Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001402-37.2019.4.03.6336
Relator(a)
Juiz Federal GABRIELA AZEVEDO CAMPOS SALES
Órgão Julgador
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
30/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 07/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BOLSA-FAMÍLIA. Concessão do benefício condicionada à elegibilidade do
postulante e à disponibilidade de recursos destinados a cada município. Impossibilidade de
concessão sem a observância daordem de cadastro de potenciais beneficiários. Legalidade da
cessação do benefício anterior. Sentença mantida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
13ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001402-37.2019.4.03.6336
RELATOR:39º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: IZAQUE JERONIMO
Advogado do(a) RECORRENTE: HORACIDES MARTINS - SP412222
RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001402-37.2019.4.03.6336
RELATOR:39º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: IZAQUE JERONIMO
Advogado do(a) RECORRENTE: HORACIDES MARTINS - SP412222
RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o
pedido concessão de benefício Bolsa Família.
A parte autora recorre argumentando fazer jus ao benefício postulado, pois sua renda per
capitaé de R$ 80,00 (oitenta reais), advindas de trabalho informal como coletor de recicláveis e
que não está mais trabalhando, por não poder mais juntar em sua residência reciclagem, em
razão das reclamações de seus vizinhos. Requer a reforma da sentença ora atacada e
conceder o benefício ora pleiteado em razão de sua vulnerabilidade; b) alternativamente, caso
não seja de entendimento dessa turma, anular a sentença proferida e determinar a realização
de nova perícia, pela assistência local.
Houve contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001402-37.2019.4.03.6336
RELATOR:39º Juiz Federal da 13ª TR SP
RECORRENTE: IZAQUE JERONIMO
Advogado do(a) RECORRENTE: HORACIDES MARTINS - SP412222
RECORRIDO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Rejeito o pedido de anulação da sentença, uma vez que desnecessária e impertinente a
realização de perícia socioeconômica, na medida em que é incontroversa a miserabilidade da
parte autora.
No mérito, a Lei 9.099/1995, em seu artigo 46, permite que, em grau de recurso, a sentença
seja confirmada por seus próprios fundamentos.
Esta é a solução a ser adotada no caso em pauta, isso porque todas as questões de fato e de
direito relevantes ao julgamento da demanda foram corretamente apreciadas em primeiro grau
de jurisdição. Extrai-se da sentença o seguinte excerto, que destaco como razão de decidir:
“A Lei nº 10.836, de 09 de janeiro de 2004, criou o programa Bolsa Família, destinado às ações
de transferência de renda a unidades familiares que se encontrem em situação de pobreza
(renda per capita de até R$178,00) ou extrema pobreza (renda per capita de até R $89,00).
Estabelece o art. 2º da citada lei quatro modalidades do benefício de bolsa família: I - o
benefício básico, destinado a unidades familiares que se encontrem em situação de extrema
pobreza, no valor mensal de R$89,00; II - o benefício variável, destinado a unidades familiares
que se encontrem em situação de pobreza e extrema pobreza e que tenham em sua
composição gestantes, nutrizes, crianças entre 0 (zero) e 12 (doze) anos ou adolescentes até
15 (quinze) anos, sendo pago até o limite de 5 (cinco) benefícios por família; III - o benefício
variável, vinculado ao adolescente, destinado a unidades familiares que se encontrem em
situação de pobreza ou extrema pobreza e que tenham em sua composição adolescentes com
idade entre 16 (dezesseis) e 17 (dezessete) anos, sendo pago até o limite de 2 (dois) benefícios
por família; IV - o benefício para superação da extrema pobreza, no limite de um por família,
destinado às unidades familiares beneficiárias do Programa Bolsa Família e que,
cumulativamente: tenham em sua composição crianças e adolescentes de 0 (zero) a 15
(quinze) anos de idade; e apresentem soma da renda familiar mensal e dos benefícios
financeiros igual ou inferior a R$ 70,00 (setenta reais) per capita.
