Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0052496-95.2020.4.03.6301
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
25/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 07/03/2022
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. ENFERMIDADE CONGÊNITA E, PORTANTO, ANTERIOR AO INGRESSO DA
PARTE AUTORA NO RGPS. PORÉM, INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE
DECORRENTE DO AGRAVAMENTO DA DOENÇA, CONFORME CONSTATADO NO LAUDO
PERICIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONCEDIDA PELO PRÓPRIO INSS POR
CERCA DE VINTE ANOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DA PARTE
RÉ DESPROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0052496-95.2020.4.03.6301
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: MAURO DE PAULA SIERVO
REPRESENTANTE: ALCIR NARCISO
Advogado do(a) RECORRIDO: ADRIANE BRAMANTE DE CASTRO LADENTHIN - SP125436-
A,
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0052496-95.2020.4.03.6301
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MAURO DE PAULA SIERVO
REPRESENTANTE: ALCIR NARCISO
Advogado do(a) RECORRIDO: ADRIANE BRAMANTE DE CASTRO LADENTHIN - SP125436-
A,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou a presente ação na qual requereu a concessão/restabelecimento de
benefício por incapacidade.
O juízo singular proferiu sentença e julgou procedente o pedido.
Inconformada, a autarquia ré interpôs o presente recurso. Alegou, em síntese, que a doença
incapacitante é preexistente ao ingresso do autor no RGPS, o que obstaria a concessão de
aposentadoria por invalidez.
Em contrarrazões, o demandante pugnou pela manutenção do decidido.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0052496-95.2020.4.03.6301
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: MAURO DE PAULA SIERVO
REPRESENTANTE: ALCIR NARCISO
Advogado do(a) RECORRIDO: ADRIANE BRAMANTE DE CASTRO LADENTHIN - SP125436-
A,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Passo à análise do recurso.
A concessão do benefício previdenciário auxílio-doença exige, nos termos da legislação
específica (Lei 8.213/1991, art. 59 e ss.), a presença dos seguintes requisitos: (i) incapacidade
laborativa temporária superior a 15 (quinze) dias; (ii) prova da condição de segurado e sua
manutenção à época do início da incapacidade; (iii) que a doença incapacitante não seja
preexistente à filiação do segurado ao RGPS, exceto nos casos de progressão e agravamento;
e (iv) carência de 12 contribuições mensais (à exceção de algumas hipóteses).
Já para a concessão da aposentadoria por invalidez se exige, além dos referidos requisitos
previstos para a concessão de auxílio-doença, que a incapacidade seja total e permanente,
insuscetível de reabilitação do segurado para atividade diversa que lhe garanta a sobrevivência,
nos termos do que dispõem os art. 42 e ss. da Lei 8.213/1991.
Incapacidade total indica que o segurado não tem condições de exercer qualquer atividade
laboral; incapacidade permanente denota que não há prognóstico de que o segurado possa
recuperar a capacidade de trabalho para a mesma ou outra atividade.
No caso em análise, a perícia médica, realizada em 04/02/2021, por especialista em Medicina
Legal e Perícia Médica, apontou que o demandante, nascido em 09/09/1969 (52 anos na data
do exame), apresenta quadro de atraso no desenvolvimento cognitivo provavelmente
decorrente de distúrbio genético, o que o incapacita de forma total e permanente para quaisquer
atividades laborativas.
Fixou a DID e a DII na infância, quando foi percebida a dificuldade de alfabetização na idade
escolar. No entanto, pontuou que houve agravamento da enfermidade.
Transcrevo o seguinte trecho a fim de melhor ilustrar o quadro de saúde do autor:
“(...) Discussão
Periciando com histórico de atraso no desenvolvimento cognitivo e na aquisição de habilidades
comportamentais e sociais sem que a etiologia possa ser definida, mas se trata de filho de pais
consanguíneos, o que é uma causa importante de distúrbios cognitivos. As alterações no
comportamento e, sobretudo na cognição, estão presentes no caso do Autor, que não
conseguiu ser alfabetizado, caracterizando retardo mental (RM). O diagnóstico de RM é definido
com base em três critérios: início do quadro clínico antes de 18 anos de idade; função
intelectual significativamente abaixo da média, demonstrada por um quociente de inteligência
(QI) igual ou menor que 70; e deficiência nas habilidades adaptativas em pelo menos duas das
seguintes áreas: comunicação, autocuidados, habilidades sociais/interpessoais, auto
orientação, rendimento escolar, trabalho, lazer, saúde e segurança. O Autor apresenta
alterações executivas que comprometem o pragmatismo.
