Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5002037-65.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/11/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/12/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-
DOENÇA - INCAPACIDADE PARA O TRABALHO - DEMAIS REQUISITOS PREENCHIDOS -
TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO - JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA -
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – APELO(S) PROVIDO EM PARTE - SENTENÇA
REFORMADA, EM PARTE.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão
de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso
de aposentadoria por invalidez (art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de
15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (art. 59).
3. Para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência,
quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
4. No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 06/05/2019, constatou que a parte
autora,servente de pedreiro, idade atual de 38 anos, é portadora de HIV, mas não está
incapacitada para o exercício de sua atividade laboral, como se vê do laudo oficial.
5.A parte autora é pessoa de baixa instrução e sempre se dedicou a atividades braçais, como
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
servente de pedreiro, que são incompatíveis com as suas condições de saúde.
6. E não se pode ignorar que, nesses ambientes de trabalho, são maiores a estigmatização social
e a discriminação sofridas pelos portadores do vírus HIV, que acabam sendo preteridos nos
processos de seleção para admissão no trabalho, ainda mais considerando que, nessa área, há
muita mão-de-obra disponível.
7. O magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o artigo 436
do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, devendo considerar também aspectos
socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, como no caso dos portadores do vírus
HIV, ainda que assintomáticos. Nesse sentido, a Súmula nº 78/TNU.
8. Não obstante a conclusão negativa do perito judicial, mas considerando as dificuldades
enfrentadas pelos soropositivos para se recolocarem no mercado de trabalho em razão do
preconceito, os riscos que representam para a integridade da parte autora o exercício de
atividades extenuantes e o fato de que a parte autora tem baixa instrução e sempre se dedicou a
atividades braçais e que exigem grandes esforços físicos, é possível conceder o auxílio-doença
com reabilitação profissional, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
8. Não obstante a conclusão negativa do perito judicial, mas considerando as dificuldades
enfrentadas pelos soropositivos para se recolocarem no mercado de trabalho em razão do
preconceito, os riscos que representam para a integridade da parte autora o exercício de
atividades extenuantes e o fato de que sempre se dedicou a atividades laborais como motorista
de caminhão de carga, é mais adequado ao caso a concessão de aposentadoria por invalidez,
até porque preenchidos os demais requisitos legais.
9. Restou incontroverso, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e
cumpriu a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91.
10. O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento
administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese
de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
11. Tal entendimento, pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, está embasado no fato
de que "o laudo pericial norteia somente o livre convencimento do juiz quanto aos fatos alegados
pelas partes, mas não serve como parâmetro para fixar termo inicial de aquisição de direitos"
(AgRg no AREsp 95.471/MG, 5ª Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 09/05/2012), sendo
descabida, portanto, a fixação do termo inicial do benefício à data da perícia.
12. No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/06/2018, dia seguinte ao da cessação do
auxílio-doença.
13. Considerando que benefício foi concedido com base na incapacidade definitiva para a
atividade habitual, o benefício de auxílio-doença deverá ser mantido até que a parte autora esteja
reabilitada para o exercício de outra atividade que lhe garanta o sustento, observado o disposto
no artigo 62, parágrafo 1º, da Lei nº 8.213/91, que não seja atividade em condições extenuantes.
14. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
15. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
16. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
17A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais no âmbito da Justiça Federal
(Lei nº 9.289/96, art. 4º, I), mas (i) não no âmbito da Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul (Lei
Estadual nº 3.779, de 11/11/2009, e Súmula nº 178/STJ), (ii) nem do reembolso das custas
recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso,
tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora, (iii) tampouco do
pagamento de honorários periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido
antecipado pela Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art.
32).
18. Os honorários periciais foram fixados por decisão interlocutória que restou irrecorrida, sendo
descabida a sua alteração via recurso de apelação, vez que precluso o direito de recorrer.
19. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11,
como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
20. Provido o apelo da parte autorainterposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente,
descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais.
21. Apelo(s) provido em parte. Sentença reformada, em parte.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002037-65.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: DIEKSON ANDRE CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: JOCIANE GOMES DE LIMA - MS10070-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002037-65.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: DIEKSON ANDRE CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: JOCIANE GOMES DE LIMA - MS10070-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação interposta contra sentença que julgou IMPROCEDENTE o pedido de concessão de
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ ou AUXÍLIO-DOENÇA, com fundamento na ausência de
incapacidade laborativa, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais, bem
como honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor atribuído à causa, suspensa a
execução, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões de recurso, sustenta a parte autora:estar incapacitada total e permanentemente
para sua atividade habitual, fazendo jus à concessão do benefício pleiteado. Requer a reforma da
sentença, para que seja concedida aposentadoria por invalidez ou, subsidiariamente, auxílio-
doença.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002037-65.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: DIEKSON ANDRE CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: JOCIANE GOMES DE LIMA - MS10070-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a
apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso
de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais
de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício
provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a
reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade
for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por
invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está
dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer
natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções
elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência,
quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 06/05/2019, constatou que a parte
autora,servente de pedreiro, idade atual de 38 anos, é portadora de HIV, mas não está
incapacitada para o exercício de sua atividade laboral, como se vê do laudo constante do
ID130462762 :
“• DIAGNÓSTICO: SÍNDROME DA IMUNODEFIÊNCIA HUMANA (HIVAIDS) E INSÔNIA. CID
B24 E G470.
• DATA DE INÍCIO DOENÇA (DID): INSÔNIA PRESENTE HÁ MAIS DE 10 ANOS. O HIV-AIDS
FOI DIAGNOSTICADO NO FINAL DE 2017.
• NÃO SE COMPROVA NESTA PERÍCIA INVALIDEZ PARA EXERCER A SUA PROFISSÃO OU
MESMO OUTRAS ATIVIDADES CAPAZES DE PROVER O SEU SUSTENTO.”
Ocorre que a parte autora é pessoa de baixa instrução (ensino fundamental incompleto- 5a série)
e sempre se dedicou a atividades que exigem esforço físico, como a de servente de pedreiro, que
são incompatíveis com as suas condições de saúde.
E não se pode ignorar que, nesses ambientes de trabalho, são maiores a estigmatização social e
a discriminação sofridas pelos portadores do vírus HIV, que acabam sendo preteridos nos
processos de seleção para admissão no trabalho, ainda mais considerando que, nessa área, há
muita mão-de-obra disponível.
Destaco que o magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o
artigo 436 do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, devendo considerar também os aspectos
socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, como no caso dos portadores do vírus
HIV, ainda que assintomáticos.
Nesse sentido, dispõe a Súmula nº 78 da Turma Nacional de Uniformização:
Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as
condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisara incapacidade em
sentido amplo, em face da elevada estigmatização da doença.
Assim, não obstante a conclusão negativa do perito judicial, mas considerando as dificuldades
enfrentadas pelos soropositivos para se recolocarem no mercado de trabalho em razão do
preconceito, os riscos que representam para a integridade da parte autora o exercício de
atividades extenuantes e o fato de que a parte autora tem baixa instrução e sempre se dedicou a
atividades braçais e que exigem grandes esforços físicos, é possível conceder o auxílio-doença
com reabilitação profissional, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
Nesse sentido, é o entendimento firmado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
... a jurisprudência do STJ alinhou-se no sentido de que, para a concessão da aposentadoria por
invalidez, o magistrado não está vinculado à prova pericial e pode concluir pela incapacidade
laboral levando em conta os aspectos socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado.
