Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0005284-63.2020.4.03.6306
Relator(a)
Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA
Órgão Julgador
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
01/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 06/12/2021
Ementa
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. LAUDOS MÉDICOS COMPROVAM PATOLOGIA INCAPACITANTE.
TRANSTORNO MENTAL ORGÂNICO E EPILEPSIA. HISTÓRICO DE INTERNAÇÃO COM
SEQUELAS COGNITIVAS POR TENTATIVA DE SUICÍDIO. QUADRO COM POUCA
PERSPECTIVA DE REMISSÃO. CURADORIA ESTABELECIDA NA JUSTIÇA ESTADUAL.
DESNECESSIDADE DA ANÁLISE DAS CONDIÇÕES PESSOAIS DA AUTORA.
RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO DOENÇA COM CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DA PARTE RÉ
DESPROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005284-63.2020.4.03.6306
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: ELISANDRA MARIA DA SILVA
REPRESENTANTE: ANGELA CRISTINA MENDES
Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA OCILENE DE ALMEIDA NASCIMENTO - SP269818,
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005284-63.2020.4.03.6306
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ELISANDRA MARIA DA SILVA
REPRESENTANTE: ANGELA CRISTINA MENDES
Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA OCILENE DE ALMEIDA NASCIMENTO - SP269818,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou a presente ação na qual requereu a concessão/restabelecimento de
benefício por incapacidade.
O juízo singular proferiu sentença e julgou procedente o pedido a fim de restabelecer o auxílio
doença e convertê-lo em aposentadoria por invalidez em benefício da autora.
Inconformada, a autarquia ré interpôs o presente recurso. Pleiteia, em síntese, a ampla reforma
da sentença.
Em contrarrazões, a demandante pugnou pela manutenção do decidido.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005284-63.2020.4.03.6306
RELATOR:45º Juiz Federal da 15ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: ELISANDRA MARIA DA SILVA
REPRESENTANTE: ANGELA CRISTINA MENDES
Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA OCILENE DE ALMEIDA NASCIMENTO - SP269818,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Passo à análise do recurso.
A concessão do benefício previdenciário auxílio-doença exige, nos termos da legislação
específica (Lei 8.213/1991, art. 59 e ss.), a presença dos seguintes requisitos: (i) incapacidade
laborativa temporária superior a 15 (quinze) dias; (ii) prova da condição de segurado e sua
manutenção à época do início da incapacidade; (iii) que a doença incapacitante não seja
preexistente à filiação do segurado ao RGPS, exceto nos casos de progressão e agravamento;
e (iv) carência de 12 contribuições mensais (à exceção de algumas hipóteses).
Já para a concessão da aposentadoria por invalidez se exige, além dos referidos requisitos
previstos para a concessão de auxílio-doença, que a incapacidade seja total e permanente,
insuscetível de reabilitação do segurado para atividade diversa que lhe garanta a sobrevivência,
nos termos do que dispõem os art. 42 e ss. da Lei 8.213/1991.
Incapacidade total indica que o segurado não tem condições de exercer qualquer atividade
laboral; incapacidade permanente denota que não há prognóstico de que o segurado possa
recuperar a capacidade de trabalho para a mesma ou outra atividade.
No caso em análise, a perícia médica, realizada em 28/10/2020, por especialista em Psiquiatria,
apontou que a demandante, nascida em 30/01/1995 (25 anos na data do exame), apresenta
quadro de transtorno mental orgânico e epilepsia, o que lhe acarreta incapacidade total e
permanente para a realização de suas atividades habituais. Fixou a data de início da
incapacidade em 28/03/2017, definida pela internação hospitalar. Transcrevo os trechos
pertinentes do laudo pericial:
“(...) Os documentos dos autos mostram que em 28/03/2017 houve intoxicação por ingesta de
medicação em excesso, levando a parada cardiorrespiratória por 8 minutos e a sequelas devido
à anóxia. OS exames de tomografia feitos à época mostraram lesões cerebrais em
consequência do ocorrido. Ficou internada até 08/06/2017. O ocorrido levou também a quadro
de epilepsia. Em 17/06/2019 vinha em tratamento na rede pública, em uso de Sertralina 100mg
+ Ácido Valpróico 500mg + Fenitoína 200mg + Clonazepam 2mg. Em 03/07/2020 a médica
neurologista da rede pública informa estabilização da epilepsia, porém manutenção de déficits
cognitivos. A médica informa pedido de tomografia, ainda não realizada.
