Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0005936-81.2020.4.03.6338
Relator(a)
Juiz Federal OMAR CHAMON
Órgão Julgador
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
07/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 21/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO PERICIAL.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. VINCULAÇÃO DO
JUIZ. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE O CONTRARIEM. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
RECURSO IMPROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
5ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005936-81.2020.4.03.6338
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: IVONETE XAVIER PEREIRA
Advogados do(a) RECORRENTE: MARCIO LINHARES FERREIRA - SP413490-A,
JOSEVALDO DUARTE GUEIROS - SP252887-A, FABIANA MARIA GOES FACCHINI -
SP186408-A, CLEITON DA SILVA GERMANO - SP221590-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005936-81.2020.4.03.6338
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: IVONETE XAVIER PEREIRA
Advogados do(a) RECORRENTE: MARCIO LINHARES FERREIRA - SP413490-A,
JOSEVALDO DUARTE GUEIROS - SP252887-A, FABIANA MARIA GOES FACCHINI -
SP186408-A, CLEITON DA SILVA GERMANO - SP221590-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A parte autora ajuizou ação objetivando a concessão/restabelecimento de benefício por
incapacidade.Proferida sentença, o pedido foi julgado improcedente diante da ausência de
incapacidade.Desta forma, interpõe a parte autora o presente recurso postulando a ampla
reforma da sentença.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005936-81.2020.4.03.6338
RELATOR:13º Juiz Federal da 5ª TR SP
RECORRENTE: IVONETE XAVIER PEREIRA
Advogados do(a) RECORRENTE: MARCIO LINHARES FERREIRA - SP413490-A,
JOSEVALDO DUARTE GUEIROS - SP252887-A, FABIANA MARIA GOES FACCHINI -
SP186408-A, CLEITON DA SILVA GERMANO - SP221590-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Requisitos
Os requisitos exigidos pela lei para a concessão de aposentadoria por incapacidade
permanente ou auxílio por incapacidade temporária são os seguintes: a) a condição de
segurado da parte requerente, mediante prova de sua filiação ao sistema da Previdência Social;
b) a comprovação de ser a parte requerente incapaz permanente ou temporariamente para o
trabalho; c) a manutenção da sua condição de segurado na data do evento que determina a
concessão desse benefício, ou seja, da incapacidade; d) o cumprimento da carência.
Incapacidade
A mera existência de uma doença, por si só, não gera o direito a benefício por incapacidade.
Tanto o auxílio por incapacidade temporária quanto a aposentadoria por incapacidade
permanente pressupõem a existência de incapacidade laborativa, decorrente da instalação de
uma doença ou lesão, sendo que a distinção entre tais benefícios reside na intensidade de risco
social que acometeu o segurado, assim como a extensão do tempo pelo qual o benefício
poderá ser mantido.
O auxílio por incapacidade temporária será concedido quando o segurado ficar incapacitado
total e temporariamente para exercer suas atividades profissionais habituais, devendo-se
entender como habitual a atividade para a qual o interessado está qualificado e que desenvolvia
antes do evento incapacitante.
A aposentadoria por incapacidade permanente, por sua vez, é devida quando o segurado ficar
incapacitado total e definitivamente de desenvolver qualquer atividade laborativa e for
insusceptível de reabilitação para o exercício de outra atividade, adequada a sua escolaridade
formal, que lhe garanta a subsistência.
Nova perícia ou esclarecimentos.
Considerando a condição do magistrado de destinatário da prova (artigo 370, CPC/2015), é
importante frisar que “só ao juiz cabe avaliar a necessidade de nova perícia” (JTJ 142/220,
197/90, 238/222). De tal forma, compete apenas ao juiz apreciar a conveniência de realização
de nova avaliação, bem como o acolhimento de quesitos complementares (artigo 470, I c/c
artigo 480, CPC/2015), sendo certo que “o julgamento antecipado da lide tem total amparo
legal, decorrente da aplicação do CPC 330, I, não se configurando afronta aos CPC 425 e
331”.(STJ, 6ª Turma, AI 45.539/MG, Relator Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em
16/12/1993, decisão monocrática, DJ de 08/02/1994, grifos nossos).
É importante registrar que a simples contrariedade entre as conclusões dos laudos trazidos pela
parte ou pelo INSS, no processo administrativo, com as conclusões do perito judicial não é
suficiente para que seja convertido o julgamento em diligência, para a produção de novo laudo.
Novo laudo exige desqualificação do primeiro, seja em face de sua superficialidade ou omissão,
seja em face de baixa qualidade técnica. De outra forma, jamais o processo se encerraria, pois
sempre a parte descontente poderia requerer uma terceira perícia, para “desempatar”.
