Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5003857-24.2017.4.03.6120
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
04/06/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE MANDATO ELETIVO.
VEREADOR. NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES
PREVIDENCIÁRIAS. LEI N. 10.887/2004. PERÍODO ESPECIAL. RUÍDO ACIMA DOS LIMITES
DE TOLERÂNCIA. POSSIBILIDADE. CONVERSÃO EM COMUM. FATOR 1,40. SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA.
- A partir da EC n, 20/1998 e por força de dispositivo constitucional, os ocupantes exclusivamente
de cargos temporários, no tocante ao direito fundamental social à previdência, passaram a se
sujeitar ao regime geral da previdência social - RGPS.
- A regulação atual da matéria é conferida pela Lei n. 10.887/2004, a qual, adequada à Emenda
Constitucional n. 20/1998, passou a considerar o vereador e seus congêneres como segurados
obrigatórios, inserindo a alínea "j" no inc. I do art. 11 da atual Lei de Benefícios.
- No caso dos autos, no período vindicado de 1º/1/1998 a 9/5/2004, quando exerceu o autor o
cargo de vereador, não o fez na qualidade de segurado obrigatório do Regime Geral da
Previdência Social, de modo que o cômputo deste interstício somente é possível, à luz do art. 55,
§ 1º, da Lei n. 8.213/1991, mediante o recolhimento das respectivas contribuições, cuja
responsabilidade, à época, não era da Prefeitura de Araraquara/SP, senão do próprio parlamentar
municipal.
- Aplicável, à espécie, o disposto no artigo 55, III e §1º da Lei n. 8.213/1991, o qual autoriza o
cômputo do referido lapso temporal laboral, desde que verificado o recolhimento das respectivas
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
contribuições previdenciárias. Precedentes.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a exposição habitual e permanente aruído em nível superioraos limites de
tolerância previstos nas normas regulamentares.
- A parte autora não faz jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
- Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, devem as partes arcar com os
honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor
atualizado da causa, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do CPC. Suspensa, porém, a
exigibilidade no tocante à parte autora, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto
processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida em parte.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003857-24.2017.4.03.6120
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: RONALDO NAPELOSO
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003857-24.2017.4.03.6120
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: RONALDO NAPELOSO
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
AExma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: trata-se de ação de conhecimento
proposta em face do INSS, na qual a parte autora pleiteia o reconhecimento de período de
mandato eletivo e o enquadramento de atividade especial, com vistas à concessão de
aposentadoria por tempo de contribuição.
A sentença julgou improcedente o pedido.
Inconformada, a parte autora recorreu exorando a reforma do julgado, porquanto demonstrada à
saciedade o período em que atuou como vereador, mediante os respectivos recolhimentos
previdenciários, bem como o intervalo de atividade penosa na extinta FEPASA, o que lhe
assegura a contagem diferenciada no tempo total de labor.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003857-24.2017.4.03.6120
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: RONALDO NAPELOSO
Advogado do(a) APELANTE: CRISTIANE AGUIAR DA CUNHA BELTRAME - SP103039-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
AExma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: o recurso atende aos pressupostos de
admissibilidade e merece ser conhecido.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do período de mandato eletivo (vereador)
Discute-se o cômputo de período do autor trabalhado como vereador no município de
Araraquara/SP.
Segundo a declaração (id 75860147 - p. 3), expedida pela Câmara Municipal de Araraquara, a
parte autora ocupou a vereança daquela municipalidade a partir de 1º/1/1997.
Entretanto, resta discutir qual a natureza desses vínculos e, consequentemente, a quem caberiam
os recolhimentos das contribuições previdenciárias.
Vejamos.
A partir da EC n. 20/1998 e por força de dispositivo constitucional, os ocupantes exclusivamente
de cargos temporários, no tocante ao direito fundamental social à previdência, passaram a se
sujeitar ao regime geral da previdência social - RGPS.
No entanto, antes mesmo da promulgação da aludida Emenda 20, a Lei n. 9.506/1997,
acrescentando uma alínea "h" ao inc. I do art. 12 da Lei n. 8.212/1991, pretendeu tornar segurado
obrigatório do RGPS "o exercente de mandato eletivo federal, estadual ou municipal, desde que
não vinculado a regime próprio de previdência social". Tal dispositivo legal foi considerado
inconstitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (RE n. 351.717/PR, Tribunal Pleno,
DJ 21-11-2003, Rel. Min. Carlos Velloso).
