D.E. Publicado em 27/04/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária, tida por interposta, e à apelação, e fixar, de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002466-23.2011.4.03.6123/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria especial ou, sucessivamente (fl. 155), a aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), ajuizado por Benedito Donizete Aparecido de Godoi em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS às fls. 66/76, na qual sustenta o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, bem como a impossibilidade de conversão de tempo trabalhado em condições especiais, em tempo de serviço comum, após o advento da Lei n 9.711/98, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
Réplica da parte autora às fls. 86/134.
Sentença às fls. 173/183, pela parcial procedência do pedido, para reconhecer os períodos de 06.09.1984 a 09.03.1993, 13.12.1993 a 21.05.2002, 22.05.2002 a 07.12.2005, 08.12.2005 a 07.10.2010 e 08.10.2010 a 26.01.2012, como sendo de natureza especial e determinar a implantação da aposentadoria especial da parte autora, desde a data da citação, fixando a sucumbência com isenção de custas, em face do deferimento da assistência judiciária gratuita.
Apelação do INSS às fls. 189/191, pelo não acolhimento do pedido formulado na exordial e consequente inversão da sucumbência.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 05.02.1962, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 06.09.1984 a 09.03.1993, 13.12.1993 a 21.05.2002, 22.05.2002 a 07.12.2005, 18.10.2005 a 07.10.2010, 01.10.2010 a 23.08.2011, e a concessão do benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 23.08.2011).
Preliminarmente, dou por interposta a remessa oficial, nos termos do § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil.
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, os períodos incontroversos totalizam de 30 (trinta) anos, 02 (dois) meses e 10 (dez) dias (fls. 125/127 e 132), tendo sido reconhecido como de natureza especial o período de 06.09.1984 a 09.03.1993 (fls. 33 e 126). Portanto, a controvérsia colocada nos autos engloba o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 13.12.1993 a 21.05.2002, 22.05.2002 a 07.12.2005, 08.12.2005 a 07.10.2010 e 01.10.2010 a 23.08.2011 (data do requerimento administrativo).
Ocorre que, nos períodos de 13.12.1993 a 21.05.2002 (fl. 35/36), 22.05.2002 a 07.12.2005 (fl. 37 e PPP - fl. 39), 08.12.2005 a 07.10.2010 (PPP - fls. 40) e 01.10.2010 a 23.08.2011 (PPP - fls. 41/42), a parte autora, exerceu a atividade de vigilante, devendo ser reconhecida a natureza especial da atividade exercida nesses períodos, conforme código 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64.
Por outro lado, em relação à alegação de ausência de comprovação da natureza do serviço prestado junto à empresa Officio Tecnologia em Vigilância Eletrônica Ltda., não entrevejo elementos que infirmem os fundamentos da sentença, da qual extraio o seguinte excerto, para melhor análise da questão:
Com efeito, na impossibilidade da produção da prova hábil a corroborar o tempo de serviço laborado em empresa especializada em segurança privada e vigilância patrimonial, em face do encerramento da empresa, se torna lícita a presunção do porte de arma de fogo a partir da análise do conjunto probatório constante dos autos.
Cumpre observar que jurisprudência equipara a atividade de vigilante àquela exercida pelo guarda, independentemente da utilização de arma de fogo, reconhecendo a natureza especial da prestação de serviço, consoante código 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64. Nesse sentido, registre-se o entendimento adotado nesta Corte:
Quanto ao período posterior ao citado Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (em que o exercício da atividade de vigilante deixou de ser previsto como apto a gerar a contagem em condições especiais), a questão ganha outros contornos em face da edição da Lei nº 12.740, de 08 de dezembro de 2012, que alterou a redação do art. 193 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, e redefiniu os critérios utilizados para aferição do exercício de atividades ou operações perigosas, nos seguintes termos:
Destarte, diante da definição trazida pela legislação trabalhista, quanto à periculosidade da atividade de vigilante, não vejo óbice ao reconhecimento de sua especialidade, no âmbito do direito previdenciário, em relação aos períodos posteriores à 05.03.1997. Nesse sentido:
O termo inicial da concessão do benefício previdenciário conta-se e calcula-se da data do requerimento administrativo, e não da citação ou da juntada aos autos do laudo pericial, observando-se a prescrição quinquenal, considerando os 05 (cinco) anos que antecedem a propositura da presente ação, conforme entendimento jurisprudencial do egrégio Superior Tribunal de Justiça:
Sendo assim, somados todos os períodos especiais, totaliza a parte autora 26 (vinte e seis) anos, 02 (dois) meses e 15 (quinze) dias de tempo especial até a data do requerimento administrativo (23.08.2011), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram cumpridos pela parte autora, portanto, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria especial, com renda mensal inicial de 100% do salário-de-benefício, nos termos do art. 57 da Lei nº 8.213/91, sendo este último calculado pela média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo, nos termos do art. 29, inc. II, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
Com relação aos honorários advocatícios, esta Turma firmou o entendimento no sentido de que estes devem ser fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença de primeiro grau, nos termos da Súmula 111 do E. STJ.
Entretanto, na ausência de impugnação da parte autora, mantenho o termo inicial do benefício (26.01.2012), bem como os honorários, como fixados na sentença, em respeito ao princípio da vedação à reformatio in pejus.
Ante o exposto, nego provimento à remessa oficial e à apelação, fixando, de oficio, os consectários legais, na forma acima explicitada.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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Data e Hora: | 18/04/2017 17:15:36 |