Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000386-83.2021.4.03.6334
Relator(a)
Juiz Federal DAVID ROCHA LIMA DE MAGALHAES E SILVA
Órgão Julgador
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
03/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 10/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
LAUDO PERICIAL DESFAVORÁVEL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE PARA A ATIVIDADE
HABITUAL. MANUTENÇÃO DO JULGAMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 46 DA LEI Nº
9.099/95, COMBINADO COM A LEI Nº 10.259/2001. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO
DA PARTE AUTORA.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000386-83.2021.4.03.6334
RELATOR:9º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: MARIA APARECIDA GUEDES SANTANA
Advogados do(a) RECORRENTE: JULIO CESAR ALPHONSE - SP325620-N, SILVIA REGINA
ALPHONSE - SP131044-N
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
Relatório dispensado nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000386-83.2021.4.03.6334
RELATOR:9º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: MARIA APARECIDA GUEDES SANTANA
Advogados do(a) RECORRENTE: JULIO CESAR ALPHONSE - SP325620-N, SILVIA REGINA
ALPHONSE - SP131044-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
VOTO - EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
LAUDO PERICIAL DESFAVORÁVEL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE PARA A ATIVIDADE
HABITUAL. MANUTENÇÃO DO JULGAMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 46 DA LEI Nº
9.099/95, COMBINADO COM A LEI Nº 10.259/2001. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO
DA PARTE AUTORA.
1. Ação proposta para obtenção/restabelecimento de benefício por incapacidade (aposentadoria
por invalidez ou auxílio-doença) cujo pedido fora julgado improcedente por ausência de
requisito indispensável, qual seja, a incapacidade para a atividade habitual. Recurso da parte
autora no qual alega, em síntese, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, devendo
o feito ser convertido em diligência para a complementação do laudo pericial, com as respostas
do nobre perito dos quesitos suplementares/elucidativos. No mérito, sustenta que os requisitos
necessários para a concessão do benefício pleiteado foram devidamente comprovados nos
autos.
2. Não assiste razão à parte recorrente.
3. Inicialmente, afasto a alegação de nulidade por cerceamento de defesa, pois foram
observados nos autos os princípios da ampla defesa e do contraditório, em conformidade com o
que dispõe a Lei n. 10.259, de 12 de julho de 2001. Importante mencionar que a perícia foi
realizada por perito de confiança do juízo cujas conclusões estão embasadas nos documentos
médicos constantes dos autos e principalmente no exame clínico direto. Desnecessária a
realização de novas perícias na medida em que inexistem contradições entre as informações
constantes do laudo que indiquem imprecisão na colheita da prova.
4. No essencial a r. sentença recorrida está assim fundamentada:
(...) No caso dos autos, não se verifica a ocorrência do requisito indispensável da incapacidade
laborativa da parte autora.O laudo pericial oficial apresentado pelo médico Perito de confiança
deste Juízo informa, de maneira analítica e segura, após análise particularizada e presencial
das condições clínicas da parte autora, que ela não está incapacitada para o exercício de
atividade profissional remunerada. Em perícia realizada em 05/07/2021 (ID nº 62288375), a Sra.
Perita Médica nomeada pelo Juízo esclareceu que a autora, aos 54 anos de idade, referiu, em
entrevista pericial, que:
“...teve acidente em fevereiro de 2019 – estava atrás do carro próximo ao bagageiro e moto a
atropelou. Relata que evoluiu com infecção local da perna E e osteomielite sendo submetida a
amputação de terço médio da perna E. Atualmente refere dores articulares em quadris e joelho
D, que dificultam sua deambulação. Paciente consegue deambular pois usa prótese em perna
E. Refere que também apresenta epilepsia + depressão e está em uso de divalpropato de sódio
800mg/d + clonazepam + sertralina 100 mg/d + amitriptilina 50 mg/d”.
Ao exame físico pericial, observou a Experta: “bom estado geral, corado, hidratado, anictérico,
acianótico, deambula normalmente. Sem sinais neurológicos grosseiros, sem alterações de
importância médico legal. Amputação de terço médio da perna E”. Concluiu a Experta que:
“Periciando avaliado com quadro compatível de amputação de terço médio da perna esquerda
após trauma. Está em uso de prótese, deambula sem dificuldade, do lar e realiza as próprias
tarefas diárias. Sendo assim, não reúne condições que a incapacitem para suas atividades
habituais. À luz da regra processual da persuasão racional, não está o julgador submetido à
conclusão do laudo médico do Perito do Juízo. Poderá dele divergir sempre que outros
documentos médicos pautem juízo contrário ao quanto restou consignado na perícia. Porém, os
documentos médicos particulares apresentados, porque não atestam de forma peremptória a
incapacidade laboral da parte autora, não são suficientes a ilidir a conclusão da perícia médica
oficial.
