Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5348466-17.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
22/04/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-
DOENÇA - CERCEAMENTO DE DEFESA - PROVA PERICIAL: NECESSIDADE -APELO
PROVIDO - SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.
1. Em razão de sua regularidade formal, o recurso foi recebido, nos termos do artigo 1.011 do
CPC/2015.
2. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso
de aposentadoria por invalidez (art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de
15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (art. 59).
3. Para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência,
quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
4. No caso dos autos, ao contrário do que constou da sentença, a parte autora compareceu à
perícia judicial, embora com atraso, não podendo subsistir a sentença que julgou improcedente o
pedido, com fundamento na ausência de incapacidade.
5. Ante a exigência de apresentação de exames recentes e a renúncia do perito judicial, deveria o
Juízo de origem ter nomeado novo perito e, assim, propiciar a realização da prova pericial.
6. O julgamento da lide, sem a realização da perícia médica,requerida pela parte autora de forma
expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88).
7. Apelo provido. Sentença desconstituída.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5348466-17.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA DE FATIMA CAMPANORATTO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: RENAN BORGES CARNEVALE - SP334279-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5348466-17.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA DE FATIMA CAMPANORATTO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: RENAN BORGES CARNEVALE - SP334279-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação interposta contra sentença que julgou IMPROCEDENTE o pedido de concessão de
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ ou AUXÍLIO-DOENÇA, com fundamento na ausência de
prova da incapacidade laborativa, condenando a parte autora ao pagamento de custas e
despesasprocessuais, bem como honorários advocatícios arbitrados em R$ 500,00, suspensa a
execução, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões de recurso, sustenta a parte autora:
- quecompareceu ao local designado para a perícia e foi atendida pelo médico nomeado;
- que faz acompanhamento pelo SUS e não teria condições de realizar exames e apresentar
resultados na nova data agendada pelo perito judicial;
- que o perito judicial renunciou ao encargo, sendo imprescindível a nomeação de outro perito e a
realização da prova pericial;
- que o Juízo a quo, ao deixar de nomear um novo perito e realizar a prova pericial, incorreu em
cerceamento de defesa.
Requer a anulação da sentença.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5348466-17.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA DE FATIMA CAMPANORATTO DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: RENAN BORGES CARNEVALE - SP334279-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Em razão de sua
regularidade formal, recebo o recurso, nos termos do artigo 1.011 do CPC/2015.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso
de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais
de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício
provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a
reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade
for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por
invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está
dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer
natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções
elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Assim, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência,
quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, a ação foi julgada improcedente, pois a parte autora teria deixado de
comparecer à perícia judicial.
No entanto, ao contrário do que constou da sentença,o perito nomeado informou, nos autos, que
a parte autora compareceu, sim, à perícia, no entanto, com atraso e sem trazer a documentação
médica necessária, tendo ele interrompido a perícia, que já havia iniciado, eagendado uma nova
data, na qual a parte autora novamente se atrasou e não pode ser examinada, o que motivou a
sua renúncia ao encargo, como se vê do ID145664214:
"A autora identificada abaixo, estava com a perícia médica agendada para o dia 23/08/2019, as
8hs, agendada como determinado por esta Vara.
Nesta data a autora chegou ao ato pericial, 40 minutos atrasadas, no entanto iniciamos o ato
pericial. Todavia a autora não apresentava os documentos necessários e ainda necessitava de
documentação recente além da comprovação do uso da medicação.
Interrompemos a pericia, esclarecemos a necessidade dos documentos, orientamos de forma
repetitiva e finalmente fizemos a solicitação por escrito.
Esclarecemos ainda que estaríamos agendando de forma excepcional como encaixe, no dia
27/08/2019, as 8:30hs.
No entanto novamente a autora adentrou a recepção desta clinica 25 minutos atrasada,
encontrando este perito já em saída para o próximo compromisso.
Desta feita orientamos a autora que esta vara faria o agendamento de nova data após ouvir o
advogado da parte.
Solicito portanto, caso seja possível, novo agendando para outro perito de confiança desta vara."
Ora, se a parte autora, de fato, não tivesse comparecido à perícia, a sentença seria nula, já que,
conforme se depreende dos autos, não houve intimação pessoal.
Tratando-se de ato pessoal afeto à parte, de acordo com o entendimento desta Egrégia Corte
Regional, o autor deve ser intimado por oficial de justiça, na forma estabelecida no artigo 239 do
CPC/1973 e no artigo 275 do CPC/2015.
A esse respeito, confiram-se o seguinte julgado desta Egrégia Turma:
PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PROVA PERICIAL. PARTE
AUTORA. INTIMAÇÃO PESSOAL. INDISPENSABILIDADE. ATO PERSONALÍSSIMO.
PRECEDENTES. AGRAVO RETIDO E APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDOS.
SENTENÇA ANULADA.
1 - Tratando-se de demanda em que se pleiteia a concessão do benefício de aposentadoria por
invalidez, de rigor a realização de prova médico-pericial, por profissional a ser designado pelo juiz
da causa, a fim de se aferir as condições físicas da parte autora.
2 - No caso em tela, não fora cumprida a formalidade de intimação pessoal do autor para
comparecimento à perícia médica, cuja ausência ensejou o decreto de improcedência do pedido.
3 - Cuidando-se de ato pessoal afeto à parte, porquanto indelegável, esta deverá ser intimada por
meio de oficial de justiça, na forma estabelecida pelo art. 239 do então vigente CPC/73
(reproduzido no art. 275 do CPC/15), como é o caso do exame médico pericial, notadamente nas
ações de natureza previdenciária e assistencial, cujos autores, em sua grande maioria, são
pessoas necessitadas e de pouca instrução. Precedentes das Turmas Especializadas da 3ª
Seção.
