Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001825-60.2020.4.03.6336
Relator(a)
Juiz Federal OMAR CHAMON
Órgão Julgador
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
26/10/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 03/11/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE
LABORATIVA. DOENÇA E INCAPACIDADE PREEXISTENTE AO INGRESSO AO REGIME
PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO POR EXPRESSA
VEDAÇÃO LEGAL. AÇÃO IMPROCEDENTE. RECURSO PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001825-60.2020.4.03.6336
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: GLORIA GUALBERTO DO NASCIMENTO AVANTE
Advogado do(a) RECORRIDO: CARMEM NOGUEIRA MAZZEI DE ALMEIDA PACHECO -
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
SP288159
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001825-60.2020.4.03.6336
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: GLORIA GUALBERTO DO NASCIMENTO AVANTE
Advogado do(a) RECORRIDO: CARMEM NOGUEIRA MAZZEI DE ALMEIDA PACHECO -
SP288159
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou ação objetivando a concessão/restabelecimento de benefício por
incapacidade.
Proferida sentença, o pedido foi julgado procedente para “implantar o auxílio por incapacidade
temporária E/NB 31/707.258.450-2, com DIB em 14/08/2020 e DCB em 31/08/2021,
descontados os valores eventualmente recebidos na esfera administrativa ou provenientes de
benefício inacumulável, inclusive a título de auxílio emergencial.”.Desta forma, interpõe a parte
ré o presente recurso sustentando, em síntese, que a incapacidade é preexistente ao
reingresso ao RGPS.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001825-60.2020.4.03.6336
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: GLORIA GUALBERTO DO NASCIMENTO AVANTE
Advogado do(a) RECORRIDO: CARMEM NOGUEIRA MAZZEI DE ALMEIDA PACHECO -
SP288159
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Requisitos
Os requisitos exigidos pela lei para a concessão de aposentadoria por incapacidade
permanente ou do auxílio por incapacidade temporária são os seguintes: a) a condição de
segurado da parte requerente, mediante prova de sua filiação ao sistema da Previdência Social;
b) a comprovação de ser a parte requerente incapaz permanente ou temporariamente para o
trabalho; c) a manutenção da sua condição de segurado na data do evento que determina a
concessão desse benefício, ou seja, da incapacidade; d) o cumprimento da carência.
Incapacidade
A mera existência de uma doença, por si só, não gera o direito a benefício por incapacidade.
Tanto o auxílio por incapacidade temporária quanto a aposentadoria por incapacidade
permanente pressupõem a existência de incapacidade laborativa, decorrente da instalação de
uma doença ou lesão, sendo que a distinção entre tais benefícios reside na intensidade de risco
social que acometeu o segurado, assim como a extensão do tempo pelo qual o benefício
poderá ser mantido.
O auxílio por incapacidade temporária será concedido quando o segurado ficar incapacitado
total e temporariamente para exercer suas atividades profissionais habituais, devendo-se
entender como habitual a atividade para a qual o interessado está qualificado e que desenvolvia
antes do evento incapacitante.
A aposentadoria por incapacidade permanente, por sua vez, é devida quando o segurado ficar
incapacitado total e definitivamente de desenvolver qualquer atividade laborativa e for
insusceptível de reabilitação para o exercício de outra atividade, adequada a sua escolaridade
formal, que lhe garanta a subsistência.
Nova perícia ou esclarecimentos.
Considerando a condição do magistrado de destinatário da prova (artigo 370, CPC/2015), é
importante frisar que “só ao juiz cabe avaliar a necessidade de nova perícia” (JTJ 142/220,
197/90, 238/222). De tal forma, compete apenas ao juiz apreciar a conveniência de realização
de nova avaliação, bem como o acolhimento de quesitos complementares (artigo 470, I c/c
artigo 480, CPC/2015), sendo certo que “o julgamento antecipado da lide tem total amparo
legal, decorrente da aplicação do CPC 330, I, não se configurando afronta aos CPC 425 e
331”.(STJ, 6ª Turma, AI 45.539/MG, Relator Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em
16/12/1993, decisão monocrática, DJ de 08/02/1994, grifos nossos).
