamente a restrição física constatada obsta o desempenho de atividades laborativa que lhe garantam o sustento.
- Os benefícios por incapacidade têm a finalidade de substituir a renda que o segurado percebia no período em que exercia suas atividades laborais, devendo ser mantidos enquanto perdurar o estado incapacitante. O fato de a parte autora ter trabalhado para garantir a sua subsistência, em razão da não obtenção da aposentadoria/auxílio-doença pela via administrativa não descaracteriza a existência de incapacidade (Tema 1.013 do STJ). Concessão de aposentadoria por invalidez mantidas. O benefício concedido neste feito devem ser implantados nos termos da lei vigente na data de seu início.
- Termo inicial do benefício fixado na data do pedido administrativo. Laudo pericial informa a existência de incapacidade laboral naquele momento.
- As parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no capítulo 4.3, do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
- Os honorários advocatícios devem ser mantidos nos termos fixados na sentença, eis que de acordo com a norma vigente e o entendimento desta Turma.
- Preliminar arguida pelo INSS acolhida. Apelação do INSS parcialmente provida. Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
