D.E. Publicado em 04/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à Apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003109-32.2012.4.03.6127/SP
RELATÓRIO
Vistos, etc.
Trata-se de Apelação em sede de Ação Ordinária, interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, contra sentença (fls. 337 a 339) na qual foram julgados parcialmente procedentes os pedidos, declarando que, em relação às prestações do empréstimo consignado regularmente descontadas pelo INSS da Aposentadoria por Idade e posteriormente estornadas, a responsabilidade do autor se restringe a repassar ao Banco Mercantil o valor do complemento positivo recebido do INSS, e condenando o INSS a pagar indenização por danos morais no valor de R$5.000,00, incidindo atualização monetária a partir da data da sentença e juros de mora de 1% ao mês a partir da data do evento danoso, ocorrido em 28.07.2012. O INSS foi condenado a pagar honorários advocatícios de R$1.000,00 em favor do autor que, por sua vez, foi condenado a pagar honorários advocatícios de R$1.000,00 ao Banco Mercantil, observados os benefícios previstos pela Lei 1.060/50.
Em razões de Apelação (fls. 343 a 350), o INSS alega inexistir dever de indenizar, uma vez que não foi responsável pela causa direta e imediata do dano moral, qual seja, a inscrição do autor em cadastro de inadimplentes - SERASA; que ao INSS apenas é permitida a inscrição no CADIN; que houve violação do art. 391 do Código Civil, bem como ao art. 403 daquele Código; que o dano moral foi causado por isolada do Banco Mercantil, verdadeiro responsável; que a responsabilidade legal do INSS quanto aos empréstimos consignados é limitada, ora violando-se o disposto pelo art. 6º da Lei 10.820/03; que os empréstimos constituem relação entre segurado e instituição financeira, não havendo ato de vontade por parte do INSS. Alternativamente, alega que houve responsabilidade exclusiva de terceiro, uma vez que a cessação do benefício ao qual estava relacionado o empréstimo consignado se deu por força de decisão judicial; que o valor arbitrado à indenização proporciona enriquecimento sem causa, devendo ser reduzido a R$1.000,00 e os, ou R$1.000,00 a si e R$4.000,00 ao Banco Mercantil.
Laércio Stanguini apresentou contrarrazões (fls. 353 a 357), pelas quais faz menção ao pedido do INSS de devolução dos valores pelo Banco Mercantil, demonstrando sua responsabilidade pela inadimplência e consequente negativação de seu nome; que a limitação de responsabilidade do INSS, conforme previsto pela Lei 10.820/03, não é absoluta. Nesses termos, requer a manutenção da sentença.
Banco Mercantil do Brasil S.A. apresentou contrarrazões (fls. 378 a 387), pelas quais aduz à realização dos descontos de benefício percebido pela parte autora, ao passo que os valores não estavam sendo repassados à instituição financeira; que o INSS, por livre e espontânea vontade, solicitou a devolução dos valores adimplidos, sem informar à parte autora que se encontrava inadimplente; que apenas exerceu seu direito ao realizar a negativação; que cabe não a si, mas ao órgão de proteção ao crédito a notificação prévia à inscrição. Destarte, requer o improvimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
A presente Ação de Indenização por Danos Morais foi ajuizada por Laércio Stanguini em 27.11.2012 (fls. 2).
Nossa Constituição Federal, em seu art. 37, §6º, consagra a responsabilidade do Estado de indenizar os danos causados por atos, omissivos ou comissivos, praticados pelos seus agentes a terceiros, independentemente de dolo ou culpa, in verbis:
Trata-se do postulado de responsabilidade civil objetiva do Estado, que prescinde da prova de dolo ou culpa do agente público, a qual fica restrita à hipótese de direito de regresso contra o responsável (responsabilidade civil subjetiva dos agentes), não abordada nestes autos.
São elementos da responsabilidade civil a ação ou omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever de indenizar.
