Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000839-09.2020.4.03.6336
Relator(a)
Juiz Federal CIRO BRANDANI FONSECA
Órgão Julgador
6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
19/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 01/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. LOAS. BENEFÍCIO REVISADO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS.
INEXIGILIDADE. AÇÃO AJUIZADA EM MOMENTO ANTERIOR À PUBLICAÇÃO DO TEMA 979
DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MODULAÇÃO DE EFEITOS. MÁ-FÉ QUE NÃO SE
PRESUME. VALORES JÁ DESCONTADOS NÃO PODEM SER DEVOLVIDOS UMA VEZ QUE
DECLARADOS INDEVIDOS. RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA
REFORMADA EM PARTE.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000839-09.2020.4.03.6336
RELATOR:16º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DE LOURDES SOUSA ESPIRITO SANTO
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIO LUIZ DIAS MODESTO - SP176431-N
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000839-09.2020.4.03.6336
RELATOR:16º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DE LOURDES SOUSA ESPIRITO SANTO
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIO LUIZ DIAS MODESTO - SP176431-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte autora, em face de sentença que julgou improcedente
o pedido de declaração de ilegalidade do desconto mensal no benefício assistencial de
prestação continuada no período de 20/03/2018 a 13/10/2018 e a de devolução dos valores já
descontados.
Alega a parte autora que não ficou demonstrado nos autos que agiu de má-fé ou de forma
fraudulenta. Aduz que recebeu o benefício em ação judicial e, posteriormente, o seu cônjuge
passou a perceber salário, fato que não descaracteriza a boa-fé. Assim, requer a reforma da
sentença.
Intimado, o réu não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000839-09.2020.4.03.6336
RELATOR:16º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: MARIA DE LOURDES SOUSA ESPIRITO SANTO
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIO LUIZ DIAS MODESTO - SP176431-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, cabe destacar que o tema 979 do Superior Tribunal de Justiça foi julgado e
publicado em 23/04/2021, firmando-se a seguinte tese:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até
30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado,
diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que
não lhe era possível constatar o pagamento indevido.”
Contudo, houve modulação dos efeitos, a fim de que a tese seja aplicada apenas aos
processos distribuídos na primeira instância, a partir da publicação do acórdão.
No caso dos autos, a ação foi ajuizada em 03/06/2020, de forma que a tese firmada pelo
Superior Tribunal de Justiça não se aplica ao caso concreto.
Portanto, o ônus da prova de que a autora recebeu os valores a título do benefício assistencial
de má-fé compete ao réu.
A Administração Pública é regida por inúmeros princípios, merecendo especial atenção o
princípio da legalidade, de sede constitucional, responsável pela imposição da lei como
fundamento de todos os atos administrativos, que a ela devem estrita obediência.
Neste sentido, foram editadas pelo Supremo Tribunal Federal as Súmulas 346 e 476, as quais,
respectivamente, enunciam: “A administração pública pode declarar a nulidade dos seus
próprios atos”, assim como “pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os
tornam ilegais, porque deles não se originam direito, ou revogá-los por motivo de conveniência
ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a
apreciação judicial.”
Todavia, antes da publicação do tema 979, há diversos julgados que orientam que nos casos de
erro administrativo no pagamento de valores de benefícios há que ser demonstrado que o
beneficiário agiu mediante fraude no recebimento do benefício, a fim de preservar a segurança
jurídica das relações jurídicas, conforme se verifica das ementas a seguir transcritas:
“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES
PAGOS EM RAZÃO DE ERRO DA ADMINISTRAÇÃO NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIO.
DESNECESSIDADE. BOA-FÉ DO SEGURADO. HIPOSSUFICIÊNCIA. NATUREZA
ALIMENTAR DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. É incabível a devolução pelos segurados do
Regime Geral da Previdência Social de valores recebidos em decorrência de erro da
Administração Pública. Entendimento sustentado na boa-fé do segurado, na sua condição de
hipossuficiente e na natureza alimentar dos benefícios previdenciários. Agravo regimental
desprovido.
(STJ, Agravo regimental no agravo de instrumento n. 1170485, Relator Felix Fischer, decisão
de 17/11/2009).
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ESPÉCIE RECURSAL INDEVIDA
PARA FINS DE DISCUSSÃO DE MÉRITO. VERIFICAÇÃO DE OMISSÃO QUANTO À
RESPONSABILIDADE DA 2ª RÉ PELAS PARCELAS EM ATRASO. EMBARGOS ACOLHIDOS
PARCIALMENTE. SEM EFEITOS MODIFICATIVOS. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO
INDEVIDO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. VALORES RECEBIDOS DE BOA FÉ. NÃO
CABIMENTO DE RESTITUIÇÃO.
