Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001021-78.2018.4.03.6141
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
18/06/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 19/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
CERCEAMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL. ESTIVADOR. ENQUADRAMENTO. EXPOSIÇÃO A
RUÍDOS ACIMA DOS LIMITES LEGALMENTE ADMITIDOS. REQUISITOS PREENCHIDOS.
CONSECTÁRIOS. SUCUMBÊNCIA.
- Nos termos do art.373, I, do CPC, é da parte autora o ônus de comprovar a veracidade dos fatos
constitutivos de seu direito, por meio de prova suficiente e segura, competindo ao juizdecidir a lide
conforme seu livre convencimento,fundado em fatos, provas, jurisprudência, aspectos ligados ao
tema e legislação que entender aplicável ao caso.Cerceamento de defesa não visualizado.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Perfil Profissiográfico Previdenciário atualizado do OGMO, em que atesta, de forma específica,
as condições do ambiente laboral do obreiro, entre 1º/10/1996 e 6/3/2019, e as funções exercidas
como "estivador", “portaló”, “guincheiro”, “motorista de autos”, “conexo”, “C/M Porão”,
"monotécnico", “C/M geral”, “sinaleiro”, “Mot. EA”, “parqueador” entre “outros”, permanecendo
exposto a ruído habitual de 93,6 dB para o lapso até 30/4/2010 e, a partir de 1º/5/2010, a níveis
inferiores a 92 dB, além de gases - monóxido de carbono e poeira/gases minerais.
- A profissão penosa de estivador portuário é considerada especial. Precedentes.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral desde a citação.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR).
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Fica o INSS condenado a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento)
sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, já
aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo (acórdão em vez de sentença),
consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do Superior Tribunal de Justiça. Todavia,
na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito econômico
ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.85, § 4º, II, do CPC).
- A autarquia previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
- Apelação do INSS não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001021-78.2018.4.03.6141
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CELSO ROBSON DE
SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS ADRIANO ANHUCI VICENTE - SP155813-A
APELADO: CELSO ROBSON DE SOUZA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: LUIS ADRIANO ANHUCI VICENTE - SP155813-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001021-78.2018.4.03.6141
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CELSO ROBSON DE
SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS ADRIANO ANHUCI VICENTE - SP155813-A
APELADO: CELSO ROBSON DE SOUZA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: LUIS ADRIANO ANHUCI VICENTE - SP155813-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de tempo de serviço
especial, com vistas à concessão de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido para: "... 1. Reconhecer o caráter especial
do período de atividade do autor, enquanto trabalhador portuário, de 29/04/1995 a 05/03/1997; 2.
Determinar ao INSS que averbe tal período, considerando-o como especial; 3. Reconhecer os
períodos de atividade comum do autor, nos meses de janeiro a dezembro de 1997; outubro a
dezembro de 2000, fevereiro a junho de 2001, agosto de 2001, e de outubro a dezembro de
2001...".
Inconformada, a parte autora interpôs apelação. Inicialmente, alega cerceamento de defesa. No
mérito, pugna pelo reconhecimento da especialidade de todos os períodos descritos na exordial,
nas funções de estivador do Porto de Santos, de acordo com o laudo do OGMO, a possibilitar a
concessão do benefício.
Não resignada, a autarquia também interpôs apelação, na qual sustenta a impossibilidade dos
enquadramentos efetuados.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5001021-78.2018.4.03.6141
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CELSO ROBSON DE
SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: LUIS ADRIANO ANHUCI VICENTE - SP155813-A
APELADO: CELSO ROBSON DE SOUZA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: LUIS ADRIANO ANHUCI VICENTE - SP155813-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: osrecursos atendem aos pressupostos
de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
De início, entendo não configurado o alegado cerceamento de defesa.
Efetivamente, cabe à parte autora, nos termos do artigo 373, I, do CPC, os ônus de comprovar a
veracidade dos fatos constitutivos do direito invocado, por meio de prova suficiente e segura.
