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NÃO NECESSARIAMENTE IMPLICA AUSÊNCIA DE DOENÇA OU LESÃO. TRF3. 0000857-30.2020.4.03.6336...

Data da publicação: 09/08/2024, 03:48:25

VOTO-EMENTA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. 1. Trata-se de ação na qual a parte autora (52anos de idade na data da perícia, sexo masculino, ensino básico completo, mecânico de trator,portadora de lesão de ombro) busca a concessão de aposentadoria por invalidez (alega que está em gozo de auxílio-doença NB 6296900469, com encaminhamento à reabilitação). 2. Sentença de improcedência do pedido, em razão da não constatação de incapacidade laborativa. 3. Recurso da parte autora: requer a concessão de aposentadoria por invalidez aduzindo que não tem condições físicas de exercer seu trabalho, tanto que está recebendo auxílio-doença do INSS, tendo a autarquia lhe encaminhado à reabilitação profissional; argumenta que sequer tem condições de permanecer parado na mesma posição, seja sentado ou em pé, durante a jornada de trabalho; alega que o INSS quer reabilitá-lo em função inferior, ou seja, para receber salário menor ao que percebe como mecânico agrícola; pede, genericamente, a realização de nova perícia. 4. Para a conversão pretendida, deve haver demonstração de que o segurado é “incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” (art. 42 da Lei nº 8.213/91). 5. A incapacidade é demonstrada principalmente por meio de prova pericial, mas também analisada por qualquer outro meio idôneo de prova (arts. 369 e seguintes do Novo Código de Processo Civil). 6. A perícia pode ser realizada por médico não especialista, salvo em situações excepcionais em que é imperioso um grau de conhecimento maior (TNU. PEDILEF 200970530030463), o que não se observa neste feito. Tampouco se verifica a necessidade de uma segunda perícia, uma vez que não há irregularidade ou insuficiência na perícia realizada (art. 480 e seus parágrafos do Novo Código de Processo Civil). 7. No caso, o laudo pericial (clínica geral – evento 24) indicou expressamente a inexistência de incapacidade laborativa. O perito judicial concluiu: “Discussão: O Autor entra com o membro superior direito "caído" sem utilizá-lo para nenhuma situação. O Periciando não utilizava o membro superior direito, apesar de ser destro, para manipular os documentos, nem para abrir e fechar a porta do consultório. O Autor refere que "desde o incidente em 2019 não utiliza o membro superior direito para nada" sic. Ao exame físico, os perímetros dos dois membros são idênticos e o tônus muscular é normal e simétrico. Essa situação é incompatível com o que alega o Autor, sendo que se um grupo muscular for negligenciado, em poucos meses já será possível identificar atrofia muscular, redução do tônus muscular e diferença de perímetros em relação ao membro contralateral. Na avaliação da dor, o médico assistencial considera o relato próprio do paciente como padrão ouro de informação porque traduz em palavras e expressões faciais verdadeiras a intensidade e outras características desse sintoma tão subjetivo. Já essas informações perdem muito de seu valor em uma perícia médica, pois estão impregnadas de interpretações, interesses e distorções, tornando assim esse padrão ouro como duvidoso. Torna-se perigoso ao perito acreditar que a dor é aquilo que o indivíduo diz que é ou diz que tem. Ter uma dor é, de fato, tê-la; já ouvir que outro a tem, é ficar-se com uma dúvida a ser esclarecida. Não se nega a dor de outrem. O que não se pode é simplisticamente transformar sintoma em doença, ou doença em incapacidade, ou risco em nexo. Pela frequência e pelas possibilidades de fraude, o médico perito necessita saber qualificar, quantificar, localizar, correlacionar a queixa dolorosa, através do exame físico, questionamento e manobras. A cinética descrita pelo Autor como a origem da lesão, não se mostrou compatível com provável causa da lesão de tendão. A anamnese detalhada e o uso abrangente de sinais clínicos podem contribuir com 90% dos diagnósticos corretos de tendinite do ombro, com sensibilidade de 91,3% e especificidade de 88,9, sem o auxílio de qualquer