(AgInt nos EDcl no AREsp nº 884.666/DF, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 08/11/2016)
E, seguindo essa orientação, aquela Egrégia Corte Superior, em decisões monocráticas
terminativas, tem confirmado os julgados dos Tribunais Regionais que, a despeito da conclusão
médico-pericial, mas com base nas condições socioeconômicos, profissionais e culturais do
segurado, vêm concedendo aposentadoria por invalidez a portadores do vírus HIV, ainda que
assintomáticos (REsp nº 1.609.463/MG, Relatora Ministra Assusete Magalhães, DJe 13/11/2017;
AREsp nº 956.184/RS, Relator Ministro Og Fernandes, DJe 26/04/2017; REsp nº 1.610.428/MG,
Relator Ministro Benedito Gonçalves, DJe 16/08/2016).
Confiram-se, nesse sentido, os seguintes julgados dos Tribunais Regionais Federais:
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. ASSISTÊNCIA SOCIAL. DIREITO DE IGUALDADE.
PROTEÇÃO ANTIDISCRIMINATÓRIA. PESSOAS VIVENDO COM HIV/AIDS.
SINTOMATOLOGIA E CONDIÇÃO ASSINTOMÁTICA. INCAPACIDADE LABORAL. AUXÍLIO-
DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. MODELO BIOMÉDICO, SOCIAL E
INTEGRADO (BIOPSICOSSOCIAL) DA INCAPACIDADE. TUTELA ESPECÍFICA.
IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: a) a qualidade de
segurado; b) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; c) a
incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária
(auxílio-doença).
2. A concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez pressupõe a
averiguação da incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência do
segurado, e terá vigência enquanto permanecer ele nessa condição.
3. A correta interpretação das normas constitucionais e legais exige a concretização do conceito
jurídico de incapacidade laboral como impossibilidade de desempenho de funções específicas de
uma atividade ou ocupação, em consequência da interação entre doenças ou acidentes e
barreiras presentes no contexto social, que resultam em impedimentos de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial, comprometendo o sustento.
4. A experiência de pessoa vivendo com HIV/AIDS requer avaliação quanto à presença de
deficiência em virtude de problemas em funções corporais, que podem resultar, nos termos da
CIF (Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde), tanto limitações de
atividade, quanto restrições de participação. Limitações de atividade são, nos termos da CIF,
"dificuldades que um indivíduo pode encontrar na execução de atividades" e restrições de
participação, por sua vez, são "problemas que um indivíduo pode enfrentar ao se envolver em
situações de vida".
5. Há direito a benefício por incapacidade para pessoa vivendo com HIV, assintomática para
AIDS, se o preconceito e a discriminação, associados a outros fatores, impedirem ou reduzirem o
exercício de atividade laboral remunerada, como também ao benefício de prestação continuada,
se este conjunto de fatores obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
oportunidades.
6. Do ponto de vista jurídico constitucional, não se trata de estabelecer uma relação direta entre
sorologia positiva para HIV, ainda que sem sintomas, e incapacidade laboral decorrente de
estigma ou impedimento de longo prazo que, em interação com barreiras, obstrui participação
igualitária na vida social, assim como estar-se-ia incorrendo em equívoco simplesmente
afirmando que, em si mesma, a ausência de sintomas relacionados ao HIV seja garantia de
capacidade laboral ou de participação igualitária às pessoas vivendo com HIV/AIDS.
7. A mera invocação da assintomatologia de pessoas vivendo com HIV/AIDS é inadequada e
insuficiente para fazer concluir necessariamente pelo indeferimento do benefício, assim como da
pura menção quanto à existência de processos sociais de estigmatização não decorre
imediatamente o direito ao benefício.
8. Necessidade de avaliação de outros fatores além da condição assintomática ou não, cuja
presença pode importar em obstrução para participação igualitária na vida social, tais como: (a)
intersecção com condição econômica e social; (b) intersecção com pertencimentos identitários
que acarretam discriminação múltipla (como raça, etnia, orientação sexual e identidade de
gênero); (c) qualidade da atenção em saúde acessível à pessoa vivendo com HIV/AIDS; (d)
manifestações corporais diversas experimentadas, como lipodistrofias; (e) contexto social e
cultural onde inserido o indivíduo, englobando, por exemplo, níveis de preconceito e
discriminação, estrutura urbana, inserção e socialização em diversos grupos e corpos sociais
intermediários.