4 - Agravo retido e apelação do autor providos. Sentença anulada.
(AC nº 0002700-80.2012.4.03.9999/SP, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal Carlos
Delgado, DE 17/05/2018)
Todavia, considerando que a parte autora compareceu à perícia, embora com atraso, é de se
concluir que foi válida a intimação.
Consta, das informações prestadas pelo perito judicial, acima transcritas,quea parte autora
compareceu ao local designado e, embora estivesse atrasada, foi atendida pelo médico, que só
interrompeu a perícia, por não ter a parte autoratrazido todos os exames que entendia serem
necessários para a realização da perícia judicial.
Embora o perito nomeado tenha, por sua iniciativa, agendado uma nova data para a perícia, não
houve tempo suficiente para a parte autora realizar os exames solicitados e obter os resultados,
de modo que, diante da renúncia do perito, deveria o Juízo a quo nomear um outro profissional,
para propiciar a realização da prova pericial.
E, ao julgar o presente feito sem propiciar a realização da referida prova,conforme foi requerido
pela parte autora, o Juízo "a quo" vulnerou o princípio da ampla defesa, insculpido no artigo 5º da
Constituição Federal, que diz:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado desta Egrégia Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL INCOMPLETO. NECESSIDADE DE NOVA PERÍCIA.
- Pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
- O laudo, elaborado por especialista em psiquiatria, atesta que a parte autora apresenta
depressão de grau leve, sem incapacidade para o trabalho. Entretanto, é portador de esclerose
múltipla, que pode ser incapacitante, devendo ser avaliado por neurologista.
- Da análise dos autos, observa-se que o requerente alegou, na petição inicial, ter sido
diagnosticado com diversas patologias, entre elas a esclerose múltipla.
- Não houve, portanto, análise quanto à doença alegada pelo autor e lastreada em documentação
acostada aos autos. Observo que, embora o perito judicial narre as moléstias descritas pelo autor
na exordial, analisou apenas as patologias psiquiátricas e concluiu que o requerente deve ser
avaliado por especialista em neurologia.
- Desta forma, resta claro que o laudo médico apresentado se mostrou insuficiente para atender
aos propósitos da realização da perícia médica judicial, que tem por objetivo auxiliar o juiz na
formação de seu convencimento acerca dos fatos alegados.
- Assim, faz-se necessária a execução de um novo laudo pericial, para esclarecimento do
possível diagnóstico das enfermidades relatadas na inicial, com análise de documentos
complementares, se o caso, dirimindo-se quaisquer dúvidas quando à incapacidade ou não do
autor para o labor, para que, em conformidade com as provas materiais carreadas aos autos,
possa ser analisada a concessão ou não do benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-
doença.
- Apelação parcialmente provida. Sentença anulada.
(AC nº 0030588-48.2017.4.03.9999, 8ª Turma, Desembargadora Federal Tania Marangoni, DE
12/12/2017)
Desse modo, o julgamento da lide, sem a realização da prova pericial, requerida pela parte autora
de forma expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito
constitucional à ampla defesa.
Cabe lembrar, nesse sentido, anotação jurisprudencial dos ilustres Theotônio Negrão et alii, em
seu Código de Processo Civil e legislação processual em vigor (São Paulo, Saraiva, 2016, nota
"6" ao artigo 370 do CPC/2015, pág. 441):
"O indeferimento de realização de provas, possibilidade oferecida pelo art. 130 do CPC, não está
ao livre arbítrio do juiz, devendo ocorrer apenas, e de forma motivada, quando forem
dispensáveis e de caráter meramente protelatório" (STJ-1ª T., REsp 637.547, Min. José Delgado,
j. 10.8.04, DJU 13.9.04).
O julgamento antecipado da lide deve acontecer quando evidenciada a desnecessidade de
produção de prova; de outro modo, caracterizado fica o cerceamento de defesa" (RSTJ 48/405).
"Se a pretensão do autor depende da produção da prova requerida, esta não lhe pode ser
negada, nem reduzido o âmbito de seu pedido com um julgamento antecipado, sob pena de
configurar-se uma situação de autêntica denegação de Justiça" (RSTJ 21/416). No mesmo
sentido: RJM 189/95 (AP 1.0027.07.134463-7/001).
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao apelo da parte autora, para desconstituir a sentença
apelada, caracterizado o cerceamento de defesa, e determinar o retorno dos autos à Vara de
origem, para que se dê prosseguimento ao feito, com a realização da prova pericial por médico
especialista em Psiquiatriae a prolação de nova sentença.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-
DOENÇA - CERCEAMENTO DE DEFESA - PROVA PERICIAL: NECESSIDADE -APELO
PROVIDO - SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.
1. Em razão de sua regularidade formal, o recurso foi recebido, nos termos do artigo 1.011 do
CPC/2015.
2. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso
de aposentadoria por invalidez (art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de
15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (art. 59).
3. Para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência,
quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
4. No caso dos autos, ao contrário do que constou da sentença, a parte autora compareceu à
perícia judicial, embora com atraso, não podendo subsistir a sentença que julgou improcedente o
pedido, com fundamento na ausência de incapacidade.
5. Ante a exigência de apresentação de exames recentes e a renúncia do perito judicial, deveria o
Juízo de origem ter nomeado novo perito e, assim, propiciar a realização da prova pericial.
6. O julgamento da lide, sem a realização da perícia médica,requerida pela parte autora de forma
expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à
ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88).
7. Apelo provido. Sentença desconstituída. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento ao apelo, para desconstituir a sentença, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
