Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5330586-12.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
19/11/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 24/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RURAL POR INCAPACIDADE LABORAL QUALIDADE DE
SEGURADO ESPECIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Com o advento da Constituição da República de 1988, não mais há distinção entre
trabalhadores urbanos e rurais (artigos 5º, caput, e 7º, da CF/1988), cujos critérios de concessão
e cálculo de benefícios previdenciários regem-se pelas mesmas regras.
- Não comprovada a qualidade de segurado especial da parte autora não é possível a concessão
do benefício não contributivo pretendido, não obstante demonstrada sua incapacidade total e
permanente para o exercício de quaisquer atividades laborais.
- Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, suspensa, porém,
a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5330586-12.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: NEUSA GONSALVES ASSIS RIGO
Advogado do(a) APELANTE: DENISE RODRIGUES MARTINS LIMA - SP268228-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5330586-12.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: NEUSA GONSALVES ASSIS RIGO
Advogado do(a) APELANTE: DENISE RODRIGUES MARTINS LIMA - SP268228-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença que julgou improcedente
o pedido de concessão de benefício rural por incapacidade laboral.
Alega, em síntese, possuir os requisitos legais para a concessão do benefício e requer a reforma
integral do julgado.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5330586-12.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: NEUSA GONSALVES ASSIS RIGO
Advogado do(a) APELANTE: DENISE RODRIGUES MARTINS LIMA - SP268228-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Discute-se nos autos o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício por
incapacidade à parte autora.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal de 1988 (CF/1998),
com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998, que tem o seguinte teor:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e
idade avançada; (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da
CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o
trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade
que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo
59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social,
Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005,
p. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho.
São requisitos para a concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as
condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou de
auxílio-doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n.
8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza,
ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica,
por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo, o juiz
não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos
pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos
autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização são pertinentes a esse tema.
Súmula 33 da TNU: "Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais para a
concessão da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo, esta
data será o termo inicial da concessão do benefício".
Súmula 47 da TNU: “Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez”.
Súmula 53 da TNU: “Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social”.
Súmula 77 da TNU: “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais
quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
Noutro passo, para os trabalhadores rurais segurados especiais, a legislação prevê o pagamento
de alguns benefícios não contributivos, no valor de um salário mínimo (artigo 39, I, da Lei nº
8.213/91).
Depois da edição da Lei n. 8.213/1991, a situação do rurícola modificou-se, pois passou a integrar
sistema único, com os mesmos direitos e obrigações dos trabalhadores urbanos, tornando-se
segurado obrigatório da Previdência Social.
A partir do advento da CF/1988, não mais há distinção entre trabalhadores urbanos e rurais
(artigos 5º, caput, e 7º, da CF/1988), cujos critérios de concessão e cálculo de benefícios
previdenciários regem-se pelas mesmas regras.
Assim, a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença para os
trabalhadores rurais, se atendidos os requisitos essenciais, encontra respaldo na jurisprudência
do Egrégio Superior Tribunal de Justiça e nesta Corte: STJ/ 5ª Turma, Processo 200100465498,
rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 22/10/2001; STJ/5ª Turma, Processo 200200203194, rel.
Min. Laurita Vaz, DJ 28/4/2003; TRF-3ª Região/ 9ª Turma, Processo 20050399001950-7, rel.
juíza Marisa Santos, DJ 10/10/2005; TRF-3ª Região/ 8ª Turma, Processo 200403990027081, rel.
juiz Newton de Lucca, DJ 11/7/2007; TRF-3ª Região/ 10ª Turma, Processo 200503990450310,
rel. juíza Annamaria Pimentel, DJ 30/5/2007.
Pois bem.
No caso dos autos, a autora alega ter exercido atividades rurais, em regime de economia familiar,
até ser acometida de doença incapacitante que a impede de trabalhar.
A perícia médica judicial, realizada no dia 28/5/2019, constatou a incapacidade laboral total e
permanente da autora (nascida em 1953), desde 11/2018, em razão de "insuficiência venosa com
presença de ulcera varicosa, hipertensão arterial e obesidade".
Resta averiguar, entretanto, o exercício de atividades rurais nos doze meses que antecedem o
início da incapacidade laboral da autora.
Como início de prova material do alegado trabalho rural, consta dos autos a) certidão de seu
casamento, ocorrido em 17/1972, na qual seu marido está qualificado como "lavrador" e A autora
"Doméstica"; b) Contrato particular de parceria agrícola, em nome da autora, qualificada como
“lavradora”; c) Escritura Pública lavrada, referente à compra de um imóvel rural, denominado
"Chácara Nossa Senhora Aparecida”, de propriedade do marido da requerente, com área de 4,8
hectares, localizada no município de Osvaldo Cruz; d) Notas Fiscais de Produtor Rural, em nome
de seu patrão, fazenda menção à venda de café,em nome do marido da requerente nos meses
de 05/2003, 10/2004, 06/2005, 18/2006, 06/2007, 08/2008, 08/2009, 03/2013, 08/2010, 08/2011,
08/2013, e e) Declaração de Trabalhador Rural em seu nome, com data de início em 08/1992.
Assim, não há outros elementos de convicção, em nome da autora, capazes de estabelecer liame
entre o ofício rural alegado e a forma de sua ocorrência, mormente nos doze meses que
antecedem o início da incapacidade laboral, pois o início de prova material é assaz antigo.
A prova testemunhal, por outro lado, formada por três depoimentos, atesta que a autora sempre
trabalhou em propriedade rural juntamente com sua família até 2014.
Observo, ainda, que os dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) revelam que
o cônjuge da autora - Onofri Rigo - é trabalhador urbano desde 9/1982 e atualmente recebe
aposentadoria por tempo de contribuição desde 25/10/1995.
Ademais, as notas ficais datadas de 2009 a 2013 demonstram a realização de venda de grande
monta, circunstância incompatível com a condição de regime de economia familiar, porque a
autora e o marido possuem plena capacidade contributiva de recolher contribuições à previdência
social.
Além disso, nos termos do artigo 11, § 9º, da Lei n. 8.213/1991, com a redação da Lei n.
11.718/2008, não é segurado especial o grupo familiar que possua outra fonte de rendimento. No
caso, o grupo familiar possui outra fonte de rendimento há décadas, consistindo inicialmente no
trabalho do marido como urbano e após sua aposentadoria por tempo de contribuição.
Evidente que, num regime de previdência social em que os urbanos e rurais possuem regime
único desde 1991 (artigo 194, § único, da CF/1998, que conforma o princípio da uniformidade e
equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais), não é razoável que se
conceda benefícios não contributivos para quem possui plena capacidade econômica de
contribuição.
Como se vê, a autora não logrou carrear indícios razoáveis de prova material capazes de
demonstrar a faina agrária aventada, mormente em regime de economia familiar.
Nesse passo, concluo pelo não preenchimento dos requisitos necessários à concessão do
benefício pleiteado.
Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, suspensa, porém,
a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de
beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RURAL POR INCAPACIDADE LABORAL QUALIDADE DE
SEGURADO ESPECIAL. NÃO COMPROVAÇÃO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- Com o advento da Constituição da República de 1988, não mais há distinção entre
trabalhadores urbanos e rurais (artigos 5º, caput, e 7º, da CF/1988), cujos critérios de concessão
e cálculo de benefícios previdenciários regem-se pelas mesmas regras.
- Não comprovada a qualidade de segurado especial da parte autora não é possível a concessão
do benefício não contributivo pretendido, não obstante demonstrada sua incapacidade total e
permanente para o exercício de quaisquer atividades laborais.
- Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de
advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados
em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, suspensa, porém,
a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de
beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