É importante registrar que a simples contrariedade entre as conclusões dos laudos trazidos pela
parte ou pelo INSS, no processo administrativo, com as conclusões do perito judicial não é
suficiente para que seja convertido o julgamento em diligência, para a produção de novo laudo.
Novo laudo exige desqualificação do primeiro, seja em face de sua superficialidade ou omissão,
seja em face de baixa qualidade técnica. De outra forma, jamais o processo se encerraria, pois
sempre a parte descontente poderia requerer uma terceira perícia, para “desempatar”.
Qualidade de segurado
A qualidade de segurado se adquire com a filiação ao Regime Geral da Previdência Social –
RGPS, ou seja, com o exercício de atividade remunerada. Contudo, a lei estabelece um lapso
temporal denominado período de graça no qual, ainda que o segurado não esteja exercendo
atividade remunerada ou efetivando recolhimentos, não perderá a qualidade de segurado,
fazendo jus, portanto, a eventual benefício (artigo 15, Lei n.º 8.213/1991).
Importa ressaltar que o ordinário se presume e o extraordinário se prova. Há presunção relativa
de incapacidade preexistente, na hipótese de segurado que permaneceu, sem efetivar
contribuições, por longos anos e que volta a contribuir pouco antes de pleitear benefício por
incapacidade. Nessa hipótese, inclusive, a data indicada pela perícia pouco significa, tendo em
vista que a perícia se fundamenta nos documentos trazidos pela parte interessada. Portanto,
deverá, nesse caso, o segurado esclarecer a razão pela qual voltou a contribuir, após longos
anos. O ônus da prova é do segurado, nesse caso.
A aludida regra é decorrente da natureza do sistema previdenciário, que nada mais é que um
sistema de seguro social. Caso fosse admitido o pagamento de contribuições posteriores à
contingência social contra a qual visa a lei assegurar o trabalhador, como uma doença
incapacitante, não haveria mais previdência pois o trabalhador passaria a recolher as
contribuições apenas se necessitasse de um benefício.
Sob esta ótica, o sistema deixaria de ser mutualista e solidário e passaria a ter caráter
estritamente individual, já que o trabalhador deixaria de contribuir para todo o sistema, isto é,
para o pagamento de todos os benefícios a serem concedidos pelo regime previdenciário,
fraudando a concepção “securitária” do sistema.
Carência
Em regra, para os benefícios por incapacidade a carência corresponde a 12 (doze)
contribuições mensais, salvo se a incapacidade for decorrente de acidente de qualquer
natureza e causa; de acidente do trabalho ou doença ocupacional ou ainda se tiver origem em
doenças graves, previstas na legislação, que dispensam a carência: tuberculose ativa,
hanseníase, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e
incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante,
nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante), síndrome da
deficiência imunológica adquirida (AIDS), contaminação por radiação, com base em conclusão
da medicina especializada e hepatopatia grave. Referido rol, conforme a jurisprudência
majoritária, é meramente exemplificativo. Todavia, a doença deverá ser comprovadamente
grave, para que haja a dispensa da carência.
Caso concreto
No caso em tela, a autora nasceu em 08/06/1958, cursou o ensino fundamental incompleto e,
conforme cópia da CTPS acosta à inicial, possui experiência profissional nas funções de
serviços diversos, auxiliar de crediário e costureira.
A perícia médica judicial concluiu que a autora é portadora de patologia em visão que lhe causa
incapacidade total e temporária para o trabalho. Destaco trechos do laudo pericial:
“(...)