A regulação atual da matéria é conferida pela Lei n. 10.887/2004, a qual, adequada à Emenda
Constitucional n. 20/1998, voltou a considerar o vereador e seus congêneres como segurados
obrigatórios, inserindo a alínea "j" no inc. I do art. 11 da atual Lei de Benefícios.
No caso dos autos, impõe-se concluir, no entanto, que, no período vindicado de 1º/1/1998 a
9/5/2004, quando exerceu o autor o cargo de vereador, não o fez na qualidade de segurado
obrigatório do Regime Geral da Previdência Social, de modo que o cômputo deste interstício
somente será possível, à luz do art. 55, § 1º, da Lei n. 8.213/1991, mediante o recolhimento das
respectivas contribuições, cuja responsabilidade, à época, não era da Prefeitura de
Araraquara/SP ("...§ 1º A averbação de tempo de serviço durante o qual o exercício da atividade
não determinava filiação obrigatória ao anterior Regime de Previdência Social Urbana só será
admitida mediante o recolhimento das contribuições correspondentes, conforme dispuser o
Regulamento, observado o disposto no § 2º"), senão do próprio parlamentar municipal.
Em relação ao período posterior à edição da Lei n. 9.506/1997, isto é, 31/10/1997 a 15/12/1998,
os vereadores tinham a obrigação dos recolhimentos ao RGPS, os quais ocorriam, em regra,
mediante desconto automático na remuneração e o posterior repasse aos cofres do INSS.
Entretanto, como já explicitado, referido dispositivo legal foi declarado inconstitucional pelo C.
Supremo Tribunal Federal, que entendeu pela necessidade de lei complementar para a instituição
de referida contribuição social.
Posteriormente, com o advento da Emenda Constitucional n. 20/1998 dando nova redação ao art.
195, I, alínea "a", da Constituição Federal, criou-se fundamento de validade para a legislação
infraconstitucional regular a matéria via lei ordinária, e assim sobreveio a Lei n. 10.887/2004, que
acrescentou a alínea "j" ao art. 12 da Lei n. 8.212/1991, criando a contribuição incidente sobre os
subsídios dos agentes políticos. Portanto, a cobrança de contribuição previdenciária dos agentes
políticos somente passou a ser exigível a partir da competência setembro de 2004.
Aplicável, portanto, à espécie, o disposto no artigo 55, III e §1º da Lei n. 8.213/1991, o qual
autoriza o cômputo deste lapso temporal laboral, desde que verificado o recolhimento das
respectivas contribuições previdenciárias.
Nesse aspecto, cumpre colacionar os seguintes julgados (gn):
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. ART. 557, §1º, DO C.P.C. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE SERVIÇO. MANDATO ELETIVO MUNICIPAL. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. CARÊNCIA. NÃO CUMPRIDA. RURAL.
APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ART. 143 DA LEI 8.213/91. REQUISITOS
PREENCHIDOS. I - Em recurso extraordinário foi julgado inconstitucional o §1º do art. 13 da Lei
9.506/97, que acrescentou a alínea "h" ao inciso I do art.12 da Lei 8.212/91, que tornou o
exercente de cargo público segurado obrigatório do regime geral da previdência social e instituiu
a contribuição previdenciária sobre os subsídios dos ocupantes de mandato eletivo, por ofensa
aos arts. 154, I, e 195, §4º (na redação original), ambos da Constituição da República que exige
lei complementar para instituição de tal contribuição, posto que anterior ao advento da Emenda
Constitucional 20/98 que, dando nova redação ao art. 195, I, da Constituição da Republica,
ampliou o leque de contribuintes para custeio da previdência social. II - Dessa forma, apenas a
partir da Emenda Constitucional n.20/98 o exercente de mandato eletivo é contribuinte e
segurado obrigatório do regime geral da previdência social, desde que não vinculado a regime
próprio de previdência social, assim, desconsiderados os períodos em que o autor foi detentor de
mandato eletivo, não cumpre a carência para concessão de aposentadoria por tempo de serviço
(art.142 da Lei 8.213/91). (...)". (AC 200303990247544, JUIZ SERGIO NASCIMENTO, TRF3 -
DÉCIMA TURMA, 31/10/2007)
"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
SERVIÇO. AGENTE POLÍTICO. EXERCÍCIO DE MANDATO ELETIVO. VEREADOR .