O aspecto característico da responsabilidade objetiva reside na desnecessidade de comprovação, por quem se apresente como lesado, da existência da culpa do agente ou do serviço.
Assim, para que o ente público responda objetivamente, suficiente que se comprovem a conduta da Administração, o resultado danoso e o nexo causal entre ambos, porém com possibilidade de exclusão da responsabilidade na hipótese de caso fortuito/força maior ou culpa exclusiva da vítima. Trata-se da adoção, pelo ordenamento jurídico brasileiro, da teoria do risco administrativo.
A propósito, colaciono aresto do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
Aos fatos. Laércio Stanguini percebeu o benefício de Auxílio-Doença a partir de 03.04.2007, vindo a ser administrativamente cessado em 03.06.2008 (fls. 78, 145). Inconformado, em 08.07.2008 ajuizou a Ação 2008.61.27.002969-2 (fls. 179), na qual foi indeferido o pedido de tutela antecipada para restabelecimento do benefício, decisão contra a qual foi interposto em 15.09.2008 o Agravo de Instrumento 2008.03.00.035200-4, sendo então determinado o restabelecimento. Porém, julgado improcedente o pedido formulado na ação principal em dezembro de 2009 e revogada a tutela, foi novamente cessado o benefício, pago até o mesmo mês.
Em 18.08.2010, oito meses após, portanto, é concedido administrativamente ao autor o benefício de Aposentadoria por Idade (fls. 79, 193); em 25.07.2011 contrai empréstimo junto ao Banco Mercantil do Brasil S.A. - BMB (fls. 310), a ser pago em 60 parcelas mensalmente deduzidas de seu benefício.
Porém, a título de corrigir a data de cessação do benefício de Auxílio-Doença, a fim de excluir o período de 04.06.2008 a 31.12.2009 para caracterizá-lo como indevido e possibilitar sua cobrança, foi realizada a reativação (apenas para fins de sistema) do Auxílio, o que levou o sistema a considerar indevida a posterior concessão da Aposentadoria, classificando-o como cessado pelo "motivo 36 - acumulação indevida de benefício", em 16.05.2012 (fls. 167), vindo a ser reativado em 11.06.2012 (fls. 168). Ao assim proceder, não apenas a parcela do consignado deixou de ser repassada à instituição financeira (fls. 245) como entendeu por bem o INSS solicitar junto ao Banco a devolução dos valores até então repassados (fls. 181, 234, 243), além de continuar a realizar os descontos relativos ao empréstimo (fls. 29 a 39, 195), mas não repassá-los; caracterizada a inadimplência, ainda que o autor sofresse descontos em seu benefício, o BMB promoveu sua inscrição junto à SERASA e ao SCPC (fls. 21 a 28). Constatando o ocorrido, em 06.08.2012 o autor requereu junto ao INSS a devolução dos valores (fls. 192 e seguintes). Não sendo solucionada a questão, em 27.11.2012 ajuizou a presente demanda (fls. 2); apenas em 01.03.2013 o INSS emitiu carta ao autor informando que o valor indevidamente glosado seria devolvido, disponibilizado de 06.03.2013 a 30.04.2013 (fls. 245, 246).
Do relatado constata-se o caráter indevido tanto da cessação do benefício de Aposentadoria por Idade quanto da glosa; indevido ainda o próprio procedimento realizado por servidor não identificado do INSS, pois a própria autarquia, "em virtude do crescente número de reclamações das instituições financeiras relativas ao desconhecimento dos atendentes do INSS sobre as situações de glosa das parcelas de empréstimos consignados", emitiu o Memorando-Circular 29, de 19.11.2007 (fls. 124 a 126), alertando acerca da possibilidade de ocorrer exatamente o que se passou com o autor, além de comunicado - em data ignorada, mas presume-se contemporâneo ao primeiro - de que em caso de cessação do benefício o motivo a ser registrado no sistema eletrônico deveria ser diverso do utilizado no caso em tela (fls. 123). Desse modo, forçoso concluir que a utilização errônea do sistema eletrônico da autarquia por seu próprio servidor provocou a indevida cessação do benefício de Aposentadoria por Idade e da indevida solicitação ao BMB dos valores até então repassados.
