
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012866-39.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARTA GUILARDI CASTRO GOMES
Advogado do(a) APELANTE: DEBORA PATRICIA ROSA BONETTI - SP392886-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012866-39.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARTA GUILARDI CASTRO GOMES
Advogado do(a) APELANTE: DEBORA PATRICIA ROSA BONETTI - SP392886-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta em face da r. sentença que julgou procedente o pedido para conceder a aposentadoria por incapacidade permanente desde 24/6/2022, acrescido dos consectários legais.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
Nas razões de apelação, a parte autora alega, preliminarmente, a nulidade da sentença por cerceamento de defesa e requer a realização de nova perícia médica.
No mérito, alega ser devido o adicional de 25% sobre o valor do benefício, requer a fixação do termo inicial da aposentadoria por incapacidade permanente desde 1/9/2016, ou desde a cessação do auxílio por incapacidade temporária em 14/4/2021, ou desde o requerimento administrativo em 25/6/2021. Requer, por fim, que o cálculo do benefício seja realizado de acordo com as regras anteriores à EC n. 103/2019.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012866-39.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: MARTA GUILARDI CASTRO GOMES
Advogado do(a) APELANTE: DEBORA PATRICIA ROSA BONETTI - SP392886-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Preliminarmente, não prospera a alegação de cerceamento de defesa.
De fato, é pacífico que a incapacidade laborativa somente pode ser atestada por prova documental e laudo pericial, nos termos do que preconiza o artigo 443, inciso III, do Código de Processo Civil (CPC).
Na hipótese, como prevê o artigo 370 do CPC, foi coletada a prova pericial, a fim de verificar a existência, ou não, de incapacidade laborativa.
O laudo pericial apresentado, elaborado pelo médico de confiança do Juízo, mencionou o histórico dos males relatados, descreveu os achados no exame clínico e nos registros complementares que lhe foram apresentados e respondeu aos quesitos essenciais ao deslinde da lide.
Desse modo, não se vislumbra ilegalidade na decisão recorrida, pois não houve óbice à formação do convencimento do MM. Juízo a quo por meio da perícia realizada, revelando-se desnecessária a sua complementação.
A mera irresignação da autora com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para realização de nova perícia, apresentação de quesitos complementares ou realização de diligências.
Ademais, o médico nomeado pelo Juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da medicina, não sendo necessária a especialização para o diagnóstico de doenças ou para a realização de perícias.
A propósito, é entendimento desta Corte ser desnecessária a nomeação de um perito especialista para cada sintoma alegado. Nesse sentido: TRF 3ª Região - Proc. nº. 2007.61.08.005622-9 - 9ª Turma - Rel. Des. Fed. Marisa Santos - DJF3 CJ1 05/11/2009, p. 1.211.
Superada a preliminar, passo a análise do mérito.
No caso dos autos, a controvérsia recursal cinge-se ao termo inicial, ao adicional de 25% sobre o valor do benefício e ao critério de apuração da renda mensal inicial, pois os requisitos para a concessão do benefício estão cumpridos e não foram impugnados nas razões da apelação.
A perícia médica judicial, realizada no dia 12/5/2023, constatou a incapacidade laboral total e permanente da autora (nascida em 1953, qualificada no laudo como vendedora), conquanto portadora de osteoartrose em joelhos, espondilodiscoartrose lombar e sequelas de acidente vascular cerebral.
O perito, em laudo complementar, fixou a data de início da incapacidade (DII) em 1/9/2016, data do acidente vascular cerebral.
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.
Contudo, entendo não ser possível conceder o benefício desde a DII em 1/9/2016, tendo em vista o trânsito em julgado em 5/9/2019 do processo n. 0054239-14.2018.4.03.6301, que tramitou perante o Juizado Especial Federal de São Paulo-SP, julgado procedente o pedido para restabelecer o auxílio por incapacidade temporária.
Nessa ação, a pretensão deduzida referia-se justamente a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente ou ao restabelecimento do auxílio por incapacidade temporária cessado em 14/12/2018 e as conclusões da perícia médica judicial, datada de 12/6/2019, foram as seguintes (destaquei):
“Considerando a atividade de vendedora ambulante (sacoleira), entende-se que há incapacidade total e temporária por um ano para a função especifica, à fim de que se restabeleça do quadro funcional em joelho esquerdo."
Nessa esteira, é forçoso concluir que a discussão acerca de possível incapacidade permanente, desde 2016, não pode ser aventada neste feito, sob pena de afronta à coisa julgada.
