Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000119-42.2018.4.03.6104
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO.APOSENTADORIA ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DE
ATIVIDADE ESPECIAL. OPERADOR DE PRODUÇÃO DA USIMINAS. RUÍDO E CALOR ACIMA
DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA. LAUDO PERICIAL. METODOLOGIA DE AFERIÇÃO DO
RUÍDO. IRRELEVÂNCIA. REQUISITOS PREENCHIDOS NA DER. SUCUMBÊNCIA.
- Alegação de remessa oficial afastada, por ter sido proferida a sentença na vigência do atual
Código de Processo Civil, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
- Não se cogita de prescrição quinquenal, pois entre o indeferimento administrativo e o
ajuizamento da ação não decorreu lapso superior a cinco anos.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC-73).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Presença de PPP e laudo pericial, que atestaexposição habitual e permanente a níveis de ruído
superiores aos limites de tolerância para a época estabelecidos na norma regulamentadora, o que
autoriza o enquadramento nos códigos 1.1.6do anexo ao Decreto n. 53.831/1964 e 2.0.1dos
anexos aos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
- Possível utilização de metodologia diversa não desnatura a prejudicialidade do período, uma vez
constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre e comprovado por meio de
PPP ou laudo técnico, consoante jurisprudência desta Corte.
- A controvérsia a respeito do computo de período em gozo de auxílio doença como tempo de
serviço especial encontra-se pacificada, haja vista a tese firmada no Tema Repetitivo n. 998 do
STJ.
- Presente o quesito temporal, uma vez que a soma de todos os períodos de trabalho confere à
parte autora mais de 25anos na DER.
- Deve ser observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial, sob
pena de cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei n. 8.213/1991 e
nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Em razão da sucumbência, deve o INSS arcar com os honorários de advogado, arbitrados em
12% (dozepor cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a
data da sentença, já computada a sucumbência recursal, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º,
2º, 3º, I, e 11, do CPC e verbete da Súmula n. 111 do STJ.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Recurso adesivo da parte autora prejudicado.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000119-42.2018.4.03.6104
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCO ANTONIO SANTOS DE ALCANTARA
Advogado do(a) APELADO: MANOEL RODRIGUES GUINO - SP33693-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000119-42.2018.4.03.6104
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCO ANTONIO SANTOS DE ALCANTARA
Advogado do(a) APELADO: MANOEL RODRIGUES GUINO - SP33693-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço insalubre, com
vistas à concessão de aposentadoria especial no lugar do benefício atual.
A sentença, integralizada via declaratórios,julgou procedente o pedido:
"para reconhecer como tempo de contribuição especial os períodos de 06/03/1997 a 31/03/2001
e determinar a conversão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição (NB
42/176.384.293-0), em aposentadoria especial, compensando-se as parcelas járecebidas,
desde a DER. Além da concessão do benefício, o requerente faz jus também ao pagamento
dos atrasados, os quais são devidos desde a data da concessão no âmbito administrativo. Os
valores atrasados deverão ser acrescidos de correção monetária desde o dia em que deveriam
ter sido pagos e de juros de mora a partir da citação, ambos calculados nos moldes do Manual
de Cálculos da Justiça Federal em vigor no momento da execução. Custas na forma da Lei.
Condeno o INSS a suportar os honorários advocatícios de sucumbência, devidos na forma do
caput do art. 85 do CPC/2015. Fixo-os no patamar mínimo que tratam os incisos I a V do
parágrafo 3º desse mesmo artigo, considerando as escalas de proveito econômico legalmente
estabelecidas, a serem conhecidas no caso concreto apenas quando da liquidação, observada
a Súmula 111 do STJ. ...".
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação, invocando, inicialmente, a remessa
oficial e observância da prescrição quinquenal. Sustenta a impossibilidade do enquadramento
efetuado, sobretudo no tocante à metodologia utilizada na aferição do agente nocivo “ruído” e à
necessidade de laudo técnico contemporâneo. Ademais, enfatiza a imprestabilidade do PPP e
do laudo judicial. Por cautela, pugnou por exclusão de eventual auxílio doença como tempo
especial e por modificação do termo inicial de concessão. Prequestionou a matéria para fins de
recursais.
A parte autora também recorreu, via adesivo, postulando, caso conhecido o reexame
necessário, a análise de toda matéria desfavorável ao segurado, bem como majoração da verba
sucumbencial.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000119-42.2018.4.03.6104
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCO ANTONIO SANTOS DE ALCANTARA
Advogado do(a) APELADO: MANOEL RODRIGUES GUINO - SP33693-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso do INSS atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
De início, afasto a alegação de remessa oficial, por ter sido proferida a sentença na vigência do
atual Código de Processo Civil, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de
jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários
mínimos.
