Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6094061-32.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/10/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 14/10/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CERCEAMENTO DE
DEFESA. NÃO CONFIGURADO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
VIBRAÇÃO DE CORPO INTEIRO. PROVA EMPRESTADA. POSSIBILIDADE. REQUISITO
TEMPORAL PREENCHIDO. BENEFÍCIO CONCEDIDO DESDE A DATA DA CITAÇÃO.
CONSECTÁRIOS.
- Inexistindo dúvida fundada sobre as condições em que o segurado desenvolveu suas atividades
laborativas, despicienda revela-se a produção de prova pericial para o julgamento da causa, não
se configurando cerceamento de defesa ou violação de ordem constitucional ou legal. Preliminar
rejeitada.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
regime do artigo 543-C do CPC).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a exposição habitual e permanente a ruído de 86,78 decibéis (códigos 1.1.5 do
anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 2.0.1 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n.
3.048/1999) e a níveis de vibração de corpo inteiro superiores aos limites de tolerância previstos
na legislação de regência (códigos 2.0.2 dos anexos dosDecretos n. 2.172/1997 e 3.048/1999).
Precedente desta Corte.
- A parte autora logrou comprovar, via PPP emprestado, que exercia suas atividades com a
utilização do equipamento motosserra e estava exposto a ruído em nível superior ao limite
previsto nas normas regulamentares, fato que permite o enquadramento requerido. Precedentes.
- A parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo
57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Termo inicial fixado na data do requerimento administrativo. Todavia, deve ser observada a
incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob pena de cessação da
aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR).
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- O INSS fica condenado a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento)
sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, já
aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo (acórdão em vez de sentença),
consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do Superior Tribunal de Justiça. Todavia,
na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito econômico
ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.85, § 4º, II, do CPC).
- A autarquia previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Apelação da parte autora provida.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6094061-32.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: DONIZETE CRISPIM RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO BASSI - SP204334-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DONIZETE CRISPIM
RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6094061-32.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: DONIZETE CRISPIM RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO BASSI - SP204334-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DONIZETE CRISPIM
RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o
enquadramento de atividade especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer como especiais as
atividades desempenhadas pelo autor nos períodos de 18/12/1996 a 15/6/2001, de 22/11/2001 a
9/3/2004, de 6/9/2004 a 6/6/2009 e de 21/6/2010 a 21/8/2017 e, por fim, fixou a sucumbência
recíproca.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, no qual suscita, preliminarmente, a
ocorrência de cerceamento do direito de defesa. No mérito, exora a procedência integral dos
pedidos arrolados na inicial.
Não resignada, a autarquia também apresentou apelação, na qual aduz, em síntese, a
impossibilidade dos enquadramentos efetuados. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6094061-32.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: DONIZETE CRISPIM RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARCELO BASSI - SP204334-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, DONIZETE CRISPIM
RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: MARCELO BASSI - SP204334-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
No mais, despicienda a produção de nova prova pericial.
A parte autora alega ter trabalhado em condições especiais, nos períodos de 4/4/1988 a
26/2/1992 e de 1º/11/1994 a 1º/12/1995, nas empresas “José Antônio de Proença” e “José Carlos
de Almeida”-, que se encontram inativas.
Dessa forma, o requerente entende ser a utilização da similaridade - com a elaboração de laudo
pericial segundo comparações com trabalhadores que atuem em condições da mesma natureza -
a única forma de demonstrar a atividade insalubre.
Com efeito, verifica-se que a parte requerente juntou Perfil Profissiográfico Previdenciário
suficiente para o deslinde da demanda.
Ademais, inexistindo dúvida fundada sobre as condições em que o segurado desenvolveu suas
atividades laborativas, despicienda revela-se a produção de prova pericial para o julgamento da
causa, não se configurando cerceamento de defesa ou violação de ordem constitucional ou legal.