HISTÓRICO
Conforme informações fornecidas pelo(a) periciando(a): histórico familiar, condições em que
vive, internações e cirurgias, uso de medicamentos, diagnósticos anteriores:
Referiu apresentar baixa de acuidade visual progressiva em ambos os olhos de longa data, pior
em olho direito. Refere que procurou atendimento oftalmológico sendo diagnosticada com
catarata em ambos os olhos. Refere ter sido indicado a realização de cirurgia, porém ainda não
realizou procedimentos. Está aguardando convocação para a realização do procedimento pelo
SUS na Santa Casa de Jaú.
Detalhes da anamnese: Referiu fazer uso de óculos, porém sem melhora da acuidade visual.
Nega uso de colírios. Referiu ser hipertensa e dislipidêmica. Faz uso da medicação Losartana.
Negou cirurgias oculares prévias.
Exame físico feito pelo perito:
Acuidade Visual com correção para longe: movimentos de mão anteface em olho direito, conta
dedos a 2 metros em olho esquerdo.
Biomicroscopia de segmento anterior: cílios e pálpebras sem alterações em ambos os olhos,
conjuntiva calma em ambos os olhos, córnea sem alterações em ambos os olhos, câmara
anterior formada em ambos os olhos, íris trófica e fotorreagente em ambos os olhos, catarata
em ambos os olhos, sendo catarata total rubra em olho direito e nuclear 2+/4+ em olho
esquerdo.
Biomicroscopia de segmento posterior: não é possível focar em olho direito devido às
opacidades de meio (catarata densa). Em olho esquerdo disco óptico de limites nítidos com
escavação fisiológica, região macular sem alterações, vasos retinianos sem alterações, retina
aplicada, vítreo limpo.
(...)
DISCUSSÃO:
De acordo com a portaria 3.128 de 24 de dezembro de 2008, considera-se baixa visão ou visão
subnormal, quando o valor da acuidade visual corrigida no melhor olho é menor do que 0,3
(20/60) e maior ou igual a 0,05 (20/400) ou seu campo visual é menor do que 20º no melhor
olho com a melhor correção óptica (categorias 1 e 2 de graus de comprometimento visual do
CID 10) e considera-se cegueira quando esses valores encontram-se abaixo de 0,05 ou o
campo visual menor do que 10º (categorias 3, 4 e 5 do CID 10). Portanto, de acordo com a
medida da acuidade visual realizada durante a perícia médica a autora é portadora de cegueira
bilateral decorrente de catarata (CID-10 H25.9/ H54.0).
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), acuidade visual de 20/30 a 20/60 é
considerado leve perda de visão, ou próximo da visão normal, de 20/70 a 20/160 é considerada
baixa visão moderada, de 20/200 a 20/400 é considerado grave deficiência visual, de 20/500 a
20/1000 é considerada baixa visão profunda, inferior a 20/1000 é considerado quase total a
deficiência visual, e nenhuma percepção da luz é considerada cegueira total. Nesta
classificação a autora é portadora de quase total a deficiência visual de olho direito e baixa
visão profunda em olho esquerdo.
CONCLUSÃO:
Pericianda se apresenta com alteração incapacitante para a atividade laboral exercida.
(...)
1. Caso a incapacidade decorra de doença, é possível determinar a data de início da doença?
Não é possível estimar desde quando apresenta a baixa visão. Referiu ter sido dispensada do
trabalho há cerca de 3 anos pois já apresentava baixa visão.
1. Constatada a incapacidade, é possível determinar se esta decorreu de agravamento ou
progressão de doença ou lesão?
Sim, decorreu da progressão natural da catarata.
1. Caso a resposta seja afirmativa, é possível estimar a data e em que se baseou para fixar a
data do agravamento ou progressão.
Não é possível estimar.
1. É possível determinar a data de início da incapacidade? Informar ao juízo os critérios
utilizados para a fixação desta data, esclarecendo quais exames foram apresentados pelo autor
quando examinado e em quais exames baseou-se para concluir pela incapacidade e as razões
pelas quais agiu assim.
