Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5297853-90.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
19/06/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 24/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE. TEMA 1031 STJ.
RUÍDO. LAUDO PERICIAL. PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO. AUTOMATICIDADE.
ENQUADRAMENTO. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO NA DER.
CONSECTÁRIOS. SUCUMBÊNCIA.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC/73).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Presença de laudo técnico pericial da confiança do Juízo, apontando exposição habitual e
permanente a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância estabelecidos na legislação
previdenciária, bem como a agentes químicos hidrocarbonetos, o que autoriza o enquadramento
nos códigos 1.1.6, 1.2.11 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964, 1.1.5, 1.2.10 do anexo ao Decreto
n. 83.080/1979, 1.0.17, 2.0.1 e 2.0.4 dos anexos aos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Precedentes.
- A perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado de fazer prova de
condição de trabalho especial.
- Presença de laudo pericial e carteira nacional de vigilante, indicando a profissão perigosa do
autor de "vigilante" armado, responsável pela segurança patrimonial, de modo que resta
configurada a existência de risco à sua integridade física (periculosidade), inerente às suas
funções - código 2.5.7 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964. Precedentes.
- Inteligência da tese fixada no Tema 1031 do STJ.
- Presente o quesito temporal, uma vez que a soma de todos os períodos de trabalho confere à
parte autora mais de 25anos na DER, consoante compreensão jurisprudencial.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados
por ocasião da liquidação do julgado.
- Mantida a condenação do INSSa arcar com os honorários de advogado, cujo percentual sobe
para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data
da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§
1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Matéria preliminar afastada.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5297853-90.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADEVANE APARECIDO DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: JEAN CARLOS MICHELIN - SP322795-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5297853-90.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADEVANE APARECIDO DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: JEAN CARLOS MICHELIN - SP322795-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia
oenquadramento de atividade especial,com vistas à concessão de aposentadoria especial ou
por tempo de contribuição.
A sentença foi proferida nestes termos:
"JULGO PROCEDENTE o pedido inicial para: 1) reconhecer que o autor exerceu atividades
especiais nos seguintes períodos: 02.01.1985 a 22.05.1990; 03.05.1993 a 23.02.1996;
01.08.1996 a 07.09.1997; 01.09.1997 a 30.09.2002; 07.03.2002 a 19.06.2005; 21.06.2005 a
05.10.2006; 08.11.2006 a 04.09.2014 e 01.06.2015 a 16.02.2018 - devendo o instituto réu
proceder à devida averbação no cadastro previdenciário do autor; 2) condenar a autarquia a
conceder ao autor aposentadoria especial, a partir do requerimento administrativo (16.02.2018
fls.80). Assim o faço com resolução do mérito, nos termos do art.487, I do Código de Processo
Civil. A correção monetária deverá observar o percentual cominado pelo Índice de Preços ao
Consumidor Amplo Especial IPCA-E. Já os juros de mora observarão o disposto no art.1º-F da
Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09. A atualização deverá incidir até a
data de expedição do precatório, caso este seja pago no prazo estabelecido pelo art. 100 da
CF/88(STF, RE298.616 SP). Segundo restou decidido no julgamento do RE nº 579.431,
"incidem juros de mora entre a data da realização dos cálculos e a da requisição ou do
precatório". Referentemente à verba honorária, condeno o INSS ao pagamento dos honorários
advocatícios do advogado do autor, que fixo em 10% (artigo 85, §3º, inciso I, do CPC), sendo
que sua incidência deve ocorrer sobre as parcelas vencidas até a data desta sentença, nos
termos da Súmula 111 do STJ. Sentença não sujeita a reexame necessário, vez que, apesar de
ilíquida, o valor da condenação não suplanta 1.000 salários. R.P.I. Oportunamente, arquivem-se
os autos".
A autarquia interpôs apelação. Inicialmente, impugnou a justiça gratuita e arguiu prescrição
quinquenal. No mérito, opôs-se ao enquadramento efetuado nas funções de vigilante e com
exposição a agentes nocivos, à míngua de comprovação da natureza insalubredo ofício.
Ademais, destacou a ausência de prévia fonte de custeio para pagar a aposentadoria especial.