Assim, rejeito a preliminar arguida.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições
ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador,retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente habilitado
pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade
sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Nesse caso, no que tange aos intervalos de 4/9/1992 a 9/6/1994, de 18/12/1996 a 15/6/2001, de
22/11/2001 a 9/3/2004, de 6/9/2004 a 6/6/2009 e de 21/6/2010 a 21/8/2017, constam Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP) e laudo técnico, os quais anotam a exposição habitual e
permanente a ruído de 86,78 decibéis (códigos 1.1.5 do anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 2.0.1
dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999) e a níveisde vibração de corpo inteiro
superiores aos limites de tolerância previstos na legislação de regência (códigos 2.0.2 dos anexos
dosDecretos n. 2.172/1997 e 3.048/1999).
Sobre a especialidade decorrente da sujeição avibrações, colaciono o seguinte julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO PREVISTO NO §1º ART.557 DO C.P.C.
EXPOSIÇÃO A VIBRAÇÃO E RUÍDO. EPI. I - O nível de vibração/trepidação a que o autor esteve
exposto, na função de motorista de caminhão e operador de máquina moto niveladora, supera,
em muito, o limite legal de 1,15 m/s2 para vibração de corpo inteiro, justificando, por si só, a
contagem especial para fins previdenciários, ainda que no período estivesse também exposto a
ruídos de 86 decibéis. II - Não há notícias nos autos de utilização do equipamento de proteção
individual referente à exposição à vibração. III - Mantidos os termos da decisão agravada que
considerou comprovado o exercício de atividade especial de 01.06.1986 a 17.09.2007, por
exposição a ruídos de 86,20 decibéis e vibração de corpo inteiro 5,69 m/s2, na função de
motorista de caminhão, e de 18.09.2007 a 06.09.2012, por exposição a ruídos de 90,02 decibéis
e vibração de corpo inteiro de 10,57 m/s2, na função de patroleiro/operador de moto niveladora,
agente nocivo previsto no código 1.1.5 do Decreto 53.831/64 "trepidação e vibrações: operações
capazes de serem nocivas à saúde" c/c o item 2 do anexo 8 da NR-15., e ruído previsto no código
2.0.1 do Decreto 3.048/99. IV - Agravo do INSS improvido (art.557, §1º do C.P.C)." (APELREEX
00019116820134036112, JUIZ CONVOCADO RENATO BECHO, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-
DJF3 Judicial 1 DATA:28/05/2014)
Em relação aos períodos de 4/4/1988 a 26/2/1992 e de 1º/11/1994 a 1º/12/1995, a parte autora
logrou comprovar, via PPP emprestado do intervalo laborado na empresa “Votorantim Siderurgia
S.A.” (de 4/9/1992 a 9/6/1994), que exercia suas atividades com a utilização do equipamento
motosserra e estava exposto a ruído em nível superior ao limite previsto nas normas
regulamentares à época, fato que permite o enquadramento requerido.
Salienta-se que, neste caso específico, o mencionado PPP é documento hábil a demonstrar a
especialidade das atividades desempenhadas pela parte autora nos períodos em contenda, uma
vez que foi realizada a perícia in loco na empresa “Votorantim Siderurgia S.A.” em que o
requerente efetivamente trabalhou e a análise técnica ocorreu em relação à mesma função
(operador de motosserra).
Nesse sentido decidiu o STJ (g.n.):
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. OMISSÃO INEXISTENTE. DEVIDO
ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES RECURSAIS.
1. Não há violação do art. 535 do CPC quando a prestação jurisdicional é dada na medida da
pretensão deduzida, com enfrentamento e resolução das questões abordadas no recurso.
2. Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade
de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter
eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o
segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção,
no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica.
3. Em casos análogos, é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à
legalidade da prova emprestada, quando esta é produzida com respeito aos princípios do
contraditório e da ampla defesa.
Recurso especial improvido." (RESP 1.397.415/RS, Min. Humberto Martins, DJe: 20/11/2013)
Nessa esteira, esta Corte Regional também já se pronunciou: ApReeNec – Apelação/Remessa
Necessária - 2131810 0006065-81.2011.4.03.6183, Desembargador Federal Luiz Stefanini, 8ª
Turma, e-DJF3: 22/11/2018;AR - Ação Rescisória - 11247 0012431-85.2016.4.03.0000,
Desembargador Federal Baptista Pereira, 3ª Seção, e-DJF3: 7/6/2018.
No mais, questões afetas ao recolhimento de contribuições previdenciárias ou divergências na
GFIP não devem, em tese, influir no cômputo da atividade especial exercida pelo segurado, à
vista do princípio da automaticidade (artigo 30, I, da Lei n. 8.212/1991), aplicável neste enforque.
