
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5076429-68.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: JOSE GOMES CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: VANESSA CRISTINA MARTINS FRANCO - SP164298-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5076429-68.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: JOSE GOMES CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: VANESSA CRISTINA MARTINS FRANCO - SP164298-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ajuizada em 08/01/2014, que tem por objeto a concessão de aposentadoria por invalidez ou o restabelecimento de auxílio-doença, desde a primeira alta administrativa (1º/08/2012).
O feito foi sentenciado em 12/01/2023. O pedido foi julgado parcialmente procedente. Deferiu-se ao autor auxílio-doença a partir do requerimento administrativo posterior à incapacidade apurada (30/09/2020), ressalvado o período de 25/11/2020 a 04/01/2021, ao longo do qual já havia recebido benefício de igual natureza. Determinou o julgado que sobre as parcelas vencidas incidisse correção monetária pelo IPCA-E e e juros de mora na forma da Lei nº 11.960/09. Os honorários advocatícios sucumbenciais foram arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do STJ. A sentença foi submetida a reexame necessário.
O autor interpôs apelação. Em suas razões, apontando a nulidade da sentença, sustenta a necessidade de realização de nova perícia médica, por entender insuficiente o laudo produzido. No mérito, pugna pela reforma do julgado, a fim de obter aposentadoria por invalidez, por estar acometido de patologia incapacitante de longa data e sem perspectiva de cura.
Sem contrarrazões, os autos subiram ao E. TJSP.
A aludida Corte determinou a remessa dos autos a este Tribunal, por tratar-se de matéria previdenciária.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5076429-68.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: JOSE GOMES CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: VANESSA CRISTINA MARTINS FRANCO - SP164298-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A hipótese não engendra reexame necessário.
O artigo 496, § 3º, I, do Código Processo Civil afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico perseguido for inferior a 1.000 (um mil) salários mínimos. Comparece, no caso, a certeza matemática de que a condenação a alcançar não será superior ao limite legal estabelecido, daí por que aqui não se aplica o teor da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Isso considerado, analisam-se as questões de mérito trazidas a julgamento.
Analiso, de saída, o propalado cerceamento de defesa.
O autor queixa-se da perícia realizada, para ele insuficiente, diante do agravamento de seu estado de saúde em razão da patologia psiquiátrica de que é portador.
Todavia, os laudos confeccionados no bojo destes autos oferecem informações suficientes, esclarecendo cabalmente a matéria investigada, daí por que não merecem sanção de nulidade.
Percebo que o autor, nascido em 30/10/1958 (ID 282368552), esteve em gozo de auxílio-doença previdenciário nos períodos compreendidos entre 18/05/2012 e 31/07/2012 e de 18/04/2013 a 25/04/2013 (ID 282369561).
À cata de restabelecimento de benefício por incapacidade, ajuizou a presente ação em 08/01/2014.
Em suas dobras, observado o devido processo legal, perícia médico-judicial foi elaborada em 06/05/2015 (ID 282369594).
Os achados revelam que o autor – motorista, com escolaridade correspondente à 5ª série do ensino fundamental – padece de síndrome depressiva em tratamento regular e fratura consolidada no tornozelo esquerdo.
O senhor Perito deixou consignado que o autor “faz uso atualmente de medicamentos neurolépticos que promovem sonolência e diminuição dos reflexos” (ID 282369594 – Pág. 4).
Arrematou seu trabalho concluindo que o autor está parcial e temporariamente incapacitado para as atividades laborativas, “sendo passível de reabilitação profissional para atividades que não exijam a manipulação de máquinas ou ferramentas, condução de veículos, trabalho em alturas ou reflexos apurados” (ID 282369594 – Pág. 4).
Em complementação ao laudo, o senhor Perito ratificou a conclusão que exteriorizara, no sentido de existir incapacidade parcial e temporária em razão da patologia psiquiátrica encontrada (ID 282369624).
O autor impugnou as conclusões do trabalho pericial.
Após pesquisas e diligências, démarches que longo tempo demandaram, nova perícia foi determinada.
O ato foi realizado em 05/04/2022 (ID 282369805).
Nele se levantou que o autor – operador, vendedor e motorista – enfrenta episódios depressivos com sintomas psicóticos e outros transtornos mentais relacionados a lesão e disfunção cerebral.
Expôs o senhor Perito: “De acordo com as informações obtidas na documentação médica anexada aos autos do processo, conclui-se que o periciando evoluiu com transtorno psíquico após infecção por COVID-19 ocorrida em agosto de 2020 quando permaneceu internado para tratamento definido como esquizofrenia, demandando seguimento psiquiátrico regular e uso de diversas medicações antipsicótica, benzodiazepínica e moduladora do humor. Anteriormente, o autor refere quadro de gonartralgia bilateral sem tratamento especializado que se intensificou após o processo infeccioso respiratório em associação aos sintomas mentais. Ao exame psíquico atual, o periciando apresenta desorientação temporoespacial, déficit de memórias de fixação e de evocação, prejuízo cognitivo e do pensamento e perda do pragmatismo, revelando atividade da doença mental” (ID 282369788 – Pág. 6).
Do que concluiu: “Dessa maneira, fica definida uma incapacidade laborativa total e temporária constatada ao exame médico pericial, devendo o periciando ser reavaliado em aproximadamente 6 meses” (ID 282369788 – Pág. 6).
