Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5005495-63.2018.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
03/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 06/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CERCEAMENTO. TUTELA DE
URGÊNCIA. VIGILANTE. TEMA 1031 STJ. PPP. ENQUADRAMENTO. REQUISITOS
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO NA DER. CONSECTÁRIOS. SUCUMBÊNCIA.
- Não se cogita de cerceamento, pois efetivamente cabe à parte autora, nos termos do artigo 373,
I, do CPC, os ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos do direito invocado, por
meio de prova suficiente e segura.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC/73).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Presença de Perfil Profissiográfico Previdenciário, o qual anota o ofício de "vigilante" patrimonial,
restando configurada, desse modo, a existência de risco à integridade física da parte autora
(periculosidade), inerente às suas funções. Precedentes.
- Inteligência da tese fixada no Tema 1031 do STJ.
- Presente o quesito temporal, uma vez que a soma de todos os períodos de trabalho confere à
parte autora mais de 25anos na DER.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento)
ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da
caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo final
de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Em razão da sucumbência, deve o INSS arcar com os honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a
data deste acórdão, já computada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo
(acórdão em vez de sentença), consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC e
verbete da Súmula n. 111 do STJ.
- A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Matéria preliminar afastada.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005495-63.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: CICERO OLEGARIO DOMINGOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO CARLOS DE AZEVEDO - SP168579-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CICERO OLEGARIO
DOMINGOS
Advogado do(a) APELADO: ROBERTO CARLOS DE AZEVEDO - SP168579-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005495-63.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: CICERO OLEGARIO DOMINGOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO CARLOS DE AZEVEDO - SP168579-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CICERO OLEGARIO
DOMINGOS
Advogado do(a) APELADO: ROBERTO CARLOS DE AZEVEDO - SP168579-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia
oenquadramento de atividade insalubre,com vistas à concessão de aposentadoria especial.
A sentença foi proferida nestes termos:
"julgo parcialmente procedentes os pedidos para: a) reconhecer como tempo especial os
períodos laborados para Oliveira Bastos – Utilfast Indústria Metalúrgica (de 01/09/1987 a
29/08/1989) e Center Norte S/A Construção (de 10/11/1993 a 28/04/1995); b) reconhecer 27
anos, 05 meses e 04 dias de tempo total de contribuição na data da DER: 02/05/2017.
Presentes os elementos da probabilidade do direito e o perigo de dano, nos termos do art. 300
do CPC, concedo a tutela de urgência para determinar que a autarquia federal reconheça o
tempo ora discriminado para fins de novo requerimento administrativo do autor, , no prazo de 20
(vinte) dias, comprovando nos autos o
cumprimento. Considerando a sucumbência recíproca das partes, condeno o autor e o réu ao
pagamento, cada um, de honorários advocatícios de sucumbência de percentual de 5% (cinco
por cento) do valor atribuído à causa, nos termos do art. 85, § 4º, III do CPC. Em relação ao
autor, beneficiário de justiça gratuita, a execução fica suspensa nos termos do art. 98, § 3º do
CPC.".
Inconformada, a parte autora recorreu, suscitando, inicialmente, cerceamento de defesa. Na
questão de fundo, pugnou pelo reconhecimento dos lapsos insalubres afastados pelo julgado, o
que lhe assegura o benefício em foco na DER.
A autarquia também interpôs apelação. Insurgiu-se, inicialmente, contra a tutela de urgência
concedida, opondo-se, no mérito, ao enquadramento efetuado, à míngua de comprovação da
natureza insalubredo ofício. Prequestionou a matéria para fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
Apreciado tema repetitivo relacionado a este processo, a suspensão foi levantada e os autos
vieram conclusos.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005495-63.2018.4.03.6183
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: CICERO OLEGARIO DOMINGOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
- INSS
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO CARLOS DE AZEVEDO - SP168579-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, CICERO OLEGARIO
DOMINGOS
Advogado do(a) APELADO: ROBERTO CARLOS DE AZEVEDO - SP168579-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
De início, afasto a alegação de não cabimento da tutela jurídica antecipada. Convencido o
julgador do direito da parte, e presentes os requisitos do art. 497 do CPC, a tutela jurisdicional
pode ser antecipada na prolação da sentença.