Por cautela, requereu modificação no termo inicial de concessão. Prequestionou a matéria para
fins recursais.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
Apreciado tema repetitivo relacionado a este processo, a suspensão foi levantada e os autos
vieram conclusos.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5297853-90.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADEVANE APARECIDO DE SOUZA
Advogado do(a) APELADO: JEAN CARLOS MICHELIN - SP322795-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso atende aos pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
De plano, afasto o pleito de revogação da gratuidade, haja vista o regular recolhimento das
custas do processo pelo autor (id 138678478 p. 1/3).
Ademais, não se cogita de prescrição quinquenal, pois entre o requerimento administrativo e o
ajuizamento da ação não decorreu lapso superior a 5 (cinco) anos.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma; Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/02/2008, DJe 07/04/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ,
assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível
tão-somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp
894.266/SP, Rel. Min.HERMAN BENJAMIN, 2T, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC/1973, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa
do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/5/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições
ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n.
664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de
neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso
concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar
completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na
hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do
EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
Em relação ao PPP, instituído pelo art. 58, § 4º, da Lei n. 9.528/1997, este é emitido com base
em laudo técnico elaborado pelo empregador,retrata as características do trabalho do segurado
e traz a identificação do profissional legalmente habilitado pela avaliação das condições de
trabalho, apto, portanto, a comprovar o exercício de atividade sob condições especiais.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Neste caso, em relação aos intervalos enquadrados como especiais, de 2/1/1985 a 22/5/1990,
de 3/5/1993 a 23/2/1996, de 8/11/2006 a 4/9/2014 e de 1º/6/2015 a 16/2/2018, consta laudo
técnico pericial da confiança do Juízo, apontando exposição habitual e permanente a ruído em
níveis superiores aos limites de tolerância estabelecidos na legislação previdenciária, bem
como agentes químicos hidrocarbonetos, o que autoriza o devido enquadramento nos códigos
1.1.6, 1.2.11 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964, 1.1.5, 1.2.10 do anexo ao Decreto n.
83.080/1979, 1.0.17, 2.0.1 e 2.0.4 dos anexos aos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
No mais, os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos, em especial os
hidrocarbonetos, não requerem análise quantitativa, senão qualitativa. Nesse sentido: TRF4,
APELREEX50611258620114047100/RS, Rel.(Auxílio Vânia) PAULO PAIM DA SILVA,
Julgamento: 09/07/2014, 6T, Data de Publicação: D.E. 10/07/2014; TRF1,
AC00435736820104013300, Rel.JUIZ FEDERAL ANTONIO OSWALDO SCARPA, Julgamento:
14/12/2015, 1ª CÂMARA REG.PREVID.DA BAHIA, Data de Publicação: 22/01/2016 e-DJF1 P.
281.
Assinalo que a perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado de
fazer prova de condição de trabalho especial (REsp 1370229/RS, MAURO CAMPBELL
MARQUES, 2T, julgado em 25/2/2014; REsp 201700371993, HERMAN BENJAMIN, 2T, DJe:
2/5/2017).
Cumpre ainda reconhecer o caráter degradante dos lapsos de 1º/8/1996 a 7/9/1997, de
1º/9/1997 a 30/9/2002, de 7/3/2002 a 19/6/2005, de 21/6/2005 a 5/10/2006, com base no
mesmo laudo pericial e carteira nacional de vigilante, indicando a profissão perigosa do autor de
"vigilante" armado, responsável pela segurança patrimonial, de modo que resta configurada,
assim, a existência de risco à sua integridade física (periculosidade), inerente às suas funções -
código 2.5.7 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964.
Ademais, no que tange à possibilidade de enquadramento em razão da periculosidade, o STJ,
ao apreciar Recurso Especial n. 1.306.113, reconheceu a controvérsia da matéria e concluiu
positivamente pelo reconhecimento, como insalutífero, do tempo de serviço no qual o segurado
ficou sujeito à periculosidade em período posterior a 5/3/1997, por ser meramente
exemplificativo o rol de agentes nocivos constante do Decreto n. 2.172/1997 (STJ, REsp n.
1.306.113/SC, Rel. Herman Benjamin, Primeira Seção, J: 14/11/2012, DJe: 7/3/2013).
