Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5008943-73.2020.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
ATIVIDADE URBANA COMUM. CTPS. TEMPO DE ATIVIDADE ESPECIAL. TENSÃO ELÉTRICA
ACIMA DE 250 VOLTS. PERICULOSIDADE. ENQUADRAMENTO. REQUISITO TEMPORAL
PREENCHIDO ENTRE A DER E O AJUIZAMENTO. POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL NA
CITAÇÃO.
- Alegação de remessa oficial afastada, por ter sido proferida a sentença na vigência do atual
Código de Processo Civil, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
- Não se cogita de prescrição quinquenal, porquanto entre o requerimento administrativo e o
ajuizamento não decorreu lapso superior a cinco anos.
- Inteligência do artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- As anotações lançadas em Carteira de Trabalho gozam de presunção legal de veracidade "juris
tantum", recaindo sobre o réu os ônus de comprovar a falsidade de suas anotações (Enunciado n.
12 do C. Tribunal Superior do Trabalho). Precedente.
- Tempo comum demonstrado, cujo período encontra-se cronologicamente anotado em Carteira
de Trabalho e Previdência Social (CTPS), sem indícios de rasura ou adulterações.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 dB era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n.
2.172/97, que majorou o nível para 90 dB. Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o
limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis,
sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o regime do
artigo 543-C do CPC/73).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a especialidade em razão da exposição habitual e permanente a tensão elétrica
superior a 250 V.
- Possibilidade de reconhecimento da natureza nocente do tempo de serviço em que o segurado
ficou exposto à periculosidade, por ser meramente exemplificativo o rol de agentes nocivos
constante do Decreto n. 2.172/1997. Precedente do STJ.
- A exposição de forma intermitente à tensão elétrica não descaracteriza o risco produzido pela
eletricidade. Precedente.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral mediante DER fixada após o requerimento administrativo primitivo.
- Em razão do cômputo do tempo de serviço entre a DER e o ajuizamento da ação, o termo inicial
do benefício deve ser fixado na citação. Precedente.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS parcialmente provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5008943-73.2020.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CESAR HELENO TEIXEIRA
Advogados do(a) APELADO: ARISMAR AMORIM JUNIOR - SP161990-A, MILENA SILVA DE
MIRANDA CASTRO - SP414224-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5008943-73.2020.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CESAR HELENO TEIXEIRA
Advogados do(a) APELADO: ARISMAR AMORIM JUNIOR - SP161990-A, MILENA SILVA DE
MIRANDA CASTRO - SP414224-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social
(INSS), na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de atividades comum e especial, com
vistas à concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer a especialidade do
vínculo de 19/8/1997 a 13/8/2008, o período comum de 1º/8/1994 a 11/8/1995 e determinar a
concessão do benefício mediante DER fixada após o ingresso administrativo. Ademais, fixou os
consectários e a verba sucumbencial.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação. De início, suscitou prescrição
quinquenal e invocou o reexame necessário. No mérito, refutou o enquadramento especial
efetuado, à míngua de comprovação da periculosidade do ofício com tensão elétrica. Por
cautela, impugnou os critérios de incidência dos consectários e do termo inicial.
A final, prequestionou a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5008943-73.2020.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CESAR HELENO TEIXEIRA
Advogados do(a) APELADO: ARISMAR AMORIM JUNIOR - SP161990-A, MILENA SILVA DE
MIRANDA CASTRO - SP414224-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Contudo, afasto a alegação preambular de reexame necessário, por ter sido proferida a
sentença na vigência do atual Código de Processo Civil, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a
exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior
a 1.000 (mil) salários mínimos.
No caso, à evidência, esse montante não é alcançado, devendo a certeza matemática
prevalecer sobre o teor da Súmula n. 490 do Superior Tribunal de Justiça.
No mais, afasto a prejudicial de prescrição quinquenal, porquanto entre o requerimento
administrativo e o ajuizamento não decorreu lapso superior a cinco anos.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do período de atividade urbana comum
Assim estabelece o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de
segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de
segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante
o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento,
observado o disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência
desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito
quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto
no Regulamento."
As anotações lançadas em Carteira de Trabalho gozam de presunção legal de veracidade "juris
tantum", recaindo sobre o réu os ônus de comprovar a falsidade de suas anotações (Enunciado
n. 12 do C. Tribunal Superior do Trabalho).
Confira-se:
"TST, Enunciado n.º 12. Carteira profissional. As anotações apostas pelo empregador na
carteira profissional do empregado não geram presunção 'juris et de jure', mas apenas 'juris
tantum'."
No mesmo sentido, o seguinte precedente:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RURÍCOLA. INÍCIO
RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL E PROVA TESTEMUNHAL. LAPSO TEMPORAL
LEGALMENTE EXIGIDO NÃO ALCANÇADO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO.
(...)
XVI - Com relação à veracidade das informações constantes da CTPS, esta Corte firmou
entendimento no sentido de que não necessitam de reconhecimento judicial diante da
presunção de veracidade 'juris tantum' de que goza referido documento. As anotações nela
contidas prevalecem até prova inequívoca em contrário, nos termos do Enunciado nº 12 do
TST, constituindo prova plena do serviço prestado nos períodos ali registrados."
(Tribunal Regional Federal da 3ª Região, AC n. 470.691, 9ª Turma, j. em 21/06/2004, DJU de
12/08/2004, p. 504, Rel. Juíza Marisa Santos)
Acrescento que, em se tratando de relação empregatícia, é inexigível a comprovação do
recolhimento das contribuições previdenciárias do trabalhador urbano, pois o encargo desse
recolhimento incumbe ao empregador de forma compulsória, sob fiscalização do órgão
previdenciário.
Nesse sentido é a jurisprudência de que é exemplo o acórdão abaixo transcrito:
"CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. CONCESSÃO.
EMPREGADA RURAL. QUALIFICAÇÃO DE LAVRADOR EXTENSÍVEL À ESPOSA.
APLICAÇÃO ANÁLOGA À UNIÃO ESTÁVEL. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL.
PROVA TESTEMUNHAL. ATIVIDADE COMPROVADA. CARÊNCIA. CONTRIBUIÇÃO
PREVIDENCIÁRIA. VALOR DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA.
JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS.
PREQUESTIONAMENTO.
(...)
6 - O dever legal de recolher as contribuições previdenciárias ao Instituto Autárquico e
descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao
empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência.
(...)
13 - Prejudicado o prequestionamento apresentado pela parte autora em suas razões recursais.
14 - Apelação parcialmente provida."
(TRF/3ª Região; 9ªT; AC 950431, Rel. Desembargador Federal Nelson Bernardes, DJU em
17/05/07, p. 578)
A controvérsia cinge-se à possibilidade de reconhecimento do labor urbano comum de
1º/8/1994 a 11/8/1995.
Dúvida não há acerca da efetiva prestação de serviço, consoante revela a CTPS do litigante
indicando o contrato empregatício celebrado com Fornesse Refeições Balanceadas Ltda. e
opção do FGTS.
De fato, o tempo comum em referência encontra-se cronologicamente anotado em Carteira de
Trabalho e Previdência Social (CTPS), sem indícios de rasura ou adulterações.
Por outro giro, cabia ao INSS comprovar eventual irregularidade das anotações da CTPS do
segurado, ônus dos quais não se desincumbiu nestes autos.
Assim, prospera o pleito de reconhecimento do intervalo comum indicado na sentença.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ,
assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível
tão somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp
894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016,
DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 dB era considerada atividade insalubre até a edição
do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 dB. Isso porque os Decretos n.
83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/73, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/5/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições
ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a
ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n.
9.528/1997, este é emitido com base em laudo técnico elaborado pelo empregador, retrata as
características do trabalho do segurado e traz a identificação do profissional legalmente
habilitado pela avaliação das condições de trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de
atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
No tocante ao interstício enquadrado como especial, de 19/8/1997 a 13/8/2008, a parte autora
logrou demonstrar, via PPP regularmente preenchido, exposição habitual e permanente à
tensão elétrica superior a 250 V, bem como à periculosidade decorrente do risco potencial de
descarga elétrica à integridade física, durante as funções de "eletricista" do sistema elétrico de
potência da Eletropaulo Eletricidade de São Paulo S.A, situação passível de enquadramento no
código 1.1.8 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964.
Sobre a periculosidade, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao apreciar o REsp n. 1.306.113,
sob o regime do artigo 543-C do CPC/1973, concluiu, ao analisar questão relativa à tensão
elétrica superior a 250 V, pela possibilidade do enquadramento especial, mesmo para período
posterior a 5/3/1997, desde que amparado em laudo pericial, por ser meramente exemplificativo
o rol de agentes nocivos constante do Decreto n. 2.172/1997 (STJ, REsp n. 1.306.113/SC, Rel.
