Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000193-08.2020.4.03.6333
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
01/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 06/12/2021
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE PARCIAL E
PERMANENTE PARA ATIVIDADES QUE EXIJAM ESFORÇO FÍSICO E CARREGAMENTO DE
PESOS. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA ATENDIDAS. SÚMULA 47 DA TNU.
CONDIÇÕES PESSOAIS E SOCIAIS FAVORÁVEIS A REINSERÇÃO NO MERCADO DE
TRABALHO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ QUE POR ORA NÃO SE JUSTIFICA.
CONCESSÃO DE AUXÍLIO DOENÇA ATÉ A EFETIVA REABILITAÇÃO PROFISSIONAL.
DISCRICIONARIEDADE DO INSS NA CONDUÇÃO DO PROCEDIMENTO. SENTENÇA
REFORMADA. RECURSO DA PARTE RÉ PARCIALMENTE PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000193-08.2020.4.03.6333
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: BALTAZAR JOSE DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: ANDERSON MACOHIN - SP284549-N, CAROLINA VINAGRE
CARPES CARDOSO - SP279926-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000193-08.2020.4.03.6333
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: BALTAZAR JOSE DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: ANDERSON MACOHIN - SP284549-N, CAROLINA VINAGRE
CARPES CARDOSO - SP279926-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou a presente ação na qual requereu a concessão/restabelecimento de
benefício por incapacidade.
O juízo singular proferiu sentença e julgou procedente o pedido a fim de conceder
aposentadoria por invalidez em favor da parte autora.
Inconformada, a autarquia ré interpôs o presente recurso. Postula, em síntese, a ampla reforma
da sentença.
Contrarrazões pelo demandante.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000193-08.2020.4.03.6333
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: BALTAZAR JOSE DA SILVA
Advogados do(a) RECORRIDO: ANDERSON MACOHIN - SP284549-N, CAROLINA VINAGRE
CARPES CARDOSO - SP279926-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Passo à análise do recurso.
A concessão do benefício previdenciário auxílio-doença exige, nos termos da legislação
específica (Lei 8.213/1991, art. 59 e ss.), a presença dos seguintes requisitos: (i) incapacidade
laborativa temporária superior a 15 (quinze) dias; (ii) prova da condição de segurado e sua
manutenção à época do início da incapacidade; (iii) que a doença incapacitante não seja
preexistente à filiação do segurado ao RGPS, exceto nos casos de progressão e agravamento;
e (iv) carência de 12 contribuições mensais (à exceção de algumas hipóteses).
Já para a concessão da aposentadoria por invalidez se exige, além dos referidos requisitos
previstos para a concessão de auxílio-doença, que a incapacidade seja total e permanente,
insuscetível de reabilitação do segurado para atividade diversa que lhe garanta a sobrevivência,
nos termos do que dispõem os art. 42 e ss. da Lei 8.213/1991.
Incapacidade total indica que o segurado não tem condições de exercer qualquer atividade
laboral; incapacidade permanente denota que não há prognóstico de que o segurado possa
recuperar a capacidade de trabalho para a mesma ou outra atividade.
No caso em análise, a perícia médica, realizada em 25/11/2020, por especialista em Medicina
do Trabalho, apontou que o demandante, motorista de caminhões, nascido em 23/09/1968 (52
anos na data do exame), apresenta quadro de atroplastia total de quadril, o que lhe acarreta
incapacidade parcial e permanente para suas atividades habituais. No entanto, frisou que o
autor possui capacidade residual para a própria função de motorista, desde que respeitadas
suas limitações, como evitar carga e descarga de produtos.
Por fim, fixou a data de início da incapacidade em janeiro de 2019. Eis o trecho da conclusão da
perita judicial:
“(...) De acordo com a documentação e laudos médicos em anexo, a Parte Autora apresenta
radiculopatia/hérnia discal lombar, polineuropatia e osteoartrose do quadril, além de fratura do
colo femoral provocado por um acidente de transito em 07/01/2019, encontrando-se
incapacitado para o desempenho de suas atividades laborativas.
(...)
Discussão:
O Autor refere uso de medicação para controle da dor 1-2x/semana, não sabe informar o nome,
tampouco apresenta receita médica. O tratamento relatado não é adequado para controle da
dor crônica.
Para a função de motorista não há qualquer impedimento para o exercício das atividades. O
Autor deve evitar apenas realizar a carga e descarga do caminhão pelo fato de ter sido
submetido a artroplastia total de quadril.