9. Relevância de considerar-se a reemergência da epidemia, acompanhada da fragilização da
participação da sociedade civil e das dificuldades enfrentadas pelo SUS, acrescida do
recrudescimento de forças conservadoras e dissonantes do paradigma dos direitos humanos de
soropositivos, alimentam significativamente os processos sociais de estigmatização de pessoas
vivendo com HIV/AIDS, sejam assintomáticas ou não.
10. É necessário superar a naturalização do paradigma de comparação (soronegativo obviamente
sem sintomas para HIV/AIDS) em face do "diferente" (soropositivo assintomático); atentar para
possíveis circunstâncias diversas daquelas vividas pelo paradigma de comparação (presença de
discriminação no mercado de trabalho contra pessoas vivendo com hiv, independente de
sintomatologia); por fim, ampliar o leque de respostas possíveis, uma vez informada a percepção
pela perspectiva do "diferente" (eventual direito ao benefício, ainda que assintomático,
dependendo do contexto).
11. No caso dos autos, a parte autora é portadora de HIV e possui incapacidade total e
permanente para a atividade laborativa. Considerando que as condições pessoais da parte autora
são absolutamente desfavoráveis e é inviável sua reabilitação profissional, é o caso de concessão
de aposentadoria por invalidez.
12. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do
segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos
provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e
537 do CPC/2015.
13. A determinação de implantação imediata do benefício, com fundamento nos artigos
supracitados, não configura violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973 e 37 da CF/88.
(TRF4, Apel Reex nº 0001148 -48.2015.4.04.9999/SC, 5ª Turma, Relator Desembargador Federal
Roger Raupp Rios, de 17/03/2017)
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AIDS (HIV).
CONTEXTO SOCIOECONÔMICO. ESTIGMA SOCIAL. IMPROVÁVEL REABILITAÇÃO
PROFISSIONAL. PRECEDENTE. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES
DO MAGISTRADO. INCAPACIDADE CONFIGURADA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE
MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DANOS MORAIS. REMESSA NECESSÁRIA E
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA PARCIALMENTE
REFORMADA. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE.
1 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
2 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício previdenciário da
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência
exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for
considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe garanta a
subsistência.
3 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
4 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o
prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte)
dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do
art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
5 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, conforme art. 26, II, da Lei
nº 8.213/91, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social -
RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 do mesmo diploma
legislativo.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o
deferimento do benefício se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por 24
(vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos termos
do art. 15 e §1º da Lei.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze)
contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência,
para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei
nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame
pericial de fls. 228/235, diagnosticou a requerente como portadora "Síndrome da Imunodeficiência
Adquirida e Depressão". Salientou que a autora deve ser submetida à intensiva assistência
multidisciplinar clínica, psicológica, psiquiátrica e nutricional e que a medicação utilizada para o
controle da sua condição neuropatológica reduz a capacidade de vigília. Consignou que a autora
poderá sofrer preconceito num exame admissional (fl. 235). Concluiu pela incapacidade total e
temporária, desde 04/06/02 (fl. 232).
10 - A CTPS de fls. 24/29 e o extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais em anexo
comprovam que a autora efetuou recolhimentos previdenciários nos seguintes períodos: 18/05/88
a 18/02/89, 19/02/89 a 19/03/90, 11/04/91 a 31/05/91, 29/04/95 a 02/01/97, 03/11/97 a 28/02/99 e
30/03/98 a 04/02. Além disso, o mesmo extrato do CNIS revela que a autora esteve em gozo do
benefício de auxílio-doença de 09/04/99 a 17/05/99 e 04/06/02 a 13/05/09.