EXIGIBILIDADE DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. 1. Até o advento da Lei 10.887/04 o
exercício de mandato eletivo não implicava filiação obrigatória ao RGPS. 2. Nos termos do § 1º
do art. 55 da Lei 8.213/91, a averbação de tempo de serviço cujo exercício não determinava
filiação obrigatória ao RGPS só será admitida mediante o recolhimento das contribuições
correspondentes." (EINF 200171140005167, JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, TRF4 -
TERCEIRA SEÇÃO, 30/09/2009)
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. EXERCÍCIO DE MANDATO
ELETIVO. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE RECOLHIMENTOS. REQUISITOS LEGAIS DE
IDADE E CARÊNCIA PREENCHIDOS. TERMO INICIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
CUSTAS. 1. A aposentadoria por idade é devida ao segurado que, havendo cumprido o período
de carência estabelecido no art. 142 da Lei nº 8.213/91, completar 65 (sessenta e cinco) anos de
idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher, conforme dispõe o art. 48 do mesmo diploma legal.
2. Deve-se observar que para aferir a carência a ser cumprida deverá ser levada em
consideração a data em que foi implementado o requisito etário para a obtenção do benefício e
não aquele em que a pessoa ingressa com o requerimento de aposentadoria por idade junto ao
Instituto Nacional do Seguro Social. Por outro lado, no caso de cumprimento do requisito etário,
mas não da carência, o aferimento desta, relativamente à aposentadoria por idade, será realizado
quando do atingimento da idade esperada, ainda que, naquele momento a pessoa não tivesse
completado a carência necessária. 3. A averbação de tempo referente ao exercício de mandato
eletivo (federal, estadual ou municipal), em período anterior a setembro de 2004 (Lei nº
10.887/04), somente é possível mediante o recolhimento das contribuições correspondentes
(como facultativo), conforme entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça. 4. Requisitos
ensejadores à concessão do benefício preenchidos. 5. Em havendo requerimento administrativo,
o termo inicial do benefício deve se dar a partir deste, por ser o momento em que o Réu toma
ciência da pretensão. In casu, 12/05/2006 (fl. 60). 6. Tendo em vista o reconhecimento da
sucumbência recíproca, proceder-se-á a compensação dos honorários advocatícios, arcando
cada parte, com tais despesas, ante seus mandatários( art. 21, caput, do CPC), ficando a parte
autora isenta do pagamento da aludida verba por estar ao abrigo da justiça gratuita. 7. Apelações
do INSS e da parte Autora parcialmente providas". (AC 00114415120084039999,
DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, TRF3 - SÉTIMA TURMA, e-DJF3
Judicial 1 DATA: 07/07/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Aqui, constato a presença de uma declaração firmada pelo autor, optando pela filiação como
contribuinte facultativo durante o período de seu mandato de 1º/1/1998 a 30/9/2004. No mesmo
documento afirma não haver solicitado a restituição dos valores vertidos no interregno (id
75860158 - p. 35), como orientava a Portaria MPS 133/2006.
Cabia, assim, à parte autora manter a pontualidade dos recolhimentos na qualidade de
facultativo.
Ocorre que o extrato do CNIS colacionado aos autos (id 75860159 - p. 5) revela a existência de
contribuições apenas no período de junho de 2000 a janeiro de 2001 e a partir de setembro de
2004.
Assim, viável se afigura o reconhecimento das contribuições vertidas, tão somente, entre junho de
2000 e janeiro de 2001, durante o mandato de edil do demandante.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a
seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum,
observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ, assentou-
se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão somente
até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp 894.266/SP, Rel. Ministro
HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016, DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos
n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n.
2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação
aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo
Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo
à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro
de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições
ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o
enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de
repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não
haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou
dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se
optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído
acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas
instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação
não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
Além disso, a lei não exige a contemporaneidade desses documentos (laudo técnico e PPP). É
certo, ainda, que em razão dos muitos avanços tecnológicos e da fiscalização trabalhista, as
circunstâncias agressivas em que o labor era prestado tendem a atenuar-se com o decorrer do
tempo.
Nesse caso, quanto ao intervalo de labor na FEPASA, de 15/5/1982 a 30/9/1991, a parte autora
logrou demonstrar, via formulário padrão e laudo técnico, exposição habitual e permanente a
níveis de ruído superiores aos limites de tolerância previstos nas normas regulamentares (códigos
1.1.6 do anexo ao Decreto n. 53.831/1964, 1.1.5 do anexo ao Decreto n. 83.080/1979 e 2.0.1 dos
anexos aos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999).
Destarte, o período supracitado deve ser reconhecido como especial, convertido em comum e
somado aos demais incontroversos.
