Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001971-79.2020.4.03.6311
Relator(a)
Juiz Federal OMAR CHAMON
Órgão Julgador
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
07/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 21/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
LAUDO PERICIAL FAVORÁVEL. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO NA DATA DE INÍCIO
DA INCAPACIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE O CONTRARIEM. PROCEDÊNCIA
DO PEDIDO. RECURSO PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001971-79.2020.4.03.6311
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MAIRA PORCHAT DE ASSIS MOTA
Advogados do(a) RECORRENTE: NATASHA CRISTINA FRANCISCO - SP365796,
FERNANDA RAMOS GONCALVES ZANOTTO - SP432331-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001971-79.2020.4.03.6311
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MAIRA PORCHAT DE ASSIS MOTA
Advogados do(a) RECORRENTE: NATASHA CRISTINA FRANCISCO - SP365796,
FERNANDA RAMOS GONCALVES ZANOTTO - SP432331-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou ação objetivando a concessão de benefício por incapacidade.Proferida
sentença, o pedido foi julgado improcedente em razão da perda da qualidade de
segurado.Desta forma, interpõe a parte autora o presente recurso postulando a ampla reforma
da sentença.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001971-79.2020.4.03.6311
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: MAIRA PORCHAT DE ASSIS MOTA
Advogados do(a) RECORRENTE: NATASHA CRISTINA FRANCISCO - SP365796,
FERNANDA RAMOS GONCALVES ZANOTTO - SP432331-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Requisitos
Os requisitos exigidos pela lei para a concessão de aposentadoria por incapacidade
permanente ou do auxílio por incapacidade temporária são os seguintes: a) a condição de
segurado da parte requerente, mediante prova de sua filiação ao sistema da Previdência Social;
b) a comprovação de ser a parte requerente incapaz permanente ou temporariamente para o
trabalho; c) a manutenção da sua condição de segurado na data do evento que determina a
concessão desse benefício, ou seja, da incapacidade; d) o cumprimento da carência.
Incapacidade
A mera existência de uma doença, por si só, não gera o direito a benefício por incapacidade.
Tanto o auxílio por incapacidade temporária quanto a aposentadoria por incapacidade
permanente pressupõem a existência de incapacidade laborativa, decorrente da instalação de
uma doença ou lesão, sendo que a distinção entre tais benefícios reside na intensidade de risco
social que acometeu o segurado, assim como a extensão do tempo pelo qual o benefício
poderá ser mantido.
O auxílio por incapacidade temporária será concedido quando o segurado ficar incapacitado
total e temporariamente para exercer suas atividades profissionais habituais, devendo-se
entender como habitual a atividade para a qual o interessado está qualificado e que desenvolvia
antes do evento incapacitante.
A aposentadoria por incapacidade permanente, por sua vez, é devida quando o segurado ficar
incapacitado total e definitivamente de desenvolver qualquer atividade laborativa e for
insusceptível de reabilitação para o exercício de outra atividade, adequada a sua escolaridade
formal, que lhe garanta a subsistência.
Nova perícia ou esclarecimentos.
Considerando a condição do magistrado de destinatário da prova (artigo 370, CPC/2015), é
importante frisar que “só ao juiz cabe avaliar a necessidade de nova perícia” (JTJ 142/220,
197/90, 238/222). De tal forma, compete apenas ao juiz apreciar a conveniência de realização
de nova avaliação, bem como o acolhimento de quesitos complementares (artigo 470, I c/c
artigo 480, CPC/2015), sendo certo que “o julgamento antecipado da lide tem total amparo
legal, decorrente da aplicação do CPC 330, I, não se configurando afronta aos CPC 425 e
331”.(STJ, 6ª Turma, AI 45.539/MG, Relator Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em
16/12/1993, decisão monocrática, DJ de 08/02/1994, grifos nossos).
É importante registrar que a simples contrariedade entre as conclusões dos laudos trazidos pela
parte ou pelo INSS, no processo administrativo, com as conclusões do perito judicial não é
suficiente para que seja convertido o julgamento em diligência, para a produção de novo laudo.
Novo laudo exige desqualificação do primeiro, seja em face de sua superficialidade ou omissão,
seja em face de baixa qualidade técnica. De outra forma, jamais o processo se encerraria, pois
sempre a parte descontente poderia requerer uma terceira perícia, para “desempatar”.
Qualidade de segurado
A qualidade de segurado se adquire com a filiação ao Regime Geral da Previdência Social –
RGPS, ou seja, com o exercício de atividade remunerada. Contudo, a lei estabelece um lapso
temporal denominado período de graça no qual, ainda que o segurado não esteja exercendo
atividade remunerada ou efetivando recolhimentos, não perderá a qualidade de segurado,
fazendo jus, portanto, a eventual benefício (artigo 15, Lei n.º 8.213/1991).