Tal conclusão não pode ser afastada pela alegação de que a parte autora se submete a
tratamento médico. O fato de continuar com o tratamento médico não significa que esteja
incapaz para o trabalho. Auxílio-doença não tem como fato gerador a doença, mas sim a
incapacidade. Quanto à discordância entre os médicos, verifico que existe natural tendência de
que o médico que cuida do paciente recomendar o seu afastamento do trabalho, pensando
numa melhora mais rápida e efetiva. Enfim, o perito do Juízo é capaz de analisar o caso com
maior neutralidade, e examinado a parte autora não viu gravidade incapacitante da doença no
caso em apreço.
A perícia médica não precisa ser, necessariamente, realizada por “médico especialista”, já que,
para o diagnóstico de incapacidade laboral ou realização de perícias médicas não é exigível,
em regra, a especialização do profissional da medicina, sendo descabida a nomeação de
médico especialista para cada sintoma descrito pela parte, exceto se a moléstia narrada for
demasiadamente específica e comportar peculiaridades imperceptíveis à qualquer outro
profissional médico. Em tais oportunidades, por certo o próprio perito judicial - médico de
confiança do Juízo - suscitaria tal circunstância, sugerindo Parecer de profissional
especializado, nos termos do art. 468, I, do CPC.
Desse modo, tenho como confiáveis as conclusões da perícia judicial; e suficientes para pautar
o julgamento de improcedência da pretensão, sem a necessidade de complementação do laudo
e/ou nomeação de novo médico perito.
Além disso, é importante observar o histórico contributivo da autora (CNIS ID nº 62288352):
ingressou no RGPS em 15/05/1986; afastou-se do sistema em 11/04/1992; refiliou-se em
01/05/2010, na qualidade de contribuinte individual, e assim permaneceu apenas até
31/12/2010; em seguida, em 14/01/2011, teve deferido em seu favor o auxílio salário
maternidade até 13/05/2011; efetuou o pagamento das contribuições de maio e junho/2011 e,
após anos sem efetuar nenhuma contribuição previdenciária, retornou ao RGPS em 08/10/2019
(pagamento da competência 09/2019), na qualidade de contribuinte individual. Vejamos o CNIS:
(...) Em casos como o presente, compete à parte autora o ônus de comprovar que reingressou
no RGPS capaz de desempenhar atividade profissional e que a doença e seu eventual
agravamento foram posteriores à filiação e ao cumprimento do período de carência, quando
exigível, por meio de exames, relatórios e prontuários médicos, a teor do que dispõe o artigo
373, inciso I, do Código de processo Civil, pois cuida-se, certamente, de fato constitutivo do
direito que alega ter. A prova de tal condição não é diabólica e a parte autora poderia tê-la
produzido.
A mera apresentação e atestado, exame ou qualquer documento médico posterior à filiação e
ao período de carência não tem o condão de afastar a conclusão de que a doença é
preexistente, tendo em vista a possibilidade de a parte selecionar os documentos que deseja
apresentar ao perito e juntar aos autos.
Apesar afirmar que sofreu acidente de trânsito que culminou com a amputação do terço médio
da perna E (vide entrevista pericial), além de ser portadora de outras doenças ortopédicas (em
joelhos, quadril e coluna – vide petição inicial) e, ainda, doenças de cunho psiquiátrico
(transtorno misto ansioso e depressivo), a autora não trouxe aos autos seu prontuário médico
completo, desde o primeiro atendimento, visando comprovar quando as doenças tiveram início
e se têm ou não relação com o acidente ocorrido.
Os documentos juntados (a maioria datados de 2021, apenas uma declaração médica de
11/2020, conforme ff. 32, ID nº 62286749) fazem prova de que a autora está em tratamento. A
autora não trouxe o boletim de ocorrência comprobatório do acidente (ocorrido em 02/2019),
nem mesmo juntou aos autos as principais peças dos processos identificados no ID nº
62288354, especialmente aqueles promovidos em face da Seguradora Líder do Consórcio do
Seguro DPVAT S/A (nº 1002480-80.2019.8.26.0417) e aquele promovido em face de Anderson
Jose Oliveira de Souza, com assunto “Acidente de Trânsito”, que poderia eventualmente conter
o laudo pericial médico lá realizado. Ora, o sistema previdenciário pressupõe mutualidade, com
o recolhimento de contribuições pelo tempo mínimo da carência exigida para cada benefício,
previamente à ocorrência dos riscos sociais dos quais o seguro social protege seus segurados.
Se assim não fosse, o segurado passaria a verter contribuições apenas se, e quando,
necessitasse do benefício, de modo a subverter a concepção securitária do sistema. Ainda que
a doença incapacitante alegada seja progressiva, a Lei n.º 8.213/91 somente assegura a
progressão da doença quando ela é combinada com características próprias da atividade
exercida, a exemplo daquele que possui doença em ambos os ombros e, no entanto, exerce a
profissão de lenhador por período suficiente a conduzir ao agravamento dela e,
consequentemente, à incapacidade.