exame complementar. Esses valores de acerto baseado exclusivamente na técnica clínica têm fidedignidade superior àquela do diagnóstico ultrassonográfico das mesmas lesões do ombro. Isso, de modo algum, diminui a importância do ultrassom, mas se constitui em evidência contrária à sua incorreta supervalorização. O desempenho relativamente bom do ultrassom em detectar rupturas tendíneas do ombro torna-se discutível e sujeito a altas taxas de falsa-positividade com o avançar da idade. Wallny et al. mostraram que a especificidade do ultrassom nestas condições é de apenas 42,9%, revelando falsa-positividade substancial (valor preditivo positivo de apenas 63,6%, ou seja, é a porcentagem de verdadeiros positivos dentre aqueles que foram diagnosticados como positivo através do exame de ultrassom). Fora do cenário litigioso, o tempo de cura de uma tendinite originada por sobrecargas biomecânicas oscila entre 1 e 3 semanas. Todavia, muitos têm sido os trabalhadores com este suposto diagnóstico que permanecem anos afastados do trabalho e sem referir qualquer melhora, como se a tendinite originada por esforços fosse uma enfermidade perene, progressiva e/ou sem cura, contrariando as evidências. Apesar da elevada sensibilidade e especificidade diagnóstica das tendinites e da fibromialgia usando-se somente métodos clínicos, observa-se uma demasiada solicitação de exames complementares para essas condições, aumentando a chance de falsos resultados positivos de doenças não existentes naqueles pacientes. A aplicação do conhecimento clínico pode superar comprovadamente a eficácia diagnóstica do ultrassom, neste cenário, para certas lesões tendíneas, sem eliminar ou diminuir a importância do ultrassom, porém as evidências mostram que a clínica (exame físico) é soberana. O Autor referiu dor como um dos fatores incapacitantes, mas negou uso de medicações contínuas. Ora, se a dor é incapacitante, como pode o Autor não se submeter a um tratamento adequado para controle do quadro álgico? O Periciando foi pouco colaborativo ao exame físico de membro superior direito, porém ante tudo que fora exposto, o quadro relatado pelo Autor de impossibilidade de uso do membro superior direito não foi constatado neste exame pericial, justificado por diversos elementos descritos em Discussão e no campo Exame físico. O Autor pode ter uma lesão em ombro direito, mas essa não gera limitações funcionais. O Autor não referiu realizar tratamento de hemodiálise, tampouco referiu que esse tratamento lhe incapacita para o labor e não foram apresentados elementos que comprovem as alegações das iniciais de tratamento com 3 sessões de hemodiálise por semana. Um indivíduo é considerado capaz para exercer uma determinada atividade ou ocupação quando reúne as condições morfopsicofisiológicas compatíveis com o seu pleno desempenho. NÃO NECESSARIAMENTE IMPLICA AUSÊNCIA DE DOENÇA OU LESÃO. Tendo exposto isso, não foi constatada incapacidade. Conclusão: A partir do exame pericial realizado, conclui-se que: a. O Periciando é portador de lesão de ombro; b. A doença apresentada NÃO TEM relação com a sua atividade laboral; c. Ao exame físico, NÃO FORAM constatadas repercussões funcionais da sua doença de base, NÃO HAVENDO, portanto, incapacidade laboral”. 8. Assim, não há comprovação da existência de incapacidade total e permanente sob o ponto de vista médico. Os documentos juntados aos autos apontam, inclusive, que o INSS encaminhou a parte recorrente à reabilitação profissional. Ônus da prova de que não se desincumbiu a parte autora. 9. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 10. Condenação da parte recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da causa (artigo 55, da Lei nº 9.099/95), devidamente atualizado em conformidade com os critérios definidos na Resolução CJF nº 658/2020, cuja execução fica suspensa nas hipóteses de concessão de gratuidade de justiça. 11. É o voto. PAULO CEZAR NEVES JUNIOR JUIZ FEDERAL RELATOR (TRF 3ª Região, 11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0000857-30.2020.4.03.6336, Rel. Juiz Federal PAULO CEZAR NEVES JUNIOR, julgado em 04/10/2021, DJEN DATA: 07/10/2021)



Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP

0000857-30.2020.4.03.6336

Relator(a)

Juiz Federal PAULO CEZAR NEVES JUNIOR

Órgão Julgador
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

Data do Julgamento
04/10/2021

Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 07/10/2021

Ementa


VOTO-EMENTA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE
IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.

1. Trata-se de ação na qual a parte autora (52anos de idade na data da perícia, sexo masculino,
ensino básico completo, mecânico de trator,portadora de lesão de ombro) busca a concessão de
aposentadoria por invalidez (alega que está em gozo de auxílio-doença NB 6296900469, com
encaminhamento à reabilitação).

2. Sentença de improcedência do pedido, em razão da não constatação de incapacidade
laborativa.

3. Recurso da parte autora: requer a concessão de aposentadoria por invalidez aduzindo que não
tem condições físicas de exercer seu trabalho, tanto que está recebendo auxílio-doença do INSS,
tendo a autarquia lhe encaminhado à reabilitação profissional; argumenta que sequer tem
condições de permanecer parado na mesma posição, seja sentado ou em pé, durante a jornada
de trabalho; alega que o INSS quer reabilitá-lo em função inferior, ou seja, para receber salário
menor ao que percebe como mecânico agrícola; pede, genericamente, a realização de nova
perícia.
4. Para a conversão pretendida, deve haver demonstração de que o segurado é “incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” (art. 42
da Lei nº 8.213/91).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos

5. A incapacidade é demonstrada principalmente por meio de prova pericial, mas também
analisada por qualquer outro meio idôneo de prova (arts. 369 e seguintes do Novo Código de
Processo Civil).
6. A perícia pode ser realizada por médico não especialista, salvo em situações excepcionais em
que é imperioso um grau de conhecimento maior (TNU. PEDILEF 200970530030463), o que não
se observa neste feito. Tampouco se verifica a necessidade de uma segunda perícia, uma vez
que não há irregularidade ou insuficiência na perícia realizada (art. 480 e seus parágrafos do
Novo Código de Processo Civil).
7. No caso, o laudo pericial (clínica geral – evento 24) indicou expressamente a inexistência de
incapacidade laborativa. O perito judicial concluiu:

“Discussão:
O Autor entra com o membro superior direito "caído" sem utilizá-lo para nenhuma situação. O
Periciando não utilizava o membro superior direito, apesar de ser destro, para manipular os
documentos, nem para abrir e fechar a porta do consultório.
O Autor refere que "desde o incidente em 2019 não utiliza o membro superior direito para nada"
sic.
Ao exame físico, os perímetros dos dois membros são idênticos e o tônus muscular é normal e
simétrico. Essa situação é incompatível com o que alega o Autor, sendo que se um grupo
muscular for negligenciado, em poucos meses já será possível identificar atrofia muscular,
redução do tônus muscular e diferença de perímetros em relação ao membro contralateral.
Na avaliação da dor, o médico assistencial considera o relato próprio do paciente como padrão
ouro de informação porque traduz em palavras e expressões faciais verdadeiras a intensidade e
outras características desse sintoma tão subjetivo. Já essas informações perdem muito de seu
valor em uma perícia médica, pois estão impregnadas de interpretações, interesses e distorções,
tornando assim esse padrão ouro como duvidoso. Torna-se perigoso ao perito acreditar que a dor
é aquilo que o indivíduo diz que é ou diz que tem.
Ter uma dor é, de fato, tê-la; já ouvir que outro a tem, é ficar-se com uma dúvida a ser
esclarecida.
Não se nega a dor de outrem. O que não se pode é simplisticamente transformar sintoma em
doença, ou doença em incapacidade, ou risco em nexo.
Pela frequência e pelas possibilidades de fraude, o médico perito necessita saber qualificar,
quantificar, localizar, correlacionar a queixa dolorosa, através do exame físico, questionamento e
manobras.
A cinética descrita pelo Autor como a origem da lesão, não se mostrou compatível com provável
causa da lesão de tendão.
A anamnese detalhada e o uso abrangente de sinais clínicos podem contribuir com 90% dos
diagnósticos corretos de tendinite do ombro, com sensibilidade de 91,3% e especificidade de
88,9, sem o auxílio de qualquer exame complementar. Esses valores de acerto baseado
exclusivamente na técnica clínica têm fidedignidade superior àquela do diagnóstico
ultrassonográfico das mesmas lesões do ombro. Isso, de modo algum, diminui a importância do
ultrassom, mas se constitui em evidência contrária à sua incorreta
supervalorização.
O desempenho relativamente bom do ultrassom em detectar rupturas tendíneas do ombro torna-
se discutível e sujeito a altas taxas de falsa-positividade com o avançar da idade. Wallny et al.
mostraram que a especificidade do ultrassom nestas condições é de apenas 42,9%, revelando
falsa-positividade substancial (valor preditivo positivo de apenas 63,6%, ou seja, é a porcentagem
de verdadeiros positivos dentre aqueles que foram diagnosticados como positivo através do

