Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0019031-64.2017.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
24/06/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 29/06/2021
Ementa
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE LABOR
RURAL. TEMPO DE SERVIÇO URBANO INCONTROVERSO. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
CUSTAS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.
1 - Tendo implementado a idade mínima de 60 anos em 28 de dezembro de 2009, deveria a
autora comprovar a carência de 168 (cento e sessenta e oito) meses, ônus do qual, de fato, se
desincumbiu.
2 - Conforme disposição expressa do § 3º, do art. 55 da Lei n. 8.213/91, a distinção entre a
aposentadoria por idade rural e a de caráter híbrido, além do cômputo do exercício de atividade
rural e de períodos de contribuição sob outras categorias conjuntamente, reside no requisito
etário.
3 - Por sua vez, os critérios para apreciação do conjunto probatório referente ao exercício de
atividade rural são idênticos em ambas as modalidades de aposentadorias por idade. Assim
sendo, é necessária apenas a comprovação do efetivo exercício de labor rural para efeito de
carência.
4 - A controvérsia cinge-se ao período de exercício de labor rural, de 1961 a 1985, no qual não
foram efetuados os devidos recolhimentos, conforme aduz a autarquia.
5 - Foi coligida aos autos cópia de escritura pública de doação, lavrada em 1986, atestando que
os genitores da autora, proprietários rurais, doaram a ela e aos irmãos frações da propriedade
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
rural deles. Tal documento constitui suficiente início de prova material do alegado labor rural, em
regime de economia familiar.
6 – A prova oral produzida corroborou o início de prova material apresentado.
7 - Diante do preenchimento da carência exigida em lei, mediante o somatório dos períodos de
atividades rurais e urbanas, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por idade, na
modalidade híbrida.
8 - Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo.
9 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
10 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
11 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
12 - Isento o INSS de custas processuais.
13 - Apelação da autora provida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0019031-64.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ANGELINA PONTES MATTOCHECK
Advogado do(a) APELANTE: MARILIA ZUCCARI BISSACOT COLINO - SP259226-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0019031-64.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ANGELINA PONTES MATTOCHECK
Advogado do(a) APELANTE: MARILIA ZUCCARI BISSACOT COLINO - SP259226-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por MARIA ANGELINA PONTES MATTOCHECK em ação
ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a
concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida.
A r. sentença (ID 100022900, p. 125-128) julgou improcedente o pedido inicial e condenou a
autora no pagamento dos ônus da sucumbência, suspensa a exigibilidade em razão dos
benefícios da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais (ID 100022900, p. 131-144), pugna a autora pela reforma da sentença, ao
argumento de que restou comprovado o exercício de labor rural pelo período de carência
exigido em lei.
Intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0019031-64.2017.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ANGELINA PONTES MATTOCHECK
Advogado do(a) APELANTE: MARILIA ZUCCARI BISSACOT COLINO - SP259226-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
A aposentadoria por idade, na modalidade híbrida, encontra previsão no art. 48, § 3º, da Lei nº
8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso
de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I,
na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher."
Nos termos do dispositivo supramencionado, incluído pela Lei 11.718/2008, o segurado terá
direito à aposentadoria por idade, na forma híbrida, isto é, como trabalhador rural e urbano,
quando atingir 65 (homens) ou 60 (mulheres) anos, desde que tenha cumprido a carência
exigida, devendo ser considerados ambos os períodos (urbano e rural) para efeitos de se
cômputo da carência exigida no art. 27, inc. II, da Lei 8.213/91.
Em relação ao ponto, restou assentado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião
do julgamento do REsp nº 1.674.221/SP, submetido ao rito dos recursos representativos de
controvérsia repetitiva (Tema nº 1.007), o entendimento segundo o qual é permitido ao
segurado mesclar os períodos de atividade rural e urbana, para a obtenção do benefício de
aposentadoria por idade híbrida, sendo indiferente a qual regime pertencia (rural ou urbano) por
ocasião do requerimento do benefício, desde que respeitada a exigência etária, conforme se
verifica in verbis
"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO AO RITO
DOS RECURSOS REPETITIVOS. OBSERVÂNCIA DO ARTIGO 1.036, § 5o. DO CÓDIGO FUX
E DOS ARTS. 256-E, II, E 256-I DO RISTJ. APOSENTADORIA HÍBRIDA. ART. 48, §§ 3o. E 4o.