Qualidade de segurado
A qualidade de segurado se adquire com a filiação ao Regime Geral da Previdência Social –
RGPS, ou seja, com o exercício de atividade remunerada. Contudo, a lei estabelece um lapso
temporal denominado período de graça no qual, ainda que o segurado não esteja exercendo
atividade remunerada ou efetivando recolhimentos, não perderá a qualidade de segurado,
fazendo jus, portanto, a eventual benefício (artigo 15, Lei n.º 8.213/1991).
Importa ressaltar que o ordinário se presume e o extraordinário se prova. Há presunção relativa
de incapacidade preexistente, na hipótese de segurado que permaneceu, sem efetivar
contribuições, por longos anos e que volta a contribuir pouco antes de pleitear benefício por
incapacidade. Nessa hipótese, inclusive, a data indicada pela perícia pouco significa, tendo em
vista que a perícia se fundamenta nos documentos trazidos pela parte interessada. Portanto,
deverá, nesse caso, o segurado esclarecer a razão pela qual voltou a contribuir, após longos
anos. O ônus da prova é do segurado, nesse caso.
A aludida regra é decorrente da natureza do sistema previdenciário, que nada mais é que um
sistema de seguro social. Caso fosse admitido o pagamento de contribuições posteriores à
contingência social contra a qual visa a lei assegurar o trabalhador, como uma doença
incapacitante, não haveria mais previdência pois o trabalhador passaria a recolher as
contribuições apenas se necessitasse de um benefício.
Sob esta ótica, o sistema deixaria de ser mutualista e solidário e passaria a ter caráter
estritamente individual, já que o trabalhador deixaria de contribuir para todo o sistema, isto é,
para o pagamento de todos os benefícios a serem concedidos pelo regime previdenciário,
fraudando a concepção “securitária” do sistema.
Carência
Em regra, para os benefícios por incapacidade a carência corresponde a 12 (doze)
contribuições mensais, salvo se a incapacidade for decorrente de acidente de qualquer
natureza e causa; de acidente do trabalho ou doença ocupacional ou ainda se tiver origem em
doenças graves, previstas na legislação, que dispensam a carência: tuberculose ativa,
hanseníase, alienação mental, neoplasia maligna, cegueira, paralisia irreversível e
incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante,
nefropatia grave, estado avançado da doença de Paget (osteíte deformante), síndrome da
deficiência imunológica adquirida (AIDS), contaminação por radiação, com base em conclusão
da medicina especializada e hepatopatia grave. Referido rol, conforme a jurisprudência
majoritária, é meramente exemplificativo. Todavia, a doença deverá ser comprovadamente
grave, para que haja a dispensa da carência.
Caso concreto
No presente caso, a autora nasceu em 05/11/1981, cursou o ensino médio completo e refere
como atividade habitual a função de copeira.
Consta nos autos que a autora esteve em gozo de benefício de auxílio por incapacidade
temporária nos períodos de 13/06/2019 a 10/10/2019 e31/08/2020 a 29/09/2020
(pet.192935681).
Analisando detidamente o laudo pericial médico anexado ao presente feito, verifico que a perita,
especialista em Psiquiatria, foi categórica ao afirmar que a patologia (transtorno depressivo
recorrente – episódio atual leve)que acometea autora não a incapacita para o exercício de suas
atividades habituais e para o trabalho. Destaco trechos do laudo pericial:
“(...)
1. História:
Trata-se de pericianda de 39 anos de idade, que relata início de acompanhamento em saude
mental em 2018, quando buscou psicólogo do
local em que trabalhava, por “se sentir mal”(sic), tendo sido encaminhada para
acompanhamento psiquiátrico. Diz que só se percebeu doentequando seu médico a orientou a
se afastar das atividades laborais.
Atualmente, refere sintomas como dificuldade de se concentrar, esquecimento, falta de vontade
de fazer as coisas, referindo que“praticamente não sai de casa”, cansaço, dores no corpo, dor
no peito e crises com falta de ar e fadiga, além de pensamento constante deque vai morrer
(sic).
Refere estar em acompanhamento médico a cada 90 dias (devido a pandemia) em Unidade
Básica de Saude (UBS), também estando compsicoterapia interrompida devido à pandemia.
Nega histórico de internação psiquiátrica. Refere fazer uso de Sertralina 100mg/dia,
Amitriptilina75mg/dia e medicação “para dor no peito”(sic) que não sabe referir o nome. É
portadora de hipertensão arterial sistêmica, com uso deLosartana 50mg 12/12h.
Refere morar com marido e dois filhos, sendo sua filha a responsável por auxiliá-la no uso das
medicações. Afirma que só sai de casa seacompanhada, por medo.
