Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000452-34.2019.4.03.6334
Relator(a)
Juiz Federal JOAO CARLOS CABRELON DE OLIVEIRA
Órgão Julgador
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
15/10/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 25/10/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
RECURSO DA PARTE AUTORA. Restabelecimento de benefício por incapacidade concedido
judicialmente. Cessação pelo INSS. Complementação ao laudo pericial realizado sem a presença
da parte autora, como anteriormente exigido, e que tampouco fundamenta a conclusão quanto a
sua capacidade laboral. Nulidade do laudo declarada. Necessidade de reabertura da instrução
processual, com nomeação de novo perito médico. Sentença anulada. Recurso da parte autora a
que se dá provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000452-34.2019.4.03.6334
RELATOR:38º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: EMILTON SILVA CIDADE
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANO GIROTO DA SILVA - SP200060-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000452-34.2019.4.03.6334
RELATOR:38º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: EMILTON SILVA CIDADE
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANO GIROTO DA SILVA - SP200060-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte autora na qual pretende a reforma de sentença que
julgou improcedente seu pedido de restabelecimento de benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez, sob o fundamento da inexistência de incapacidade para o exercício
de atividade laboral.
Em suas razões recursais a parte autora, preliminarmente, impugna o laudo pericial, afirmando
que contrariou a prova documental trazida aos autos, tendo, inclusive, realizado laudo
complementar sem a presença física do autor, o que importa em sua nulidade, requerendo,
assim, a realização de nova perícia judicial. No mérito, afirma permanecer seu estado de
incapacidade, outrora declarado em sede judicial, razão pela qual faz jus ao restabelecimento
do benefício de aposentadoria por invalidez. Requer, nesses termos, o provimento do recurso.
Intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000452-34.2019.4.03.6334
RELATOR:38º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: EMILTON SILVA CIDADE
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANO GIROTO DA SILVA - SP200060-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A controvérsia inicial estabelecida nesta fase recursal diz respeito à deficiência do laudo
pericial, em especial de sua complementação, a partir da qual não se constatou a incapacidade
laboral da parte autora.
O Código de Processo Civil (CPC), em seu art. 473, dispõe sobre o conteúdo do laudo pericial,
nos seguintes termos:
“Art. 473. O laudo pericial deverá conter:
I - a exposição do objeto da perícia;
II - a análise técnica ou científica realizada pelo perito;
III - a indicação do método utilizado, esclarecendo-o e demonstrando ser predominantemente
aceito pelos especialistas da área do conhecimento da qual se originou;
IV - resposta conclusiva a todos os quesitos apresentados pelo juiz, pelas partes e pelo órgão
do Ministério Público.
§ 1º No laudo, o perito deve apresentar sua fundamentação em linguagem simples e com
coerência lógica, indicando como alcançou suas conclusões.
§ 2º É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões
pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.”
A prova pericial produzida nos autos se destina à comprovação ou não da continuidade da
situação de incapacidade laboral da parte autora, em razão de seu pedido de restabelecimento
de benefício de aposentadoria por invalidez recebido no período de 14.04.2009 a 17.12.2018,
com recebimento de mensalidades de recuperação até 17.06.2020, concedido no bojo da ação
judicial nº 2008.61.11.004029-6, que tramitou perante a 1ª Vara Federal de Marília.
Naqueles autos houve a concessão de aposentadoria por invalidez ao autor com base em laudo
pericial que constatou ser ele portador de “outros transtornos mentais especificados devidos a
uma lesão e disfunção cerebral e uma doença física”, CID F06.8, estando total e
permanentemente incapacidade para suas atividades habituais.
Submetido a perícia médica nestes autos, por parte de médica especialista em psiquiatria, a
conclusão foi pela permanência do estado de incapacidade do autor, inclusive com o mesmo
diagnóstico obtido no processo anterior, nesses termos:
“IV – Exame Psíquico: Periciado comparece trajado e asseado de maneira adequada para a
situação vivenciada. Inquieto. Periciado durante o ato pericial, com postura onipotente,
irritadiço, respondendo às perguntas de maneira jocosa, irônica. Atento. Orientado globalmente,
memória com leve prejuízo. Déficit cognitivo moderado. Nega alteração do senso percepção.
