Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
0003714-88.2014.4.03.6003
Relator(a)
Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
05/08/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 12/08/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. TRABALHADOR RURAL. LEI Nº
8.213/1991. LAUDO ELABORADO POR FISIOTERAPEUTA. CONDIÇÃO DE SEGURADO.
PROVA TESTEMUNHAL. IMPRESCINDIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. SENTENÇA
ANULADA DE OFÍCIO. TUTELA REVOGADA.
- A decisão que deferiu a realização de perícia médica nomeou, como perito, profissional da área
de fisioterapia, que não possui conhecimento técnico suficiente para diagnosticar, em
profundidade, as moléstias que acometem a parte autora.
- Nas ações previdenciárias, especificamente no que se refere às perícias judiciais para apuração
de incapacidade laboral, faz-se necessário que o perito nomeado pelo MM. Juízo a quo seja
graduado em medicina e inscrito no respectivo Conselho.
- A nomeação de expert que não seja médico é admitida, porém restrita a casos excepcionais, ou
seja, comarcas onde não existam profissionais habilitados para tanto, o que não é o caso dos
autos. Precedentes jurisprudenciais.
- Em razão da natureza da demanda, é imprescindível a realização da prova testemunhal, ante a
possibilidade de comprovação da atividade rural mediante princípio de prova documental,
ratificado por testemunhos idôneos, independentemente de contribuição.
- O julgamento da lide deu-se sem a realização de audiência, malferindo os princípios do
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
contraditório e da ampla defesa, assegurados pelo art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal.
- Frustrada a concretização do conjunto probatório, impõe-se a anulação da sentença de Primeiro
Grau.
- Sentença anulada de ofício, determinando o retorno dos autos à origem, para reabertura da fase
probatória, com vistas à produção da prova pericial por médico habilitado, bem assim à produção
de prova oral, prosseguindo-se o feito em seus ulteriores termos.
- Tutela antecipada revogada.
- Apelação interposta pelo INSS prejudicada.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003714-88.2014.4.03.6003
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JONATHAS PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: MARCIO AURELIO DE OLIVEIRA - SP281598-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003714-88.2014.4.03.6003
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JONATHAS PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: MARCIO AURELIO DE OLIVEIRA - SP281598-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Vistos, em autoinspeção.
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo INSS em face da r. sentença, não submetida
ao reexame necessário, que julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a
Autarquia Previdenciária a conceder auxílio-doença à parte autora, a partir da data de entrada
do requerimento administrativo, em 19/11/2014, discriminados os consectários, antecipados os
efeitos da tutela de mérito.
Pretende, o apelante, que seja reformada a sentença, sustentando, em síntese, a ausência da
qualidade de segurado do proponente, bem assim do cumprimento da carência exigida à
outorga da benesse. Insurge-se, outrossim, quanto ao termo inicial do benefício. Suscita, por
fim, o prequestionamento legal para efeito de interposição de recursos.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0003714-88.2014.4.03.6003
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JONATHAS PEREIRA
Advogado do(a) APELADO: MARCIO AURELIO DE OLIVEIRA - SP281598-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A teor do disposto no art. 1.011 do Código de Processo Civil, conheço do recurso de apelação,
uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade.
Discute-se o direito da parte autora a benefício por incapacidade.
Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado
que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença é devido ao segurado temporariamente incapacitado, nos termos
do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não para quaisquer atividades
laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da
Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e
Esmafe, Porto Alegre, 2005, pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra
atividade que garanta a subsistência - aposentadoria por invalidez, ou a incapacidade
temporária - auxílio-doença, observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2
– cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 -
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de
progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.
Realizada a perícia médica em 08/04/2016, o laudo apresentado considerou o autor, nascido
em 16/02/1966, trabalhador rural, portador de epicondilite medial bilateral e lombalgia, que o
incapacitam, de forma parcial e temporária, para o desempenho de atividades que exijam
esforços físicos, tal como aquela por ele exercida.
No entanto, o compulsar dos autos está a revelar que a decisão que deferiu a realização de
perícia médica nomeou, como perito, profissional da área de fisioterapia, que não possui
conhecimento técnico suficiente para diagnosticar, em profundidade, as moléstias que
acometem a parte autora (doc. 130555539, págs. 5/10 e 14/17).