Com efeito, inexiste violação da regra inscrita no artigo 195, § 5º, do Texto Magno, haja vista
caber ao empregador o recolhimento das contribuições previdenciárias, inclusive as devidas pelo
segurado. Nesse sentido: TRF3, Ap 00204944120174039999, AC 2250162, Rel. DES. FED.
TORU YAMAMOTO, 7ª Turma, Fonte e-DJF3 Judicial 1, DATA: 25/9/2017.
Desse modo, os intervalos de 4/4/1988 a 26/2/1992, de 4/9/1992 a 9/6/1994, de 1º/11/1994 a
1º/12/1995, de 18/12/1996 a 15/6/2001, de 22/11/2001 a 9/3/2004, de 6/9/2004 a 6/6/2009 e de
21/6/2010 a 21/8/2017 devem ser enquadrados como especiais.
Nessas circunstâncias, considerados os períodos enquadrados, a parte autora conta mais de 25
(vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial e, desse modo, faz jus à concessão do
benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
Passo à análise dos consectários
O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo. Todavia, deve ser
observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob pena de
cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017).
Fica afastada a incidência da Taxa Referencial (TR) na condenação, pois a Suprema Corte, ao
apreciar embargos de declaração apresentados nesse recurso extraordinário, deliberou pela não
modulação dos efeitos.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês,
contadosda citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência
do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser
utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante
alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09
(Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux), observada, quanto ao
termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em
19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Invertida a sucumbência, condeno o INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10%
(dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data
deste acórdão, já aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo (acórdão em
vez de sentença), consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do Superior Tribunal
de Justiça.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito
econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.85, § 4º, II, do CPC).
Com relação às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia
Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996, bem
como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, tal isenção não exime a
Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte
autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
No que concerne ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma
à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou provimento à apelação da parte
autora para, nos termos da fundamentação: (i) também enquadrar como atividade especial os
períodos de 4/4/1988 a 26/2/1992, de 4/9/1992 a 9/6/1994 e de 1º/11/1994 a 1º/12/1995; (ii)
determinar a concessão do benefício de aposentadoria especial; (iii) discriminar os consectários
legais. Nego provimento à apelação do INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. CERCEAMENTO DE
DEFESA. NÃO CONFIGURADO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
VIBRAÇÃO DE CORPO INTEIRO. PROVA EMPRESTADA. POSSIBILIDADE. REQUISITO
TEMPORAL PREENCHIDO. BENEFÍCIO CONCEDIDO DESDE A DATA DA CITAÇÃO.
CONSECTÁRIOS.
- Inexistindo dúvida fundada sobre as condições em que o segurado desenvolveu suas atividades
laborativas, despicienda revela-se a produção de prova pericial para o julgamento da causa, não
se configurando cerceamento de defesa ou violação de ordem constitucional ou legal. Preliminar
rejeitada.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a exposição habitual e permanente a ruído de 86,78 decibéis (códigos 1.1.5 do
anexo do Decreto n. 83.080/1979 e 2.0.1 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n.
3.048/1999) e a níveis de vibração de corpo inteiro superiores aos limites de tolerância previstos
na legislação de regência (códigos 2.0.2 dos anexos dosDecretos n. 2.172/1997 e 3.048/1999).
Precedente desta Corte.
- A parte autora logrou comprovar, via PPP emprestado, que exercia suas atividades com a
utilização do equipamento motosserra e estava exposto a ruído em nível superior ao limite
previsto nas normas regulamentares, fato que permite o enquadramento requerido. Precedentes.
- A parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo
57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- Termo inicial fixado na data do requerimento administrativo. Todavia, deve ser observada a
incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob pena de cessação da
aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei nº 8.213/91.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR).
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- O INSS fica condenado a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento)
sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, já
aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo (acórdão em vez de sentença),
consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do Superior Tribunal de Justiça. Todavia,
na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito econômico
ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.85, § 4º, II, do CPC).
- A autarquia previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Apelação da parte autora provida.
- Apelação do INSS desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação da
parte autora, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