11 - Assim, observada a data de início da incapacidade laboral (04/06/02) e histórico contributivo
da autora, verifica-se que ela havia cumprido a carência mínima exigida por lei, bem como
mantinha a qualidade de segurada, quando eclodiu sua incapacidade laboral.
12 - Saliente-se, no entanto, que a análise da incapacidade para o labor, no caso da
imunodeficiência adquirida, deve se dar à luz das ocupações funcionais habituais do seu
portador, do seu grau de escolaridade, do potencial exibido para recolocação profissional e
reabilitação e, por fim, do ambiente profissional de convivência, eis que muitos dos portadores do
vírus HIV, ainda que assintomáticos, não têm oportunidades de trabalho e são marginalizados
pela sociedade, sofrendo com os constrangimentos, preconceitos e estigmas que giram em torno
da doença; apresentam debilidades físicas e psicológicas; e, em razão do coquetel que são
submetidos, passam por diversos efeitos colaterais, com náuseas e fadigas que dificultam o
exercício de atividade laboral.
13 - Pois bem, no caso em apreço, verifica-se que a requerente sempre desempenhou atividades
braçais (ajudante geral, auxiliar de cozinha, copeira - CTPS de fls. 24/29) e, provavelmente, vive
em um ambiente social hostil a referida patologia, no qual a AIDS é estigmatizada, sobretudo, em
razão do desconhecimento acerca de sua forma de transmissão, decorrente da própria condição
socioeconômica das pessoas que fazem parte do seu convívio.
14 - Destaca-se, do laudo pericial, o seguinte trecho: "Sem antes nada sentir, 1999 começou com
fraqueza e lesão de pele, foi no médico fez exame (herpes zoster), HIV positiva e hepatite viral
tipo C. Trata depressão e ansiedade" (fl. 229). Ademais, conforme relatório médico fornecido pela
Secretaria de Estado da Saúde, Coordenação e Controle de Doenças (SP), a autora apresenta
diagnósticos de: infecção pelo vírus da imunodeficiência adquirida, depressão grave, fibromialgia,
neuropatia periférica (provavelmente desencadeada pelo HIV e potencializada por algumas
drogas do tratamento antirretroviral-ARV), HPV, hepatite viral C e DM tipo II.
15 - O CNIS da autora revela que o trabalho para prover a subsistência sempre integrou o seu
cotidiano e o afastamento profissional decorreu do diagnóstico do HIV positivo. Precedente: Ag
em AC 0006313-40.2014.4.03.9999/SP, 7ª Turma, relator Desembargador Federal Toru
Yamamoto, DJE 23.09.2016.
16 - Dessa forma, pelo diagnóstico apresentado, a idade da autora (56 anos), a falta de
qualificação profissional, o histórico laborativo indicativo da busca do autossustento por meio de
sua força de trabalho e o ambiente profissional de convívio, somado à depressão, tem-se por
presente a incapacidade absoluta e definitiva para o exercício de atividade que lhe garanta a
subsistência.
17 - Sendo assim, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.
18 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
19 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
20 - Honorários advocatícios. De acordo com o entendimento desta Turma, estes devem ser
reduzidos para 10% (dez por cento) incidente sobre a condenação, entendida como o valor das
parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula nº 111 do Superior Tribunal de
Justiça). Isto porque, de um lado, o encargo será suportado por toda a sociedade - vencida no
feito a Fazenda Pública - e, do outro, diante da necessidade de se remunerar adequadamente o
profissional, em consonância com o disposto no art. 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil.