Da aposentadoria por tempo de contribuição
Antes da edição da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, a aposentadoria
por tempo de serviço estava prevista no artigo 202 da Constituição Federal, assim redigido:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a
média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e
comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus
valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior,
se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
definidas em lei:
(...)
§ 1º - É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após
vinte e cinco, à mulher."
Já na legislação infraconstitucional, a previsão está contida no artigo 52 da Lei n. 8.213/1991:
"Art. 52. A aposentadoria por tempo de serviço será devida, cumprida a carência exigida nesta
Lei, ao segurado que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se do sexo feminino, ou 30
(trinta) anos, se do masculino."
Assim, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, o segurado teria de
preencher somente dois requisitos, a saber: tempo de serviço e carência.
Com a inovação legislativa trazida pela citada Emenda Constitucional, de 15/12/1998, a
aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, restando, contudo, a observância do direito
adquirido. Isso significa dizer: o segurado que tivesse satisfeito todos os requisitos para obtenção
da aposentadoria integral ou proporcional, sob a égide daquele regramento, poderia, a qualquer
tempo, pleitear o benefício.
No entanto, àqueles que estavam em atividade e não haviam preenchido os requisitos à época da
Reforma Constitucional, a Emenda em comento, no seu artigo 9º, estabeleceu regras de
transição e passou a exigir, para quem pretendesse se aposentar na forma proporcional, requisito
de idade mínima (53 anos de idade para os homens e 48 anos para as mulheres), além de um
adicional de contribuições no percentual de 40% sobre o valor que faltasse para completar 30
anos (homens) e 25 anos (mulheres), consubstanciando o que se convencionou chamar de
"pedágio".
No caso vertente, o requisito da carência restou cumprido em conformidade com o artigo 142 da
Lei n. 8.213/1991.
Não obstante, somados os períodos citados à contagem administrativa incontroversa, a parte
autora não conta os 35 anos de serviço necessários à concessão do benefício em contenda.
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno as partes a pagar honorários ao
advogado da parte contrária, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da
causa, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do CPC.
Suspensa, porém, a exigibilidade no tocante à parte autora, na forma do artigo 98, § 3º, do
mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação para, nos termos da fundamentação,
determinar: (i) a inclusão na contagem de tempo do segurado do período comum de junho de
2000 a janeiro de 2001 e (ii) a conversão em comum, sob o fator 1,40, do lapso insalubre
exercido de15/5/1982 a 30/9/1991.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE MANDATO ELETIVO.
VEREADOR. NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES
PREVIDENCIÁRIAS. LEI N. 10.887/2004. PERÍODO ESPECIAL. RUÍDO ACIMA DOS LIMITES
DE TOLERÂNCIA. POSSIBILIDADE. CONVERSÃO EM COMUM. FATOR 1,40. SUCUMBÊNCIA
RECÍPROCA.
- A partir da EC n, 20/1998 e por força de dispositivo constitucional, os ocupantes exclusivamente
de cargos temporários, no tocante ao direito fundamental social à previdência, passaram a se
sujeitar ao regime geral da previdência social - RGPS.
- A regulação atual da matéria é conferida pela Lei n. 10.887/2004, a qual, adequada à Emenda
Constitucional n. 20/1998, passou a considerar o vereador e seus congêneres como segurados
obrigatórios, inserindo a alínea "j" no inc. I do art. 11 da atual Lei de Benefícios.
- No caso dos autos, no período vindicado de 1º/1/1998 a 9/5/2004, quando exerceu o autor o
cargo de vereador, não o fez na qualidade de segurado obrigatório do Regime Geral da
Previdência Social, de modo que o cômputo deste interstício somente é possível, à luz do art. 55,
§ 1º, da Lei n. 8.213/1991, mediante o recolhimento das respectivas contribuições, cuja
responsabilidade, à época, não era da Prefeitura de Araraquara/SP, senão do próprio parlamentar
municipal.
- Aplicável, à espécie, o disposto no artigo 55, III e §1º da Lei n. 8.213/1991, o qual autoriza o
cômputo do referido lapso temporal laboral, desde que verificado o recolhimento das respectivas
contribuições previdenciárias. Precedentes.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- O enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes do STJ.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a exposição habitual e permanente aruído em nível superioraos limites de
tolerância previstos nas normas regulamentares.
- A parte autora não faz jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
- Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, devem as partes arcar com os
honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor
atualizado da causa, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do CPC. Suspensa, porém, a
exigibilidade no tocante à parte autora, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto
processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação provida em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação autoral, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