Por outro lado, não prospera a anulação da sentença, pois efetivamente cabe à parte autora,
nos termos do artigo 373, I, do CPC, os ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos
do direito invocado, por meio de prova suficiente e segura.
Nesse passo, a fim de demonstrar a natureza nocente do labor, deve a parte suplicante carrear
documentos aptos certificadores das condições insalubres em que permaneceu exposta, como
formulários patronais e laudos técnicos individualizados, cabendo ao magistrado, em caso de
dúvida, o deferimento de prova pericial para confrontação do material reunido à exordial.
Ao julgador compete a condução do processo, cabendo-lhe apreciar a questão de acordo com o
debatido e não está obrigado a decidir a lide conforme pleiteado pelas partes, senão conforme
seu convencimento, respeitada obviamente a dialogicidade necessária, com base em fatos,
provas, jurisprudência, aspectos ligados ao tema e legislação que entender aplicável ao caso.
Se não houver dúvida sobre as condições deletérias da atividade, despicienda se afigura a
produção de prova pericial para o julgamento da causa e, por consequência, não estará
configurado cerceamento de defesa ou violação de ordem constitucional ou legal.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ,
assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível
tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp
894.266/SP, Rel. Min.HERMAN BENJAMIN, 2T, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/5/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n.
664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de
neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso
concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar
completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na
hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do
EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao PPP, instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n. 9.528/1997, este é emitido com base
em laudo técnico elaborado pelo empregador,retrata as características do trabalho do segurado
e traz a identificação do profissional legalmente habilitado pela avaliação das condições de
trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
A parte autora busca neste recursoo reconhecimento da especialidadedos períodos de
8/11/1989 a 22/6/1990, no segmento de galvanização, e de 29/4/1995 a 2/5/2017 nas funções
de vigilante.
Com efeito, para o primeiro período, constato a presença de CTPS apontando a profissão de
"ajudante geral" em indústria de galvanoplastia, o que não assegura o enquadramento
pleiteado, à míngua de maiores detalhes acerca das atribuições do obreiro.
De fato, a ocupação registrada em CTPS é deveras genérica e não permite a automática
correlação com a atividade fabril da empregadora do segmento de galvanização, razão pela
qual deve ser contado como tempo normal.
Em relação ao período de 29/4/1995 a 2/5/2017, verifico a presença de Perfil Profissiográfico
Previdenciário, o qual anota o ofício de "vigilante" patrimonial, restando configurada, desse
modo, a existência de risco à integridade física da parte autora (periculosidade), inerente às
suas funções.
Ademais, quanto à possibilidade de enquadramento em razão da periculosidade, o STJ, ao
apreciar Recurso Especial n. 1.306.113, reconheceu a controvérsia da matéria e concluiu pela
possibilidade de reconhecimento, como especial, do tempo de serviço no qual o segurado ficou
sujeito a periculosidade no período posterior a 5/3/1997, por ser meramente exemplificativo o rol
de agentes nocivos constante do Decreto n. 2.172/1997 (STJ, REsp n. 1.306.113/SC, Rel.
Herman Benjamin, Primeira Seção, J: 14/11/2012, DJe: 7/3/2013).
No mesmo sentido, o STJ julgou, em 9/12/2020, o Tema 1031 que tratava dapossibilidade de
reconhecimento do tempo de serviço especial para a atividade de vigilante, exercida após a
edição da Lei n. 9.032/1995 e do Decreto n. 2.172/1997, com ou sem o uso de arma de fogo,
nos seguintes termos:
“É admissível o reconhecimento da atividade especial de vigilante, com ou sem arma de fogo,
em data posterior à edição da Lei 9.032/95 e do Decreto 2.172/97, desde que haja
comprovação da efetiva nocividade da atividade por qualquer meio de prova até 05.03.1997 e,
após essa data, mediante apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente,
para comprovar a permanente, não ocasional, nem intermitente, exposição a agente nocivo que
coloque em risco a integridade física do segurado”.