Humor instável, afeto superficial. Juízo crítico da realidade parcialmente prejudicado.
V – Diagnóstico Psiquiátrico: Após avaliação história clínica, exame psíquico, atestados
médicos e cuidadosa leitura do processo, relato que, a meu ver, em que pesem atestados
médicos com pareceres contrários, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, o periciado Emilton
Silva Cidade é portador de Transtorno Mental decorrente de lesão e disfunção cerebrais, tipo
Transtorno Cognitivo Grave-CID10 F 06.8.
[...]
VI – Síntese: Após avaliação da história clínica, exame psíquico, e cuidadosa leitura e análise
da documentação médica inclusa aos autos, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista
médico psiquiátrico, o periciado Emilton Silva se encontra INCAPAZ de exercer toda e qualquer
função laboral e/ou de exercer os atos da vida civil.”
Sobreveio, então, manifestação do INSS, alegando que o autor teria obtido a renovação de sua
carteira nacional de habilitação (CNH), para a categoria “D”, a qual permite conduzir veículos de
passageiros, como ônibus, micro-ônibus e vans, tendo sido essa CNH emitida em 21.05.2014.
Informou o INSS, fato esse incompatível com a sua alegada incapacidade.
Instada a esclarecer se o fato de “ter renovado a CNH, categoria ‘D’, sem restrições renovada
em 21/05/2014 (após aposentadoria no RGPS) é compatível com a constatação de
incapacidade ao trabalho desde 2009”, conforme despacho judicial (Id 166099156), a perita
médica teceu as seguintes considerações:
“A- Está perita esclarece que, a meu ver, o periciado Emilton Silva Cidade, no ato pericial, sob o
ponto de vista médico psiquiátrico, apresentou quadro psíquico segundo os critérios
diagnósticos do CID10, compatível com Transtorno Mental decorrente de lesão e disfunção
cerebrais, tipo Transtorno Cognitivo Grave-CID10- F06.8.
No ato pericial, periciado não apresentou a CNH como documento de identidade e apresentou
certidão de interdição judicial datada em 11.02. 2011.
Com os novos fatos aqui apresentados, solicito o reagendamento de nova perícia médica
psiquiátrica, para reavaliação do quadro psiquiátrico apresentado pelo periciado Emilton Silva
Cidade para posterior revisão (retificação ou ratificação) do item VI do laudo pericial realizado
na data de 25.09.2019.”
Assim, em linha de princípio, mesmo à vista de ter o autor sido habilitado para conduzir veículos
da categoria “D”, a perita judicial manteve sua anterior conclusão, ressalvando, contudo, a
possibilidade de revisar esse entendimento, mediante nova perícia médico-psiquiátrica,
oportunidade em que o autor seria reavaliado.
Contudo, sobreveio novo despacho judicial (Id 166099186), o qual, ponderando que a perita
médica havia pedido a suspensão de seu trabalho perante a subseção judiciária de origem,
indeferiu o pedido de reagendamento de nova perícia, e determinou fosse complementado o
laudo pericial, visando à reanálise da condição de saúde do autor à vista da documentação
acostada aos autos, vinda do Detran-SP, para que fosse dirimida a questão relativa à existência
de “compatibilidade ou não entre a renovação da CNH do autor por 02 (duas) vezes enquanto
encontra-se recebendo benefício por incapacidade, devendo, também retificar ou ratificar a
conclusão estampada no laudo médico pericial anteriormente apresentado”.
A perita médica, então, complementou o laudo pericial nos seguintes termos:
“COMPLEMENTAÇÃO DE LAUDO PSIQUIÁTRICO
Eu, Dra. Cristina Alvarez Guzzardi, médica psiquiatra- CRM-40664, perita do juízo, venho
através desta, responder o solicitado pelo Exmo. Sr. Dr. Juiz Federal:
‘...intime-se a Sra. Perita judicial nomeada nos presentes autos para que analise a
documentação juntada pelo DETRAN no evento 58, bem como a nova documentação
encaminhada pelo CIRETRAN de Marília, para o fim de esclarecer se existia/existe
compatibilidade ou não entre a renovação da CNH do autor por 02 (duas) vezes enquanto
encontra-se recebendo benefício por incapacidade, devendo, também retificar ou ratificar a
conclusão estampada no laudo médico pericial anteriormente apresentado no evento 32’.