A somatória de elementos observados ao exame pericial permitem caracterizar a incapacidade
total e permanente do Autor para as atividades laborais.
Conclusão
Incapacidade total e permanente para as atividades laborais.
(...)
3. Caso a incapacidade decorra de doença, é possível determinar a data de início da doença?
R. Não, mas provavelmente se trata de doença congênita.
4. Constatada a incapacidade, é possível determinar se esta decorreu de agravamento ou
progressão de doença ou lesão?
R. Progressão.
4.1. Caso a resposta seja afirmativa, é possível estimar a data e em que se baseou para fixar a
data do agravamento ou progressão.
R. Sim.
5. É possível determinar a data de início da incapacidade? Informar ao juízo os critérios
utilizados para a fixação desta data, esclarecendo quais exames foram apresentados pelo autor
quando examinado e em quais exames baseou-se para concluir pela incapacidade e as razões
pelas quais agiu assim.
R. Sim, desde a infância, pois se trata de atraso do desenvolvimento cognitivo que já se
manifestou na idade escolar, posto que o Autor não conseguiu ser alfabetizado. O fato de ser
filho de pais consanguíneos permite supor a existência de um distúrbio genético.
(...)” (destaquei)
O laudo pericial apresentado deve ser acolhido.
Com base nos art. 371 e 479 do Código de Processo Civil, o juiz deve indicar às partes as
razões de seu convencimento e deverá indicar os motivos que o levaram a considerar ou deixar
de considerar as conclusões do laudo.
Não se pode negar que o laudo pericial em demandas nas quais se discute a incapacidade para
o trabalho, desde que bem fundamentado e elaborado de forma conclusiva, constitui importante
peça no conjunto probatório.
No caso em julgamento o laudo pericial apresentado merece integral prestígio, eis que
elaborado por técnico de confiança do juízo, profissional equidistante das partes, que não teria
nenhuma razão para atestar que a parte autora está totalmente incapaz para o trabalho, caso
essa circunstância não restasse cristalina no exame.
Conforme extrato do CNIS (evento 10, p. 2), o demandante ingressou no RGPS em 1990, tendo
efetuado contribuições na qualidade de segurado autônomo, contribuinte individual e facultativo.
Após, gozou de auxílio doença de 11/1997 a 02/2000 e de aposentadoria por invalidez de
02/2000 a 06/2019, alternando períodos sem qualquer contribuição recolhida.
Em relação ao agravamento/progressão da doença, consoante a conclusão do laudo pericial,
entendo que a incapacidade total e permanente do autor decorreu do agravamento da doença,
conforme se depreende do laudo pericial.
Com efeito, embora o autor tenha sido diagnosticado com enfermidade congênita desde a
primeira infância, a evolução dos sintomas e o risco de desenvolver atividade laborativa
sofreram evidente progressão ao longo dos anos, inclusive expressamente constatada pelo
perito judicial.
Não obstante, em perícias conduzidas pelo INSS, a própria autarquia ré reconheceu a
existência de patologia incapacitante, posicionando a data de início da incapacidade em
13/11/1997 (evento 10, p. 9), portanto em momento posterior à filiação do demandante ao
RGPS.
Nesse sentido, não há elementos nos autos que nos permitam concluir que a incapacidade do
autor, embora decorrente de enfermidade congênita, ocorreu antes da sua filiação ao RGPS.
Os documentos médicos trazidos aos autos também são relativamente recentes e comprovam
que houve progressão do quadro, revelando evolução do déficit cognitivo e motor (evento 2, p.
14/15).
Assim, verifica-se que, embora a enfermidade acometa o autor desde a infância ou mesmo
desde o nascimento, a incapacidade total e permanente eclodiu quando já havia se filiado ao
RGPS, seja pelo ponto de vista do INSS, seja pela conclusão do perito judicial. Com isso, a
concessão de aposentadoria por invalidez não resvala na vedação do art. 42, § 2º, da LBPS.
No ponto, a sentença restou assim fundamentada:
“(...) No caso dos autos, a parte autora requer a concessão de benefício por incapacidade.