No caso, à evidência, esse montante não é alcançado, devendo a certeza matemática
prevalecer sobre o teor da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Por via de consequência, torno prejudicado o recurso adesivo da parte autora.
No mais, não se cogita de prescrição quinquenal, pois entre o indeferimento administrativo e o
ajuizamento da ação não decorreu lapso superior a cinco anos.
Examino o mérito da controvérsia.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ,
assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível
tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp
894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016,
DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/5/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
No caso, no tocante ao período de 6/3/1997 a 31/3/2001, a parte autora logrou demonstrar, via
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), posteriormente corroborado em laudo pericial
produzido no curso da ação, exposição - habitual e permanente - a níveis de ruído e calor
superiores aos limites de tolerância para a época estabelecidos na norma regulamentadora,
como "operador de produção" da USIMINAS, o que autoriza o devido enquadramento nos
códigos 1.1.6 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964 e 2.0.1dos anexos aos Decretos n.
2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Por outro giro, não se cogita de inviabilidade do reconhecimento do caráter especial com
fundamento em metodologia diversa da determinada pela legislação (NHO-01 da
FUNDACENTRO), uma vez que possíveis irregularidades no preenchimento dos formulários e
na adoção dos critérios técnicos e metodológicos aplicáveis ao laudo técnico são de
responsabilidade do empregador e não podem prejudicar o empregado quanto à avaliação do
agente nocivo. E ao INSS cabe a fiscalização da empresa e eventual punição, se o caso.
De qualquer sorte, possível utilização de metodologia diversa não desnatura a prejudicialidade
do período, uma vez constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre e
comprovado por meio de PPP ou laudo técnico, consoante jurisprudência desta Corte (Ap –
Apelação Cível - 2306086 0015578-27.2018.4.03.9999, Des. Fed. Inês Virgínia, 7T, e-DJF3
Judicial 1 Data: 7/12/2018; Ap – Apelação Cível - 3652270007103-66.2015.4.03.6126, Des.
Fed. Baptista Pereira, 10T, e-DJF3 Judicial 1 Data: 19/7/2017).
No mais, a controvérsia a respeito do computo de período em gozo de auxílio doença como
tempo de serviço especial encontra-se pacificada, haja vista a tese firmada no Tema Repetitivo
n. 998 do Superior Tribunal de Justiça, no seguinte sentido: “O segurado que exerce atividades
em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário
, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.” (STJ, REsp
1723181/RS e REsp 1759098/RS, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1ª SEÇÃO,
julgado em 26/6/2019, DJe 1º/8/2019).
Nessas circunstâncias, considerados todos os intervalos especiais reconhecidos, a parte autora
reúne mais de 25 (vinte e cinco) anos de trabalho em atividade especial até a DER do benefício
originalmente formulado(26/5/2014) e, desse modo, faz jus à concessão do benefício de
aposentadoria especial, no lugar do benefício atual, nos termos do artigo 57 e parágrafos da Lei
n. 8.213/1991.
Irretorquível, portanto, se afigura o julgado nesse aspecto.
Sobre o termo inicial do benefício, algumas considerações devem ser feitas.
De plano, como a comprovação da atividade debatida ocorreu apenas nestes autos, por meio
de prova não submetida à prévia apreciação administrativa, penso ser adequada a fixação do
termo inicial dos efeitos financeiros na citação, momento em que a autarquia teve ciência da
pretensão, em sua plenitude, e a ela pôde resistir.
Quanto a esse aspecto, destaca-se o fato de o Poder Judiciário exercer suas atribuições em
substituição à Administração que deve praticar os atos que lhe são inerentes como atividade
primária.
Vale dizer: preponderantemente, apenas os atos que a Administração deveria, por lei, praticar
podem ser passíveis de controle judicial, sob o enfoque de possível lesão ou ameaça a direito.
Nessa esteira, a concessão de benefício fundada em prova produzida exclusivamente na esfera
judicial, por impedir a Administração de exercer o pleno exercício das atribuições que lhe são
inerentes, afasta a configuração de mora da autarquia e a possibilidade de fixação do termo
inicial na data do requerimento administrativo.
Afinal, a insuficiência ou inaptidão de elementos probatórios do direito invocado configura
situação que, de forma indireta, inviabiliza o exercício de atividade própria da Administração.
A propósito, esses mesmos fundamentos foram evocados pelo Ministro Roberto Barroso ao
apreciar, sob o regime da repercussão geral, o RE n. 631.240 e fixar tese sobre a necessidade
de prévio requerimento administrativo nas ações de conhecimentos de cunho previdenciário.