Não é possível estimar desde quando apresenta acuidade visual baixa.
(...)
1. A incapacidade é insusceptível de recuperação ou reabilitação para o exercício de outra
atividade que garanta subsistência ao periciando?
Não, a acuidade visual pode ser recuperada completamente com a realização da cirurgia para
remoção da catarata.
1. Caso seja constatada incapacidade total, esta é temporária ou permanente?
É temporária.
1. É possível estimar qual é o tempo necessário para que o periciando se recupere e tenha
condições de voltar a exercer seu trabalho ou atividade habitual? Justifique. Em caso positivo,
qual é a data estimada?
Não é possível estimar. Após a cirurgia a recuperação visual completa ocorre em cerca de 30
dias.
(...)”
Não há motivo para afastar as conclusões da perita, pois esta as fundou nos documentos
médicos constantes nos autos, bem como em exame clínico realizado. Pela mesma razão,
desnecessária a realização de nova perícia ou laudo complementar. Também não verifico
contradições entre as informações constantes do laudo aptas a ensejar dúvida em relação ao
mesmo, o que afasta qualquer alegação de nulidade.
A perita informou que não é possível estimar a data de início da doença e do agravamento da
patologia.
Da análise detida dos autos virtuais, verifico que durante a perícia judicial a autora informou ser
portadora de baixa de acuidade visual progressiva em ambos os olhos de longa data, entretanto
colacionou aos autos documentos médicos datados a partir de 2019, sendo que o relatório
médico emitido em 02/06/2020 relata quadro avançado da doença.
O processo administrativo juntado aos autos pela ré (evento 07) demonstra que a após o
encerramento do vínculo laboral em 08/08/1987, a autora reingressou ao RGPS somente no
ano de 2015, vertendo recolhimentos, na qualidade de contribuinte individual, nos períodos de
01/07/2015 a 30/09/2015, 01/11/2015 a 30/11/2015, 01/11/2017 a 28/02/2018 e 01/04/2018 a
28/02/2019. Consta no CNIS que esteve em gozo de benefício de auxílio por incapacidade
temporária nos períodos de 14/08/2019 a 13/05/2020, 02/06/2020 a 01/07/2020 e 21/07/2020 a
19/08/2020.
Anoto que consta no laudo da perícia administrativa realizada em 13/04/2016 que “AX1, 57
anos, SABI mostra ter sido desempregada em 1987, após período de 28 anos sem
contribuições, fez exatas 4 contribuições individuais no ano de 2015 (meses 07, 08, 09 e
11/2015), orientada por advogados (Sérgio Cardoso e Rogério - sic), mora em chácara, com
marido (58 anos - trabalha fora|) e 2 filhos (28 e 25 anos -trabalham fora), a requerente faz as
atividades da casa.”.
Assim, considerando que a patologia em visão é de longa data, a escassez de documentos
médicos acostados aos autos, bem como a retomada das contribuições após 28 anos sem
contribuir e quando já contava com 57 anos de idade, entendo que o reingresso da autora ao
RGPS se deu quando já portadora da patologia alegada como causa da incapacidade, razão
pela qual não há como se conceder o benefício, diante da vedação contida no artigo 42, § 2º e
no artigo 59, parágrafo único, ambos da Lei n.º 8.213/1991.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso da parte ré para julgar improcedente o pedido.
Sem condenação em custas e honorários.
Revogo a antecipação dos efeitos da tutela concedida nestes autos. Expeça-se oficio, com
urgência.
De acordo com a posição pacífica do E. Superior Tribunal de Justiça o INSS poderá cobrar os
valores indevidamente recebidos pela segurada em ação autônoma.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE
LABORATIVA. DOENÇA E INCAPACIDADE PREEXISTENTE AO INGRESSO AO REGIME
PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO POR EXPRESSA
VEDAÇÃO LEGAL. AÇÃO IMPROCEDENTE. RECURSO PROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma decidiu,
por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