DA LEI 8.213/1991. PREVALÊNCIA DO PRINCÍPIO DE ISONOMIA A TRABALHADORES
RURAIS E URBANOS. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL, REMOTO E DESCONTÍNUO, ANTERIOR À LEI
8.213/1991 A DESPEITO DO NÃO RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO
TEMPO DE SERVIÇO PARA FINS DE CARÊNCIA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO
DO LABOR CAMPESINO POR OCASIÃO DO IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO OU DO
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. TESE FIXADA EM HARMONIA COM O PARECER
MINISTERIAL. RECURSO ESPECIAL DA SEGURADA PROVIDO.
1. A análise da lide judicial que envolve a proteção do Trabalhador Rural exige do julgador
sensibilidade, e é necessário lançar um olhar especial a esses trabalhadores para compreender
a especial condição a que estão submetidos nas lides campesinas.
2. Como leciona a Professora DANIELA MARQUES DE MORAES, é preciso analisar quem é o
outro e em que este outro é importante para os preceitos de direito e de justiça. Não obstante o
outro possivelmente ser aqueles que foi deixado em segundo plano, identificá-lo pressupõe um
cuidado maior. Não se pode limitar a apontar que seja o outro. É preciso tratar de tema
correlatos ao outro, com alteridade, responsabilidade e, então, além de distinguir o outro, incluí-
lo (mas não apenas de modo formal) ao rol dos sujeitos de direito e dos destinatários da justiça
(A Importância do Olhar do Outro para a Democratização do Acesso à Justiça, Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2015, p. 35).
3. A Lei 11.718/2008, ao incluir a previsão dos §§ 3o. e 4o. no art.
48 da lei 8.213/1991, abrigou, como já referido, aqueles Trabalhadores Rurais que passaram a
exercer temporária ou permanentemente períodos em atividade urbana, já que antes da
inovação legislativa o mesmo Segurado se encontrava num paradoxo jurídico de desamparo
previdenciário: ao atingir idade avançada, não podia receber a aposentadoria rural porque
exerceu trabalho urbano e não tinha como desfrutar da aposentadoria urbana em razão de o
curto período laboral não preencher o período de carência (REsp. 1.
407.613/RS, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 28.11.2014).
4. A aposentadoria híbrida consagra o princípio constitucional de uniformidade e equivalência
dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, conferindo proteção àqueles
Trabalhadores que migraram, temporária ou definitivamente, muitas vezes acossados pela
penúria, para o meio urbano, em busca de uma vida mais digna, e não conseguiram
implementar os requisitos para a concessão de qualquer aposentadoria, encontrando-se em
situação de extrema vulnerabilidade social.
5. A inovação legislativa objetivou conferir o máximo aproveitamento e valorização ao labor
rural, ao admitir que o Trabalhador que não preenche os requisitos para concessão de
aposentadoria rural ou aposentadoria urbana por idade possa integrar os períodos de labor rural
com outros períodos contributivos em modalidade diversa de Segurado, para fins de
comprovação da carência de 180 meses para a concessão da aposentadoria híbrida, desde que
cumprido o requisito etário de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher.
6. Analisando o tema, esta Corte é uníssona ao reconhecer a possibilidade de soma de lapsos
de atividade rural, ainda que anteriores à edição da Lei 8.213/1991, sem necessidade de
recolhimento de contribuições ou comprovação de que houve exercício de atividade rural no
período contemporâneo ao requerimento administrativo ou implemento da idade, para fins de
concessão de aposentadoria híbrida, desde que a soma do tempo de serviço urbano ou rural
alcance a carência exigida para a concessão do benefício de aposentadoria por idade.
7. A teste defendida pela Autarquia Previdenciária, de que o Segurado deve comprovar o
exercício de período de atividade rural nos últimos quinze anos que antecedem o implemento
etário, criaria uma nova regra que não encontra qualquer previsão legal. Se revela, assim, não
só contrária à orientação jurisprudencial desta Corte Superior, como também contraria o
objetivo da legislação previdenciária.