Tanto é assim que o parágrafo 2º do artigo 42 da mencionada lei estabelece que “a doença ou
lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social não
lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez”, vertente na qual é seguida pelo parágrafo
único do artigo 59.
A interpretação equivocada da parte final do § 2º do artigo 42 da Lei nº 8.213/91 (...) salvo
quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença)
pode conduzir a situação injusta e ensejadora de fraudes, pois, se o agravamento apreciado
não for ocasionado pelo exercício de atividade laboral, então toda e qualquer doença por si
mesmo progressiva já daria direito ao recebimento de Aposentadoria por Invalidez ou Auxílio-
Doença, independentemente de ter a doença se originado antes ou depois do ingresso do
doente no Regime Geral de Previdência Social.
Em suma, a lei permite que o indivíduo filie-se a qualquer momento ao Regime Geral da
Previdência Social, estabelecendo, somente, requisitos positivos como carência, tempo de
contribuição, idade, qualidade de segurado, entre outros, e requisitos negativos, como, por
exemplo, inexistência de preexistência da enfermidade incapacitante no caso de auxílio-doença
e aposentadoria por invalidez, sendo que neste último caso ressalva expressamente a
possibilidade de se conceder a proteção caso a incapacidade decorra de agravamento da
doença preexistente.
Portanto, não sendo constatada incapacidade para o exercício da atividade habitualmente
desenvolvida pela parte autora, e, diante da preexistência da doença, a improcedência do
pedido é medida que se impõe.
Os demais argumentos aventados pelas partes e porventura não abordados de forma expressa
na presente sentença deixaram de ser objeto de apreciação por não influenciarem diretamente
na resolução da demanda, a teor do quanto disposto no Enunciado nº. 10 da ENFAM (“A
fundamentação sucinta não se confunde com a ausência de fundamentação e não acarreta a
nulidade da decisão se forem enfrentadas todas as questões cuja resolução, em tese, influencie
a decisão da causa”). (...) (d.n)
5. Entendo que a r. sentença atacada enfrentou bem as questões postas, motivando e
fundamentando as suas razões de decidir, razão pela qual merece ser mantida, a teor do
disposto no artigo 46, da Lei nº 9.099/95. O magistrado a quo avaliou bem as afirmações e
documentos contidos nos autos, fazendo correto juízo de valor sobre o conjunto fático-
probatório.
6. Observo que os artigos 46 e 82, § 5°, da Lei 9.099/95, facultam à Turma Recursal dos
Juizados Especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença.
7. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Habeas Corpus n° 86.553-0, reconheceu que
este procedimento não afronta o artigo 93, IX, da Constituição Federal. Veja-se a transcrição do
v. Acórdão:
“O § 5° do artigo 82 da Lei n° 9.099/95 dispõe que ‘se a sentença for confirmada pelos próprios
fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão’. O preceito legal prevê a
possibilidade de o órgão revisor adotar como razão de decidir os fundamentos do ato
impugnado, o que não implica violação do artigo 93, IX da Constituição do Brasil.
É fora de dúvida que o acórdão da apelação, ao reportar-se aos fundamentos do ato
impugnado, não é carente de fundamentação, como sustentado pela impetrante” (HC n° 86553-
0/SP, rel. Min. Eros Grau, DJ de 02.12.2005).
8. Não obstante o prequestionamento de matérias que possam ensejar a interposição de
recurso especial ou extraordinário, com base nas súmulas 282 e 356, do Supremo Tribunal
Federal, as razões do convencimento do Juiz sobre determinado assunto são subjetivas,
singulares e não estão condicionadas aos fundamentos formulados pelas partes.
9. Ante o exposto, nego provimento ao recurso interposto pela parte autora e mantenho
integralmente a sentença recorrida.
10. Deixo de condenar a parte recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios
segundo prevê o artigo 55 da Lei 9.099/1995 c/c artigo 1º da Lei 10.259/2001 e do artigo 1.046,
§ 2º do Código de Processo Civil/2015, na medida em que, não tendo sido apresentadas
contrarrazões de recurso pelo patrono da parte recorrida, inexiste embasamento de ordem
fática para a aplicação do artigo 85, caput e seu § 1º, em virtude do que dispõe o § 2º do
mesmo artigo do Novo CPC.
É como voto.
São Paulo, 02 de fevereiro de 2022 (data do julgamento).
JUIZ FEDERAL RELATOR
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
LAUDO PERICIAL DESFAVORÁVEL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE PARA A ATIVIDADE
HABITUAL. MANUTENÇÃO DO JULGAMENTO. INTELIGÊNCIA DO ART. 46 DA LEI Nº
9.099/95, COMBINADO COM A LEI Nº 10.259/2001. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO
DA PARTE AUTORA. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso da parte autora., nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