exame de ultrassom).
Fora do cenário litigioso, o tempo de cura de uma tendinite originada por sobrecargas
biomecânicas oscila entre 1 e 3 semanas. Todavia, muitos têm sido os trabalhadores com este
suposto diagnóstico que permanecem anos afastados do trabalho e sem referir qualquer melhora,
como se a tendinite originada por esforços fosse uma enfermidade perene, progressiva e/ou sem
cura, contrariando as evidências.
Apesar da elevada sensibilidade e especificidade diagnóstica das tendinites e da fibromialgia
usando-se somente métodos clínicos, observa-se uma demasiada solicitação de exames
complementares para essas condições, aumentando a chance de falsos resultados positivos de
doenças não existentes naqueles pacientes. A aplicação do conhecimento clínico pode superar
comprovadamente a eficácia diagnóstica do ultrassom, neste cenário, para certas lesões
tendíneas, sem eliminar ou diminuir a importância do ultrassom, porém as evidências mostram
que a clínica (exame físico) é soberana.
O Autor referiu dor como um dos fatores incapacitantes, mas negou uso de medicações
contínuas. Ora, se a dor é incapacitante, como pode o Autor não se submeter a um tratamento
adequado para controle do quadro álgico?
O Periciando foi pouco colaborativo ao exame físico de membro superior direito, porém ante tudo
que fora exposto, o quadro relatado pelo Autor de impossibilidade de uso do membro superior
direito não foi constatado neste exame pericial, justificado por diversos elementos descritos em
Discussão e no campo Exame físico. O Autor pode ter uma lesão em ombro direito, mas essa não
gera limitações funcionais.
O Autor não referiu realizar tratamento de hemodiálise, tampouco referiu que esse tratamento lhe
incapacita para o labor e não foram apresentados elementos que comprovem as alegações das
iniciais de tratamento com 3 sessões de hemodiálise por semana.
Um indivíduo é considerado capaz para exercer uma determinada atividade ou ocupação quando
reúne as condições morfopsicofisiológicas compatíveis com o seu pleno desempenho.
NÃO NECESSARIAMENTE IMPLICA AUSÊNCIA DE DOENÇA OU LESÃO.
Tendo exposto isso, não foi constatada incapacidade.
Conclusão:
A partir do exame pericial realizado, conclui-se que:
a. O Periciando é portador de lesão de ombro;
b. A doença apresentada NÃO TEM relação com a sua atividade laboral;
c. Ao exame físico, NÃO FORAM constatadas repercussões funcionais da sua doença de base,
NÃO HAVENDO, portanto, incapacidade laboral”.

8. Assim, não há comprovação da existência de incapacidade total e permanente sob o ponto de
vista médico. Os documentos juntados aos autos apontam, inclusive, que o INSS encaminhou a
parte recorrente à reabilitação profissional. Ônus da prova de que não se desincumbiu a parte
autora.
9. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
10. Condenação da parte recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados
em 10% (dez por cento) do valor da causa (artigo 55, da Lei nº 9.099/95), devidamente atualizado
em conformidade com os critérios definidos na Resolução CJF nº 658/2020, cuja execução fica
suspensa nas hipóteses de concessão de gratuidade de justiça.
11. É o voto.

PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
JUIZ FEDERAL RELATOR


Acórdao

PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000857-30.2020.4.03.6336
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: EZEQUIEL DOMINGUES DOS PRAZERES

Advogado do(a) RECORRENTE: PATRICIA GUACELLI DI GIACOMO - SP193628-N

RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS


OUTROS PARTICIPANTES:





PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000857-30.2020.4.03.6336
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: EZEQUIEL DOMINGUES DOS PRAZERES
Advogado do(a) RECORRENTE: PATRICIA GUACELLI DI GIACOMO - SP193628-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:






R E L A T Ó R I O

Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.



PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000857-30.2020.4.03.6336
RELATOR:31º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: EZEQUIEL DOMINGUES DOS PRAZERES
Advogado do(a) RECORRENTE: PATRICIA GUACELLI DI GIACOMO - SP193628-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:





V O T O

Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.











VOTO-EMENTA. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. SENTENÇA DE
IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.

1. Trata-se de ação na qual a parte autora (52anos de idade na data da perícia, sexo masculino,
ensino básico completo, mecânico de trator,portadora de lesão de ombro) busca a concessão
de aposentadoria por invalidez (alega que está em gozo de auxílio-doença NB 6296900469,
com encaminhamento à reabilitação).

2. Sentença de improcedência do pedido, em razão da não constatação de incapacidade
laborativa.

3. Recurso da parte autora: requer a concessão de aposentadoria por invalidez aduzindo que
não tem condições físicas de exercer seu trabalho, tanto que está recebendo auxílio-doença do
INSS, tendo a autarquia lhe encaminhado à reabilitação profissional; argumenta que sequer tem
condições de permanecer parado na mesma posição, seja sentado ou em pé, durante a jornada
de trabalho; alega que o INSS quer reabilitá-lo em função inferior, ou seja, para receber salário
menor ao que percebe como mecânico agrícola; pede, genericamente, a realização de nova
perícia.
4. Para a conversão pretendida, deve haver demonstração de que o segurado é “incapaz e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência” (art.
42 da Lei nº 8.213/91).
5. A incapacidade é demonstrada principalmente por meio de prova pericial, mas também
analisada por qualquer outro meio idôneo de prova (arts. 369 e seguintes do Novo Código de
Processo Civil).
6. A perícia pode ser realizada por médico não especialista, salvo em situações excepcionais
em que é imperioso um grau de conhecimento maior (TNU. PEDILEF 200970530030463), o
que não se observa neste feito. Tampouco se verifica a necessidade de uma segunda perícia,
uma vez que não há irregularidade ou insuficiência na perícia realizada (art. 480 e seus
parágrafos do Novo Código de Processo Civil).
7. No caso, o laudo pericial (clínica geral – evento 24) indicou expressamente a inexistência de
incapacidade laborativa. O perito judicial concluiu:

“Discussão:
O Autor entra com o membro superior direito "caído" sem utilizá-lo para nenhuma situação. O
Periciando não utilizava o membro superior direito, apesar de ser destro, para manipular os
documentos, nem para abrir e fechar a porta do consultório.
O Autor refere que "desde o incidente em 2019 não utiliza o membro superior direito para nada"
sic.
Ao exame físico, os perímetros dos dois membros são idênticos e o tônus muscular é normal e
simétrico. Essa situação é incompatível com o que alega o Autor, sendo que se um grupo
muscular for negligenciado, em poucos meses já será possível identificar atrofia muscular,
redução do tônus muscular e diferença de perímetros em relação ao membro contralateral.
Na avaliação da dor, o médico assistencial considera o relato próprio do paciente como padrão
ouro de informação porque traduz em palavras e expressões faciais verdadeiras a intensidade e
outras características desse sintoma tão subjetivo. Já essas informações perdem muito de seu
valor em uma perícia médica, pois estão impregnadas de interpretações, interesses e
distorções, tornando assim esse padrão ouro como duvidoso. Torna-se perigoso ao perito
acreditar que a dor é aquilo que o indivíduo diz que é ou diz que tem.
Ter uma dor é, de fato, tê-la; já ouvir que outro a tem, é ficar-se com uma dúvida a ser
esclarecida.
Não se nega a dor de outrem. O que não se pode é simplisticamente transformar sintoma em
doença, ou doença em incapacidade, ou risco em nexo.
Pela frequência e pelas possibilidades de fraude, o médico perito necessita saber qualificar,