Não se observa, no caso em tela, violação do previsto pela Lei 10.820/03, que dispõe sobre os empréstimos consignados. Ainda que o INSS não seja intermediário da contratação do empréstimo, relação entre segurado e instituição financeira, é sua a responsabilidade quanto a reter os valores e repassá-los à instituição financeira, além de dispor sobre as rotinas a serem observadas, nos termos de seu art. 6º, §1º, III e VI. Do mesmo modo, não se aplica ainda o previsto pelo §2º, uma vez que a parte autora não requereu a responsabilização do INSS quanto ao empréstimo; diversamente, digno de nota que o dispositivo menciona a responsabilidade da autarquia no tocante à continuidade dos pagamentos.
Eis os dispositivos:
Colaciono ainda julgado pertinente proferido pelo Superior Tribunal de Justiça:
Igualmente não se sustentam as alegações da autarquia quanto às aventadas violações das disposições dos art. 391 e 403 do Código Civil de 2002, conforme seguem:
O art. 391 resta inaplicável por razão já mencionada: não se trata de requerer do INSS que responda pelo empréstimo, mas de sua responsabilização relativa ao inadimplemento e inscrição do autor junto a cadastros de inadimplentes.
Quanto à disposição contida no art. 403, melhor sorte não está reservada à apelante. Por certo, a inscrição se deu por ordem da instituição financeira; no entanto, tal ato não desqualifica a conduta da autarquia, como se de fato desvinculado do resultado se tratasse. Ora, o inadimplemento foi direta e exclusivamente causado por ato do INSS, sendo razão única a motivar o registro da parte autora junto aos cadastros restritivos. Faria sentido o alegado se não houvesse vinculação qualquer entre o empréstimo e o benefício, de forma que, por exemplo, o inadimplemento ocorresse por livre e espontânea vontade do segurado, mas não é o que se verifica.
No mesmo sentido aponta a doutrina, a respeito do que pode ser compreendido como o efeito direto e imediato previsto pelo art. 403 do Código Civil: "a norma comentada adota a teoria do dano direto. Agostinho Alvim entende que a melhor escolha que explica essa teoria é a que se reporta à causa. Considera-se causa do dano a que lhe é próxima ou remota, desde que esta última ligue-se ao dano diretamente A causa do dano deve ser necessária, ou seja, é exclusiva, porque opera por si só, dispensadas as outras causas. O CC 403 determina que o dano seja o efeito imediato e direto da inexecução. Assim, ao inadimplemento deve-se atribuir com exclusividade a causa do dano para que haja o dever de indenizar (Agostinho Alvim, 'Inexecução', n. 222, p. 313)" (in Código Civil Comentado. Nery Junior, Nelson; Nery, Rosa Maria de Andrade. 10ª edição, p. 606, Ed. Revista dos Tribunais, 2013).
Ainda, a jurisprudência:
Por fim, pertinente o seguinte raciocínio: seria o autor inscrito junto a cadastros de inadimplentes caso o INSS não houvesse erroneamente realizado a cessação do benefício e a glosa? Sendo negativa a resposta, como restou suficientemente demonstrado, sua conduta foi causa direta, cabendo sua responsabilização, seja por dolo ou culpa, para tanto não concorrendo a instituição bancária.
Quanto ao valor a ser arbitrado a título de indenização, deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, observando ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor e do ofendido, e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e gravidade do dano, sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito.
Em casos semelhantes, esta Corte arbitrou o valor de R$5.000,00 a título de danos morais, montante que reputo atender aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade.
Nesse sentido:
Face ao exposto, nego provimento à Apelação, nos termos da fundamentação.
É o voto.
MARCELO SARAIVA
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 24/08/2017 16:50:46 |