O laudo pericial (anexo 25), feito por perito médico perito judicial, atesta a incapacidade total e
permanentemente desde a infância, tratando-se de doença congênita.
Ainda sobre o laudo pericial - elaborado por médico de confiança deste Juízo – verifico que se
trata de trabalho lógico e coerente, que demonstra que as condições da parte autora foram
adequadamente avaliadas.
Verifico, ainda, que o perito judicial respondeu aos quesitos formulados pelas partes na época
oportuna, não se fazendo necessária, portanto, a submissão da parte autora à nova perícia,
seja na mesma especialidade, seja em outra, nem tampouco qualquer esclarecimento adicional,
por parte do perito judicial.
Em consulta aos dados do Portal CNIS (anexo 10), verifico que a parte autora filiou-se ao
RGPS em 01/10/90, não havendo, portanto, qualidade de segurado, quando do início da
incapacidade, até porque, se dá desde a infância.
De acordo com o laudo pericial, a incapacidade é decorrente de progressão.
O art. 42, § 2º, e o art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/91, preveem a não
concessão do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente ou auxílio por
incapacidade temporária, respectivamente, àquele que se filiar à Previdência Social já portador
da doença ou lesão, excetuando-se a hipótese da incapacidade sobrevier por motivo de
progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
É o caso dos autos.
Tendo em vista que a incapacidade é decorrente de progressão, estamos diante da hipótese de
exceção tratada pela legislação em vigor.
Desta forma, deve ser considerada presente a qualidade de segurado na DII, que se deu na
infância, em virtude do agravamento da incapacidade.
Tratando-se de incapacidade total e permanente, consigno que o benefício cabível na espécie é
a aposentadoria por incapacidade permanente, pelo que passo a analisar os demais requisitos
necessários à concessão.
Cumprido também o período de carência, de acordo com o art. 25, inciso I, da Lei nº
8.213/1991, alterado pelo art. 27-A da Lei nº 13.846/2019, de 04/06/2019.
Assim, tendo em vista que quando da cessação do benefício NB 1171013814, aposentadoria
por incapacidade permanente, em 30/06/2019, o autor ainda se encontrava incapaz, de rigor o
seu restabelecimento.
Conforme se verifica da inicial, é possível constatar que há pedido expresso para que a
aposentadoria por incapacidade permanente NB 1171013814, seja implantada “desde a data de
sua cessação, ou seja, 30/06/2019, ou da data do início da incapacidade fixada pelo médico
perito”, sendo este último pedido impossível de se conceder, visto que a incapacidade foi
constatada desde a infância. (destaquei)
Pois bem.
Desta forma, deverá a aposentadoria por incapacidade permanente NB 1171013814 ser
restabelecida a partir da sua cessação, ou seja, a partir de 30/06/2019, tal como requerido na
inicial, o que, resulta que, em virtude da impossibilidade de cumulação de benefícios, a DIB
deverá ser fixada a partir do dia imediatamente seguinte à cessação, ou seja, em 01/07/2019.
(...)”
Nessa esteira, conclui-se que a sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos, nos
termos do art. 46 da Lei 9.099/1995. Destaco que o Supremo Tribunal Federal, sob a
sistemática da repercussão geral, chancelou essa prática, fixando a seguinte tese:
“Não afronta a exigência constitucional de motivação dos atos decisórios a decisão de Turma
Recursal de Juizados Especiais que, em consonância com a Lei 9.099/1995, adota como
razões de decidir os fundamentos contidos na sentença recorrida” (STF, Plenário Virtual, RE
635.729 RG/SP, rel. min. Dias Toffoli, j. 30/6/2011, DJe 23/8/2011, Tema 451).
Ante todo o exposto, nego provimento ao recurso da parte ré, nos termos da fundamentação
acima.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da
causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré, se recorrente
vencida, ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado
ou for assistida pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de
assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados
ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15.
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. ENFERMIDADE CONGÊNITA E, PORTANTO, ANTERIOR AO INGRESSO DA
PARTE AUTORA NO RGPS. PORÉM, INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE
DECORRENTE DO AGRAVAMENTO DA DOENÇA, CONFORME CONSTATADO NO LAUDO
PERICIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONCEDIDA PELO PRÓPRIO INSS POR
CERCA DE VINTE ANOS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DA PARTE
RÉ DESPROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal de São Paulo decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte ré, nos
termos do voto da Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