De fato, nestes autos, a discussão está restrita à demonstração de agravamento da doença e dos sintomas, de modo a verificar a incapacidade permanente após a cessação administrativa do benefício em 14/4/2021.
Nesse passo, considerada a percepção de auxílio por incapacidade temporária em razão das mesmas doenças no período de 1/9/2016 a 14/4/2021 (vide CNIS), o termo inicial fica fixado no dia imediatamente posterior ao da cessação do referido benefício, por estar em consonância com os elementos de prova dos autos e com a jurisprudência dominante.
Confira-se, a propósito, o seguinte julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL.
1. O termo inicial da concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez é a prévia postulação administrativa ou o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença. Ausentes a postulação administrativa e o auxílio-doença, o termo a quo para a concessão do referido benefício é a citação. Precedentes do STJ.
2. Agravo Regimental não provido." (AgRg no REsp 1418604/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 11/02/2014)
À luz do princípio tempus regit actum, a data de início da incapacidade define a legislação aplicável ao caso concreto.
De fato, a incapacidade que enseja o reconhecimento da aposentadoria por incapacidade certamente difere daquela que permite a proteção por meio do auxílio por incapacidade temporária, ocorrendo em momentos distintos.
Assim, ainda que a aposentadoria tenha sido precedida de auxílio por incapacidade temporária, o direito à aposentadoria nasce apenas no momento em que a incapacidade se torna definitiva/insusceptível de reabilitação, inexistindo, portanto, direito adquirido ao regramento pretérito.
Nessa esteira, apenas na perícia médica judicial realizada em 12/5/2023 foi constatada a incapacidade total e permanente, decorrente da progressão e do agravamento das patologias.
Ademais, não é possível retroagir a data de início da incapacidade permanente para 1/9/2016, em razão da coisa julgada.
Assim, a renda mensal inicial do benefício por incapacidade permanente será calculada nos termos do artigo 26, § 2º, III, da EC n. 103/2019.
Discute-se, ainda, a concessão do adicional de 25% a que se refere o artigo 45 da Lei n. 8.213/1991 sobre a aposentadoria da parte autora.
O acréscimo de 25%, previsto artigo 45 da Lei n. 8.213/91, é devido ao beneficiário de aposentadoria por invalidez que necessite da assistência permanente de outra pessoa:
“Art. 45. O valor da aposentadoria por invalidez do segurado que necessitar da assistência permanente de outra pessoa será acrescido de 25% (vinte e cinco por cento).
Parágrafo único. O acréscimo de que trata este artigo:
a) será devido ainda que o valor da aposentadoria atinja o limite máximo legal;
b) será recalculado quando o benefício que lhe deu origem for reajustado;
c) cessará com a morte do aposentado, não sendo incorporável ao valor da pensão”.
Em resposta aos quesitos formulados pelas partes, o perito esclareceu que a autora necessita de auxílio temporário de terceiros para o desempenho de suas atividades diárias:
“8) A periciada necessita de ajuda de terceiros para a realização de suas atividades do dia a dia?
No momento, sim, devido a sequela de AVC.”
Ademais, as enfermidades apontadas não estão relacionadas no Anexo I, do RPS - Decreto n. 3.048/1999), que estabelece as situações que autorizam a concessão desse acréscimo de 25%. Vejamos:
"ANEXO I DO DECRETO N. 3.048/1999
RELAÇÃO DAS SITUAÇÕES EM QUE O APOSENTADO POR INVALIDEZ TERÁ DIREITO À MAJORAÇÃO DE VINTE E CINCO POR CENTO PREVISTA NO ART. 45 DESTE REGULAMENTO
1 - Cegueira total.
2 - Perda de nove dedos das mãos ou superior a esta.
3 - Paralisia dos dois membros superiores ou inferiores.
4 -Perda dos membros inferiores, acima dos pés, quando a prótese for impossível.
5 - Perda de uma das mãos e de dois pés, ainda que a prótese seja possível.
6 - Perda de um membro superior e outro inferior, quando a prótese for impossível.
7 - Alteração das faculdades mentais com grave perturbação da vida orgânica e social.
8 - Doença que exija permanência contínua no leito.
9 - Incapacidade permanente para as atividades da vida diária."