8. Não admitir o cômputo do trabalho rural exercido em período remoto, ainda que o Segurado
não tenha retornado à atividade campesina, tornaria a norma do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991
praticamente sem efeito, vez que a realidade demonstra que a tendência desses Trabalhadores
é o exercício de atividade rural quando mais jovens, migrando para o atividade urbana com o
avançar da idade. Na verdade, o entendimento contrário, expressa, sobretudo, a velha posição
preconceituosa contra o Trabalhador Rural, máxime se do sexo feminino.
9. É a partir dessa realidade social experimentada pelos Trabalhadores Rurais que o texto legal
deve ser interpretado, não se podendo admitir que a justiça fique retida entre o rochedo que o
legalismo impõe e o vento que o pensamento renovador sopra. A justiça pode ser cega, mas os
juízes não são. O juiz guia a justiça de forma surpreendente, nos meandros do processo, e ela
sai desse labirinto com a venda retirada dos seus olhos.
10. Nestes termos, se propõe a fixação da seguinte tese: o tempo de serviço rural, ainda que
remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da
carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido
efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3o. da Lei 8.213/1991, seja
qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho
exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.
11. Recurso Especial da Segurada provido, determinando-se o retorno dos autos à origem, a
fim de que prossiga no julgamento do feito analisando a possibilidade de concessão de
aposentadoria híbrida."
(REsp 1674221/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO,
julgado em 14/08/2019, DJe 04/09/2019) (destaque nosso)
Sendo assim, quando da análise do pedido à luz do § 3º do art. 48 da Lei 8.213/91, não incide a
vedação expressa contida no art. 55, § 2º, da referida lei.
Tendo implementado a idade mínima de 60 anos em 28 de dezembro de 2009, deveria a autora
comprovar a carência de 168 (cento e sessenta e oito) meses, ônus do qual, de fato, se
desincumbiu.
Destaco que de acordo com disposição expressa do § 3º, do art. 55 da Lei n. 8.213/91, a
distinção entre a aposentadoria por idade rural e a de caráter híbrido, além do cômputo do
exercício de atividade rural e de períodos de contribuição sob outras categorias conjuntamente,
reside no requisito etário.
Por sua vez, os critérios para apreciação do conjunto probatório referente ao exercício de
atividade rural são idênticos em ambas as modalidades de aposentadorias por idade. Assim
sendo, é necessária apenas a comprovação do efetivo exercício de labor rural para efeito de
carência.
A controvérsia cinge-se ao período de exercício de labor rural, de 1961 a 1985, no qual não
foram efetuados os devidos recolhimentos, conforme aduz a autarquia.
Foi coligida aos autos cópia de escritura pública de doação, lavrada em 1986, atestando que os
genitores da autora, proprietários rurais, doaram a ela e aos irmãos frações da propriedade rural
deles (ID 100022900, p. 19).
Tal documento constitui suficiente início de prova material do alegado labor rural, em regime de
economia familiar.
De outra parte, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a prova testemunhal
possui a capacidade de ampliar o período do labor documentalmente demonstrado, como
ocorre no caso dos autos.
Foi produzida prova oral, cujos depoimentos foram colhidos em audiência realizada em 2017.
Maria Aparecida de Oliveira relatou conhecer a autora desde a infância e que, na época, ela
trabalhava nas lides rurais. Disse que, após o casamento, a autora deixou o labor rural.
Maria José Prestes informou conhecer a autora desde a infância e que, na época, ela
trabalhava nas lides rurais com os pais dela, no sítio deles. A depoente disse que era vizinha da
família, por isso tem essas informações. Afirmou que a autora e a família dela trabalhavam com
lavoura de feijão, dentre outras. Informou que a autora permaneceu trabalhando com a família
no sítio até se casar, quando tinha trinta e sete anos.
Therezinha de Fátima Bessa Fermaz declarou conhecer a autora há quarenta e cinco anos e
que, na época, a autora trabalhava nas lides rurais. Informou que ela permaneceu nessa
atividade até se casar, aos trinta e sete anos. Afirmou que, atualmente, ela trabalha como
costureira.