quantificar, localizar, correlacionar a queixa dolorosa, através do exame físico, questionamento
e manobras.
A cinética descrita pelo Autor como a origem da lesão, não se mostrou compatível com provável
causa da lesão de tendão.
A anamnese detalhada e o uso abrangente de sinais clínicos podem contribuir com 90% dos
diagnósticos corretos de tendinite do ombro, com sensibilidade de 91,3% e especificidade de
88,9, sem o auxílio de qualquer exame complementar. Esses valores de acerto baseado
exclusivamente na técnica clínica têm fidedignidade superior àquela do diagnóstico
ultrassonográfico das mesmas lesões do ombro. Isso, de modo algum, diminui a importância do
ultrassom, mas se constitui em evidência contrária à sua incorreta
supervalorização.
O desempenho relativamente bom do ultrassom em detectar rupturas tendíneas do ombro
torna-se discutível e sujeito a altas taxas de falsa-positividade com o avançar da idade. Wallny
et al.
mostraram que a especificidade do ultrassom nestas condições é de apenas 42,9%, revelando
falsa-positividade substancial (valor preditivo positivo de apenas 63,6%, ou seja, é a
porcentagem de verdadeiros positivos dentre aqueles que foram diagnosticados como positivo
através do exame de ultrassom).
Fora do cenário litigioso, o tempo de cura de uma tendinite originada por sobrecargas
biomecânicas oscila entre 1 e 3 semanas. Todavia, muitos têm sido os trabalhadores com este
suposto diagnóstico que permanecem anos afastados do trabalho e sem referir qualquer
melhora, como se a tendinite originada por esforços fosse uma enfermidade perene,
progressiva e/ou sem cura, contrariando as evidências.
Apesar da elevada sensibilidade e especificidade diagnóstica das tendinites e da fibromialgia
usando-se somente métodos clínicos, observa-se uma demasiada solicitação de exames
complementares para essas condições, aumentando a chance de falsos resultados positivos de
doenças não existentes naqueles pacientes. A aplicação do conhecimento clínico pode superar
comprovadamente a eficácia diagnóstica do ultrassom, neste cenário, para certas lesões
tendíneas, sem eliminar ou diminuir a importância do ultrassom, porém as evidências mostram
que a clínica (exame físico) é soberana.
O Autor referiu dor como um dos fatores incapacitantes, mas negou uso de medicações
contínuas. Ora, se a dor é incapacitante, como pode o Autor não se submeter a um tratamento
adequado para controle do quadro álgico?
O Periciando foi pouco colaborativo ao exame físico de membro superior direito, porém ante
tudo que fora exposto, o quadro relatado pelo Autor de impossibilidade de uso do membro
superior direito não foi constatado neste exame pericial, justificado por diversos elementos
descritos em Discussão e no campo Exame físico. O Autor pode ter uma lesão em ombro
direito, mas essa não gera limitações funcionais.
O Autor não referiu realizar tratamento de hemodiálise, tampouco referiu que esse tratamento
lhe incapacita para o labor e não foram apresentados elementos que comprovem as alegações
das iniciais de tratamento com 3 sessões de hemodiálise por semana.
Um indivíduo é considerado capaz para exercer uma determinada atividade ou ocupação

quando reúne as condições morfopsicofisiológicas compatíveis com o seu pleno desempenho.
NÃO NECESSARIAMENTE IMPLICA AUSÊNCIA DE DOENÇA OU LESÃO.
Tendo exposto isso, não foi constatada incapacidade.
Conclusão:
A partir do exame pericial realizado, conclui-se que:
a. O Periciando é portador de lesão de ombro;
b. A doença apresentada NÃO TEM relação com a sua atividade laboral;
c. Ao exame físico, NÃO FORAM constatadas repercussões funcionais da sua doença de base,
NÃO HAVENDO, portanto, incapacidade laboral”.

8. Assim, não há comprovação da existência de incapacidade total e permanente sob o ponto
de vista médico. Os documentos juntados aos autos apontam, inclusive, que o INSS
encaminhou a parte recorrente à reabilitação profissional. Ônus da prova de que não se
desincumbiu a parte autora.
9. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
10. Condenação da parte recorrente vencida ao pagamento de honorários advocatícios
arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da causa (artigo 55, da Lei nº 9.099/95),
devidamente atualizado em conformidade com os critérios definidos na Resolução CJF nº
658/2020, cuja execução fica suspensa nas hipóteses de concessão de gratuidade de justiça.
11. É o voto.

PAULO CEZAR NEVES JUNIOR
JUIZ FEDERAL RELATOR ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Primeira
Turma Recursal, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


Resumo Estruturado

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