Nesse passo, a fim de demonstrar a natureza especial do labor desenvolvido nos lapsos
vindicados, deve a parte suplicante carrear documentos aptos certificadores das condições
insalubres em que permaneceu exposta, com habitualidade e permanência, como formulários
padrão e laudos técnicos individualizados, cabendo ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o
deferimento de prova pericial para confrontação do material reunido à exordial.
Com efeito, compete ao juiz a condução do processo, cabendo-lhe apreciar a questão de acordo
com o que está sendo debatido. Dessa forma, o juiz não está obrigado a decidir a lide conforme
pleiteado pelas partes, mas, sim, conforme seu livre convencimento, fundado em fatos, provas,
jurisprudência, aspectos ligados ao tema e legislação que entender aplicável ao caso.
Se não houver dúvida fundada sobre as condições em que o segurado desenvolveu suas
atividades laborativas, despicienda revela-se a produção de prova pericial para o julgamento da
causa e, por consequência, não estará configurado cerceamento de defesa ou violação de ordem
constitucional ou legal.
Assim, rejeito a preliminar arguida pela parte autora.
Passo à análise das questões de mérito trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais
do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n.
664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de
neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso
concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente
a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição
do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade
do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
No caso dos autos, a parte autora busca a natureza especial de longo período de atividade em
que atuou como estivador do Porto de Santos.
A tanto, trouxe à colação, basicamente, seu histórico laborativo que remonta à década de 80
constante no CNIS, perfil profissiográfico previdenciário (PPP), laudo paradigma de terceiros e
contagem administrativa.
A contagem apurou cerca de 30 anos de profissão ao segurado, após validar a especialidade na
capatazia dos períodos de 10/10/1983 a 31/10/1983, de 1º/12/1983 a 31/3/1987, de 1º/5/1987 a
31/12/1988, de 1º/1/1989 a 31/3/1989 e de 1º/5/1989 a 28/4/1995.
E o julgado reconheceu o interstício de 29/4/1995 a 5/3/1997.
De fato, compulsados os autos, tem-se que o autor laborou na função de Trabalhador Portuário
Avulso (TPA).
O caráter avulso não descaracteriza a habitualidade e permanência aos agentes nocivos, bem
como não impede o reconhecimento da atividade insalubre, pois há garantia e previsão
constitucional para este regime de trabalho, conforme artigo 7, inc. XIV da Constituição Federal:
"Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de
sua condição social:
....
"XIV - jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento,
salvo negociação coletiva”.
Ademais, na dicção do artigo 65 do Decreto n. 3.048/1999: "Considera-se trabalho permanente,
para efeito desta Subseção, aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no
qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja
indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço. Parágrafo único. Aplica-se o
disposto no caput aos períodos de descanso determinados pela legislação trabalhista, inclusive
férias, aos de afastamento decorrentes de gozo de benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria
por invalidez acidentários, bem como aos de percepção de salário-maternidade, desde que, à
data do afastamento, o segurado estivesse exercendo atividade considerada especial."
Com efeito, no caso concreto, a parte autora acostou Perfil Profissiográfico Previdenciário
atualizado (id83336759, p. 1/21), emitido em 6/3/2019 pelo Órgão Gestor de Mão de Obra do
Trabalho Portuário do Porto Organizado de Santos (OGMO), em que atesta, de forma específica,
as condições do ambiente laboral do obreiro, entre 1º/10/1996 e 6/3/2019, e as funções exercidas
como "estivador", “portaló”, “guincheiro”, “motorista de autos”, “conexo”, “C/M Porão”,
"monotécnico", “C/M geral”, “sinaleiro”, “Mot. EA”, “parqueador” entre “outros”, permanecendo
exposto a ruído habitual de 93,6 dB para o lapso até 30/4/2010 e, a partir de 1º/5/2010, a níveis
inferiores a 92 dB, além de gases - monóxido de carbono e poeira/gases minerais.
A profissão penosa de estivador portuário é considerada especial, à luz de remansosa
jurisprudência desta Corte (g.n.):
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NATUREZA
ESPECIAL DAS ATIVIDADES LABORADAS PARCIALMENTE RECONHECIDA. ESTIVADOR.
ENQUADRAMENTO. EXPOSIÇÃO A RUÍDOS ACIMA DOS LIMITES LEGALMENTE
ADMITIDOS. AGENTE FÍSICO. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM
COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. AVERBAÇÃO
DOS PERÍODOS ESPECIAIS. APELAÇÃO DESPROVIDA.
(...)
7. No caso dos autos, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa
totalizam 24 (vinte e quatro) anos, 11 (onze) meses e 01 (um) dia de tempo de contribuição (ID
43693028 – fls. 62/65), não tendo sido reconhecidos como de natureza especial nenhum dos
períodos pleiteados. Por sua vez, considerando a ausência de impugnação recursal pela parte
autora, resta superada a controvérsia em relação aos períodos de 02.03.1992 a 24.01.1994,
29.04.1995 a 31.05.1996 e 03.07.2005 a 31.03.2009, não acolhidos na sentença prolatada.
Ocorre que, no período de 25.01.1994 a 28.04.1995, a parte autora desempenhou a atividade de
estivador, permanecendo exposto a agentes agressivos, tais como intempéries e oscilação nas
condições de temperatura (ID 43693028 – fl. 81), devendo ser reconhecida a natureza especial
das atividades exercidas nesse período em razão do regular enquadramento no código 2.5.6 do
Decreto nº 53.831/64 e código 2.4.5 do Decreto nº 83.080/79. Outrossim, no período de
03.10.1996 a 02.07.2005, a parte autora esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente
admitidos (ID 43693028 – fls. 82/90), devendo ser reconhecida a natureza especial da atividade
exercida nesse período, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto
nº 83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste
ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03".
(TRF3, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL/SP, p. 0009582-69.2013.4.03.6104, Rel. Des. Fed. NELSON
DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, 10T, Data do Julgamento 15/4/2020, Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/4/2020)
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ART. 57 DA LEI N.º 8.213/91. ATIVIDADE
ESPECIAL CARACTERIZADA. ENQUADRAMENTO DA CATEGORIA PROFISSIONAL DE
ESTIVADOR EXERCIDA. COMPROVADA A SUJEIÇÃO CONTÍNUA DO SEGURADO AO
AGENTE FISICO RUÍDO EM PARTE DOS PERÍODOS. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS
NECESSÁRIOS À CONCESSÃO DA BENESSE ALMEJADA.
I - Possibilidade de enquadramento da categoria profissional "estivador", tendo em vista a
previsão legal contida no item 2.5.6, do Anexo III, do Decreto n.º 53.831/64.
II - Comprovada por perícia técnica sujeição contínua do segurado ao agente agressivo ruído em
parte dos períodos de labor.
III - Tempo insuficiente para a concessão do benefício de aposentadoria especial.
IV - Apelação parcialmente provida".
(TRF3, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2272909/SP, p. 0001209-44.2012.4.03.6311, Rel. DES. FED.
DAVID DANTAS, 8T, Data do Julgamento 19/2/2018, Data da Publicação/Fonte e-DJF3 Judicial 1
DATA: 5/3/2018)
Nessa esteira, avaliados os parâmetros postos no PPP, tenho que o interregno de 6/3/1997 a
30/4/2010 pode ser considerado como atividade especial, o que autoriza o enquadramento - pelo
ruído - nos itens 1.1.6 do Decreto n. 53.831/1964 e 2.0.1 do Decreto 3.048/1999.
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não é
realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no art. 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos da
aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
Àqueles, no entanto, que estavam em atividade e ainda não preenchiam os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um adicional de
contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30 anos (homens)
e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de "pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Quanto ao tempo de serviço, a parte autora não reúne tempo suficiente à aposentadoria especial,
porém, somados os períodos enquadrados (devidamente convertidos) aos incontroversos, conta
mais de 40 anos de profissão na data do requerimento administrativo (DER 24/10/2016).