Importa ressaltar que o ordinário se presume e o extraordinário se prova. Há presunção relativa
de incapacidade preexistente, na hipótese de segurado que permaneceu, sem efetivar
contribuições, por longos anos e que volta a contribuir pouco antes de pleitear benefício por
incapacidade. Nessa hipótese, inclusive, a data indicada pela perícia pouco significa, tendo em
vista que a perícia se fundamenta nos documentos trazidos pela parte interessada. Portanto,
deverá, nesse caso, o segurado esclarecer a razão pela qual voltou a contribuir, após longos
anos. O ônus da prova é do segurado, nesse caso.
A aludida regra é decorrente da natureza do sistema previdenciário, que nada mais é que um
sistema de seguro social. Caso fosse admitido o pagamento de contribuições posteriores à
contingência social contra a qual visa a lei assegurar o trabalhador, como uma doença
incapacitante, não haveria mais previdência pois o trabalhador passaria a recolher as
contribuições apenas se necessitasse de um benefício.
Sob esta ótica, o sistema deixaria de ser mutualista e solidário e passaria a ter caráter
estritamente individual, já que o trabalhador deixaria de contribuir para todo o sistema, isto é,
para o pagamento de todos os benefícios a serem concedidos pelo regime previdenciário,
fraudando a concepção “securitária” do sistema.
Carência
Em regra, para os benefícios por incapacidade a carência corresponde a 12 (doze)
contribuições mensais, salvo se a incapacidade for decorrente de acidente de qualquer
natureza e causa; de acidente do trabalho ou doença ocupacional ou ainda se tiver origem em
doenças graves, previstas na legislação, que dispensam a carência: tuberculose ativa,
hanseníase, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e
incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante,
nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante), síndrome da
deficiência imunológica adquirida (AIDS), contaminação por radiação, com base em conclusão
da medicina especializada e hepatopatia grave. Referido rol, conforme a jurisprudência
majoritária, é meramente exemplificativo. Todavia, a doença deverá ser comprovadamente
grave, para que haja a dispensa da carência.
Caso concreto
No presente caso, a autora nasceu em 25/03/1980, cursou o ensino médio e refere experiência
profissional nas funções de operadora de caixa e operadora de telemarketing.
Consta nos autos que a autora esteve em gozo de benefício de auxílio por incapacidade
temporária nos períodos de 07/12/2017 a 31/05/2019 e 13/06/2019 a 30/10/2019 (pet.
203439569).
A perícia médica judicial concluiu que a patologia (Transtorno de Ajustamento ou Adaptação)
que acomete a autora lhe incapacita total e temporariamente para o trabalho desde 13/01/2021
(data da perícia). Destaco trechos do laudo pericial:
“(...)
V – Histórico da moléstia atual:
Dados colhidos nos autos e na entrevista com o periciado.
Natural e procedente de Santos/SP,é a 2° de prole de 2, ES incompleto em Nutrição (2001),
viúva (2007), 4 filhos (18, 17, 15 e 3 anos).
Atualmente não trabalha e reside com seu pai seus filhos. Espírita.
Interrompeu a faculdade quando engravidou do seu marido com quem teve 3 filhos. Ele
suicidou-se em 2007. Antes cuidava do lar, após osuicídio do companheiro chegou a trabalhar
por um tempo como operadora de caixa, depois fez doces que uma outra pessoa revendia,
masesta pessoa parou de comprar, então foi trabalhar como operadora de telemarketing, de
2016 até 2019. Depois disso não trabalhou mais.
A primeira vez que buscou tratamento psiquiátrico foi logo após o suicídio do marido. Seguiu
por cerca de um ano em uso de medicação (nãose recorda) até a interrupção por conta própria.
Teve um novo relacionamento no qual engravidou, diz que se tratava de um relacionamento
abusivo no qual ela era agredida, até a ocasião daúltima agressão quando sua filha tinha entre
4 e 6 meses. Fez denúncia e entrou com uma medida protetiva, mas diz que não entrou
comnenhuma ação.
Depois desses acontecimentos foi que conseguiu buscar um tratamento. Menciona que logo
após o nascimento da filha caçula (aproximadahá 03anos) chegou a passar em uma consulta,
mas que como amamentava não deu seguimento. Depois do fim da licença maternidadeesteve
afastada por indicação da médica do NAPS.
Quando teve seu benefício interrompido chegou a tentar voltar ao trabalho, mas teve uma crise
e saiu e foi demitida por justa causa.
Nunca fora internada em hospital psiquiátrico, tampouco ficou em observação em pronto-
atendimento. Refere uma tentativa de suicídio poringesta medicamentosa, sem internação.
Atualmente em consultas a cada 2 meses no CAPS, e em uso de: paroxetina 20mg,
prometazina 25mg e clonazepam 2mg.
Antecedentes pessoais:nada digno de nota.
Antecedentes Familiares: mãe faz tratamento por “depressão e síndrome do pânico”.
(...)
B) Por exame médico:
Veste trajes próprios, em adequado estado de alinho e higiene. Orientado no tempo e no
espaço.
Coopera com o exame. Responde às perguntas ao tempo certo e de forma correta. Consegue
informar corretamente seu histórico. Mantémsua atenção no assunto proposto.
