Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / MS
0001553-71.2015.4.03.6003
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
14/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO. PEDIDO DE REPETIÇÃO DE
INDÉBITO. ERRO ADMINISTRATIVO. RESP 1.381.734/RN TESE 979 STJ. NÃO CABIMENTO.
- Aplicação da Tese 979 do E. STJ: “Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu
desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a
hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo
com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.”
- Demonstrado, in casu, a boa-fé da parte autora, que não reunia condições de notar eventual
equívoco do INSS no pagamento de benefícios deferidos administrativamente em datas próximas,
além do caráter alimentar do benefício, deve ser aplicado o princípio da irrepetibilidade dos
valores pagos pelo INSS.
- Recurso a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0001553-71.2015.4.03.6003
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: MANOEL ZEFERINO DE MAGALHAES NETO - MS14971-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0001553-71.2015.4.03.6003
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: MANOEL ZEFERINO DE MAGALHAES NETO - MS14971-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Mandado de segurança interposto objetivando a determinação de suspensão do desconto, dos
valores percebidos pela parte autora a título de aposentadoria por invalidez previdenciária (NB
109.260.125-0), de parcela do montante que lhe foi pago a título de auxílio suplementar de
acidente de trabalho (NB 077.178.949-1) no interregno compreendido entre 10/9/2005 e
24/3/2015, posteriormente tido como indevido pelo ente autárquico em virtude da
impossibilidade de recebimento cumulativo de ambos por força do art. 167 do Decreto-Lei
3.048/1999.
Foi deferida a antecipação dos efeitos da tutela para suspender os descontos efetuados pelo
ente autárquico aos proventos mensais do benefício previdenciário recebido pelo autor (Id.
143005794, p. 8-9)
O juízo a quo concedeu a segurança, tal qual formulada pelo impetrante, determinando ao INSS
que “se abstenha de promover descontos da renda mensal da aposentadoria por invalidez NB
109.260.125-0 para cobrar as parcelas indevidamente pagas do auxílio-suplementar de
acidente de trabalho NB 077.178.949-1, confirmando a liminar exarada.” Determinou a remessa
obrigatória dos autos para reexame, nos termos do art. 14, § 1º, da Lei nº. 12.016/09.
Apela, o INSS, pleiteando a integral reforma da sentença, argumentando, em síntese, a
legalidade do procedimento adotado pelo INSS no sentido de promover o ressarcimento ao
erário de benefícios cumulados indevidamente pela parte autora, pelo que a segurança
concedida deve ser cassada. Se vencido, pede a fixação de percentual de desconto em valor
menor que o teto legal (30%), “viabilizando tanto o ressarcimento ao erário quanto a
manutenção da dignidade do segurado”.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento do recurso autárquico (Id.
144211290, p. 1-4).
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0001553-71.2015.4.03.6003
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: PEDRO DEODATO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: MANOEL ZEFERINO DE MAGALHAES NETO - MS14971-A
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Trata-se de pedido de reconhecimento da inexigibilidade de valores cobrados
administrativamente pelo INSS, após constatação de indevida cumulação de percepção de
benefícios no período de 21/10/1998 a 24/3/2015, conforme “Ofício nº 06.001.09.0/0175/2015”,
datado de 24/3/2015, que teve por objeto a suspensão do auxílio suplementar decorrente de
acidente de trabalho de registro nº 077.178.949-1, de seguinte teor (Id. 143005793, p. 11-12):
“Conforme ofício 745 expedido em 20/11/2014, em consulta aos sistemas internos desta
autarquia, foi verificado que Vossa Senhoria aufere 02 (dois) benefícios previdenciários, auxílio
suplementar decorrente de acidente de trabalho (desde 01/07/1983) e aposentadoria por
invalidez (desde 21/1 0/1998).