21 - Afastado o pedido de indenização por danos morais, eis que a reparação em questão
pressupõe a prática inequívoca de ato ilícito que implique diretamente lesão de caráter não
patrimonial a outrem, inocorrente nos casos de indeferimento ou cassação de benefício, tendo a
Autarquia Previdenciária agido nos limites de seu poder discricionário e da legalidade, mediante
regular procedimento administrativo, o que, por si só, não estabelece qualquer nexo causal entre
o ato e os supostos prejuízos sofridos pelo segurado. Precedentes desta Corte: TRF3: 7ª Turma,
AGr na AC nº 2014.03.99.023017-7, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, D.E 28/03/2016; AC nº
0002807-79.2011.4.03.6113, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, D.E 28/10/2014.
22 - Remessa necessária e apelação do INSS parcialmente providas. Sentença parcialmente
reformada. Ação julgada parcialmente procedente.
(TRF3, Apel Reex nº 0000534-82.2009.4.03.6183/SP, 7ª Turma, Relator Desembargador Federal
Carlos Delgado, DE 17/05/2018)
Restou incontroverso, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e cumpriu
a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91, como se
vê dos documentos constantes do ID 130462762 (extrato dataprev).
Tanto é assim que o próprio INSS, como se depreende desse(s) documento(s), já lhe havia
concedido o auxílio-doença no período de 31/07/2017 a 31/05/2018.
A presente ação foi ajuizada em 04/09/2018.
O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo
ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-
doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
Tal entendimento, pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, está embasado no fato de
que "o laudo pericial norteia somente o livre convencimento do juiz quanto aos fatos alegados
pelas partes, mas não serve como parâmetro para fixar termo inicial de aquisição de direitos"
(AgRg no AREsp 95.471/MG, 5ª Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 09/05/2012), sendo
descabida, portanto, a fixação do termo inicial do benefício à data da perícia.
No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/06/2018, dia seguinte ao da cessação do
auxílio-doença.
Na verdade, nessa ocasião, a parte autora já estava incapacitada para o exercício da atividade
laboral, conforme se depreende do laudo pericial.
O auxílio-doença é um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso
de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a
subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser
convertido em aposentadoria por invalidez, se o segurado for considerado insusceptível de
reabilitação.
Assim, se o benefício foi concedido em razão de incapacidade temporária e a decisão judicial não
fixou um prazo estimado para duração do benefício, pode o INSS, nos termos dos parágrafos 8º e
9º do artigo 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 739/2016, convertida na Lei
nº 13.457/2017, cessar o auxílio-doença no prazo de 120 dias, cumprindo ao segurado, se
entender não estar em condições de retornar à atividade laborativa, requerer, na esfera
administrativa, a prorrogação do seu benefício.
De outro modo, nos casos em que o benefício foi concedido com base na incapacidade definitiva
para o exercício da atividade habitual, não se aplicam as regras contidas nos parágrafos 8º e 9º
do artigo 60 da Lei nº 8.213/91, pois há regra específica, prevista no artigo 62 e parágrafo único
da Lei nº 8.213/91:
Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade
habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra
atividade. (redação dada pela Lei nº 13.457/2017)
Parágrafo 1º. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o segurado
seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou,
quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez. (incluído pela Lei nº
13.846/20179)
No caso concreto, considerando que benefício foi concedido com base na incapacidade definitiva
para a atividade habitual, o benefício de auxílio-doença deverá ser mantido até que a parte autora
esteja reabilitada para o exercício de outra atividade que lhe garanta o sustento, observado o
disposto no artigo 62, parágrafo 1º, da Lei nº 8.213/91, que não seja atividade extenuante.
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos
no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo
Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período
em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério
estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e
confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
No que se refere às custas processuais, no âmbito da Justiça Federal, delas está isenta a
Autarquia Previdenciária, a teor do disposto no artigo 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96.
Tal isenção, decorrente de lei:
- não se aplica no âmbito da Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, nos termos artigo 27 da Lei
Estadual nº 3.779/2009, que está em consonância com o disposto na Súmula nº 178/STJ ("O
INSS não goza de isenção de pagamento de custas e emolumentos, nas ações acidentárias e de
benefícios, propostas na Justiça Estadual").