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas na profissiografia, conclui-se que, na
hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Da aposentadoria especial
A aposentadoria especial prevista no art. 57 da Lei n. 8.213/1991 pressupõe o exercício de
atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 (quinze, vinte ou vinte e cinco) anos,
e, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a
100% (cem por cento) do salário de benefício (§ 1º do art. 57).
Nessas circunstâncias, considerados todos intervalos enquadrados como atividade especial, a
parte autora conta 25 (vinte e cinco) anos de labor degradante até a DER e, desse modo, faz
jus à concessão do benefício de aposentadoria especial, nos termos do artigo 57 e parágrafos
da Lei n. 8.213/1991.
O termo inicial do benefício deve ser fixado no requerimento (DER 2/5/2017), consoante
entendimento sedimentado no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da
legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os
cálculos na Justiça Federal.
Fica afastada a incidência da Taxa Referencial (TR) na condenação (Repercussão Geral no RE
n. 870.947).
Com relação aos juros moratórios, estes devem ser contados da citação (art. 240 do CPC), à
razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, por força do art. 1.062 do CC/1916, até a vigência do
CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos
termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, utilizando-se, a partir de julho de 2009,
a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações
introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009 (Repercussão
Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a
tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017.
Invertida a sucumbência, mínima, condeno o INSS a arcar com os honorários de advogado,
arbitrados em 10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas
vencidas até a data deste acórdão, já computada a sucumbência recursal pelo aumento da
base de cálculo (acórdão em vez de sentença), consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I,
e 11, do CPC e verbete da Súmula n. 111 do STJ.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se a condenação ou o proveito
econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (artigo 85, § 4º, II, do CPC).
Com relação às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia
Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/1974, 8.620/1993 e 9.289/1996,
bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/1985 e 11.608/2003. Contudo, tal isenção não exime a
Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à
parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido desrespeito algum à
legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, afasto a matéria preliminar, nego provimento à apelação do INSS e dou
parcial provimento ao apelo do autor para, nos termos da fundamentação: (i) determinar o
enquadramento, como atividade especial, do período de 29/4/1995 a 2/5/2017; (ii) determinar a
concessão do benefício de aposentadoria especial desde o requerimento administrativo (DER
2/5/2017), compensado como possível provento recebido acumuladamente; (iii) discriminar os
consectários legais.
Por fim, mantenho a tutela de urgência deferida, mas para determinar ao INSS a concessão de
aposentadoria especial.
Informe-se à Autarquia, via sistema, para fins de adaptação e cumprimento da ordem judicial.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CERCEAMENTO. TUTELA DE
URGÊNCIA. VIGILANTE. TEMA 1031 STJ. PPP. ENQUADRAMENTO. REQUISITOS
PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO NA DER. CONSECTÁRIOS. SUCUMBÊNCIA.
- Não se cogita de cerceamento, pois efetivamente cabe à parte autora, nos termos do artigo
373, I, do CPC, os ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos do direito invocado,
por meio de prova suficiente e segura.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995
(Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do
Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882,
de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido
para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260,
sob o regime do artigo 543-C do CPC/73).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo
ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima
dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Presença de Perfil Profissiográfico Previdenciário, o qual anota o ofício de "vigilante"
patrimonial, restando configurada, desse modo, a existência de risco à integridade física da
parte autora (periculosidade), inerente às suas funções. Precedentes.
- Inteligência da tese fixada no Tema 1031 do STJ.
- Presente o quesito temporal, uma vez que a soma de todos os períodos de trabalho confere à
parte autora mais de 25anos na DER.
- A correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação
superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na
Justiça Federal, afastada a incidência da Taxa Referencial – TR (Repercussão Geral no RE n.
870.947).
- Os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês,
até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por
cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração
da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947), observada, quanto ao termo
final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
- Em razão da sucumbência, deve o INSS arcar com os honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre a condenação, computando-se o valor das parcelas vencidas até a
data deste acórdão, já computada a sucumbência recursal pelo aumento da base de cálculo
(acórdão em vez de sentença), consoante critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC e
verbete da Súmula n. 111 do STJ.
- A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais no Estado de São Paulo.
Contudo, essa isenção não a exime do pagamento das custas e despesas processuais em
restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
- Matéria preliminar afastada.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.
- Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à
apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