Dessa forma, o Autor está parcialmente e permanenentemente incapacitado, pois apresenta
redução da capacidade laborativa, mas não está impedido de laborar como motorista ou de
garantir o próprio sustento.
Conclusão:
A partir do exame pericial realizado, conclui-se que:
a. O Periciando é portador de artroplastia total de quadril;
b. A doença apresentada NÃO TEM relação com a sua atividade
laboral;
c. Ao exame físico, FORAM constatadas repercussões funcionais da sua doença de base,
HAVENDO, portanto, incapacidade laboral.
(...)
8. Quais as alterações clínicas encontradas em exame físico?
R: O Autor não apresentou alterações ao exame físico. O Autor apresenta restrição para a
realização de esforço físico devido a artroplastia total de quadril.
(...)
15. A incapacidade é omniprofissional, multiprofissional, ou uniprofissional?
Especifique quais as restrições apresentadas.
R: Multiprofissional. O Autor deve evitar realizar esforço físico, afim de proteger a prótese de
quadril. Não está impedido de continuar exercendo a função de motorista, desde que não
realize a atividade de carga e descarga.
(...)” (destaquei)
Com base na conclusão pericial e demais provas carreadas aos autos, eis a solução proposta
pelo juízo a quo:
“(...) Postas estas premissas, cabe analisar as provas trazidas aos autos no caso concreto.
O exame pericial médico realizado na parte autora (arquivo 22) informa que a parte autora é
portadora de “artroplastia total de quadril.”
Concluiu ainda que a incapacidade é parcial e permanente para sua função habitual. Fixou a
data de início em janeiro.
Sobre a incapacidade, o perito ainda atesta que é Multiprofissional. Diz que o “Autor deve evitar
realizar esforço físico, afim de proteger a prótese de quadril.”
Como se verifica, a parte já tem mais de 52 anos e baixa escolaridade (ensino fundamental),
além de histórico laborativo em atividades braçais (motorista).
Assim, embora aventada no laudo a possibilidade hipotética de trabalho como motorista, no
caso dos autos verifico pela documentação médica anexa que a natureza das moléstia, bem
como seu caráter crônico, não permitem supor que possa conseguir exercê-la ou mesmo ser
reabilitado a atividade que lhe garanta o autossustento, o que torna improvável seu retorno ao
mercado de trabalho, mormente na época atual, marcada pela pandemia de COVID-19.
Tal situação, somada às demais condições exigidas por lei, poderá dar ensejo ao benefício de
aposentadoria por incapacidade à parte autora.
Qualidade de segurado e carência
Mencione-se, ademais, que para o gozo do benefício não basta apenas a comprovação da
existência de lesão ou moléstia incapacitante, sendo necessária a demonstração da qualidade
de segurado, bem como o cumprimento da carência de 12 meses.
Isso porque o regime previdenciário brasileiro, tal como regulado pela Constituição Federal,
possui um caráter eminentemente contributivo (artigo 201). Significa dizer que quem não
contribui não possui direito de usufruir dos benefícios proporcionados pelo Regime Geral.
Analisando a documentação acostada, em especial a consulta ao CNIS (arquivo 29), verifica-se
que a parte autora tem vínculos de emprego, seguido de recolhimentos e auxílio por
incapacidade até 31/10/2019. Assim, restou comprovada a qualidade de segurado da parte
autora.
Deste modo, considerando que houve o preenchimento de todos os requisitos legais
indispensáveis ao restabelecimento benefício de aposentadoria por incapacidade permanente.
(...)”
Em seu pleito recursal, a autarquia ré pleiteia a reforma da sentença diante da ausência de
incapacidade laborativa para a atividade de motorista constatada no laudo pericial.
Com efeito, o benefício aposentadoria por invalidez pressupõe a configuração da incapacidade
total e permanente, o que não restou demonstrado no caso em análise.
Embora o perito tenha informado que o autor pode realizar a atividade de motorista, ressalvou
que há limitações em relação a carga e descarga de mercadoria, função inerente ao seu cargo.
Por conseguinte, em que pese a falta de clareza do laudo emitido, é evidente que o
demandante se encontra totalmente incapaz para a atividade de motorista de caminhão, visto
que se não pode exercer tarefa essencial enquanto caminhoneiro.
Por outro lado, observo que a parte autora faz jus ao auxílio doença, que é o benefício
destinado aos casos de incapacidade parcial e permanente, ao menos até sua efetiva
reabilitação em outra função, compatível com as suas limitações.
Da análise dos autos verifico que também não é possível fundamentar o deferimento da
aposentadoria por invalidez na aplicação das Súmulas 47 e 77 da TNU.
