
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0014729-89.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA ZELIA DE OLIVEIRA DE JESUS
Advogado do(a) APELANTE: DENILTO MORAIS OLIVEIRA - SP238996-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0014729-89.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA ZELIA DE OLIVEIRA DE JESUS
Advogado do(a) APELANTE: DENILTO MORAIS OLIVEIRA - SP238996-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou IMPROCEDENTE o pedido de concessão de APOSENTADORIA POR INVALIDEZ ou AUXÍLIO-DOENÇA, com fundamento na ausência de incapacidade e na preexistência da doença ao reingresso no regime, condenando a parte autora ao pagamento de custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios arbitrados 10% do valor atribuído à causa, suspensa a execução, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões de recurso, sustenta a parte autora:
- que, não tendo a perícia judicial, verificado o nexo causal entre a doença e a a atividade, a competência para julgar o processo é do Juizado Especial Federal de São Vicente, e não do Juízo Estadual da Comarca de Praia Grande;
- cerceamento de defesa, eis que o laudo pericial cuidou apenas de verificar a existência de nexo causal entre a doença e a atividade, não analisando se a parte autora está apta, ou não, para o exercício da sua atividade laboral;
- que a parte autora preenche os requisitos legais para a obtenção do benefício por incapacidade.
Requer a anulação da sentença ou a sua reforma, para que seja concedida aposentadoria por invalidez ou, subsidiariamente, auxílio-doença.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0014729-89.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: MARIA ZELIA DE OLIVEIRA DE JESUS
Advogado do(a) APELANTE: DENILTO MORAIS OLIVEIRA - SP238996-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil.
Depreende-se, da petição inicial, que a parte autora pretende obter, nestes autos, benefício previdenciário por incapacidade.
Residindo no Município de Praia Grande, que não é sede do Juizado Especial Federal, a parte autora poderia optar em ajuizar a ação no Juízo Estadual da Comarca de Praia Grande (competência delegada) ou no Juizado Especial Federal de São Vicente, nos termos do artigo 109, parágrafo 3º, da Constituição Federal c.c. o artigo 15 da Lei nº 5.010/66.
Assim, tendo a parte autora optado pelo primeiro, descabe, agora, em sede de recurso, alegar a incompetência daquele Juízo.
Aliás, a questão já foi apreciada, tendo esta Egrégia Corte, quando do julgamento do Conflito de Competência nº 0008705-45.2012.4.03.0000/SP, decidido que o Juízo de Direito da 3ª Vara de Praia Grande é competente para julgar a presente demanda.
Quanto à preliminar de cerceamento de defesa, merece acolhida a preliminar suscitada pela parte autora, em suas razões.
Os
benefícios por incapacidade
, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso deaposentadoria por invalidez
(artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso deauxílio-doença
(artigo 59).No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame médico, realizado em 27/01/2014 pelo perito oficial, constatou que a parte autora, doméstica, idade atual de 63 anos, constatou que a parte autora é portadora de obesidade importante, genu valgo a esquerda, rarefação óssea difusa e artrose difusa, nada concluindo quando à incapacidade laboral da parte autora, como se vê do laudo constante de fls. 97/102.
Em laudo complementar, esclareceu o perito oficial, à fl. 126, que o exame pericial limitou-se a analisar se havia, ou não, nexo causal entre a doença e a atividade:
"Não questionamos em nossa avaliação pericial se a A. encontra-se inapta para o trabalho e sim que suas mazelas ou inaptidão não apresentam qualquer vínculo profissional ou acidentário."
(fl. 126)Intimada a se manifestar sobre o laudo complementar, a parte autora requereu a realização de nova perícia, a fim de ser constatada a sua incapacidade, conforme fls. 132/133.
E, ao julgar o feito, sem propiciar a realização de nova perícia, conforme requerido pela parta autora, o Juízo "a quo" vulnerou o princípio da ampla defesa, insculpido no artigo 5º da Constituição Federal, que diz:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado desta Egrégia Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL INCOMPLETO. NECESSIDADE DE NOVA PERÍCIA.
- Pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
- O laudo, elaborado por especialista em psiquiatria, atesta que a parte autora apresenta depressão de grau leve, sem incapacidade para o trabalho. Entretanto, é portador de esclerose múltipla, que pode ser incapacitante, devendo ser avaliado por neurologista.
- Da análise dos autos, observa-se que o requerente alegou, na petição inicial, ter sido diagnosticado com diversas patologias, entre elas a esclerose múltipla.
