D.E. Publicado em 30/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa oficial e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0001003-77.2014.4.03.6111/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora busca o enquadramento de atividade insalubre, com vistas à concessão de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido para enquadrar os lapsos especiais de 12/11/1986 a 14/9/1993, de 3/1/1995 a 4/8/1995 e de 20/4/2007 a 18/7/2007, com a consequente concessão da aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, desde a data da citação (14/5/2014), com correção monetária e acréscimo de juros de mora e determinou a sucumbência recíproca.
Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a parte autora interpôs apelação, na qual requer a anulação da sentença para realização de prova pericial. No mérito, exora a procedência total do pleito.
Sem contrarrazões da parte autora, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
Considerando que a r. sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não se aplicam as novas regras previstas no artigo 496 e §§ do Novo CPC.
Quanto à tese preliminar de cerceamento de defesa, cabe ressaltar o fato de que a parte autora detém o ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos de seu direito, por meio de prova suficiente e segura, nos termos do artigo 333, I, do CPC/1973.
Nesse aspecto, para demonstração da natureza especial do labor desenvolvido nos lapsos vindicados, deveria a parte suplicante ter carreado documentos aptos certificadores das condições insalubres em que permaneceu exposta, com habitualidade e permanência, cabendo ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o deferimento de prova pericial para confrontação do material reunido à exordial.
Assim, à míngua de prova documental descritiva das condições insalubres no ambiente laboral do obreiro, despicienda revela-se a produção de prova pericial para o deslinde da causa, não se configurando cerceamento de defesa ou violação de ordem constitucional ou legal.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Busca a parte autora o enquadramento dos seguintes períodos: de 18/4/1977 a 30/12/1977, de 2/1/1978 a 27/7/1978, de 15/8/1978 a 28/2/1980, de 16/6/1980 a 10/9/1980, de 20/9/1980 a 31/12/1984, de 12/11/1986 a 14/9/1993, de 18/10/1994 a 21/12/1994, de 3/1/1995 a 4/8/1995, de 7/8/1995 a 16/7/1996, de 1º/8/1996 a 8/10/2001, de 9/4/2002 a 2/9/2002, de 27/11/2002 a 2/1/2003, de 6/1/2003 a 4/7/2003, de 4/7/2003 a 9/11/2004, de 6/7/2005 a 2/11/2005, de 10/11/2005 a 18/1/2006, de 6/2/2006 a 6/5/2006, de 1º/7/2006 a 1º/11/2006, de 27/11/2006 a 25/2/2007, de 20/4/2007 a 18/7/2007, de 19/8/2007 a 18/6/2008 e de 19/6/2008 a 30/10/2013, resultando, segundo seus cálculos, tempo suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria especial (25 anos de atividade insalubre), ou alternativamente, aposentadoria por tempo de contribuição.
Senão vejamos.
Quanto aos intervalos enquadrados como especiais, de 12/11/1986 a 14/9/1993, de 3/1/1995 a 4/8/1995 e de 20/4/2007 a 18/7/2007, consta "Perfil Profissiográfico Previdenciário" (PPP), o qual anota a exposição, habitual e permanente, a ruído superior aos limites de tolerância estabelecidos na norma em comento.
Em relação ao lapso de 7/8/1995 a 16/7/1996, o PPP informa a atividade de pintor industrial, utilizando inclusive, revólver para pintura, o que viabiliza o enquadramento pela atividade - códigos 2.5.4 do anexo do Decreto n. 53.831/64 e 2.5.3 do anexo do Decreto 83.080/79.
Já em relação ao intervalo de 1º/8/1996 a 8/10/2001, é possível o enquadramento por categoria profissional de "pintor" até 5/3/1997, porquanto o PPP atesta a utilização de pistola de pintura a ar comprimido.
Os períodos de 6/3/1997 a 8/10/2001, de 4/7/2003 a 9/11/2004, de 19/8/2007 a 18/6/2008 e de 19/6/2008 a 30/10/2013 devem ser computados como comuns, pois os PPPs atestam, em relação a esses interregnos, que o ruído estava abaixo do nível limítrofe estabelecido em lei e não foi comprovada a exposição a outros agentes nocivos.
Outrossim, o interstício de 9/4/2002 a 2/9/2002 não pode ser reconhecido como especial, pois o PPP apresentado consta apenas como fator de risco "contato com resíduo animal" e não há indicação de responsável pelos registros ambientais.