R: Esta perita, após cuidadosa releitura e reanálise da documentação médica psiquiátrica
acostada aos autos e das documentações informadas por este juízo, RETIFICA o seu parecer
técnico referente aos itens V e VI do laudo pericial realizado na data de 25.09.2019. Leia-se:
V- Diagnóstico Psiquiátrico: Após análise psicopatológica do examinado Emilton Silva Cidade
relato que, a meu ver, sob o ponto de vista médico psiquiátrico, em que pesem atestados
médicos com pareceres contrários, de acordo com a 10ª revisão da Classificação Internacional
de Doenças, ser o mesmo portador de quadro de Transtornos do humor (afetivos) orgânicos-
CID10-F06.3.
[...]
VI – Síntese: Após avaliação da história clínica, exame psíquico, e cuidadosa leitura e análise
da documentação médica inclusa aos autos, concluo que, a meu ver, sob o ponto de vista
médico psiquiátrico, o periciado Emilton Silva Cidade se encontra CAPAZ de exercer toda e
qualquer atividade laborativa incluindo a habitual e CAPAZ de exercer os atos da vida civil.”
Com base nessa complementação do laudo pericial, o pedido inicial foi julgado improcedente,
pela ausência de incapacidade laboral do autor.
Ocorre que a complementação do laudo, acima transcrita, mostra-se nula e não contém
qualquer valor jurídico.
De início, ressalto que a complementação do laudo, dadas as circunstâncias do caso concreto,
não poderia ser feita sem a presença do autor, para nova avaliação de seu estado psiquiátrico.
Quem afirmou esse fato foi a própria perita médica, por ocasião de sua segunda manifestação
nos autos, quando, já confrontada com o fato de que o autor obterá, anteriormente, habilitação
para dirigir veículos da categoria “D”, condicionou eventual ratificação ou retificação do laudo a
uma reavaliação de seu quadro psiquiátrico, mediante reagendamento da perícia.
Ausente nova avaliação presencial do autor, a complementação do laudo, que acabou por
adquirir a feição de novo laudo pericial, com diagnóstico e conclusão diversos do primeiro
laudo, revela-se, portanto, nula.
Ainda que assim não fosse, a complementação do laudo psiquiátrico não atendeu aos ditames
do art. 473 do CPC. Mais especificamente, não consta do laudo a fundamentação que ampare
sua conclusão, pois não foram explicitados os motivos pelos quais houve a alteração do
diagnóstico anteriormente feito, com a consequente declaração de capacidade do autor.
Assim, também por esse motivo, a complementação do laudo pericial, que, em verdade,
terminou por fazer as vezes deste, deve ser declarada nula.
Concluo, portanto, pela necessidade de realização de novo exame pericial nos autos, em face
da nulidade da complementação do laudo pericial que embasou o julgamento de mérito.
Por fim, a hipótese é de anulação da sentença, proferida com base em laudo pericial
subsistente, pois se mostra necessária a reabertura da fase instrutória, com nomeação de novo
perito nos autos e realização da prova pericial.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A
SENTENÇA PROFERIDA, determinando o retorno dos autos à origem para a reabertura da
instrução processual, com a realização de nova perícia médica na área da psiquiatria.
Indefiro o pedido de tutela de urgência, por não vislumbrar, ante o quadro probatório acima
descrito, prova suficiente a respeito do estado de incapacidade do autor.
Sem condenação em honorários advocatícios, tendo em vista a ausência de recorrente vencido,
nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
RECURSO DA PARTE AUTORA. Restabelecimento de benefício por incapacidade concedido
judicialmente. Cessação pelo INSS. Complementação ao laudo pericial realizado sem a
presença da parte autora, como anteriormente exigido, e que tampouco fundamenta a
conclusão quanto a sua capacidade laboral. Nulidade do laudo declarada. Necessidade de
reabertura da instrução processual, com nomeação de novo perito médico. Sentença anulada.
Recurso da parte autora a que se dá provimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Terceira Turma
decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso para anular a sentença, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