Em decorrência, concluo pelo preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição integral deferida.
Contudo, o termo inicial de concessão e, respectivos efeitos financeiros, são devidos da citação
(1º/3/2019), tendo em vista a apresentação de PPP atualizado somente no curso da lide.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos
na Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017).
Fica afastada a incidência da Taxa Referência (TR) na condenação, pois a Suprema Corte, ao
apreciar embargos de declaração apresentados nesse recurso extraordinário, deliberou pela não
modulação dos efeitos.
Com relação aos juros moratórios, estes devem ser contados da citação (art. 240 do CPC), à
razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, por força do art. 1.062 do CC/1916, até a vigência do
CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a
taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações
introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009 (Repercussão
Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a
tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017.
Invertida a sucumbência, mínima, condeno o INSS a pagar honorários de advogado, arbitrados
em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a
data deste acórdão, consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC e Súmula nº
111 do Superior Tribunal de Justiça. Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser
reduzido, se o caso, na hipótese do artigo 85, § 4º, II, do mesmo estatuto processual, caso a
condenação ou o proveito econômico ultrapassar duzentos salários mínimos (200 sm).
Com relação às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia
Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como
nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia
Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora,
por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Diante do exposto, nego provimento ao apelo do INSS e dou parcial provimento ao recurso da
parte autora para, nos termos da fundamentação: (i) reconhecer a especialidade do interstício de
6/3/1997 a 30/4/2010; (ii) conceder o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
integral, e respectivos efeitos financeiros, desde 1º/3/2019; (iii) discriminar o critério de aplicação
dos consectários. Mantidos, de resto, os demais termos da decisão recorrida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
CERCEAMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL. ESTIVADOR. ENQUADRAMENTO. EXPOSIÇÃO A
RUÍDOS ACIMA DOS LIMITES LEGALMENTE ADMITIDOS. REQUISITOS PREENCHIDOS.
CONSECTÁRIOS. SUCUMBÊNCIA.
- Nos termos do art.373, I, do CPC, é da parte autora o ônus de comprovar a veracidade dos fatos
constitutivos de seu direito, por meio de prova suficiente e segura, competindo ao juizdecidir a lide
conforme seu livre convencimento,fundado em fatos, provas, jurisprudência, aspectos ligados ao
tema e legislação que entender aplicável ao caso.Cerceamento de defesa não visualizado.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Perfil Profissiográfico Previdenciário atualizado do OGMO, em que atesta, de forma específica,
as condições do ambiente laboral do obreiro, entre 1º/10/1996 e 6/3/2019, e as funções exercidas
como "estivador", “portaló”, “guincheiro”, “motorista de autos”, “conexo”, “C/M Porão”,
"monotécnico", “C/M geral”, “sinaleiro”, “Mot. EA”, “parqueador” entre “outros”, permanecendo
exposto a ruído habitual de 93,6 dB para o lapso até 30/4/2010 e, a partir de 1º/5/2010, a níveis
inferiores a 92 dB, além de gases - monóxido de carbono e poeira/gases minerais.
- A profissão penosa de estivador portuário é considerada especial. Precedentes.
- Atendidos os requisitos (carência e tempo de serviço) para a concessão da aposentadoria por
tempo de contribuição integral desde a citação.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, utilizando-se o IPCA-E, afastada a incidência da Taxa Referencial (TR).
Repercussão Geral no RE n. 870.947.
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Fica o INSS condenado a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento)
sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a data deste acórdão, já
aplicada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo (acórdão em vez de sentença),
consoante critérios do artigo 85 do CPC e Súmula n.111 do Superior Tribunal de Justiça. Todavia,
na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito econômico
ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art.85, § 4º, II, do CPC).
- A autarquia previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
- Apelação do INSS não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao apelo do INSS e dar parcial provimento ao recurso da
parte autora. O Desembargador Federal Gilberto Jordan acompanhou a Relatora com ressalva de
entendimento pessoal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