Nesse contexto, em que pese o estado de saúde da autora, não se justifica, por ora, a concessão acréscimo de 25% sobre a aposentadoria por incapacidade permanente por ele recebido, porque não caracterizada a necessidade de assistência permanente de terceiros, na esteira dos precedentes que cito:
“PREVIDENCIÁRIO - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - ADICIONAL DE 25% - ART. 45, DA LEI Nº 8.213/91 - NECESSIDADE DE ASSISTÊNCIA PERMANENTE DE OUTRA PESSOA - DIFERENÇAS - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - JUROS DE MORA - CORREÇÃO MONETÁRIA. I-À época da concessão da aposentadoria por invalidez já necessitava o autor da assistência permanente de outra pessoa, preenchendo, portanto, o pressuposto estatuído no art. 45 da Lei nº 8.213/91 razão pela qual faz jus às diferenças devidas entre a data da concessão do benefício e a data da concessão do adicional em tela. II-A correção monetária incide sobre as prestações em atraso, desde os respectivos vencimentos, na forma da Súmula 8 do E. TRF da 3ª Região, observada a legislação de regência especificada na Portaria nº 92/2001 DF-SJ/SP, de 23.10.2001 e Provimento nº 64/2005 da E. Corregedoria-Geral da Justiça da 3ª Região. III- Os juros moratórios devem ser calculados, de forma globalizada para as parcelas anteriores à citação e de forma decrescente para as prestações vencidas após tal ato processual. Será observada a taxa de 6% ao ano até 10.01.2003 e, a partir de 11.01.2003, será considerada a taxa de 1% ao mês, nos termos do art. 406 do Código Civil e do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, incidindo tais juros até a data da conta de liquidação, caso o precatório seja pago no prazo estabelecido pelo art. 100 da CF/88. (AI-aGr 492779 - Rel. Min. Gilmar Mendes - DJ de 3.3.2006; p. 76). IV-A base de cálculo dos honorários advocatícios corresponde à 15% sobre prestações vencidas até a data em que foi proferida a rua sentença recorrida, nos termos da Súmula 111 do E. STJ, em sua nova redação. V- Remessa Oficial e Apelação do réu parcialmente providas.” (AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1047389 Processo: 2005.03.99.032813-9 UF: SP Órgão Julgador: DÉCIMA TURMA Data do Julgamento:15/05/2007 Fonte: DJU DATA:06/06/2007 PÁGINA: 533 Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO).
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. ARTIGO 557, § 1º, CPC. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ACRÉSCIMO DE 25%. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. 1. Em relação à comprovação do requisito incapacidade, o laudo médico-pericial, atestou a devida incapacidade para as atividades laborais, necessitando de auxílio permanente de terceiros para suas atividades pessoais diárias (quesito 6, fl. 36, respondido fl. 55), tendo em vista que a parte Autora é portadora de "retardo mental leve e transtorno depressivo recorrente com sintomas psicóticos". Logo, o quadro diagnosticado mostra-se condizente com o benefício de aposentadoria por invalidez, com acréscimo de 25%, previsto no artigo 45, da Lei nº 8.213. 2. O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data do requerimento administrativo em 09.12.2004, acrescido do abono anual, nos termos do artigo 40, da Lei nº 8.213/91. 3. O juiz não está adstrito a examinar todas as normas legais trazidas pelas partes, bastando que, in casu, decline os fundamentos suficientes para lastrear sua decisão. 4. Das alegações trazidas no presente, salta evidente que não almeja a parte Agravante suprir vícios no julgado, buscando, em verdade, externar seu inconformismo com a solução adotada, que lhe foi desfavorável, pretendendo vê-la alterada. 5. Agravo legal não provido." (TRF3 - AC 00042528520094039999, Relator Desembargador Federal ANTONIO CEDENHO, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 18/06/2010)
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e dou parcial provimento à apelação para fixar o termo inicial em 15/4/2021.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NOVA PERÍCIA DESNECESSÁRIA. PRELIMINAR AFASTADA. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE LABORAL. TERMO INICIAL. RENDA MENSAL INICIAL. ADICIONAL DE 25% INDEVIDO.
- A mera irresignação da parte autora com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para realização de nova perícia. Preliminar afastada.
- O termo inicial da concessão do benefício previdenciário por incapacidade laboral é a cessação administrativa. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
- A renda mensal inicial do benefício por incapacidade permanente será calculada nos termos do artigo 26, § 2º, III, da EC n. 103/2019.
- Não constatada a necessidade de assistência permanente de terceiros, não está configurada a hipótese descrita no artigo 45 da Lei n. 8.213/1991. Indevido, portanto, o adicional de 25% sobre o valor da aposentadoria por incapacidade permanente.
- Preliminar afastada. Apelação provida em parte.