Mas concitado, em complementação ao laudo, o senhor Louvado esclareceu: “Analisando-se as folhas apontadas na presente impugnação que trazem documentos médicos aos autos, depreende-se que o periciando manteve seguimento médico especializado com psiquiatra e realizou tratamento medicamentoso de maneira irregular ao longo dos anos. Constata-se que o autor passou a apresentar sintomas depressivos em outubro de 2010, porém com acompanhamento psiquiátrico a partir de abril de 2013. Os relatórios médicos se sucedem até novembro de 2014 relatando um quadro psicopatológico exuberante com sintomatologia psicótica compatível com uma incapacidade laborativa total e temporária. Posteriormente, há um lapso de tempo no seguimento médico, retomado em setembro de 2016 quando o periciando novamente apresenta sintomas exuberantes da doença mental, que se mantém até setembro de 2017, inferindo novo período de incapacidade laborativa total e temporária. Em março de 2018 consta uma consulta pontual que também descreve um quadro psicopatológico importante e depois de setembro de 2020 grande comprometimento das funções mentais superiores, que se mantém sem avaliações subsequentes e que chega ao momento da realização da perícia médica".
Culminam-se assim suas conclusões: "Portanto, a incapacidade laborativa total e temporária apontada no laudo médico pericial se iniciou em setembro de 2020 e ressalta-se que seu prognóstico é desfavorável devido à evolução crônica da doença mental, com pequena possibilidade de melhora” (ID 282369805 – Págs. 2/3).
Coadunando com as considerações técnicas lançadas no último trabalho pericial elaborado, o autor trouxe a lume prontuários e atestados médicos, emitidos em 2013, 2014, 2017, 2018 e 2020, por especialista em Psiquiatria, atestando sofrer de “quadro psicopatológico de déficit cognitivo com prejuízo da atenção e memória; isolamento social; apatia; prejuízo do pragmatismo e alucinações auditivas”, de difícil controle, sem previsão de alta e com indicação de aposentadoria (sugestão que se reporta a 2014) (ID's 282369553, 282369580, 282369593 – Pág. 2, 282369609, 282369719, 282369755 e 282369757).
Nos extratos do INSS, observo que a concessão dos auxílios-doença mencionados deu-se em razão de o autor ter sido assaltado por episódios depressivos (CID F32) (ID 282369561 – Pág. 17).
Em consulta atualizada ao Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, verifico que o autor, após o ajuizamento da ação, tornou a receber auxílio-doença previdenciário entre 30/09/2020 e 17/08/2023, em dois períodos. Desfruta de aposentadoria por idade desde 30/10/2023.
Dispõe o art. 479 do CPC que “O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”.
De acordo com o dispositivo legal posto em tela, as conclusões do laudo pericial não vinculam necessariamente o juiz, se este localizar nos autos outros elementos que o persuadam a desconsiderá-las.
Como visto, o autor completou 65 (sessenta e cinco) anos de idade. Vem doente por mais de dez anos, segundo exuberante prova que aportou nos autos. Não se recuperou. Sua moléstia, bem ao contrário, vem-se agravando. Sua última atividade de motorista, ficou desde a primeira perícia estabelecido, não a pode mais desempenhar.
A essa altura não passaria de quimera supor que o autor, afastado do trabalho desde 2012, em razão de mal psiquiátrico, possa recuperar-se ou mesmo reabilitar-se para diferente atividade profissional. A incapacidade diagnosticada deve ser reputada omniprofissional e permanente.
Dessa maneira, deve ser deferida ao autor aposentadoria por invalidez, como pede, a partir de 30/09/2020, no lugar do auxílio-doença que lhe foi concedido.
Ajusto e esclareço os acréscimos legais que comporão a condenação.
Ao autor serão pagas, de uma única vez, as prestações vencidas desde a data de início do benefício fixada neste julgado, descontando-se o período em que tenha comprovadamente recebido benefício inacumulável, acrescidas de correção monetária, calculada na forma da Lei nº 6.899/81 e legislação superveniente, aplicadas as diretrizes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Juros de mora serão devidos a partir da citação, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002 e, a partir de então, à razão de 1% (um por cento) ao mês (artigo 406 do Código Civil). Desde de julho de 2009, incide a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE nº 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE nº 579.431.
A contar o mês de promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
Mantenho a condenação do INSS na verba honorária sucumbência arbitrada, insuscetível de redistribuição (porque não foi proporcionalizada) ou majoração, à míngua de provocação recursal. Outrossim, não se aplica o artigo 85, § 11, do CPC, em caso de provimento total ou parcial do recurso (Tema 1.059/STJ).
Ante o exposto, não conheço da remessa oficial, rejeito a matéria preliminar recursal e, no mérito, dou provimento à apelação do autor, para lhe conceder aposentadoria por invalidez desde 30/09/2020, esclarecendo os acréscimos legais, na forma da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
- O artigo 496, § 3º, I, do Código Processo Civil afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico perseguido for inferior a 1.000 (um mil) salários mínimos. Comparece, no caso, a certeza matemática de que a condenação que se objetiva não será superior ao limite legal estabelecido, daí por que aqui não se aplica o teor da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.
- O autor queixa-se da perícia realizada, considerada insuficiente, diante do agravamento de seu estado de saúde, em razão de patologias psiquiátricas das quais é portador.
- Prova pericial a qual, complexamente considerada, oferece informações técnicas suficientes ao deslinde do feito. Nulidade que não se proclama.
- O juiz não está adstrito às conclusões periciais, podendo fazer uso, não só delas, mas também das demais informações coligidas ao feito.
- Aposentadoria por invalidez que se defere ao autor, desde 30/09/2020.
- Acréscimos legais esclarecidos.
- Verba honorária sucumbencial mantida.
- Reexame necessário não conhecido. Matéria preliminar recursal rechaçada. Apelação do autor provida.
