Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0004405-44.2020.4.03.6310
Relator(a)
Juiz Federal TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
03/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 12/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO DESFAVORÁVEL. LOMBALGIA
CRÔNICA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. SÚMULA 77/TNU.
1. A incapacidade para o exercício de atividade laborativa deve ser comprovada nos autos, por
prova técnica, para que a parte possa fazer jus à percepção de qualquer benefício por
incapacidade, não bastando a existência de doença.
2. Caso em que a perícia realizada, que levou em consideração a documentação juntada nos
autos e o exame clínico presencial, não constatou incapacidade, apesar da presença da doença.
3. Uma vez inexistente incapacidade, não há falar em análise de condições pessoais e
socioeconômicas para a concessão de benefício. Inteligência da Súmula 77/TNU.
4. Recurso a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004405-44.2020.4.03.6310
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: ZENILDE ROSA PRATES DIAS
Advogado do(a) RECORRENTE: EDMARA MARQUES - SP283347-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004405-44.2020.4.03.6310
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: ZENILDE ROSA PRATES DIAS
Advogado do(a) RECORRENTE: EDMARA MARQUES - SP283347
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pela parte Autora, ora Recorrente, em face da
sentença que julgou improcedente o pedido de concessão/restabelecimento de benefício por
incapacidade, tendo em vista a ausência de incapacidade para o trabalho.
Nas razões recursais (34), a parte Recorrente impugna o laudo pericial, sustentando que é
portadora de problemas crônicos em coluna lombar e que deveriam ter sido avaliadas suas
condições pessoais.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0004405-44.2020.4.03.6310
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: ZENILDE ROSA PRATES DIAS
Advogado do(a) RECORRENTE: EDMARA MARQUES - SP283347
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Passo ao exame do mérito.
O artigo 1.013 do Código de Processo Civil preconiza que o recurso devolve à instância
recursal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido
solucionadas desde que relativas ao capítulo impugnado.
O benefício do auxílio doença (agora denominado benefício por incapacidade temporária) tem
previsão legal no artigo 59 da Lei 8.213/1991, exigindo o preenchimento de três requisitos: i)
manutenção da qualidade de segurado; ii) incapacidade total e temporária para o exercício da
atividade habitual por mais de quinze dias consecutivos; e iii) cumprimento do período de
carência exigido pela lei.
Por sua vez, o benefício de aposentadoria por invalidez (ora chamada benefício por
incapacidade permanente) tem previsão nos artigos 42 a 47 da Lei 8.213/1991, e também exige
o preenchimento de três requisitos: i) manutenção da qualidade de segurado; ii) incapacidade
total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência; e iii) cumprimento
do período de carência exigido pela lei.
Por fim, o benefício de auxílio acidente tem previsão legal no artigo 18, I, h e § 1º bem como no
artigo 86 da Lei 8.213/91, sendo concedido, apenas aos segurados empregados, avulsos e
especiais, como indenização, ao segurado que, após consolidação das lesões decorrentes de
acidente de qualquer natureza, permanecer com seqüelas que impliquem na redução da
capacidade para o trabalho que anteriormente exercia. Para fazer jus a este benefício,
igualmente é necessária a qualidade de segurado, não existindo, no entanto, qualquer carência
a ser cumprida (art. 26, I da Lei 8.213/91).
Caso concreto.
A parte autora, 51 anos quando da perícia, sapateiro, foi submetida a perícia na especialidade
de ORTOPEDIA, na data de 15/01/2021, que concluiu pela capacidade para o exercício de sua
atividade habitual.
O laudo aponta que a autora possui doença ortopédica qual seja lombalgia crônica, mas que
esta não a incapacita para a sua função de operadora de produção, sendo necessária, apenas,
orientação ergonômica para a realização de suas atividades, o que sequer pode ser
enquadrado como reabilitação.
Se não há incapacidade, ficam prejudicadas a análise de outros pressupostos, requisitos e
exigência, quedando o pedido manifestamente improcedente, pois a parte autora não atende as
exigências da Lei 8.213/91, arts.42, art.59 e art. 86.
Nessa esteira, não se pode afastar o laudo pericial senão com argumentos técnicos, que
demonstrem equívocos de constatação ou erros de avaliação médica.