(...)
V. O art. 115, II, da Lei 8.213/91, que prevê a possibilidade de desconto de pagamento de
benefício recebido além do devido, deve ser interpretado de forma restritiva, em virtude da
natureza alimentar do benefício previdenciário. VI. Não se pode penalizar a segunda ré, viúva
do ex-segurado, à reposição de valores recebidos a maior a título de pensão por morte, na
medida em que não restou comprovado qualquer comportamento doloso, fraudulento ou de má-
fé por parte da mesma que pudesse ter concorrido para tal erro. A percepção indevida resultou
do equívoco do INSS, que se negou a conceder administrativamente o benefício à parte autora,
o que proporcionou, então, que a segunda ré recebesse um valor superior àquele que
realmente lhe seria devido. VII. É pacífica a jurisprudência no sentido de não caber desconto no
benefício a título de restituição de valores pagos aos segurados por erro administrativo, em
homenagem ao princípio da irrepetibilidade ou da não devolução de alimentos. VIII. Embargos
de declaração parcialmente acolhidos para reconhecer a omissão apontada, sem efeito
modificativo.
(TRF2, Primeira Turma, Apelação/Reexame Necessário n. 464969, Relatora Desembargadora
Federal Maria Helena Cisne, decisão de 26/10/2010).
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ERRO
ADMINISTRATIVO. DECADÊNCIA. DESCONTO DOS VALORES PAGOS INDEVIDAMENTE.
REPETIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE.
1. Apesar de não ser ignorado que a Administração pode e deve rever os atos, se eivados de
ilegalidade, também não pode ser ignorada a segurança jurídica que deve escudar aqueles
mesmos atos, em especial se o segurado percebe de boa-fé, benefício em valor superior ao
devido, como decorrência de erro administrativo devidamente reconhecido nos autos.
2. Inexistindo má-fé ou fraude, não há que se falar em revisão do ato administrativo após
superado o prazo decadencial.
3. Incabível a devolução de eventuais valores percebidos pelo segurado em decorrência de erro
administrativo, porquanto trata-se de quantia recebida de boa-fé. E, como vem reconhecendo
os Egrégios Tribunais Pátrios, as prestações alimentícias, onde incluídos os benefícios
previdenciários, se percebidas de boa-fé, não estão sujeitas a repetição.
(TRF4, REOAC 200972150004239, Remessa ex officio em ação cível, decisão de 01/12/2009).
No caso dos autos, a autora recebia o benefício assistencial com DIB em 18/09/2008 e DIP em
01/09/2010 e, processo de reavaliação, a autarquia previdenciária apurou que o cônjuge da
autora obteve vínculo empregatício e passou a perceber um salário mínimo de renda,
aumentando, portanto, a renda per capita familiar, razão pela qual foi cessado o benefício e
efetuado o desconto dos valores recebidos pela autora a título de benefício assistencial no
período de 20/03/2018 a 13/10/2018.
Embora tenha ocorrido alteração da renda familiar durante a percepção do benefício, não houve
demonstração por parte do réu de que a autora tenha agido de má-fé, sendo que a boa-fé
somente pode ser elidida por meio de provas consistentes.
Especificamente no tocante à boa fé da administrada, é certo que a revisão levada a efeito em
nenhum momento comprovou, tampouco aventou, a existência de fraude no ato concessório do
benefício, não se podendo jamais presumir a má-fé, mormente quando se trata de verba
alimentar.
Todavia, não há como haver a restituição dos valores já descontados, ainda que reconhecida a
boa-fé da parte autora, uma vez que reconhecidamente declarados como indevidos pelo INSS.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da autora para isentá-la da devolução dos
valores recebidos no período de 20/03/2018 a 13/10/2018, ressalvados os valores já
descontados pelo réu.
Tendo em vista a existência de disposição específica na Lei nº. 9.099/95, não se aplicam
subsidiariamente as disposições contidas no art. 85 da Lei nº 13.105/2015, razão pela qual não
há condenação em honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. LOAS. BENEFÍCIO REVISADO. DEVOLUÇÃO DE VALORES
RECEBIDOS. INEXIGILIDADE. AÇÃO AJUIZADA EM MOMENTO ANTERIOR À PUBLICAÇÃO
DO TEMA 979 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MODULAÇÃO DE EFEITOS. MÁ-FÉ
QUE NÃO SE PRESUME. VALORES JÁ DESCONTADOS NÃO PODEM SER DEVOLVIDOS
UMA VEZ QUE DECLARADOS INDEVIDOS. RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE
PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Vistos e relatados estes
autos em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta Turma Recursal dos Juizados
Especiais Federais da Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, dar parcial provimento
ao recurso da autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