Ocorre que o artigo 167, do regulamento da previdência social , aprovado pelo decreto 3048/99,
bem como o artigo 421, XVll, da IN45ANNS/2010, vedam expressamente a acumulação dos
dois benefícios, sendo possível a percepção de apenas um deles.
Assim sendo, os valores auferidos indevidamente deverão ser ressarcidos aos cofres públicos
bem como um deles deverá ser suspenso/cessado.
Abriu-se prazo de 10 (dez) dias para apresentação de defesa. Contudo, embora
ciente, conforme aviso de recebimento, o prazo transcorreu-se sem sua manifestação.
Face ao exposto, o benefício 077.178.949-1 foi suspenso, o período de recebimento indevido é
de 21/10/1998 (data da concessão da aposentadoria por invalidez) até a presente data.
Como não existe comprovação de má fé os valores a serem devolvidos referem-se: 10/09/2005
até a presente data, calculando R$ 18.974,70, levando-se em consideração a opção pelo
benefício mais vantajoso e respeitado o período prescricional. Referido valor será consignado
da Aposentadoria por lnvalidez n° 109.260.125-0 sendo descontado 30% (trinta por cento) da
renda mensal até quitação total do débito.”
O juízo a quo registrou, na decisão atacada, in verbis (Id. 132695819):
“Da análise dos documentos constantes nos autos, extrai-se que a parte autora recebeu de boa
fé o benefício de auxílio-suplementar de acidente de trabalho. Em outras palavras, não há prova
da má-fé do titular do benefício no recebimento dos valores pagos.
Ademais, deve-se considerar o caráter alimentar do benefício de auxílio-suplementar, o que
impõe a irrepetibilidade das parcelas pagas por erro da Administração e recebida de boa fé.”
Assim é que a questão sub judice envolve a necessidade ou não de devolução de valores
recebidos pelo autor a título de auxílio suplementar de acidente de trabalho no interregno
compreendido entre 10/9/2005 e 24/3/2015, posteriormente tido como indevido pelo ente
autárquico em virtude da impossibilidade de recebimento cumulativo do benefício com a
aposentadoria por invalidez que lhe foi concedida em 21/10/1998, por força do art. 167 do
Decreto-Lei 3.048/1999, em face de erro administrativo que resultou na manutenção do
pagamento de ambos (Ids. 143005793, p. 15, e 143005794, p. 4).
A esse respeito, o Colendo Superior Tribunal de Justiça proferiu acórdão de afetação cuja
ementa segue transcrita:
“DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE
BOA-FÉ. EM RAZÃO DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA, MÁ APLICAÇÃO DA LEI OU ERRO
DA ADMINISTRAÇÃO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL.
1. Delimitação da controvérsia: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de
benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da
Administração da Previdência Social.
2. Recurso especial afetado ao rito do art. 1.036 e seguintes CPC/2015 e art. 256-I do RISTJ,
incluído pela Emenda Regimental 24, de 28/09/2016.”
Sobreveio, em 10/3/2021, através do julgamento do REsp 1.381.734/RN (tema repetitivo 679),
decisão de seguinte teor:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991.
DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E
MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO.
POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS
ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA
PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada
ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à
hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio
também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou
assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e
similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à
suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte
tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por
força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência
Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má
aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má
aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque
também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser
aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a
sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução
dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível
que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a
presença da
boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas
situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma
inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração
previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos
objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale
dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro,
necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n.
3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou
indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de
erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o
devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com
desconto no benefício no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o
seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal,
ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé
objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento
indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste
representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável
interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a
centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os
processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste
acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá
ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade
de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de
simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na
exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos
benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da
vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos
efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente
pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.”
(Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.381.734 - RN (2013/0151218-2). Rel. Ministro BENEDITO
GONÇALVES. Órgão julgador 1ª SEÇÃO. Data do julgamento 10/3/2021. Data de publicação
DJ. 23/4/2021)
Do voto do Ministro relator se infere que, face ao poder-dever da Administração Pública de
rever seus próprios atos, quando eivados de vícios insanáveis, é imperativo que, diante de erro
administrativo no deferimento de benefícios previdenciários, instaure-se, incontinenti, processo
administrativo de suspensão, respeitado o devido processo legal, em atendimento ao quanto
preconizado pela Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal, in verbis: "A administração pode
anular seus próprios atos,quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se
originam direitos".
Nesse sentido, a jurisprudência pátria consolidou-se no sentido de que, nos casos de errônea
interpretação e/ou má aplicação da lei, por parte da Administração Pública, ora representada
pelo ente autárquico, não pode ser o beneficiário penalizado com a devolução de verba de
caráter alimentar paga além do devido, irrepetível, portanto, na medida em que não é razoável
imputar-lhe a necessidade de profundo conhecimento das leis previdenciárias e processuais, a
indicar possível erro administrativo nos cálculos. Presume-se, destarte, a boa-fé o objetiva do
beneficiário, cabendo ao ente autárquico cercar-se da cautela necessária na aplicação dos
ditames normativos.
Diversa é a situação em que o recebimento indevido decorre de erro da Administração
Previdenciária, em que se deve aprofundar a avaliação do quadro fático de forma a determinar
se, in casu, o beneficiário “tinha condições de compreender a respeito do não pertencimento
dos valores recebidos, de modo a se lhe exigir comportamento diverso, diante do seu dever de
lealdade para com a Administração Previdenciária”, conforme registrou o Eminente Relator, que
concluiu poder-se “afirmar com segurança que o caso de erro material ou operacional, para fins
de ressarcimento administrativo do valor pago indevidamente, deve averiguar a presença da
boa-fé do segurado/beneficiário, concernente na sua aptidão para compreender, de forma
inequívoca, a irregularidade do pagamento”.
Nesse sentido, restou aprovada tese no sentido de que “Com relação aos pagamentos
indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não
embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis,
sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício
pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso
concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era
possível constatar o pagamento indevido”.
Como se vê, e na linha do quanto decidido pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal
de Justiça em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos ao fixar a tese a que se fez
referência, supra, diante de casos de erro material ou operacional, como o que ora se analisa,
deve-se averiguar a presença da boa-fé do segurado, concernente à sua aptidão para
compreender, de forma inequívoca, a irregularidade do pagamento indevido, o que, em absoluto
se faz presente nos presentes autos.
Com efeito, da análise dos autos é possível inferir que a parte autora teve deferido, em
1º/7/1983, o pedido de concessão do benefício de auxílio suplementar decorrente de acidente
de trabalho (NB 077.178.949-1) e, posteriormente, em 21/10/1998, obteve êxito, também em
âmbito administrativo, na concessão do benefício de aposentadoria por invalidez (NB
109.260.125-0), passando a perceber cumulativamente ambos os valores mensais.
Necessário pontuar, para a adequada análise do caso sub judice, que o benefício de auxílio
suplementar foi instituído pela Lei 6.367, de 19 de outubro de 1976, e regulamentado pelo
Decreto nº 79.037, de 24 de dezembro de 1976, cujo escopo era dar fiel execução à primeira,
que dispunha sobre “o seguro de acidentes do trabalho a cargo do Instituto Nacional de
Previdência Social (INPS)”.
Nesse sentido é que instituídos dois benefícios destinados ao acidentado em trabalho “após a
consolidação das lesões resultantes do acidente”, quais sejam, o auxílio suplementar e o auxílio
acidente, este devido àquele que “permanecer incapacitado para a atividade que exercia na
época do acidente, mas não para outra” (art. 19º do Decreto) e aquele devido ao trabalhador
que “apresentar, como seqüela definitiva, perda anatômica ou redução da capacidade funcional
constante da relação que constitui o Anexo III, a qual, embora sem impedir o desempenho da
mesma atividade, demande permanentemente maior esforço na realização do trabalho”,
conforme art. 21 do mesmo diploma legal.