Regulamentando a Lei nº 10.836/2004, o Decreto nº 5.209/2004 dispõe que o ingresso das
famílias no Programa Bolsa Família ocorrerá na forma estabelecida pelo Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, após o registro de seus integrantes no Cadastro
Único para Programas Sociais do Governo Federal (art. 17-A). As famílias elegíveis ao
Programa Bolsa Família, identificadas no Cadastramento Único do Governo Federal, serão
selecionadas a partir de um conjunto de indicadores sociais capazes de estabelecer com maior
acuidade as situações de vulnerabilidade social e econômica, que obrigatoriamente deverá ser
divulgado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, incorporando-as,
gradualmente, ao programa, desde que atendidos os critérios de elegibilidade, observada a
disponibilidade orçamentária e financeira (art. 18).
As famílias atendidas pelo Programa Bolsa Família permanecerão com os benefícios liberados
mensalmente para pagamento, salvo na ocorrência de algumas situações, dentre elas, por
omissões de informações necessárias à habilitação do declarante e de sua família ao
recebimento do benefício financeiro (art. 25, III, primeira parte, do Decreto nº 5.209/2004).
A Portaria GM/MDS nº 321 prescreve que o descumprimento das condicionantes sujeita as
famílias beneficiárias ao bloqueio, suspensão ou cancelamento do benefício financeiro pela
Senarc (arts. 4º e 10).
A Portaria nº 555, de 11 de novembro de 2005, do Ministério do Desenvolvimento e Combate à
Fome (MDS), estatui que a não realização da revisão cadastral da família beneficiária do PBF
no prazo normativo e a omissão de informação implicam o cancelamento do benefício (art. 8º,
VII e VIII).
O Ofício nº 611/2019/MC/SEDS/SENAR/GAB-ASTEC da Secretaria Nacional de Renda de
Cidadania do Ministério da Cidadania (evento 12), de lavrada da servidora pública federal
Sheila Benjuino de Carvalho, elucida que o autor efetuou inscrição no Cadastramento Único do
Governo Federal (NIS 17049299357), atualizada em outubro/2019, tendo declarado ser o
responsável pela unidade familiar, cuja renda per capita é de R$70,00 (setenta reais). Atesta
que, em consulta ao Sistema de Benefício ao Cidadão (Sibec) e ao Sistema de Pagamentos
Sociais (Sipas), o autor teve o benefício bloqueado, em 11/2017, por "família não localizada no
endereço informado no Cadastro Único", e cancelado, em 02/2018, por "família sem indicação
de responsável Familiar no Cadastro Único", em obediência ao Decreto nº 5.209/2004 c/c a
Portaria nº 555/2005. Minudencia que, em razão do cancelamento do benefício, o autor teve
que aguardar nova concessão do benefício. Adverte, contudo, que a família do autor está
elegível ao Programa, porém a concessão do benefício depende de disponibilidade
orçamentária. Pontua, ao final, que a habilitação ao PBF é realizada de forma impessoal por
meio de um sistema informatizado, cujos dados contendo a quantidade de cadastros válidos, a
quantidade de famílias que se encaixam nas regras para concessão de benefícios e o
percentual de cobertura da estimativa oficial de famílias pobres são avaliados a cada processo
de seleção. Enfatizou que cada Município possui uma estimativa de famílias pobres, definida a
partir dos dados do Censo Demográfico de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE), e é priorizado o atendimento aos municípios com baixa cobertura e às
famílias em situação de maior pobreza.
Analisando os autos, verifica-se que restou comprovada a condição de extrema pobreza do
autor, com renda mensal inferior a R$ 70,00 (setenta reais), para a sobrevivência própria. O
extrato CNIS não indica o exercício de atividade remunerada, haja vista que o último vínculo
empregatício findou-se em 30/07/2016 (empregador Denilson Pedroso).
Da leitura do art. 1º da Lei nº 10.836/2004 depreende-se que a concessão do benefício não
está baseada apenas na simples necessidade de transferência de renda, devendo seguir uma
série de condicionalidade, dentre elas, a disponibilidade orçamentária:
Art. 6º. As despesas do Programa Bolsa Família correrão à conta das dotações alocadas nos
programas federais de transferência de renda e no Cadastramento Único a que se refere o
parágrafo único do art. 1º , bem como de outras dotações do Orçamento da Seguridade Social
da União que vierem a ser consignadas ao Programa.
Parágrafo único. O Poder Executivo deverá compatibilizar a quantidade de beneficiários e de
benefícios financeiros específicos do Programa Bolsa Família com as dotações Orçamentárias
existentes.