Em perícia, a curador informa que a Autora mantém uso de Ácido Valpróico 500mg + Fenitoína
100mg + Clonazepam 2mg + Sertralina 50mg. Quanto ao quadro de saúde atual diz que lava
louça e realiza outras tarefas simples. Diz que tem déficits locomotores que a atrapalham em
muito na realização das tarefas.
(...)
VI. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
Após anamnese psiquiátrica, exame psíquico realizado em perícia e documentos médicos
disponíveis, concluo que o Autor da ação apresenta quadro de transtorno mental orgânico e
epilepsia. A DID foi definida como sendo 28/03/2017 (definida pela internação hospitalar),
mesma data da DII atual.
(...)
O quadro do Autor da ação, segundo a documentação disponível, respondeu apenas
parcialmente ao tratamento proposto, mantendo sintomas residuais significativos. Ao exame
psíquico atual apresentava bom estado geral, vestida adequadamente, com déficits de funções
cognitivas, humor lábil, empobrecimento do pensamento e alterações em aparelho locomotor,
consistentes com o quadro neurológico apresentado. Tem compreensão diminuída sobre o
conteúdo dos assuntos discutidos, e sobre o motivo de sua presença para este exame.
Portanto, do ponto de vista psíquico, existe uma incapacidade total e permanente para o
trabalho.
(...)”
Pois bem.
Com base nos art. 371 e 479 do Código de Processo Civil, o juiz deve indicar às partes as
razões de seu convencimento e deverá indicar os motivos que o levaram a considerar ou deixar
de considerar as conclusões do laudo.
Não se pode negar que o laudo pericial em demandas nas quais se discute a incapacidade para
o trabalho, desde que bem fundamentado e elaborado de forma conclusiva, constitui importante
peça no conjunto probatório.
No caso em julgamento o laudo pericial apresentado merece integral prestígio, eis que
elaborado por técnico de confiança do juízo, profissional equidistante das partes, que não teria
nenhuma razão para atestar que a parte autora está totalmente incapaz para o trabalho, caso
essa circunstância não restasse cristalina no exame.
Ademais, é preciso ter em mente a diferença entre doença e incapacidade, pois a existência de
doença não acarreta, obrigatoriamente, a incapacidade para o trabalho.
A incapacidade fica caracterizada quando além da doença o indivíduo apresenta limitações
funcionais que o impedem de desenvolver a atividade para a qual está qualificado.
Apenas quando a doença impede o desempenho da atividade profissional teremos a
caracterização da incapacidade.
No ponto, assim restou fundamentada a sentença:
“(...) No caso dos autos, realizada perícia médica judicial para verificação da capacidade
laborativa, o jurisperito concluiu que a parte autora apresenta quadro de transtorno mental
orgânico e epilepsia, caracterizando incapacidade total e permanente. Fixou a DII em
28/03/2017.
Em resposta ao quesito 15, o Jurisperito afirma que a autora não possui capacidade para os
atos da civil.
Verifico que a autora está devidamente representada por sua curadora, Angela Cristina Mendes
(arquivo 17).
O INSS requer o retorno dos autos ao Jurisperito, para que se manifeste acerca da
possibilidade de reabilitação da autora.
Indefiro o pedido formulado pelo INSS, uma vez que o perito judicial já afirmou que não há
possibilidade de reabilitação (quesito 10 do laudo pericial).
Presente o requisito da incapacidade, é necessária ainda a comprovação da qualidade de
segurado e o cumprimento de carência, uma vez que, tratando-se de benefício de previdência
social, sua concessão está condicionada à filiação e contribuição para o sistema.
Neste ponto, a pesquisa ao sistema CNIS (arquivo 08), demonstra que a parte autora possuía
qualidade de segurada no momento do início de sua incapacidade, pois recebeu benefícios de
auxílio-doença (NB 618.220.834-5) no período de 14/04/2017 a 10/04/2019.