Vale ressaltar que a prova pericial realizada judicialmente é soberana a todas as outras provas
para a avaliação da capacidade ou não da parte autora. Vale dizer ainda, que o perito judicial
tem fé pública e ao realizar a perícia e elaborar o laudo, analisa todos os documentos médicos
juntados aos autos e os porventura trazidos na perícia.
O laudo pericial não merece reparo, pois é suficientemente claro e conclusivo e está fundado
em elementos objetivos extraídos da documentação médica e do exame clínico da parte autora.
As razões oferecidas pela recorrente não possuem o condão de afastá-lo. Estas não
apresentam informações ou fatos novos que justifique a desconsideração do laudo
apresentado, a realização de novas perícias, ou ainda o retorno dos autos aos peritos para
resposta aos quesitos apresentados.
O perito judicial que elaborou o laudo em referência é imparcial e de confiança deste juízo e o
laudo por ele elaborado encontra-se claro e bem fundamentado.
Com efeito, não obstante o artigo 42, §1º, da lei n. 8213/91 seja cristalino ao exigir a prova de
tal incapacidade mediante a realização de “exame médico-pericial” na via administrativa, na via
judicial é de conhecimento notório a existência dos princípios da liberdade de provas (artigo
369, do NCPC) e do livre convencimento motivado do magistrado (artigo 371, do NCPC), o que
abre, inicialmente, a possibilidade de reconhecimento da existência de incapacidade laboral por
outros meios de prova que não a pericial.
Destaque-se que, embora o magistrado não esteja adstrito ao laudo elaborado pelo perito
judicial, é certo que, não havendo elementos nos autos que sejam aptos a afastar suas
conclusões, tal prova deverá ser prestigiada, posto que equidistante do interesse de ambas as
partes.
A perícia médica tem por escopo não somente analisar os exames e relatórios médicos
apresentados pela parte como também validar, pelo exame clínico, os resultados e impressões
dos médicos da parte autora em conjunto com a profissão por ela exercida.
Digo inicialmente porque, se é inegável que o sistema de produção probatória firmado pelo
Código de Processo Civil não é tarifado, também é cristalino que a comprovação da
incapacidade laboral, sempre fundada em doença ou lesão, tem na prova pericial médica seu
mais importante e poderoso instrumento.
Isso porque tal constatação depende de conhecimentos técnicos na área da Medicina, o que
aponta exatamente para a necessidade de realização de prova pericial, a cargo do perito como
auxiliar de confiança do juízo.
Tal conclusão decorre inexoravelmente do prescrito pelos artigos 149 e 156, do Novo Código de
Processo Civil:
“Art. 149. São auxiliares da Justiça, além de outros cujas atribuições sejam determinadas pelas
normas de organização judiciária, o escrivão, o chefe de secretaria, o oficial de justiça, o perito,
o depositário, o administrador, o intérprete, o tradutor, o mediador, o conciliador judicial, o
partidor, o distribuidor, o contabilista e o regulador de avarias. (...)
Art. 156. O juiz será assistido por perito quando a prova do fato depender de conhecimento
técnico ou científico.
§ 1o Os peritos serão nomeados entre os profissionais legalmente habilitados e os órgãos
técnicos ou científicos devidamente inscritos em cadastro mantido pelo tribunal ao qual o juiz
está vinculado.
§ 2o Para formação do cadastro, os tribunais devem realizar consulta pública, por meio de
divulgação na rede mundial de computadores ou em jornais de grande circulação, além de
consulta direta a universidades, a conselhos de classe, ao Ministério Público, à Defensoria
Pública e à Ordem dos Advogados do Brasil, para a indicação de profissionais ou de órgãos
técnicos interessados.
§ 3o Os tribunais realizarão avaliações e reavaliações periódicas para manutenção do cadastro,
considerando a formação profissional, a atualização do conhecimento e a experiência dos
peritos interessados.
§ 4o Para verificação de eventual impedimento ou motivo de suspeição, nos termos dos arts.
148 e 467, o órgão técnico ou científico nomeado para realização da perícia informará ao juiz os
nomes e os dados de qualificação dos profissionais que participarão da atividade.
§ 5o Na localidade onde não houver inscrito no cadastro disponibilizado pelo tribunal, a
nomeação do perito é de livre escolha pelo juiz e deverá recair sobre profissional ou órgão
técnico ou científico comprovadamente detentor do conhecimento necessário à realização da
perícia.”