Como se vê, a prova oral corroborou, de forma satisfatória, o início de prova material da
atividade campesina desempenhada pela requerente.
Cumpre o observar que os períodos nos quais a autora efetuou recolhimentos como
contribuinte individual, na condição de costureira, restam incontroversos, logo, desnecessária
sua apreciação.
Dessa forma, diante do preenchimento da carência exigida em lei, mediante o somatório dos
períodos de atividades rurais e urbanas, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria
por idade, na modalidade híbrida.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (23/02/2015
– ID 100022900, p. 29).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo
com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas
as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que,
sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
Isento o INSS de custas processuais.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da autora para reformar a sentença e julgar
procedente o pedido, a fim de condenar o INSS na implantação do benefício de aposentadoria
por idade, a partir da data do requerimento administrativo, sendo que sobre os valores em
atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando
será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício
requisitório, de acordo com o mesmo Manual. Arbitro os honorários advocatícios no percentual
mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da
condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da
prolação da sentença.
É como voto.
A parte autora pleiteia a concessão de aposentadoria por idade, na forma híbrida (ou mista),
prevista no artigo 48, §§3º e 4º, da Lei nº 8.213/91, verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida
nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se
mulher.
(...)
§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela
Lei nº 11.718, de 2008)
§ 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)"
O artigo 48 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 11.718/2008, corrigiu distorção
até então existente e passou a contemplar os trabalhadores rurais que, em decorrência do
fenômeno social da urbanização do trabalho, passaram a exercer temporária ou
permanentemente, atividade urbana assegurando-lhes o direito à contagem mista do tempo de
labor rural e urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, adotando-se, para
tanto, o requisito etário mínimo de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60
(sessenta), se mulher, além do cumprimento da carência exigida.
A lei não faz distinção acerca de qual seria a atividade a ser exercida pelo segurado no
momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou requerimento
administrativo.
Por ocasião do julgamento do REsp nº 1.407.613, sob a sistemática dos recursos repetitivos, o
Eg. STJ adotou o entendimento de que pouco importa se o segurado era rural ou urbano
quando do requerimento, podendo somar ou mesclar os tempos para fins de obtenção do
benefício de aposentadoria por idade (híbrida) aos 65 (sessenta e cinco) anos, se homem, e 60
(sessenta), se mulher.
Por conseguinte, para fins de somatória dos períodos de labor urbano e rural, é irrelevante se a
atividade agrícola foi ou não exercida por último.
Quanto ao trabalho rural remoto exercido antes de 1991, em julgamento realizado em
14/08/2019, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento sob o rito
dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese:
"O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei
8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria
híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos
termos do artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor
misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do
implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo" (Tema 1.007).
A questão foi julgada pelo rito dos recursos repetitivos. Isso significa dizer que a mesma terá de
ser seguida por todas as instâncias judiciária do país, consoante previsão do art. 927, III do
CPC, que estabelece que os juízes e tribunais observem os acórdãos proferidos em recursos
extraordinário e especial repetitivos.
O C. Supremo Tribunal Federal concluiu, no dia 25/9/2020 (Plenário Virtual), o julgamento do
Tema 1104 (RE 1.281.909), que discutia a questão dos requisitos para concessão da
aposentadoria híbrida, tendo firmado a seguinte tese:
“É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a
controvérsia relativa à definição e ao preenchimento dos requisitos legais necessários para a
concessão de aposentadoria híbrida, prevista no art. 48, § 3º da Lei nº 8.213/91.”
Ausente arepercussão geralda matéria, afigura-se impossível o cabimento de recursos
extraordinários a respeito desse tema, de sorte que, prevalecerá o entendimento adotado pelo
Eg. STJ, ao julgar o Tema 1007.
Portanto, segundo o entendimento firmado pelo Eg. o STJ para concessão deaposentadoria por
idade híbrida, o tempo rural anterior a 1991pode ser utilizado para fins decarência,
aproveitando-se o tempo de trabalho rural remoto e descontínuo.