- não exime o INSS do reembolso das custas recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo
único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso dos autos, tendo em conta a gratuidade
processual que foi concedida à parte autora.
- não dispensa o INSS do pagamento de honorários periciais ou do seu reembolso, caso o
pagamento já tenha sido antecipado pela Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução
CJF nº 305/2014, art. 32.
Os honorários periciais foram fixados por decisão interlocutória que restou irrecorrida, sendo
descabida a sua alteração via recurso de apelação, vez que precluso o direito de recorrer.
Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11, como
um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
Assim, provido o apelo da parte autora interposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente,
descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO ao apelo da parte autora, para condenar o
Instituto-réu a conceder-lhe o AUXÍLIO-DOENÇA com reabilitação profissional, nos termos dos
artigos 59 e 61 da Lei nº 8213/91, a partir de 01/06/2018, determinando, ainda, na forma acima
explicitada, a aplicação de juros de mora e correção monetária, bem como o pagamento de
honorários de sucumbência.
Independentemente do trânsito em julgado, determino, com base no artigo 497 do CPC/2015, a
expedição de e-mail ao INSS, instruído com cópia dos documentos do(a) segurado(a) DIEKSON
ANDRE CORDEIRO, para que, no prazo de 30 dias, sob pena de multa-diária no valor de R$
100,00, cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata implantação do benefício de
AUXÍLIO-DOENÇA, com data de início (DIB) em 01/06/2018 (data do dia seguinte à cessação), e
renda mensal a ser calculada de acordo com a legislação vigente.
OFICIE-SE.
É COMO VOTO.
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão
de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, com fundamento na ausência de incapacidade
laborativa,
A I. Relatora deu parcial provimento à apelação, para conceder o benefício de auxílio doença à
parte autora.
Entretanto, peço vênia para apresentar minha divergência, uma vez que entendo ser o caso de
manutenção da r. sentença.
Verifico que o autor, servente de pedreiro, 38 anos, é portador do vírus HIV e está completamente
assintomático, sendo considerado totalmente capaz para o desenvolvimento de sua atividade
habitual.
Desse modo, diante do conjunto probatório, verifico que o autor não faz jus a benefício por
incapacidade.
Assim, meu voto é pelo não provimento da apelação da parte autora.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-
DOENÇA - INCAPACIDADE PARA O TRABALHO - DEMAIS REQUISITOS PREENCHIDOS -
TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO - JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA -
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – APELO(S) PROVIDO EM PARTE - SENTENÇA
REFORMADA, EM PARTE.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão
de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que,
após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por
incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso
de aposentadoria por invalidez (art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de
15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (art. 59).
3. Para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o
preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência,
quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
4. No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial em 06/05/2019, constatou que a parte
autora,servente de pedreiro, idade atual de 38 anos, é portadora de HIV, mas não está
incapacitada para o exercício de sua atividade laboral, como se vê do laudo oficial.
5.A parte autora é pessoa de baixa instrução e sempre se dedicou a atividades braçais, como
servente de pedreiro, que são incompatíveis com as suas condições de saúde.
6. E não se pode ignorar que, nesses ambientes de trabalho, são maiores a estigmatização social
e a discriminação sofridas pelos portadores do vírus HIV, que acabam sendo preteridos nos
processos de seleção para admissão no trabalho, ainda mais considerando que, nessa área, há
muita mão-de-obra disponível.
7. O magistrado não está adstrito às conclusões do laudo pericial, conforme dispõem o artigo 436
do CPC/1973 e o artigo 479 do CPC/2015, devendo considerar também aspectos
socioeconômicos, profissionais e culturais do segurado, como no caso dos portadores do vírus
HIV, ainda que assintomáticos. Nesse sentido, a Súmula nº 78/TNU.