Por fim, os interstícios de 18/4/1977 a 30/12/1977, de 2/1/1978 a 27/7/1978, de 15/8/1978 a 28/2/1980, de 16/6/1980 a 10/9/1980, de 20/9/1980 a 31/12/1984, de 18/10/1994 a 21/12/1994, de 27/11/2002 a 2/1/2003 (ajudante geral), de 6/1/2003 a 4/7/2003, de 6/7/2005 a 10/11/2005 (faxineiro), de 10/11/2005 a 18/1/2006, de 6/2/2006 a 6/5/2006 (preparador estrutura de aço), de 1º/7/2006 a 1º/11/2006 e de 27/11/2006 a 25/2/2007 (preparador de estrutura), não podem ser reconhecidos como especiais, pois a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a peça inicial, qual seja: carrear prova documental descritiva das condições insalubres às quais permaneceu exposta no ambiente laboral, como formulários padrão e laudo técnico individualizado ou PPP.
Considerando os períodos especiais reconhecidos judicialmente, a parte autora não conta 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo, não faz jus ao benefício de aposentadoria especial.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/91:
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional n. 20, de 15/12/1998, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta. Todavia, restou a observância ao direito adquirido ou às regras transitórias estabelecidas para aqueles que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos a concessão do benefício.
Em substituição à aposentadoria por tempo de serviço instituiu-se a aposentadoria por tempo de contribuição, a qual pressupõe a comprovação de 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos, se mulher, além do cumprimento do período de carência.
No caso dos autos, somados os períodos ora enquadrados (devidamente convertidos) aos lapsos incontroversos, a parte autora contava mais de 35 anos de serviço na data do requerimento administrativo (2/12/2013), conforme planilha anexa.
Ademais, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da Lei n. 8.213/91.
Em decorrência, concluo pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral.
CONSECTÁRIOS
O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação (14/5/2014).
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, observado o disposto na Lei n. 11.960/2009, consoante Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 16/4/2015, Rel. Min. Luiz Fux.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do antigo CC e 219 do CPC/73, até a vigência do novo CC (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do novo CC e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, serem mantidos no percentual de 0,5% ao mês, observadas as alterações introduzidas no art. 1-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09, pela MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012, e por legislação superveniente.
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente.
Passo à análise da questão referente aos honorários de advogado à luz do direito processual intertemporal.
"Em caso de sucumbência recíproca, deverá ser considerada proveito econômico do réu, para fins do art. 85, § 2º, do CPC/2015, a diferença entre o que foi pleiteado pelo autor e o que foi concedido, inclusive no que se refere às condenações por danos morais." (Enunciado n° 14 aprovado pela ENFAM), sendo vedada a compensação na forma do § 14 do mesmo artigo.
No caso, tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, sendo vedada a compensação pela novel legislação, deveria ser observada a proporcionalidade à vista do vencimento e da perda de cada parte, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC.
Logo, caso tivesse sido a sentença proferida já na vigência do Novo CPC, seria caso de condenar o maior sucumbente a pagar honorários ao advogado arbitrados em 7% (sete por cento) sobre o valor da condenação ou da causa, e também condenar a outra parte a pagar honorários de advogado, neste caso fixados em 3% (três por cento) sobre a mesma base de cálculo.
Todavia, abstenho-me de aplicar a novel regra do artigo 85, § 14º, do NCPC, isso para evitar surpresa à parte prejudicada, devendo prevalecer o mesmo entendimento da jurisprudência concernente à não aplicação da sucumbência recursal. Consequentemente, deixo de condenar ambas as partes a pagar honorários ao advogado, mesmo porque se trata de hipótese diversa da prevista no artigo 21, § único, do CPC/1973, que trata da sucumbência mínima.
De fato, considerando que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º a 11º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Nesse diapasão, o Enunciado Administrativo nº 7 do STJ, in verbis: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC."
De todo modo, como a questão dos honorários de advogado envolve direito substancial, deve ser observada a legislação vigente na data da publicação da sentença, porquanto pertinente ao caso a regra do artigo 6º, caput, da LINDB.
Em relação à parte autora, é suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à remessa oficial, e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação da parte autora, para, nos termos da fundamentação, também enquadrar como atividade especial os interstícios de 7/8/1995 a 16/7/1996 e de 1º/8/1996 a 5/3/1997, bem como conceder a aposentadoria integral por tempo de contribuição.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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