Humor deprimido. Modula sua expressão facial de acordo com o assunto em questão.
Inteligência dentro dos limites da normalidade.
Seu pensamento é claro e coerente, sem alterações de conteúdo.
Não apresenta indícios de sintomas sugestivos de alterações sensoperceptivas ou do juízo de
realidade.
Sem ideação ou planejamento suicida no momento.
Vontade e Pragmatismo preservados.
VII – Considerações finais ou conclusões:
Pericianda apresentou quadro psiquiátrico compatível com Transtorno de Ajustamento (ou
adaptação) no início de seu tratamento.
Sobre os Transtornos de Adaptação, F43.2, versa a CID-10: “Estados de angústia subjetiva e
perturbação emocional, usualmente interferindocom o funcionamento e o desempenho sociais e
que surgem em um período de adaptação a uma mudança significativa de vida ou
emconsequência de um evento de vida estressante (incluindo a presença ou possibilidade de
doença física séria), O estressor pode ter afetado aintegridade das relações sociais de um
indivíduo (por perdas ou experiências de separação) (...). As manifestações variam e incluem
humordeprimido, ansiedade, preocupação (ou uma mistura destes), um sentimento de
incapacidade de adaptação, planejar o futuro ou continuar nasituação atual e algum grau de
incompetência no desempenho da rotina diária (...).
O início é usualmente dentro de 1 mês da ocorrência do evento estressante ou mudança de
vida e a duração dos sintomas usualmente nãoexcede 6 meses, exceto no caso de reação
depressiva prolongada (F43.21). Se os sintomas persistem além desse período, o diagnóstico
deve ser mudado de acordo com o quadro clínico atual (...).
Desta forma, diante da manutenção da sintomatologia da pericianda, a saber manutenção de
quadro depressivo com algumascaracterísticas ansiosas, conclui-se que no momento a
pericianda apresenta quadro compatível com Episódio Depressivo – episódiomoderado, devido
à importância sintomatológica.
Assim, conclui-se que a pericianda apresenta quadro compatível com o diagnóstico de Episódio
Depressivo – episódio moderado, F32.1, deacordo com a Classificação Internacional das
Doenças, 10ª edição (CID-10), da Organização Mundial da Saúde, e atualmente encontra-
seincapaz total e temporariamente para suas atividades laborais habituais. Sugere-se
reavaliação em 06meses.
(...)
7.1. Caso a resposta seja afirmativa, é possível estimar a data e em que se baseou para fixar
data do agravamento ou progressão?
R: DID 30/11/2017.
8. É possível determinar a data de início da incapacidade?
Informar ao juízo os critérios utilizados para a fixação desta data, esclarecendo em quais
exames ou evidências baseou-se para concluir pelaincapacidade e as razões pelas quais agiu
assim.
R: 13/01/2021, a partir da data da perícia.
(...)”
Em consulta ao CNIS anexo aos autos verifico que após a cessação do benefício em outubro
de 2019a autora não verteu recolhimentos ao RGPS, mantendo a qualidade de segurada até
15/12/2020.
Embora o perito tenha fixado a data de início da incapacidade somente na data da perícia,
verifico que a autora colacionou aos autos relatório médico elaborado pela médica Psiquiatra
Dra. Lara Faria Maia, emitido em 29/07/2020, em que atesta quadro semelhante ao constatado
pelo perito: “Paciente com quadro de humor deprimido, hipobulia, anedonia, acarretando em
prejuízo do pragmatismo útil. Apresenta irritabilidade, ansiedade, discurso pessimista. Sem
condição para o trabalho. Sugiro afastamento de suas atividades laborais por 60 (sessenta)
dias”.
Assim, considerando o teor dos documentos médicos acostados aos autos, bem como o fato da
autora ter ajuizado a presente ação em julho de 2020 e a perícia judicial ter sido realizada
somente em janeiro de 2021, entendo ser possível retroagir a data de início da incapacidade
para 29/07/2020 (data do relatório médico psiquiátrico mais recente atestando quadro
semelhando ao da perícia judicial), de modo que detinha a qualidade de segurada na data de
início da incapacidade.
Tendo em vista que o início da incapacidade é posterior ao requerimento administrativo (DER
12/06/2020), a autora faz jus à concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária a
partir da data do ajuizamento da presente ação (30/07/2020). O benefício deve ser concedido
pelo prazo de 06 (seis) meses, a contar da data da perícia judicial (13/01/2021), conforme
conclusão pericial.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da parte autora para conceder o benefício de
auxílio por incapacidade temporária no período de 30/07/2020 (data do ajuizamento da presente
ação) a 13/07/2021 (06 meses contados da perícia judicial realizada em 13/01/2021).
Por ocasião da liquidação do julgado, observar-se-á o Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos da Justiça Federal, em sua versão mais recente.
Sem condenação em custas e honorários.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
LAUDO PERICIAL FAVORÁVEL. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO NA DATA DE
INÍCIO DA INCAPACIDADE. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE O CONTRARIEM.
PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO PROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma, por
unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