Nas ações previdenciárias, especificamente no que se refere às perícias judiciais para apuração
de incapacidade laboral, faz-se necessário que o perito nomeado pelo MM. Juízo a quo seja
graduado em medicina e inscrito no respectivo Conselho. Consigno que a nomeação de expert
que não seja médico é admitida, porém restrita a casos excepcionais, ou seja, comarcas onde
não existam profissionais habilitados para tanto, o que não é o caso dos autos, visto que a ação
tramitou perante a 1ª Vara da Seção Judiciária de Mato Grosso do Sul, constando, inclusive, da
decisão acostada ao doc. 130555539, págs. 5/10, que contava, à época, com dois médicos
peritos cadastrados.
Nesse sentido, o seguinte julgado desta E. Corte:
"AÇÃO ORDINÁRIA - PREVIDENCIÁRIO - AUXÍLIO-DOENÇA - LAUDO ELABORADO POR
FISIOTERAPEUTA - NULIDADE - ANULAÇÃO DA R. SENTENÇA DE OFÍCIO ,
DETERMINANDO-SE A REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA, POR PROFISSIONAL MÉDICO -
APELAÇÃO PREJUDICADA.
1. Com efeito, o cenário dos autos reclama a anulação ex officio da r. sentença recorrida, tanto
quanto do r. laudo pericial de fls. 124/135, porquanto lavrado por profissional não graduado em
Medicina (in casu, o exame foi realizado por Terapeuta).
2. A teor da v. jurisprudência desta Nona Turma, a conclusão sobre a existência ou não da
incapacidade para o labor ou desempenho das atividades habituais só pode ser declarada por
profissional graduado em Medicina, devidamente inscrito no órgão competente.
3. O fisioterapeuta pode informar quais as restrições motoras apresentadas pelo enfermo,
entretanto, não tem habilitação para diagnosticar, exercendo sua atividade sempre orientado
por Médico, a quem compete, de forma exclusa, a indicação de tratamentos e a avaliação de
resultados.
4. Quadro especialmente grave se extrai dos autos, posto que o Sr. Perito, vênias todas,
enveredou-se por campo de conhecimento muito distante do de suas especialidades,
encerrando por proferir diagnóstico de depressão (hipomania - F30.0), fls. 131, quesito n. 01,
formulado pelo INSS.
5. Portanto, o laudo pericial acostado aos autos, elaborado por fisioterapeuta , é nulo.
(Precedentes).
6. Consequentemente, flagra-se cerceada a ampla defesa, em prejuízo das partes, vez que não
produzida prova válida essencial para o reconhecimento, ou não, do acerto da pretensão
deduzida na inicial.
7. Impositiva, portanto, a anulação da r. sentença, volvendo os autos à origem, para que novo
laudo seja produzido, por Perito Médico, prejudicada a apelação do INSS.
8. Sentença anulada de ofício , prejudicada a apelação do INSS."
(TRF3, 9ª Turma, AC 1521318, Proc. 00233286120104039999, Rel. Juiz Convocado Silva Neto,
e-DJF3 Judicial 1: 13/01/2015). (grifos meus)
Ademais, em razão da natureza da demanda, é imprescindível a realização da prova
testemunhal, ante a possibilidade de comprovação da atividade rural mediante princípio de
prova documental, ratificado por testemunhos idôneos, independentemente de contribuição.
Ocorre que o julgamento da lide deu-se sem a realização de audiência, malferindo os princípios
do contraditório e da ampla defesa, assegurados pelo art. 5º, inciso LV, da Constituição
Federal.
Transcrevo, por oportuno, os seguintes julgados da Nona Turma deste E. Tribunal, proferidos
em situações análogas:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-
DOENÇA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL INDISPENSÁVEL.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE RECONHECIDA DE OFÍCIO. SENTENÇA
ANULADA. APELAÇÃO PREJUDICADA.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por
invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o
segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência
Social.
- No caso dos autos, a parte autora alega ter exercido atividades rurais até ser acometida de
doença incapacitante que a impede de trabalhar. Como início de prova material do alegado
trabalho rural , consta dos autos cópia de sua certidão de casamento e nascimento da filha,
com a qualificação de lavrador.
- Nos casos em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário por incapacidade, em
decorrência do exercício de atividade rural, a realização de prova testemunhal é imprescindível
para se aferir a qualidade de segurado da parte autora.
- Havendo necessidade de colheita de determinada prova, o Juiz deve determinar, até mesmo
de ofício, a sua produção, em homenagem ao princípio da verdade real. Precedentes do STJ.
- cerceamento de defesa configurado. Sentença anulada de ofício, com determinação de
retorno dos autos à instância de origem para a realização de prova testemunhal e novo
julgamento.
- Apelação prejudicada."