- Não houve, portanto, análise quanto à doença alegada pelo autor e lastreada em documentação acostada aos autos. Observo que, embora o perito judicial narre as moléstias descritas pelo autor na exordial, analisou apenas as patologias psiquiátricas e concluiu que o requerente deve ser avaliado por especialista em neurologia.
- Desta forma, resta claro que o laudo médico apresentado se mostrou insuficiente para atender aos propósitos da realização da perícia médica judicial, que tem por objetivo auxiliar o juiz na formação de seu convencimento acerca dos fatos alegados.
- Assim, faz-se necessária a execução de um novo laudo pericial, para esclarecimento do possível diagnóstico das enfermidades relatadas na inicial, com análise de documentos complementares, se o caso, dirimindo-se quaisquer dúvidas quando à incapacidade ou não do autor para o labor, para que, em conformidade com as provas materiais carreadas aos autos, possa ser analisada a concessão ou não do benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
- Apelação parcialmente provida. Sentença anulada.
(AC nº 0030588-48.2017.4.03.9999, 8ª Turma, Desembargadora Federal Tania Marangoni, DE 12/12/2017)
Desse modo, o julgamento da lide, sem a realização de nova perícia, requerida pela parte autora de forma expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla defesa.
Cabe lembrar, nesse sentido, anotação jurisprudencial dos ilustres Theotônio Negrão et alii, em seu Código de Processo Civil e legislação processual em vigor (São Paulo, Saraiva, 2016, nota "6" ao artigo 370 do CPC/2015, pág. 441):
"O indeferimento de realização de provas, possibilidade oferecida pelo art. 130 do CPC, não está ao livre arbítrio do juiz, devendo ocorrer apenas, e de forma motivada, quando forem dispensáveis e de caráter meramente protelatório" (STJ-1ª T., REsp 637.547, Min. José Delgado, j. 10.8.04, DJU 13.9.04).
O julgamento antecipado da lide deve acontecer quando evidenciada a desnecessidade de produção de prova; de outro modo, caracterizado fica o cerceamento de defesa" (RSTJ 48/405).
"Se a pretensão do autor depende da produção da prova requerida, esta não lhe pode ser negada, nem reduzido o âmbito de seu pedido com um julgamento antecipado, sob pena de configurar-se uma situação de autêntica denegação de Justiça" (RSTJ 21/416). No mesmo sentido: RJM 189/95 (AP 1.0027.07.134463-7/001).
Ante o exposto, REJEITO a preliminar de incompetência do Juízo e DOU PROVIMENTO ao apelo, para acolher a preliminar de cerceamento de defesa, desconstituir a sentença e determinar o retorno dos autos à Vara de origem, para que se dê prosseguimento ao feito, com a realização de nova perícia, abrangendo análise técnica e pormenorizada de todos os pontos controvertidos, e a prolação de nova sentença.
É COMO VOTO.
/gabiv/asato
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA - INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO ESTADUAL NÃO CONFIGURADA - CERCEAMENTO DE DEFESA: NECESSIDADE DE NOVA PERÍCIA JUDICIAL - PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO REJEITADA - APELO PROVIDO - SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. Não residindo a parte autora na sede do Juizado Especial Federal, pode ela optar pelo ajuizamento da ação no Juízo de Direito da sua Comarca, nos termos do artigo 109, parágrafo 3º, da Constituição Federal c.c. o artigo 15 da Lei nº 5.010/66. Ademais, esta Egrégia Corte, quando do julgamento do Conflito de Competência nº 0008705-45.2012.4.03.0000/SP, já havia decidido que o Juízo de Direito da 3ª Vara de Praia Grande é competente para julgar a presente demanda. Preliminar rejeitada.
3. Os
benefícios por incapacidade
, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (art. 25, I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso deaposentadoria por invalidez
(art. 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso deauxílio-doença
(art. 59).4. Para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
5. No caso dos autos, o perito judicial não examinou se a parte autora está, ou não, incapacitada para o trabalho, limitando-se a verificar se havia, ou não, nexo causal entre as doenças apontadas na petição inicial e a atividade desempenhada.
6. O julgamento da lide, sem a realização de nova perícia, requerida pela parte autora de forma expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88).
7. Apelo provido, para acolher a preliminar de cerceamento de defesa. Sentença desconstituída.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar de incompetência do juízo e dar provimento ao apelo, para acolher a preliminar de cerceamento de defesa, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