Herman Benjamin, Primeira Seção, J: 14/11/2012, DJe: 7/3/2013).
Cumpre observar, ainda, que a exposição de forma intermitente à tensão elétrica não
descaracteriza o risco produzido pela eletricidade, uma vez que o perigo existe tanto para
aquele que se encontra exposto de forma contínua como para aquele que, durante a jornada,
por diversas vezes, ainda que não de forma permanente, tem contato com a eletricidade. (STJ,
6º Turma, REsp 658016, Rel. Hamilton Carvalhido, DJU 21/11/2005).
Frisa-se, ainda, que o uso de EPI não elimina os riscos à integridade física do segurado.
Destarte, os interregnos supra devem ser incluídos na contagem de tempo e somados aos
demais lapsos incontroversos.
No caso dos autos, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142
da Lei n. 8.213/1991.
Presente também o pressuposto temporal, uma vez que a soma dos períodos reconhecidos aos
lapsos incontroversos, até 30/9/2019, confere à parte autora mais de 35anos de profissão,
tempo suficiente à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral.
Contudo, em razão do cômputo de tempo de serviço especial entre a DER e o ajuizamento da
ação, o termo inicial do benefício deve ser fixado na citação (cf. TNU, Pedido de Uniformização
de Interpretação de Lei n. 0002863-91.2015.4.01.3506, Rel. Juiz Federal Sérgio de Abreu Brito,
publicado em 31/10/2018).
Ademais, importante frisar que não são contemplados pela hipótese de reafirmação da DER
(Tema n. 995 do STJ) os casos nos quais o preenchimento dos requisitos ocorre até a data do
ajuizamento da ação (vide STJ; 1ª Seção; EDcl nos EDcl do Resp n. 1.727.063/SP, Rel. Min.
Mauro Campbell Marques; DJ 26/8/2020; DJe 4/9/2020).
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido desrespeito algum à
legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto,rejeito a matéria preliminar e dou parcial provimento à apelação do INSS
para, nos termos da fundamentação,fixar a aposentadoria por tempo de contribuição na citação
- 9/9/2020.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
ATIVIDADE URBANA COMUM. CTPS. TEMPO DE ATIVIDADE ESPECIAL. TENSÃO
ELÉTRICA ACIMA DE 250 VOLTS. PERICULOSIDADE. ENQUADRAMENTO. REQUISITO
TEMPORAL PREENCHIDO ENTRE A DER E O AJUIZAMENTO. POSSIBILIDADE. TERMO
INICIAL NA CITAÇÃO.
- Alegação de remessa oficial afastada, por ter sido proferida a sentença na vigência do atual
Código de Processo Civil, cujo artigo 496, § 3º, I, afasta a exigência do duplo grau de jurisdição
quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 (mil) salários mínimos.
- Não se cogita de prescrição quinquenal, porquanto entre o requerimento administrativo e o
ajuizamento não decorreu lapso superior a cinco anos.
- Inteligência do artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
- As anotações lançadas em Carteira de Trabalho gozam de presunção legal de veracidade
"juris tantum", recaindo sobre o réu os ônus de comprovar a falsidade de suas anotações
(Enunciado n. 12 do C. Tribunal Superior do Trabalho). Precedente.
- Tempo comum demonstrado, cujo período encontra-se cronologicamente anotado em Carteira
de Trabalho e Previdência Social (CTPS), sem indícios de rasura ou adulterações.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995
(Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 dB era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n.
2.172/97, que majorou o nível para 90 dB. Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o
limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis,
sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o regime do
artigo 543-C do CPC/73).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo
ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima
dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a especialidade em razão da exposição habitual e permanente a tensão elétrica
superior a 250 V.
- Possibilidade de reconhecimento da natureza nocente do tempo de serviço em que o
segurado ficou exposto à periculosidade, por ser meramente exemplificativo o rol de agentes
nocivos constante do Decreto n. 2.172/1997. Precedente do STJ.
- A exposição de forma intermitente à tensão elétrica não descaracteriza o risco produzido pela
eletricidade. Precedente.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral mediante DER fixada após o requerimento administrativo
primitivo.
- Em razão do cômputo do tempo de serviço entre a DER e o ajuizamento da ação, o termo
inicial do benefício deve ser fixado na citação. Precedente.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação do INSS parcialmente provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e dar parcial provimento à apelação do INSS,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