Ainda de acordo com a norma então vigente, o auxílio-acidente era devido à razão de 40% do
salário-de-contribuição, podendo ser somar a qualquer outro benefício não resultante de
acidente de trabalho, ao passo que o auxílio-suplementar correspondia a 20% do salário-de-
contribuição e deveria ser cessado “com a concessão de aposentadoria de qualquer espécie”.
Com o advento da Lei nº 8.213/91, a disciplina legal do auxílio suplementar foi totalmente
absorvida pela do auxílio-acidente, previsto no artigo 86 e parágrafos, referentes ao auxílio-
acidente.
O auxílio-acidente é benefício mensal de natureza previdenciária e de caráter indenizatório
(inconfundível com a indenização civil aludida no artigo 7°, inciso XXVIII, da Constituição da
República), pago aos segurados empregados, trabalhador avulso e especial, visando à
compensação da redução de sua capacidade para o trabalho que habitualmente exercia, em
razão do fortuito ocorrido.
A princípio, era benefício vitalício, pago enquanto o segurado acidentado vivesse e, de acordo
com a redação original do artigo 86, § 1º, da Lei nº 8.213/91, correspondente a 30%, 40% ou
60% de seu salário-de-benefício. Com a alteração introduzida pela Lei n° 9.032/95, passou a
ser pago no valor de 50% do salário-de-benefício do segurado. Tal percentual foi mantido com a
Lei nº 9.528/97, incidindo, o benefício, a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-
doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado,
vedada sua a cumulação com qualquer espécie de aposentadoria (artigo 86, §§ 1º e 2º).
Em sua redação original, a Lei n° 8.213/91 previa, no artigo 86, § 3º, que "o recebimento de
salário ou concessão de outro benefício não prejudicará a continuidade do recebimento do
auxílio-acidente", permitindo a cumulação de benefícios.
Com as modificações introduzidas pela Lei nº 9.528/97 de 10 de dezembro de 1997, houve
significativa alteração no § 3º, do artigo supracitado, que passou à seguinte redação:
"§ 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria,
observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-
acidente."
A partir da vigência da Lei nº 9.528, de 10 de dezembro de 1997, vedou-se a percepção
conjunta do auxílio-acidente com o benefício previdenciário de aposentadoria, perdendo a
característica da vitaliciedade, pois o artigo 31, da Lei nº 8.213/91, também alterado pela lei em
comento, possibilitou a integração dos valores recebidos a título de auxílio-acidente ao salário-
de-contribuição para fins do cálculo do salário-de-benefício de aposentadoria, nos seguintes
termos:
"Art. 31. O valor mensal do auxílio-acidente integra o salário-de-contribuição, para fins de
cálculo do salário-de-benefício de qualquer aposentadoria, observado, no que couber, o
disposto no artigo 29 e no artigo 86, § 5º."
A respeito, esclarece a doutrina:
"Esta prestação não se destinava a substituir, integralmente, a renda do segurado, uma vez que
a eclosão do evento danoso não impossibilitou o segurado de desempenhar atividade laborativa
para dela extrair o seu sustento. O risco social causa-lhe uma maior dificuldade em razão da
diminuição da capacidade de trabalho. Aí reside a finalidade da prestação, compensar a
redução da capacidade de lavor, e não substituir o rendimento do trabalho do segurado. Com o
surgimento da Lei nº 9.528, e as modificações operadas nos artigos 31, 34 e no § 3º, do art. 86,
do Plano de Benefícios, o valor mensal percebido a título de auxílio-acidente foi incluído, para
fins de cálculo, no salário-de-contribuição, e o benefício deixou de ser vitalício. Até
recentemente, levando-se em conta a disciplina legal vigente, não nos parecia adequado
computar os valores percebidos a título de auxílio-acidente no cálculo de outro benefício
previdenciário, isto é, acrescendo aos salários-de-contribuição integrantes do período apurativo
a renda mensal do benefício de auxílio-acidente . Efetivamente, a materialização de uma
contingência social mitigou a capacidade laboral do segurado implicando a diminuição da sua
possibilidade de auferir um maior nível de rendimento. Em função disto, era correto se concluir
que eventual prejuízo sofrido nos rendimentos laborais se projetava no cálculo dos benefícios
previdenciários de natureza substitutiva. Inobstante, ele não devia ser valorado no período
básico de cálculo pela singela razão de ser um benefício vitalício. Assim, como a concessão de
qualquer outro benefício não atingia o direito de continuar percebendo a prestação, se a renda
deste fosse somada aos salários-de-contribuição resultaria em uma valoração dúplice contrária
aos princípios previdenciários, principalmente os relativos ao custeio."