(AC 2016.03.99.031221-0, Relator Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, D.E.
24/11/2016)
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. PEDIDO IMPROCEDENTE POR
AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ART. 285-A. AUSÊNCIA DE PROVA
TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. SENTENÇA ANULADA. APELAÇÃO PREJUDICADA.
- À concessão da aposentadoria por idade rural , exige-se: a comprovação da idade mínima (55
anos de idade para mulher e 60 anos para homem) e o desenvolvimento de atividade rural ,
pelo tempo correspondente à carência, no período imediatamente anterior ao requerimento,
ressalvada a hipótese do direito adquirido.
- A atividade rural deve ser comprovada mediante início de prova material corroborada por
prova testemunhal idônea e robusta, independentemente de contribuição.
- A prova material em harmonia com a prova testemunhal é requisito imprescindível para o
reconhecimento judicial do benefício de aposentadoria rural por idade.
- Desse modo, apesar de o documento apresentado constituir, em tese, início de prova material,
faz-se necessária, no caso, a oitiva das testemunhas, que fora requerida pela parte autora, para
que não fique configurado cerceamento de defesa.
- O artigo 285-A do Código de Processo Civil é aplicável quando a matéria controvertida for
unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em
outros casos idênticos, podendo ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-
se o teor da anteriormente prolatada.
- No caso em análise, contudo, verifica-se que a solução para o litígio depende de dilação
probatória, posto que a controvérsia exige a produção de prova testemunhal , para
esclarecimentos acerca do exercício de atividade rural pela parte autora durante o período de
carência previsto na legislação previdenciária. A matéria controvertida, portanto, não é
unicamente de direito, de modo que também se incorre em cerceamento de defesa.
- Sentença anulada para determinando o retorno dos autos à Vara de origem para que seja
concluída a instrução probatória, com a oitiva de testemunhas.
- Apelação da parte autora prejudicada."
(AC 0027489-07.2016.4.03.9999, Relator Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, D.E.
24/11/2016)
Frustrada, portanto, a concretização do conjunto probatório, pelo fundamentos expostos, impõe-
se a anulação da sentença de Primeiro Grau.
Ante o exposto, ANULO, DE OFÍCIO, A SENTENÇA, determinando o retorno dos autos à
origem, para reabertura da fase probatória, com vistas à produção da prova pericial por médico
habilitado, bem assim à produção de prova oral, prosseguindo-se o feito em seus ulteriores
termos. Em decorrência, resta prejudicada a apelação interposta pelo INSS.
Por fim, tendo em vista o teor da presente decisão, revogo a tutela antecipada na sentença.
Comunique-se ao INSS.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. TRABALHADOR RURAL. LEI Nº
8.213/1991. LAUDO ELABORADO POR FISIOTERAPEUTA. CONDIÇÃO DE SEGURADO.
PROVA TESTEMUNHAL. IMPRESCINDIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA.
SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. TUTELA REVOGADA.
- A decisão que deferiu a realização de perícia médica nomeou, como perito, profissional da
área de fisioterapia, que não possui conhecimento técnico suficiente para diagnosticar, em
profundidade, as moléstias que acometem a parte autora.
- Nas ações previdenciárias, especificamente no que se refere às perícias judiciais para
apuração de incapacidade laboral, faz-se necessário que o perito nomeado pelo MM. Juízo a
quo seja graduado em medicina e inscrito no respectivo Conselho.
- A nomeação de expert que não seja médico é admitida, porém restrita a casos excepcionais,
ou seja, comarcas onde não existam profissionais habilitados para tanto, o que não é o caso
dos autos. Precedentes jurisprudenciais.
- Em razão da natureza da demanda, é imprescindível a realização da prova testemunhal, ante
a possibilidade de comprovação da atividade rural mediante princípio de prova documental,
ratificado por testemunhos idôneos, independentemente de contribuição.
- O julgamento da lide deu-se sem a realização de audiência, malferindo os princípios do
contraditório e da ampla defesa, assegurados pelo art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal.
- Frustrada a concretização do conjunto probatório, impõe-se a anulação da sentença de
Primeiro Grau.
- Sentença anulada de ofício, determinando o retorno dos autos à origem, para reabertura da
fase probatória, com vistas à produção da prova pericial por médico habilitado, bem assim à
produção de prova oral, prosseguindo-se o feito em seus ulteriores termos.
- Tutela antecipada revogada.
- Apelação interposta pelo INSS prejudicada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu anular, de ofício, a r. sentença, revogando a tutela antecipada,
prejudicada a apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