Por oportuno, cumpre invocar conclusão do julgamento do Tema 1031, publicado no DJe de
2/3/2021, por meio do qual o Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento sobre a
possibilidade de reconhecimento do tempo de serviço especial para a atividade de vigilante,
exercida após a edição da Lei n. 9.032/1995 e do Decreto n. 2.172/1997, com ou sem o uso de
arma de fogo, mediante fixação da seguinte tese:
“É admissível o reconhecimento da atividade especial de vigilante, com ou sem arma de fogo,
em data posterior à edição da Lei 9.032/95 e do Decreto 2.172/97, desde que haja
comprovação da efetiva nocividade da atividade por qualquer meio de prova até 05.03.1997 e,
após essa data, mediante apresentação de laudo técnico ou elemento material equivalente,
para comprovar a permanente, não ocasional, nem intermitente, exposição a agente nocivo que
coloque em risco a integridade física do segurado”.
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas na profissiografia, conclui-se que, na
hipótese, o EPI não é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Saliento, por fim, quanto à suposta violação aos princípios do equilíbrio atuarial e financeiro e
da prévia fonte de custeio, que questões afetas ao recolhimento da contribuição adicional ao
SAT por parte da empresa não devem, em tese, influir no cômputo como especial da atividade
exercida pelo segurado, mercê do princípio da automaticidade (artigo 30, I, da Lei
n.8.212/1991), haja vista caber ao empregador o recolhimento das contribuições
previdenciárias, inclusive as devidas pelo segurado.
Nesse sentido: "(...) E no que concerne ao pagamento das respectivas contribuições,
relativamente ao interregno do labor reconhecido, é de se ressaltar que compete ao
empregador a arrecadação e o recolhimento do produto aos cofres públicos, a teor do artigo 30,
inciso I, "a" e "b" da Lei 8.212/91 e ao Instituto Nacional da Seguridade Social a arrecadação,
fiscalização, lançamento e recolhimento de contribuições, consoante dispõe o artigo 33 do
aludido diploma legal, não podendo ser penalizado o empregado pela ausência de registro em
CTPS, quando deveria ter sido feito em época oportuna, e muito menos pela ausência das
contribuições respectivas, quando não deu causa. 3. E, no caso dos autos, houve a
determinação de recolhimento das contribuições previdenciárias devidas, conforme observado
dos termos da cópia da reclamação trabalhista apresentada pela parte autora, com a exordial".
(TRF3, Ap 00204944120174039999, AC 2250162, Rel. DES. FED. TORU YAMAMOTO, 7T,
Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA: 25/9/2017, FONTE_REPUBL.).
Da aposentadoria especial
A aposentadoria especial prevista no art. 57 da Lei n. 8.213/1991 pressupõe o exercício de
atividade considerada especial pelo tempo de 15, 20 ou 25 (quinze, vinte ou vinte e cinco) anos,
e, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a
100% (cem por cento) do salário de benefício (§ 1º do art. 57).
Nessas circunstâncias, considerados todos intervalos enquadrados como atividade especial, a
parte autora conta 25 (vinte e cinco) anos de labor degradante até a DER originalmente
formulada (16/2/2018) e, desse modo, faz jus à concessão do benefício de aposentadoria
especial, nos termos do artigo 57 e parágrafos da Lei n. 8.213/1991.
Sobre o termo inicial do benefício, algumas considerações devem ser feitas.
De plano, como a comprovação da atividade debatida ocorreu apenas nestes autos, por meio
de prova não submetida à prévia apreciação administrativa, penso ser adequada a fixação do
termo inicial dos efeitos financeiros na citação, momento em que a autarquia teve ciência da
pretensão, em sua plenitude, e a ela pôde resistir.
Quanto a esse aspecto, destaca-se o fato de o Poder Judiciário exercer suas atribuições em
substituição à Administração que deve praticar os atos que lhe são inerentes como atividade
primária.
Vale dizer: preponderantemente, apenas os atos que a Administração deveria, por lei, praticar
podem ser passíveis de controle judicial, sob o enfoque de possível lesão ou ameaça a direito.
Nessa esteira, a concessão de benefício fundada em prova produzida exclusivamente na esfera
judicial, por impedir a Administração de exercer o pleno exercício das atribuições que lhe são
inerentes, afasta a configuração de mora da autarquia e a possibilidade de fixação do termo
inicial na data do requerimento administrativo.
Afinal, a insuficiência ou inaptidão de elementos probatórios do direito invocado configura
situação que, de forma indireta, inviabiliza o exercício de atividade própria da Administração.