(Op cit, pp. 315, apud Daniel Machado da Rocha, Temas de Direito Previdenciário e Assistência
Social. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2003).
In casu, portanto, tendo em vista que a autora teve reconhecido o direito ao benefício de
aposentadoria por invalidez em 21/10/1998, ou seja, quando já em vigor a MP nº 1596-14,
convertida na Lei nº 9.528/97, que conferiu nova redação aos artigos 31 e 86, § 3º, da Lei nº
8.213/91, vedando a cumulação dos benefícios, sequer é possível advogar a tese da existência
de direito adquirido à cumulação, em face da concessão do primeiro benefício, de auxílio-
suplementar, anteriormente à edição da Lei nº 9.528/97.
Logo, embora de fato a autora não fizesse jus à percepção conjunta dos benefícios, diante das
mudanças legislativas acima resumidas, não seria razoável esperar que a parte autora tivesse
condições técnicas de avaliar eventual impossibilidade de cumulação de benefícios
previdenciários, dos quais um teve a própria denominação alterada, a justificar possível
equívoco do ente autárquico em pedido administrativo por ela formulado de aposentadoria por
invalidez inacumulável.
Some-se que o próprio ente autárquico, no ofício que inaugurou a presente lide, registra a
inexistência de má-fé por parte da parte autora no caso em análise: “(...) Face ao exposto, o
benefício 077.178.949-1 foi suspenso, o período de recebimento indevido é de 21/10/1998 (data
da concessão da aposentadoria por invalidez) até a presente data. Como não existe
comprovação de má fé os valores a serem devolvidos referem-se: 10/09/2005 até a presente
data, calculando R$ 18.974,70, levando-se em consideração a opção pelo benefício mais
vantajoso e respeitado o período prescricional. Referido valor será consignado da
Aposentadoria por lnvalidez n° 109.260.125-0 sendo descontado 30% (trinta por cento) da
renda mensal até quitação total do débito.” (Ofício nº 06.001.09.0/0175/2015 constante do Id.
143005793, p. 11-12)
Tudo a evidenciar, portanto, a necessidade do reconhecimento da boa-fé da parte autora
quanto ao recebimento e gozo de benefícios cujos valores ora se pretende reaver, devendo o
INSS arcar com os custos decorrentes do erro material/operacional verificado.
Posto isso, nego provimento ao recurso do INSS.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO. PEDIDO DE REPETIÇÃO DE
INDÉBITO. ERRO ADMINISTRATIVO. RESP 1.381.734/RN TESE 979 STJ. NÃO
CABIMENTO.
- Aplicação da Tese 979 do E. STJ: “Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados
decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação
errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o
seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal,
ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé
objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento
indevido.”
- Demonstrado, in casu, a boa-fé da parte autora, que não reunia condições de notar eventual
equívoco do INSS no pagamento de benefícios deferidos administrativamente em datas
próximas, além do caráter alimentar do benefício, deve ser aplicado o princípio da
irrepetibilidade dos valores pagos pelo INSS.
- Recurso a que se nega provimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