Transcrevo os verbetes pertinentes:
Súmula 47: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar
as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez”
Súmula 77: “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não
reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
Com efeito, consta dos autos que o autor possui 52 anos e experiência profissional como
motorista celetista e autônomo. Desse modo, concluo que o autor não está incapacitado para
outras funções que não exijam esforços físicos, carregamento de pesos e transporte de
mercadorias, ensejando assim a concessão de auxílio doença até a data da efetiva reabilitação
profissional em função adaptada às suas capacidades.
Segundo Frederico Amado (“Curso de Direito e Processo Previdenciário”. 10. ed. Salvador:
JusPodivm, 2018, p. 899, grifo no original), o auxílio-doença pode ser concedido em duas
hipóteses:
“a)Incapacidade temporária parcial ou total para o trabalho habitual por mais de 15 dias
consecutivos, sendo plenamente possível a recuperação do segurado para desenvolver a
mesma atividade;
b)Incapacidade permanente parcial ou total do segurado para o trabalho habitual por mais de 15
dias consecutivos, não sendo possível a recuperação do segurado para continuar
desenvolvendo o trabalho habitual, mas plenamente viável a reabilitação profissional para outra
atividade que lhe garanta a subsistência”.
O caso se enquadra na letra b, pois impossível a plena recuperação do requerente para o
trabalho habitual de motorista de caminhão. Viável, por outro lado, a reabilitação profissional
para outra atividade, na medida em que se trata de pessoa com 52 anos e experiência
profissional.
Nesse diapasão, considerando o quanto exposto, não se justifica por ora a concessão de
aposentadoria por invalidez.
Na DII, por conseguinte, o demandante possuía qualidade de segurado, uma vez que estava
em gozo de benefício por incapacidade e recolhia na qualidade de contribuinte individual.
Consoante extrato do CNIS (evento 29), também foi atendida a carência de 12 contribuições
mensais (art. 25, I, da Lei 8.213/1991).
Preenchidos os requisitos legais, o restabelecimento do benefício de auxílio doença é medida
de rigor.
Nestes termos, dou parcial provimento ao recurso para reformar a sentença e determinar a
restabelecimento do auxílio-doença cessado em 31/10/2019 e o encaminhamento do segurado
para o serviço de reabilitação profissional para que seja realizada a perícia de elegibilidade, nos
termos do artigo 62 da Lei 8.213/91 e do Tema 177 da TNU que dispõe:1. CONSTATADA A
EXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE, NÃO SENDO O CASO DE
APLICAÇÃO DA SÚMULA 47 DA TNU, A DECISÃO JUDICIAL PODERÁ DETERMINAR O
ENCAMINHAMENTO DO SEGURADO PARA ANÁLISE ADMINISTRATIVA DE
ELEGIBILIDADE À REABILITAÇÃO PROFISSIONAL, SENDO INVIÁVEL A CONDENAÇÃO
PRÉVIA À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONDICIONADA AO
INSUCESSO DA REABILITAÇÃO; 2. A ANÁLISE ADMINISTRATIVA DA ELEGIBILIDADE À
REABILITAÇÃO PROFISSIONAL DEVERÁ ADOTAR COMO PREMISSA A CONCLUSÃO DA
DECISÃO JUDICIAL SOBRE A EXISTÊNCIA DE INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE,
RESSALVADA A POSSIBILIDADE DE CONSTATAÇÃO DE MODIFICAÇÃO DAS
CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS APÓS A SENTENÇA.
Ante todo o exposto, dou parcial provimento ao recurso da parte ré, nos termos da
fundamentação acima.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da
causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré, se recorrente
vencida, ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado
ou for assistida pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de
assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados
ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15.
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE PARCIAL E
PERMANENTE PARA ATIVIDADES QUE EXIJAM ESFORÇO FÍSICO E CARREGAMENTO
DE PESOS. QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA ATENDIDAS. SÚMULA 47 DA TNU.
CONDIÇÕES PESSOAIS E SOCIAIS FAVORÁVEIS A REINSERÇÃO NO MERCADO DE
TRABALHO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ QUE POR ORA NÃO SE JUSTIFICA.
CONCESSÃO DE AUXÍLIO DOENÇA ATÉ A EFETIVA REABILITAÇÃO PROFISSIONAL.
DISCRICIONARIEDADE DO INSS NA CONDUÇÃO DO PROCEDIMENTO. SENTENÇA
REFORMADA. RECURSO DA PARTE RÉ PARCIALMENTE PROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal de São Paulo decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da parte ré,
nos termos do voto da Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA