Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
6076804-91.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
04/06/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. SEM REGISTRO EM CARTEIRA DE
TRABALHO. POSTERIOR À LEI N. 8.213.1991. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS.
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n.
8.213/1991 (31/10/1991), tem sua aplicação restrita aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e
no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não contempla a averbação de tempo de serviço
rural com o fito de obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
- A parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, pois não se fazem
presentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da Constituição
Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Apelação do INSS provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6076804-91.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELSON DONIZETE MORAS
Advogados do(a) APELADO: MARCIO CESAR BERTOLETTI - SP240856-N, ANDREZA
CRISTINA CERRI BERTOLETTI - SP164695-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6076804-91.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELSON DONIZETE MORAS
Advogados do(a) APELADO: MARCIO CESAR BERTOLETTI - SP240856-N, ANDREZA
CRISTINA CERRI BERTOLETTI - SP164695-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: Trata-se de ação de conhecimento
proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na qual a parte autora busca o
reconhecimento de labor rural, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição.
A sentença julgou parcialmente procedente o pedido, para: (i) reconhecer como tempo de serviço
rural os períodos 2/1/1988 a 31/12/1988 e de 7/11/1996 a 10/11/2002, com exceção dos lapsos
trabalhados com registro, independentemente de contribuições, exceto para fins de carência e
contagem recíproca no que se refere ao intervalo anterior a 25/7/1991, e determinar o cômputo
desses interstícios para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, caso
preenchidos os requisitos legais, desde a data do requerimento administrativo, acrescida dos
consectários e por fim, fixou a sucumbência recíproca.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação, no qual alega, em síntese, a
impossibilidade do reconhecimento do tempo de serviço entre 7/11/1996 a 10/11/2002, sem os
devidos recolhimentos previdenciários. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº6076804-91.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NELSON DONIZETE MORAS
Advogados do(a) APELADO: MARCIO CESAR BERTOLETTI - SP240856-N, ANDREZA
CRISTINA CERRI BERTOLETTI - SP164695-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: O recurso de apelação atende aos
pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do tempo de serviço rural
Segundo o artigo 55 e respectivos parágrafos da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 55. O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento,
compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados
de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:
(...)
§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade não determinava
filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será admitida mediante o
recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o Regulamento, observado o
disposto no § 2º.
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta
Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele
correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Também dispõe o artigo 106 da mesma Lei:
"Art. 106. Para comprovação do exercício de atividade rural será obrigatória, a partir 16 de abril
de 1994, a apresentação da Carteira de Identificação e Contribuição - CIC referida no § 3º do art.
12 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.
Parágrafo único. A comprovação do exercício de atividade rural referente a período anterior a 16
de abril de 1994, observado o disposto no § 3º do art. 55 desta Lei, far-se-á alternativamente
através de:
I - contrato individual de trabalho ou Carteira de Trabalho e Previdência Social;
II - contrato de arrendamento, parceria ou comodato rural;
III - declaração do sindicato de trabalhadores rurais, desde que homologada pelo INSS;
IV - comprovante de cadastro do INCRA, no caso de produtores em regime de economia familiar;
V - bloco de notas do produtor rural."
Sobre a prova do tempo de exercício da atividade rural, certo é que o legislador, ao garantir a
contagem de tempo de serviço sem registro anterior, exigiu o início de prova material, no que foi
secundado pelo Superior Tribunal de Justiça quando da edição da Súmula n. 149.
Também está assente, na jurisprudência daquela Corte, ser: "(...) prescindível que o início de
prova material abranja necessariamente esse período, dês que a prova testemunhal amplie a sua
eficácia probatória ao tempo da carência, vale dizer, desde que a prova oral permita a sua
vinculação ao tempo de carência." (AgRg no REsp n. 298.272/SP, Relator Ministro Hamilton
Carvalhido, in DJ 19/12/2002)
No julgamento do REsp n. 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima,
submetido ao rito do art. 543-C do CPC, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), examinando a
matéria concernente à possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao
documento mais antigo apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada
aos autos possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data
do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
No caso vertente, quanto ao período de 7/11/1996 a 10/11/2002, com razão a autarquia.