Assim, comprovada a natureza mista do labor exercido no período de carência, o regime será o
do artigo 48, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/1991, conforme entendimento consolidado quando do
julgamento do REsp nº. 1.407.613, segundo o qual o segurado pode somar ou mesclar os
tempos para fins de obtenção do benefício de aposentadoria por idade (híbrida) aos 65
(sessenta e cinco) anos, se homem, e 60 (sessenta), se mulher, não importando se o segurado
era rural ou urbano à época do requerimento do benefício (REsp nº. 1.407.613, julgamento em
14.10.2014, Rel. Ministro Herman Benjamin).
CARÊNCIA
No que tange à carência, para os segurados inscritos na Previdência Social até 24/07/1991, há
que se observar a regra de transição estabelecida no artigo 142 da Lei nº 8.213/91, de acordo
com o ano em que houve o implemento dos requisitos para a aposentadoria por idade e, aos
que ingressaram no sistema após essa data, aplica-se a regra prevista no art. 25, inc. II, da Lei
de Benefícios que exige a comprovação de 180 contribuições mensais.
EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL
A comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de
benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a
apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de
Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado
na Súmula nº 149, do C. STJ: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação
da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho
do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento
do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da
controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova admitindo-se início de prova
material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta
prova testemunhal.
Conforme entendimento jurisprudencial sedimentado, a prova testemunhal possui aptidão para
ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos, sendo desnecessária a sua
contemporaneidade para todo o período de carência que se pretende comprovar (Recurso
Especial Repetitivo 1.348.633/SP, (Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe
5/12/2014) e Súmula 577 do Eg. STJ.
Feitas essas considerações, o e. Relator , em seu judicioso voto, deu provimento ao recurso da
parte autora para julgar procedente o pedido, condenando o INSS ao pagamento de
aposentadoria por idade, na modalidade híbrida, em seu favor.
Após exame mais aprofundado dos autos, peço vênia para divergir,
CASO CONCRETO
Colho dos autos que a idade mínima exigida para a obtenção do benefício restou comprovada
pela documentação pessoal da autora, tendo ela nascido em 28/12/1949.
Considerando o implemento do requisito etário em 2009, a parte autora deve comprovar a
carência de 168 meses.
A controvérsia cinge-se ao período de exercício de labor rural, de 1961 a 1985, no qual não
foram efetuados os devidos recolhimentos, conforme aduz a autarquia.
COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL
Para comprovar suas alegações (atividade rural), a parte autora apresentou cópia de escritura
pública de doação, lavrada em 1986, atestando que os seus genitores, proprietários rurais,
doaram a ela e aos irmãos frações da propriedade rural deles (ID 100022900, p. 19).
Emerge dos autos que o conjunto probatório é insuficiente à comprovação do efetivo exercício
pela parte autora da atividade rural em regime de economia familiar pelo período indicado.
Isso porque, o documento apresentado não comprova o exercício de atividade rural, apenas a
posse ou propriedade do imóvel, não servindo como início de prova material, de sorte que, a
prova testemunhal, por si só, não possui aptidão para fazê-lo.
Considerando que o conjunto probatório foi insuficiente à comprovação da atividade rural pelo
período pretendido, seria o caso de se julgar improcedente a ação, não tendo a parte autora se
desincumbido do ônus probatório que lhe cabe, ex vi do art. 373, I, do CPC/2015.
Entretanto, o entendimento consolidado pelo C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de
recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973 é no sentido de que a ausência de
conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, implica a carência de pressuposto de constituição
e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem resolução do mérito
propiciando a parte autora intentar novamente a ação caso reúna os elementos necessários.
Mantida a condenação da parte autora no pagamento das custas e despesas processuais e dos
honorários advocatícios, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita (arts. 11,
§2º, e 12, ambos da Lei 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC), já que deu causa à
extinção do processo sem resolução do mérito.
Ante o exposto, peço vênia para divergir do e. Relator e, de ofício, julgo extinto o processo, sem
resolução do mérito, com fulcro no art. 485, IV do CPC/2015, diante da não comprovação do
trabalho rural e julgo prejudicado o apelo da parte autora.