3.1 Exame psíquico
Ao exame psíquico, apresenta-se vigil, com autocuidado adequado, higiene mantida, ansiosa,
colaborativa, com discurso direcionado àquestões da doença, orientada auto e
alopsiquicamente, mantendo-se normovigilante e normotenaz, memória preservada, apesar de
queixade déficit, inteligência compatível com nível socioeducacional, humor eutímico, afeto
normomodulante, congruente e hiporessoante,pensamento agregado, com conteúdo
circunstancial, não delirante, sem ideação suicida manifesta na entrevista, sem sinais indiretos
dealteração da sensopercepção, expressa-se por meio de mensagens claras, sem alterações
na psicomotricidade, volição e pragmatismopreservados, juízo de realidade preservado e crítica
presente de morbidez.
1. Discussão:
Conforme descrito no Compêndio de Psiquiatria (Kaplan &Sadock, 2017), o episódio depressivo
maior deve durar pelo menos duassemanas, e normalmente uma pessoa com esse diagnóstico
também experimenta pelo menos quatro sintomas de uma lista que incluialterações no apetite e
peso, alterações no sono e na atividade, falta de energia, sentimentos de culpa, problemas para
pensar e tomardecisões e pensamentos recorrentes de morte ou suicídio. A depressão pode
ocorrer como um episódio único ou ser recorrente. Adiferenciação entre esses pacientes e os
que têm dois ou mais episódios de transtorno depressivo maior é justificada pelo curso incerto
dotranstorno dos primeiros.
Ainda que o tratamento atual enfatize a farmacoterapia e a psicoterapia orientadas ao paciente
individual, acontecimentos estressantes davida também estão associados com aumentos nas
taxas de recaída. Portanto, o tratamento deve ser voltado à redução do número e dagravidade
dos estressores nas vidas dos pacientes. Contudo, os transtornos do humor são crônicos, como
no caso da pericianda, em quehistórico de tratamento há 03 anos, inclusive com manutenção
das mesmas medicações, em doses intermediárias. O psiquiatra deveinformar o paciente e a
família sobre as estratégias futuras do tratamento quando não há remissão dos sintomas, visto
que pacientes comsintomas residuais, em oposição à remissão total, têm mais probabilidade de
vivenciar uma recidiva ou reincidência de episódios de humor.
Além disso, a pericianda apresenta sinais e sintomas característicos de transtorno de
personalidade. Os transtornos da personalidade sãocomuns e também são crônicos, ocorrendo
em 10 a 20% da população em geral, e sua duração é expressa em décadas. A 5a edição
doManual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais (DSM-5) também define um
“transtorno da personalidade geral como um padrãopersistente de experiência interna e
comportamento que se desvia acentuadamente das expectativas da cultura do indivíduo.
Quando ostraços de personalidade são rígidos e mal-adaptativos e produzem prejuízo
funcional, ou sofrimento subjetivo, é possível diagnosticar umtranstorno da personalidade”.
Necessário ressaltar que a presença de uma patologia não deve ser confundida com a
presença de incapacidade laborativa, uma vez que aincapacidade estará presente somente se
restar comprovado que a patologia em questão impõe limitações às exigências fisiológicas
daatividade habitual da parte autora. Desta forma, a presença de uma doença não é
necessariamente um sinônimo de incapacidade laborativa.
1. Conclusão:
Pelo visto e exposto acima, conclui-se que:
A pericianda é portadora de transtorno depressivo recorrente – episódio atual leve (F33.1)
A mesma não encontra-se incapacitada para suas atividades habituais.
(...).”.
Assim, em razão da apontada inexistência de incapacidade para o exercício de atividade
habitual ou para o trabalho, a autora não faz jus ao benefício de auxílio por incapacidade
temporária e tampouco à concessão da aposentadoria por incapacidade permanente.
Não há motivo para afastar as conclusões da perita, pois esta as fundou nos documentos
médicos constantes nos autos, bem como em exame clínico realizado. Pela mesma razão,
desnecessária a realização de nova perícia. Também não verifico contradições entre as
informações constantes do laudo aptas a ensejar dúvida em relação ao mesmo, o que afasta
qualquer alegação de nulidade.
Por fim, ressalto que nos termos da Súmula nº 77 da Turma Nacional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais “O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e
sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”.
Desta forma, segundo o conjunto probatório colhido nos autos, não verifico a presença de
incapacidade laborativa que autorize o acolhimento do pedido da parte autora.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso da parte autora.
Condeno a autora em honorários advocatícios que arbitro em 10% do valor atualizado da
causa, observado o disposto no artigo 98, parágrafo terceiro, do CPC.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. LAUDO PERICIAL.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. VINCULAÇÃO
DO JUIZ. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE O CONTRARIEM. IMPROCEDÊNCIA DO
PEDIDO. RECURSO IMPROVIDO. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quinta Turma decidiu,
por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