A propósito, esses mesmos fundamentos foram evocados pelo Ministro Roberto Barroso ao
apreciar, sob o regime da repercussão geral, o RE n. 631.240 e fixar tese sobre a necessidade
de prévio requerimento administrativo nas ações de conhecimentos de cunho previdenciário.
Confira-se o seguinte trecho do voto:
“17. Esta é a interpretação mais adequada ao princípio da separação de Poderes. Permitir que
o Judiciário conheça originariamente de pedidos cujo acolhimento, por lei, depende de
requerimento à Administração significa transformar o juiz em administrador, ou a Justiça em
guichê de atendimento do INSS, expressão que já se tornou corrente na matéria. O Judiciário
não tem, e nem deve ter, a estrutura necessária para atender às pretensões que, de ordinário,
devem ser primeiramente formuladas junto à Administração. O juiz deve estar pronto, isto sim,
para responder a alegações de lesão ou ameaça a direito. Mas, se o reconhecimento do direito
depende de requerimento, não há lesão ou ameaça possível antes da formulação do pedido
administrativo. Assim, não há necessidade de acionar o Judiciário antes desta medida....”
Não obstante o entendimento acima sufragado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em
incidente de uniformização de jurisprudência, previsto no artigo 14, § 4º, da Lei n. 10.259/2001,
ao tratar especificamente da matéria, deliberou pela prevalência da seguinte orientação (g. n.):
“A comprovação extemporânea da situação jurídica consolidada em momento anterior não tem
o condão de afastar o direito adquirido do segurado, impondo-se o reconhecimento do direito ao
benefício previdenciário no momento do requerimento administrativo, quando preenchidos os
requisitos para a concessão da aposentadoria”. (Pet 9.582/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 16/09/2015)
No mesmo sentido são os recentes julgados da Corte Superior: REsp 1.859.330/CE, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/3/2020, DJe 31/8/2020;
AgInt no REsp 1.609.332/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado
em 19/03/2019, DJe 26/3/2019.
Dessa forma, curvo-me ao entendimento do STJ para fixar o termo inicial da concessão do
benefício na data do requerimento administrativo (DER 16/2/2018).
Todavia, deve ser observada a incompatibilidade de continuidade do exercício em atividade
especial, sob pena de cessação da aposentadoria especial, na forma do artigo 57, § 8º, da Lei
n. 8.213/1991 e nos termos do julgamento do Tema 709 do STF.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Fica mantida a condenação do INSSa arcar com os honorários de advogado, cujo percentual
majoro para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas
após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios
do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou
do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC).
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido desrespeito algum à
legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, afasto a matéria preliminar e nego provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE. TEMA 1031 STJ.
RUÍDO. LAUDO PERICIAL. PRÉVIA FONTE DE CUSTEIO. AUTOMATICIDADE.
ENQUADRAMENTO. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO CONCEDIDO NA DER.
CONSECTÁRIOS. SUCUMBÊNCIA.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995
(Lei n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do
Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882,
de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido
para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260,
sob o regime do artigo 543-C do CPC/73).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo
ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima
dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Presença de laudo técnico pericial da confiança do Juízo, apontando exposição habitual e
permanente a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância estabelecidos na legislação
previdenciária, bem como a agentes químicos hidrocarbonetos, o que autoriza o
enquadramento nos códigos 1.1.6, 1.2.11 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964, 1.1.5, 1.2.10 do
anexo ao Decreto n. 83.080/1979, 1.0.17, 2.0.1 e 2.0.4 dos anexos aos Decretos n. 2.172/1997
e n. 3.048/1999. Precedentes.
- A perícia por similaridade é aceita pela jurisprudência como meio adequado de fazer prova de
condição de trabalho especial.
- Presença de laudo pericial e carteira nacional de vigilante, indicando a profissão perigosa do
autor de "vigilante" armado, responsável pela segurança patrimonial, de modo que resta
configurada a existência de risco à sua integridade física (periculosidade), inerente às suas
funções - código 2.5.7 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964. Precedentes.
- Inteligência da tese fixada no Tema 1031 do STJ.
- Presente o quesito temporal, uma vez que a soma de todos os períodos de trabalho confere à
parte autora mais de 25anos na DER, consoante compreensão jurisprudencial.
- Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser
compensados por ocasião da liquidação do julgado.
- Mantida a condenação do INSSa arcar com os honorários de advogado, cujo percentual sobe
para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a
data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo
85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Matéria preliminar afastada.
- Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