No concernente à realização em si da prova pericial e suas formalidades e exigências, a
primeira constatação decorre do prescrito pelo artigo 465, caput, do NCPC, que exige que o
perito seja “especializado no objeto da perícia”.
Outrossim, o artigo 473, do NCPC traz os elementos que deverão constar no corpo dos laudos
periciais, a saber: i) a exposição do objeto da perícia; ii) a análise técnica ou científica realizada
pelo perito; iii) a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser
predominantemente aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou; iv)
resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo Órgão do
Ministério Público.
Por fim, o artigo 477, §2º, do NCPC arrola as duas hipóteses nas quais cabe o esclarecimento,
pelo perito, de pontos levantados pelas partes: i) sobre o qual exista divergência ou dúvida de
qualquer das partes, do juiz ou do órgão do ministério Público; ii) divergente apresentado no
parecer do assistente técnico da parte.
De todo o exposto, verifico que, cumpridos os requisitos legais apontados pelos artigos 465 e
473, do NCPC, o laudo pericial é idôneo, somente sendo admissível sua impugnação em dois
casos: i) quando levantada divergência pelo assistente técnico da parte; ii) quando apontada
divergência ou dúvida pela própria parte.
Por evidente que tais divergências e/ou dúvidas deverão estar devidamente fundamentadas, de
forma pormenorizada e individualizada, além de dizer respeito a fatos ou contradições
existentes no corpo do laudo pericial, não cabendo insurgências em termos de nãoaceitação
das conclusões lançadas ou a envolver matéria de direito.
Tratando-se de perícia médica na área da saúde, sem a presença de patologia complexa e
incomum, basta que seja designado profissional capacitado para tanto e regularmente inscrito
no respectivo conselho de fiscalização, prescindindo-se da especialização correspondente à
enfermidade alegada.
No caso em tela, realizada perícia médica restou comprovada, de forma peremptória, a
capacidade laboral da parte autora.
Impõe-se observar, ainda, que no próprio laudo não se nega a existência de enfermidade. O
que nele se deixa assente é que inexiste incapacidade. Impende salientar que o requisito legal
para a concessão do benefício é a incapacidade (permanente para a aposentadoria por
invalidez e auxílio-acidente e temporária para o auxílio-doença) e não meramente a
enfermidade, a qual, por si só, desvinculada daquela, não engendra direito à percepção.
A lide é fruto da discordância entre os fatos alegados e documentos médicos trazidos pela parte
autora e o parecer igualmente médico do perito do INSS.
É justamente pela contrariedade de dois pareceres unilaterais - o da parte e o do INSS, acerca
da mesma situação que surge a necessidade de produção da prova médica em Juízo.
Assim, como não se pode dar ganho de causa a ambas as partes o resultado da demanda não
é outro senão a contrariedade de um dos arcabouços de documentos médicos produzidos.
Por fim, a sentença está em consonância com a Súmula 77 da TNU “O julgador não é obrigado
a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do
requerente para a sua atividade habitual.”
Assim, ante a falta de comprovação da incapacidade a parte autora não faz jus ao benefício
pleiteado e a sentença que deve ser mantida.
Posto isso, nego provimento ao recurso.
Condeno o(a) recorrente Autor(a) vencido(a) ao pagamento de honorários advocatícios no valor
de 10% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 55 da Lei 9.099/95. Para o beneficiário da
gratuidade de justiça, o pagamento da verba honorária se sujeita ao disposto no art. 98, § 3º, do
Código de Processo Civil.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO DESFAVORÁVEL.
LOMBALGIA CRÔNICA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. SÚMULA 77/TNU.
1. A incapacidade para o exercício de atividade laborativa deve ser comprovada nos autos, por
prova técnica, para que a parte possa fazer jus à percepção de qualquer benefício por
incapacidade, não bastando a existência de doença.
2. Caso em que a perícia realizada, que levou em consideração a documentação juntada nos
autos e o exame clínico presencial, não constatou incapacidade, apesar da presença da
doença.
3. Uma vez inexistente incapacidade, não há falar em análise de condições pessoais e
socioeconômicas para a concessão de benefício. Inteligência da Súmula 77/TNU.
4. Recurso a que se nega provimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Visto, relatado e discutido
este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Quarta Turma Recursal
do Juizado Especial Federal da Terceira Região, Seção Judiciária de São Paulo, por
unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