Confira-se o seguinte trecho do voto:
“17. Esta é a interpretação mais adequada ao princípio da separação de Poderes. Permitir que
o Judiciário conheça originariamente de pedidos cujo acolhimento, por lei, depende de
requerimento à Administração significa transformar o juiz em administrador, ou a Justiça em
guichê de atendimento do INSS, expressão que já se tornou corrente na matéria. O Judiciário
não tem, e nem deve ter, a estrutura necessária para atender às pretensões que, de ordinário,
devem ser primeiramente formuladas junto à Administração. O juiz deve estar pronto, isto sim,
para responder a alegações de lesão ou ameaça a direito. Mas, se o reconhecimento do direito
depende de requerimento, não há lesão ou ameaça possível antes da formulação do pedido
administrativo. Assim, não há necessidade de acionar o Judiciário antes desta medida....”
Não obstante o entendimento acima sufragado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em
incidente de uniformização de jurisprudência, previsto no artigo 14, § 4º, da Lei n. 10.259/2001,
ao tratar especificamente da matéria, deliberou pela prevalência da seguinte orientação (g. n.):
“A comprovação extemporânea da situação jurídica consolidada em momento anterior não tem
o condão de afastar o direito adquirido do segurado, impondo-se o reconhecimento do direito ao
benefício previdenciário no momento do requerimento administrativo, quando preenchidos os
requisitos para a concessão da aposentadoria”. (Pet 9.582/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 16/09/2015)
No mesmo sentido são os recentes julgados da Corte Superior: REsp 1.859.330/CE, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/3/2020, DJe 31/8/2020;
AgInt no REsp 1.609.332/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado
em 19/03/2019, DJe 26/3/2019.
Dessa forma, curvo-me ao entendimento do STJ para fixar o termo inicial da concessão do
benefício na data do requerimento administrativo.
Todavia, deve ser observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade
especial, sob pena de cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei
n. 8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
Em razão da sucumbência, condeno o INSS a arcar com os honorários de advogado, arbitrados
em 12% (dozepor cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas
até a data da sentença, já computada a sucumbência recursal, consoante critérios do artigo 85,
§§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC e verbete da Súmula n. 111 do STJ.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito
econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.85, § 4º, II, do CPC).
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido desrespeito algum à
legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar, torno prejudicado o recurso adesivo daparte
autora e nego provimento ao apelo do INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO.APOSENTADORIA ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DE
ATIVIDADE ESPECIAL. OPERADOR DE PRODUÇÃO DA USIMINAS. RUÍDO E CALOR
ACIMA DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA. LAUDO PERICIAL. METODOLOGIA DE AFERIÇÃO
DO RUÍDO. IRRELEVÂNCIA. REQUISITOS PREENCHIDOS NA DER. SUCUMBÊNCIA.
- Alegação de remessa oficial afastada, por ter sido proferida a sentença na vigência do atual
Código de Processo Civil, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
- Não se cogita de prescrição quinquenal, pois entre o indeferimento administrativo e o
ajuizamento da ação não decorreu lapso superior a cinco anos.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim
enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo",
independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
- O enquadramento efetuado em razão da categoria profissional é possível somente até
28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995).
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do
Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882,
de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido
para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260,
sob o regime do artigo 543-C do CPC-73).
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Presença de PPP e laudo pericial, que atestaexposição habitual e permanente a níveis de
ruído superiores aos limites de tolerância para a época estabelecidos na norma
regulamentadora, o que autoriza o enquadramento nos códigos 1.1.6do anexo ao Decreto n.
53.831/1964 e 2.0.1dos anexos aos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
- Possível utilização de metodologia diversa não desnatura a prejudicialidade do período, uma
vez constatada a exposição a ruído superior ao limite considerado salubre e comprovado por
meio de PPP ou laudo técnico, consoante jurisprudência desta Corte.
- A controvérsia a respeito do computo de período em gozo de auxílio doença como tempo de
serviço especial encontra-se pacificada, haja vista a tese firmada no Tema Repetitivo n. 998 do
STJ.
- Presente o quesito temporal, uma vez que a soma de todos os períodos de trabalho confere à
parte autora mais de 25anos na DER.
- Deve ser observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade especial,
sob pena de cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei n.
8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
- Em razão da sucumbência, deve o INSS arcar com os honorários de advogado, arbitrados em
12% (dozepor cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a
data da sentença, já computada a sucumbência recursal, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º,
2º, 3º, I, e 11, do CPC e verbete da Súmula n. 111 do STJ.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Recurso adesivo da parte autora prejudicado.
- Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar, tornar prejudicado o recurso adesivo da parte
autora e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