É o voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE LABOR
RURAL. TEMPO DE SERVIÇO URBANO INCONTROVERSO. BENEFÍCIO CONCEDIDO.
TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
CUSTAS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.
1 - Tendo implementado a idade mínima de 60 anos em 28 de dezembro de 2009, deveria a
autora comprovar a carência de 168 (cento e sessenta e oito) meses, ônus do qual, de fato, se
desincumbiu.
2 - Conforme disposição expressa do § 3º, do art. 55 da Lei n. 8.213/91, a distinção entre a
aposentadoria por idade rural e a de caráter híbrido, além do cômputo do exercício de atividade
rural e de períodos de contribuição sob outras categorias conjuntamente, reside no requisito
etário.
3 - Por sua vez, os critérios para apreciação do conjunto probatório referente ao exercício de
atividade rural são idênticos em ambas as modalidades de aposentadorias por idade. Assim
sendo, é necessária apenas a comprovação do efetivo exercício de labor rural para efeito de
carência.
4 - A controvérsia cinge-se ao período de exercício de labor rural, de 1961 a 1985, no qual não
foram efetuados os devidos recolhimentos, conforme aduz a autarquia.
5 - Foi coligida aos autos cópia de escritura pública de doação, lavrada em 1986, atestando que
os genitores da autora, proprietários rurais, doaram a ela e aos irmãos frações da propriedade
rural deles. Tal documento constitui suficiente início de prova material do alegado labor rural,
em regime de economia familiar.
6 – A prova oral produzida corroborou o início de prova material apresentado.
7 - Diante do preenchimento da carência exigida em lei, mediante o somatório dos períodos de
atividades rurais e urbanas, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por idade, na
modalidade híbrida.
8 - Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo.
9 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09,
a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática
da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
10 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
11 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
12 - Isento o INSS de custas processuais.
13 - Apelação da autora provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo NO
JULGAMENTO, A SÉTIMA TURMA, POR MAIORIA, DECIDIU DAR PROVIMENTO À
APELAÇÃO DA AUTORA PARA REFORMAR A SENTENÇA E JULGAR PROCEDENTE O
PEDIDO, A FIM DE CONDENAR O INSS NA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO DE
APOSENTADORIA POR IDADE, A PARTIR DA DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO, SENDO QUE SOBRE OS VALORES EM ATRASO INCIDIRÁ CORREÇÃO
MONETÁRIA DE ACORDO COM O MANUAL DE ORIENTAÇÃO DE PROCEDIMENTOS PARA
OS CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL ATÉ A PROMULGAÇÃO DA LEI Nº 11.960/09, A
PARTIR DE QUANDO SERÁ APURADA PELOS ÍNDICES DE VARIAÇÃO DO IPCA-E, E
JUROS DE MORA ATÉ A EXPEDIÇÃO DO OFÍCIO REQUISITÓRIO, DE ACORDO COM O
MESMO MANUAL. ARBITRO OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO PERCENTUAL MÍNIMO
DO §3º DO ARTIGO 85 DO CPC, DE ACORDO COM O INCISO CORRESPONDENTE AO
VALOR DA CONDENAÇÃO, APÓS A DEVIDA LIQUIDAÇÃO, CONSIDERADAS AS
PARCELAS VENCIDAS ATÉ A DATA DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA, NOS TERMOS DO
VOTO DO RELATOR, COM QUEM VOTARAM O DES. FEDERAL PAULO DOMINGUES E O
JUIZ CONVOCADO MARCELO GUERRA, VENCIDOS A DES. FEDERAL INÊS VIRGÍNIA E O
DES. FEDERAL LUIZ STEFANINI QUE DE OFÍCIO, JULGAVAM EXTINTO O PROCESSO,
SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, COM FULCRO NO ART. 485, IV DO CPC/2015, DIANTE DA
NÃO COMPROVAÇÃO DO TRABALHO RURAL E JULGAVAM PREJUDICADO O APELO DA
PARTE AUTORA. LAVRARÁ O ACÓRDÃO O RELATOR
, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