Com efeito, o possível mourejo rural desenvolvido sem registro em Carteira de Trabalho e
Previdência Social (CTPS), ou na qualidade de produtor rural em regime de economia familiar,
depois da entrada em vigor da legislação previdenciária em comento (31/10/1991), tem sua
aplicação restrita aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e no artigo 143, ambos da Lei n.
8.213/1991, que não contempla a averbação de tempo de serviço rural com o fito de obtenção de
aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Nesse sentido, a jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça:
"PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OCORRÊNCIA DE VÍCIO PROCESSUAL.
NECESSIDADE DE CORREÇÃO. EFEITOS INFRINGENTES. SEGURADO ESPECIAL.
TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO SEM
CONTRIBUIÇÕES MENSAIS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 272 DO STJ. OMISSÃO
VERIFICADA. EMBARGOS ACOLHIDOS COM EFEITO INFRINGENTE. RECURSO ESPECIAL
AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. Constatado erro na decisão embargada, cumpre o acolhimento dos embargos, com efeitos
modificativos para sanar o defeito processual.
2. A autora, produtora rural, ao comercializar os seus produtos, via incidir sobre a sua receita
bruta um percentual, recolhido a título de contribuição obrigatória, que poderia lhe garantir, tão-
somente, a percepção de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-
reclusão ou de pensão. Tal contribuição em muito difere da contribuição facultativa calculada
sobre o salário-base dos segurados e que, nos termos do art. 39, inciso II, da Lei 8.213/91, é
requisito para a aposentadoria por tempo de serviço ora pleiteada.
(...)."
(STJ; EDcl nos EDcl; REsp n. 208.131/RS; 6ª Turma; Relatora Ministra Maria Thereza De Assis
Moura; J 22/11/2007; DJ 17.12.2007, p. 350)
Também, a Súmula n. 272 daquele Tribunal:
"O trabalhador rural, na condição de segurado especial, sujeito à contribuição obrigatória sobre a
produção rural comercializada, somente faz jus à aposentadoria por tempo de serviço, se recolher
contribuições facultativas."
No mesmo sentido, os demais julgados desta Corte: AC n. 2005.03.99.035804-1/SP, Rel. Des.
Federal Marisa Santos, 9ª Turma, DJF3 8/10/2010 e ED na AC 2004.03.99.001762-2/SP, Rel.
Des. Federal Nelson Bernardes, 9ª Turma, DJF3 29/7/2010.
Desse modo, o intervalo de 7/11/1996 a 10/11/2002 não pode ser computado como trabalho rural,
sem registro em CTPS.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos para obtenção
da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
No entanto, àqueles que estavam em atividade e não haviam preenchido os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos de idade para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um
adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30
anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de
"pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Contudo, nessas circunstâncias, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de
contribuição, pois não se fazem presentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e
201, § 7º, inciso I, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n.
20/1998.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à
legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, dou provimento à apelação do INSS para, nos termos da fundamentação,
julgar improcedentes os pedidos: (i) de reconhecimento de tempo de serviço rural, sem registro
em CTPS, em relação ao período de 7/11/1996 a 10/11/2002, e (ii) de concessão de
aposentadoria por tempo de contribuição.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. SEM REGISTRO EM CARTEIRA DE
TRABALHO. POSTERIOR À LEI N. 8.213.1991. IMPOSSIBILIDADE. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS.
- O mourejo rural desenvolvido sem registro em CTPS, depois da entrada em vigor da Lei n.
8.213/1991 (31/10/1991), tem sua aplicação restrita aos casos previstos no inciso I do artigo 39 e
no artigo 143, ambos dessa mesma norma, que não contempla a averbação de tempo de serviço
rural com o fito de obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
- A parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, pois não se fazem
presentes os requisitos dos artigos 52 da Lei n. 8.213/1991 e 201, § 7º, inciso I, da Constituição
Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998.
- Apelação do INSS provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação autárquica, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