8. Não obstante a conclusão negativa do perito judicial, mas considerando as dificuldades
enfrentadas pelos soropositivos para se recolocarem no mercado de trabalho em razão do
preconceito, os riscos que representam para a integridade da parte autora o exercício de
atividades extenuantes e o fato de que a parte autora tem baixa instrução e sempre se dedicou a
atividades braçais e que exigem grandes esforços físicos, é possível conceder o auxílio-doença
com reabilitação profissional, até porque preenchidos os demais requisitos legais.
8. Não obstante a conclusão negativa do perito judicial, mas considerando as dificuldades
enfrentadas pelos soropositivos para se recolocarem no mercado de trabalho em razão do
preconceito, os riscos que representam para a integridade da parte autora o exercício de
atividades extenuantes e o fato de que sempre se dedicou a atividades laborais como motorista
de caminhão de carga, é mais adequado ao caso a concessão de aposentadoria por invalidez,
até porque preenchidos os demais requisitos legais.
9. Restou incontroverso, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e
cumpriu a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91.
10. O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento
administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese
de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício.
11. Tal entendimento, pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, está embasado no fato
de que "o laudo pericial norteia somente o livre convencimento do juiz quanto aos fatos alegados
pelas partes, mas não serve como parâmetro para fixar termo inicial de aquisição de direitos"
(AgRg no AREsp 95.471/MG, 5ª Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 09/05/2012), sendo
descabida, portanto, a fixação do termo inicial do benefício à data da perícia.
12. No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/06/2018, dia seguinte ao da cessação do
auxílio-doença.
13. Considerando que benefício foi concedido com base na incapacidade definitiva para a
atividade habitual, o benefício de auxílio-doença deverá ser mantido até que a parte autora esteja
reabilitada para o exercício de outra atividade que lhe garanta o sustento, observado o disposto
no artigo 62, parágrafo 1º, da Lei nº 8.213/91, que não seja atividade em condições extenuantes.
14. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices
previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal,
aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de
2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial -
IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do
julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de
Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração
opostos pelo INSS.
15. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária
diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte
alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos
Tribunais Superiores.
16. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do
valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).
17A Autarquia Previdenciária está isenta das custas processuais no âmbito da Justiça Federal
(Lei nº 9.289/96, art. 4º, I), mas (i) não no âmbito da Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul (Lei
Estadual nº 3.779, de 11/11/2009, e Súmula nº 178/STJ), (ii) nem do reembolso das custas
recolhidas pela parte autora (artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 9.289/96), inexistentes, no caso,
tendo em conta a gratuidade processual que foi concedida à parte autora, (iii) tampouco do
pagamento de honorários periciais ou do seu reembolso, caso o pagamento já tenha sido
antecipado pela Justiça Federal, devendo retornar ao erário (Resolução CJF nº 305/2014, art.
32).
18. Os honorários periciais foram fixados por decisão interlocutória que restou irrecorrida, sendo
descabida a sua alteração via recurso de apelação, vez que precluso o direito de recorrer.
19. Os honorários recursais foram instituídos pelo CPC/2015, em seu artigo 85, parágrafo 11,
como um desestímulo à interposição de recursos protelatórios, e consistem na majoração dos
honorários de sucumbência em razão do trabalho adicional exigido do advogado da parte
contrária, não podendo a verba honorária de sucumbência, na sua totalidade, ultrapassar os
limites estabelecidos na lei.
20. Provido o apelo da parte autorainterposto na vigência da nova lei, ainda que parcialmente,
descabida, no caso, a sua condenação em honorários recursais.
21. Apelo(s) provido em parte. Sentença reformada, em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO
APELO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DO VOTO DA RELATORA, COM QUEM
VOTARAM O DES. FEDERAL TORU YAMAMOTO E O DES. FEDERAL LUIZ STEFANINI,
VENCIDOS O DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES E O DES. FEDERAL CARLOS DELGADO
QUE NEGAVAM PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA. LAVRARÁ O ACÓRDÃO A
RELATORA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