Outrossim, observo o cumprimento de carência, já que possui mais de doze contribuições
vertidas para o sistema previdenciário.
Diante do quadro probatório, está demonstrado que a parte autora faz jus ao restabelecimento
do benefício de auxílio-doença (NB 618.220.834-5) a partir de 11/04/2019 (dia seguinte à data
da cessação indevida) e conversão em aposentadoria por invalidez (atual benefício por
incapacidade permanente).
(...)”
Em relação ao ponto levantado no pleito recursal, o perito também foi categórico ao afirmar que
a autora apresenta incapacidade multiprofissional de forma total e permanente.
Não obstante, consta dos autos processo de interdição conduzido perante a Justiça Estadual,
por meio do qual houve a concessão de curatela da demandante diante de laudo pericial que
também constatou a incapacidade da demandante (evento 2, p. 3 e evento 42).
Os documentos médicos carreados aos autos, bem como as considerações do perito judicial,
demonstram que não há perspectiva de recuperação da capacidade laborativa a curto e médio
prazo. Pelo contrário, mesmo sob uma perspectiva leiga, apontam para cronificação do quadro,
desde o agravamento dos sintomas e o surgimento de lesões cerebrais após a internação
hospitalar por ingestão abusiva de medicamentos ocorrida em 2017.
Por derradeiro, infere-se do laudo pericial que a possibilidade de eventual melhora e remissão
dos sintomas dependem de uma série de fatores hipotéticos que, por ora, não são observados
no caso concreto.
Diante desse cenário, não vislumbro também por ora a possibilidade de reabilitação
profissional.
Caracterizada a incapacidade total e permanente, desnecessária se faz a análise das condições
pessoais e sociais da segurada.
Preenchidos este e os demais requisitos legais – que não foram objeto de recurso –, correto o
restabelecimento do auxílio doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez desde a
DER.
Nessa esteira, conclui-se que a sentença deve ser mantida por seus próprios fundamentos, nos
termos do art. 46 da Lei 9.099/1995. Destaco que o Supremo Tribunal Federal, sob a
sistemática da repercussão geral, chancelou essa prática, fixando a seguinte tese:
“Não afronta a exigência constitucional de motivação dos atos decisórios a decisão de Turma
Recursal de Juizados Especiais que, em consonância com a Lei 9.099/1995, adota como
razões de decidir os fundamentos contidos na sentença recorrida” (STF, Plenário Virtual, RE
635.729 RG/SP, rel. min. Dias Toffoli, j. 30/6/2011, DJe 23/8/2011, Tema 451).
Ante todo o exposto, nego provimento ao recurso da parte ré, nos termos da fundamentação
acima.
Fixo os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (ou da
causa, na ausência daquela), devidos pela parte recorrente vencida. A parte ré, se recorrente
vencida, ficará dispensada desse pagamento se a parte autora não for assistida por advogado
ou for assistida pela DPU (Súmula 421 STJ). Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de
assistência judiciária gratuita e recorrente vencida, o pagamento dos valores mencionados
ficará suspenso nos termos do § 3º do art. 98 do CPC – Lei nº 13.105/15.
Dispensada a elaboração de ementa na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO POSITIVO. INCAPACIDADE TOTAL E
PERMANENTE. LAUDOS MÉDICOS COMPROVAM PATOLOGIA INCAPACITANTE.
TRANSTORNO MENTAL ORGÂNICO E EPILEPSIA. HISTÓRICO DE INTERNAÇÃO COM
SEQUELAS COGNITIVAS POR TENTATIVA DE SUICÍDIO. QUADRO COM POUCA
PERSPECTIVA DE REMISSÃO. CURADORIA ESTABELECIDA NA JUSTIÇA ESTADUAL.
DESNECESSIDADE DA ANÁLISE DAS CONDIÇÕES PESSOAIS DA AUTORA.
RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO DOENÇA COM CONVERSÃO EM APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DA PARTE RÉ
DESPROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quinta Turma
Recursal de São Paulo decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte ré, nos
termos do voto da Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA