Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000838-73.2019.4.03.6331
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
23/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 26/11/2021
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. DOENÇA E INCAPACIDADE ANTERIORES AO REINGRESSO DO AUTOR NO
RGPS. INCIDÊNCIA DA VEDAÇÃO DO ART. 42, § 2º, DA LEI 8.213/1991. BENEFÍCIO
INDEVIDO. EVENTUAL COBRANÇA DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE DEVE SER
OBJETO DE AÇÃO PRÓPRIA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA
CONCEDIDA. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000838-73.2019.4.03.6331
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: EDSON SELVINO FERREIRA
Advogado do(a) RECORRIDO: MAURICIO CURY MACHI - SP153995-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000838-73.2019.4.03.6331
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: EDSON SELVINO FERREIRA
Advogado do(a) RECORRIDO: MAURICIO CURY MACHI - SP153995-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou a presente ação na qual requereu a concessão/restabelecimento de
benefício por incapacidade.
O juízo singular proferiu sentença e julgou procedente o pedido a fim de conceder
aposentadoria por invalidez desde a cessação do auxílio doença.
Inconformado, o INSS interpôs o presente recurso. Alegou, em síntese, que a doença
incapacitante é preexistente ao reingresso da parte autora no RGPS.
Em contrarrazões, a demandante pugnou pela manutenção do decidido.
Convertido o feito em diligência, houve apresentação de laudo pericial complementar.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000838-73.2019.4.03.6331
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: EDSON SELVINO FERREIRA
Advogado do(a) RECORRIDO: MAURICIO CURY MACHI - SP153995-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Passo à análise do recurso.
A concessão do benefício previdenciário auxílio-doença exige, nos termos da legislação
específica (Lei 8.213/1991, art. 59 e ss.), a presença dos seguintes requisitos: (i) incapacidade
laborativa temporária superior a 15 (quinze) dias; (ii) prova da condição de segurado e sua
manutenção à época do início da incapacidade; (iii) que a doença incapacitante não seja
preexistente à filiação do segurado ao RGPS, exceto nos casos de progressão e agravamento;
e (iv) carência de 12 contribuições mensais (à exceção de algumas hipóteses).
Já para a concessão da aposentadoria por invalidez se exige, além dos referidos requisitos
previstos para a concessão de auxílio-doença, que a incapacidade seja total e permanente,
insuscetível de reabilitação do segurado para atividade diversa que lhe garanta a sobrevivência,
nos termos do que dispõem os art. 42 e ss. da Lei 8.213/1991.
Incapacidade total indica que o segurado não tem condições de exercer qualquer atividade
laboral; incapacidade permanente denota que não há prognóstico de que o segurado possa
recuperar a capacidade de trabalho para a mesma ou outra atividade.
Cinge-se a controvérsia recursal à suposta preexistência da enfermidade em relação ao
reingresso do autor no RGPS.
No caso em análise, a perícia médica, realizada em 04/06/2019, por especialista em Clínica
Médica, apontou que o demandante, nascido em 10/02/1962 (58 anos), apresenta
neurocisticercose, hipotireoidismo, hipertensão arterial, diabetes e deficiência visual, o que lhe
acarreta incapacidade total e permanente para suas atividades habituais de
encanador/eletricista. Eis o trecho da conclusão pericial:
“(...) De acordo com a anamnese, exame físico e análise dos documentos médicos e exames
apresentados e os contidos nos autos o Sr. Edson é portador de:
a)- Neurocisticercose - CID 10: B.69.0 - A cisticercose humana, ocorre pela infestação do
Sistema Nervoso (SN) com embriões da Taenia solium – cisticercos. Não é necessário que o
paciente com neurocisticercose (NC) seja portador da teníase intestinal. A ingestão de carne de
porco contaminada com cisticercos produz a teníase intestinal e não cisticercose. Uma vez no
SN o embrião pode instalar-se no parênquima cerebral formando um cisto (Cysticercus
cellulosae). Se ele alcançar ventrículo ou espaço subaracnóide adquire a forma de vesículas
que podem se desdobrar formando um cacho (Cysticercus racemosus). As reações patológicas
podem ser discretas, podendo a infestação passar desapercebida e a NC será descoberta ao
acaso, como calcificação nos raios X de crânio (RXC) ou tomografia computadorizada do
encéfalo (TCE). A TCE e a ressonância magnética (RM) visualizam os cistos ou nódulos
permitindo analisar número e estágio evolutivo dos cistos. Outras vezes, a reação inflamatória é
intensa em torno do parasito, provocando convulsões ou hipertensão intracraniana. As
manifestações clínicas mais frequentes são: crises epilépticas, cefaleia, hipertensão
intracraniana, síndrome meníngea e distúrbios cognitivos. Informou que em janeiro de 2014
teve 2 episódios de convulsão. Diagnóstico de neurocisticercose e hidrocefalia. Submetido a
tratamento cirúrgico com o implante de válvula de derivação ventrículoperitoneal.
Atestados médicos emitidos em 18 de novembro de 2014 (doc. nos autos) e em 18 de maio de
2015 (doc. nos autos) informam a patologia e o tratamento. Atualmente as crises convulsivas
estão controladas com o uso de medicamentos. Apresenta déficit cognitivo leve, esquecimento
e tremores nas mãos.
b)- Hipotireoidismo – CID 10: E.03.9 - É uma síndrome complexa resultante da secreção
insuficiente do hormônio tireoidiano. Esses hormônios influenciam todos os sistemas orgânicos
e as manifestações de sua deficiência são múltiplas e diversas. As mais importantes são as
manifestações sobre o metabolismo lipídico e hipertensão arterial com acentuada predisposição
a vasculopatia em geral e a coronariopatia em especial.
c)- Hipertensão arterial – CID 10: I.10 - A hipertensão arterial afeta o coração e todos os órgãos
do sistema cardiovascular. Desde que bem controlada com dieta e medicamentos, não há
restrições físicas ou mentais.
d)- Diabetes – CID 10: E.14 - A diabete é uma síndrome complexa com um aumento da taxa de
glicose no sangue (hiperglicemia) e pode ocorrer complicações, tanto agudas como crônicas.
As complicações crônicas mais importantes são: a Retinopatia, a insuficiência renal e a
neuropatia periférica.
e)- Deficiência visual – CID 10: H.54.4 – Informou que em 1975 foi vítima de um acidente (uma
telha caiu de cima da casa e furou o olho). Cegueira no olho direito. (...)” (destaquei)
Por fim, em relação à data de início da doença e da incapacidade, o perito fez as seguintes
declarações:
“(...) 3. Caso a incapacidade decorra de doença, é possível determinar a data de início da
doença?
Não foi possível definir com exatidão a data de início das patologias. Informou que o diagnóstico
da neurocisticercose foi em janeiro de 2014 e a deficiência visual é desde 1975.
4. Constatada a incapacidade, é possível determinar se esta decorreu de agravamento ou
progressão de doença ou lesão?
A incapacidade laboral decorre do agravamento e progressão das patologias.
4.1. Caso a resposta seja afirmativa, é possível estimar a data e em que se baseou para fixar a
data do agravamento ou progressão?
De acordo com a anamnese, exame físico e análise dos documentos médicos e exames
apresentados e os contidos nos autos o agravamento é desde janeiro de 2014.
5. É possível determinar a data de início da incapacidade? Informar ao juízo os critérios
utilizados para a fixação desta data, esclarecendo quais exames foram apresentados pelo autor
quando examinado e em quais exames baseou-se para concluir pela incapacidade e as razões
pelas quais agiu assim.
Informou que não exerce a atividade laboral de encanador/eletricista desde janeiro de 2014.
Recebeu o benefício de auxílio doença concedido pelo INSS no período de 2 de fevereiro de
2014 até 17 de junho de 2015. (doc. nos autos).
Em janeiro de 2014 teve 2 episódios de convulsão. Diagnóstico de neurocisticercose e
hidrocefalia. Submetido a tratamento cirúrgico com o implante de válvula de derivação
ventrículo-peritoneal. Em 1975 foi vítima de um acidente (uma telha caiu de cima da casa e
furou o olho). Cegueira no olho direito. Atestados médicos emitidos em 18 de novembro de
2014 (doc. nos autos) e em 18 de maio de 2015 (doc. nos autos) informam a patologia
neurológica e o tratamento. Atualmente as crises convulsivas estão controladas com o uso de
medicamentos e apresenta déficit cognitivo leve, esquecimento e tremores nas mãos.
De acordo com a anamnese, exame físico e análise dos documentos médicos, exames
apresentados e os contidos nos autos é possível que a incapacidade laboral seja desde
fevereiro de 2014. (...)”
Pois bem.
Convertido o feito em diligência, houve apresentação do prontuário completo do demandante
sucedido de laudo pericial complementar, no qual o perito judicial retificou a DII da seguinte
forma:
“(...) De acordo com os novos documentos apresentados RETIFICO:
1. O período em que recebeu o benefício concedido pelo INNS: de 2 de fevereiro de 2014 até
17 de junho de 2015 para 2 de setembro de 2014 até 17 de junho de 2015 (evento 15 – fls. 5
dos autos).
2. Fixo a data do diagnóstico da neurocisticercose em 14 de janeiro de 2014.
3. Fixo a data de início da incapacidade laboral em 14 de janeiro de 2014. Informou que não
exercia a atividade laboral desde janeiro de 2014 quando teve 2 episódios de convulsão e foi
feito o diagnóstico e início do tratamento da patologia neurológica; relatório médico emitido em
1 de abril de 2014 (evento 49 – fls. 107 dos autos) informa que realizou Ressonância magnética
do crânio no dia 14 de janeiro de 2014 com diagnóstico de neurocisticercose; internado na
Santa Casa de Araçatuba no período de 1 de abril de 2014 até 8 de abril de 2014 com
diagnostico de hipertensão intracraniana benigna. (evento 49 - fls. 100 e 146 dos autos).
4. No dia 17 de abril de 2014 foi internado devido a piora dos sinais e sintomas e submetido a
implante de derivação ventrículo peritoneal.
RATIFICO
1. No dia da perícia médica as crises convulsivas estavam controladas com o uso de
medicamentos e apresentava déficit cognitivo leve, esquecimento e tremores nas mãos.
2. A incapacidade laboral é total e permanente. As patologias são permanentes.
(...)” (destaquei)
De fato, as enfermidades neurocisticercose e a deficiência visual foram diagnosticadas,
respectivamente, em janeiro de 2014 e em 1975. Ademais, o laudo pericial aponta que a
incapacidade decorreu do agravamento da moléstia já em janeiro de 2014.
Nesse sentido, observo que as conclusões exaradas no laudo pericial, em cotejo com o
conjunto probatório, demonstram que a incapacidade total e permanente do demandante,
motivada sobretudo pelo agravamento das moléstias, é anterior ao reingresso da parte autora
no RGPS.
Conforme extrato do CNIS (evento 15), o demandante teve seu último vínculo de emprego
encerrado em 08/2003. Após longo período sem contribuições, retornou ao RGPS, na qualidade
de contribuinte individual, em 02/2014, tendo recolhido de forma contínua e regular até 12/2015.
Por conseguinte, não restam dúvidas de que o autor se filiou novamente ao regime já
diagnosticado com as enfermidades, incapaz e com o único intuito de obter a prestação
previdenciária.
Nessa esteira, mantida a DII retificada no laudo pericial (14/01/2014), o demandante não
detinha qualidade de segurado e tampouco havia preenchido a carência necessária para a
concessão do benefício.
Com isso, a concessão de aposentadoria por invalidez resvala na vedação do art. 42, § 2º, da
LBPS.
Nesse sentido o enunciado da Súmula 53 da Turma Nacional de Uniformização: “Não há direito
a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é
preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social”.
Por fim, em relação à devolução de valores pagos indevidamente à parte autora, verifico que se
trata de questão diversa da que está em análise nesta demanda, razão pela qual a medida deve
ser pleiteada em autos próprios, se assim entender a autarquia ré.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso da parte ré para reformar a sentença, julgar
improcedente o pedido e revogar a tutela antecipada concedida em sentença.
Oficie-se ao INSS com urgência a respeito da tutela ora revogada.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da
causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré, se recorrente
vencida, ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado
ou for assistida pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de
assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados
ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15.
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. DOENÇA E INCAPACIDADE ANTERIORES AO REINGRESSO DO AUTOR
NO RGPS. INCIDÊNCIA DA VEDAÇÃO DO ART. 42, § 2º, DA LEI 8.213/1991. BENEFÍCIO
INDEVIDO. EVENTUAL COBRANÇA DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE DEVE SER
OBJETO DE AÇÃO PRÓPRIA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA
CONCEDIDA. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal de São Paulo decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da parte ré,
nos termos do voto da Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