Os critérios adotados para compatibilizar a concessão dos benefícios com as dotações
orçamentárias estão previstos no Decreto nº 5.209/2004 e na Portaria nº. 341/2008 do
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (destaquei):
Art. 2º A realização das atividades operacionais para ingresso de famílias no Programa Bolsa
Família - PBF dependerá de: I - cadastramento prévio das famílias no Cadastro Único para
Programas Sociais do Governo Federal - CadÚnico, regido pelo Decreto n° 6.135, de 26 de
junho de 2007; (...)
§ 2º O cadastramento das famílias no CadÚnico não implica ingresso no PBF.
Art. 3º Constituem processos operacionais necessários ao ingresso de famílias no PBF: I -
habilitação; II - seleção; e III - concessão. (...)
Art. 9º A concessão é o processo operacional que, vinculado aos limites quantitativos obtidos a
partir da seleção, permite identificar individualmente cada uma das famílias que ingressarão no
PBF em determinada folha de pagamentos do Programa.
Parágrafo único. Havendo excedente municipal de cadastros habilitados face ao limite
quantitativo da seleção, será dada prioridade aos cadastros das famílias com menor renda
mensal per capita e maior número de crianças e adolescentes de zero a dezessete anos, sem
prejuízo da utilização dos mecanismos previstos no § 1º do art. 18 do Decreto nº 5.209, de
2004.
A simples inscrição no Cadastramento Único do Governo Federal não assegura, por si só, a
automaticidade da habilitação da família no programa assistencial.
Os recursos destinados ao benefício assistencial apresentam um limite imposto que não deve
exceder a previsão que anualmente é divulgada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome. Com efeito, o simples cadastramento é insuficiente para o imediato
recebimento do benefício, porquanto a concessão é condicionada a limites quantitativos, não
podendo haver um excedente municipal.
No caso em concreto, o documento anexado no evento 12 faz prova de que o autor encontrava-
se habilitado no programa Bolsa Família, tendo sido bloqueado o benefício financeiro em
novembro/2017, por não localização da família no endereço indicado no CadÚnico, e cancelado
em 18/02/2018, por ausência de indicação do responsável familiar no cadastro.
Notório que o autor deu causa direta ao cancelamento do benefício. Realizado novo
procedimento de habilitação, embora tenha sido declarado como elegível em razão de se tratar
de pessoa em situação de extrema pobreza, a concessão do benefício financeiro depende do
cumprimento do requisito estabelecido pelo art. 6º da Lei nº 10.836/2004.
Ademais, havendo excedente municipal de cadastros habilitados face ao limite quantitativo da
seleção, deve ser dado prioridade aos cadastros das famílias com menor renda mensal per
capita e maior número de crianças e adolescentes de zero a dezessete anos, sem prejuízo da
utilização dos mecanismos previstos no § 1º do art. 18 do Decreto nº 5.209, de 2004. In casu, o
autor é solteiro, não tem filhos, razão pela qual, a despeito da situação de extrema pobreza, a
concessão judicial do benefício Bolsa Família poderá implicar prejuízo às famílias que estão em
situação de prioridade legal.
Dessarte, não merece ser acolhida a pretensão do autor”.
A decisão recorrida não comporta qualquer reparo, eis que proferida com base em minudente
apreciação da prova e à luz dos parâmetros fixados pela legislação e pela jurisprudência em
relação à matéria controvertida. Considerando as regras de regência do Bolsa-Família, a
elegibilidade não é suficiente para a concessão do benefício, que depende também do conjunto
da população elegível no município e dos recursos disponibilizados. Diante dessas regras, o
deferimento judicial do benefício seria admissível se verificado erro no ato administrativo de
cessação do benefício -o que não é o caso -, mas não para uma nova concessão.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
Condeno a parte recorrente ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% do valor
da causa, atualizados na data do pagamento, nos termos do artigo 55 da Lei 9.099/1995. A
execução dessa verba fica condicionada ao disposto no artigo 98, §3º, do Código de Processo
Civil, por ser a parte recorrente beneficiária da assistência judiciária gratuita.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. BOLSA-FAMÍLIA. Concessão do benefício condicionada à elegibilidade do
postulante e à disponibilidade de recursos destinados a cada município. Impossibilidade de
concessão sem a observância daordem de cadastro de potenciais beneficiários. Legalidade da
cessação do benefício anterior. Sentença mantida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Terceira
Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
