
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002479-31.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: IZABEL EUZEBIO MORELI
Advogado do(a) APELANTE: ANA CAROLINA PINHEIRO TAHAN - SP213850-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002479-31.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: IZABEL EUZEBIO MORELI
Advogado do(a) APELANTE: ANA CAROLINA PINHEIRO TAHAN - SP213850-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por IZABEL EUZEBIO MORELI, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, com pedido de antecipação de tutela.
A r. sentença (ID 131291882, p. 169-172) julgou improcedente o pedido inicial e condenou a autora no pagamento dos ônus da sucumbência, suspensa a exigibilidade em razão dos benefícios da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais (ID 131291882, p. 207-235), pugna a autora pela reforma da sentença com o acolhimento do pedido, uma vez comprovado o trabalho rural pelo período necessário ao cumprimento da carência.
Intimado, o INSS não apresentou contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002479-31.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: IZABEL EUZEBIO MORELI
Advogado do(a) APELANTE: ANA CAROLINA PINHEIRO TAHAN - SP213850-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A aposentadoria por idade do trabalhador rural encontra previsão no art. 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinquenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea "a" do inciso I, na alínea "g" do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)"
A autora pleiteia a concessão de aposentadoria por idade rural. Nasceu em 25 de janeiro de 1961, com implemento do requisito etário em 25 de janeiro de 2016. Deveria, portanto, comprovar nos autos o exercício do labor rural, em período imediatamente anterior a 2016, ao longo de, ao menos, 180 (cento e oitenta) meses, conforme determinação contida no art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Foram acostadas aos autos cópias de certidões de nascimento de filhos da autora, ocorridos em 1991 e 1993, nas quais o companheiro dela foi qualificado como lavrador (ID 131291882, p. 24-25); de CTPS da autora, na qual constam registros de caráter rural, nos períodos de 01/08/1983 a 02/08/1983, de 07/05/1984 a 13/10/1984, de 13/05/1985 a 31/10/1985, de 02/07/1986 a 07/09/1986, de 04/05/1987 a 07/12/1987, de 10/05/1988 a 02/12/1988, de 03/04/1989, sem data de término, de 28/05/1990 a 26/11/1990, de 13/05/1992 a 18/02/1993, de 24/01/2008 a 04/02/2009, de 23/10/2010 a 08/03/2012 e de 21/09/2017 a 13/01/2018 (ID 131291882, p. 26-37); e de CTPS do companheiro, na qual constam registros de caráter rural (ID 131291882, p. 42-45).
Tendo em vista a significativa extensão temporal dos registros em Carteira de Trabalho da autora, considero tal documento como início razoável de prova material acerca do desempenho da labuta campesina.
Foi produzida prova oral, cujos depoimentos foram colhidos em audiência realizada em 2019.
Alaide Simão Felipe afirmou conhecer a autora há aproximadamente 20 anos. Que se conheceram quando a depoente morava na Fazenda Barra e a autora morava na Fazenda Barra Branca. Que a autora trabalhava nessa fazenda com criação de animais, na roça, etc. Que o esposo da autora era tratorista na fazenda, e a autora cuidava dos animais, da plantação, etc. Que a autora permaneceu durante uns 6 anos nessa fazenda. Que a depoente era arrendatária. Que viu a autora trabalhar na colheita de algodão na Fazenda Jaraguá, do Sr. Benildo, como diarista rural. Que também viu a autora trabalhar na Fazenda Jico, na lavoura de feijão e milho. Que depois a autora passou a trabalhar para arrendatários, como Antonio Colibri. Que até hoje a autora trabalhar para ele. Que também viu há pouco tempo a autora trabalhando no Sítio da Monique, cuidando dos animais. Que nunca viu a autora trabalhando na cidade (ID 131291883).
Maria Alice de Andrade afirmou conhecer a autora há mais ou menos 25 anos. Que se conheceram na Fazenda Ludival, onde trabalhavam juntas em serviços gerais. Que trabalhavam como diaristas. Que continuou trabalhando como diarista até aproximadamente 3 anos atrás, quando a depoente se aposentou. Que trabalharam juntas na usina, na plantação de eucalipto. Que também trabalharam juntas na Fazenda Jaraguá onde colhiam milho, feijão, algodão, etc. Que trabalharam na Fazenda Jico, sempre como diaristas. Que vê a autora trabalhando até hoje. Que atualmente a autora faz diárias no sítio da Monique Lima, acertando cerca, alimentando os carneiros, galinhas, etc. Que a autora também trabalha para o Sr. Antonio Colibri plantando/colhendo mandioca. Que a autora nunca parou de trabalhar. Que nunca viu a autora trabalhando na cidade (ID 131291885).
Maria Aparecida Santos Conceição afirmou conhecer a autora há mais de 15 anos. Que se conheceram no fim de 1999, trabalhando na lavoura. Que colhiam algodão nas Fazendas Monte Alto, Sapé, entre outras. Que trabalharam juntas por quase 5 anos. Que também trabalharam na Fazenda Mãe da Deus. Que trabalhavam sempre por diária. Que, de início trabalhavam com algodão, mas depois colheram feijão, milho, etc. Que a depoente parou de trabalhar depois que teve filhos, mas que continuou indo para a lavoura para acompanhar o esposo e via a autora trabalhando. Que a depoente voltou a trabalhar depois que o esposo faleceu, em 2010. Que há aproximadamente 2 semanas viu a autora trabalhando para a Sra. Monique Lima. Que também viu a autora trabalhando para a Florestal Brasil, para outra empresa de mudas, entre outros lugares. Que também viu a autora trabalhando para Antonio Colibri, que é arrendatário e tem lavoura de mandioca (ID 131291886).
Como se vê, a prova oral corroborou, de forma satisfatória, o início de prova material da atividade campesina desempenhada pela requerente, atestando o exercício do trabalho na roça, a um só tempo, pelo período equivalente à carência prevista no art. 142 da Lei de Benefícios, como por ocasião do implemento da idade mínima, inclusive até os dias atuais, a contento da exigência referente à imediatidade.
Isso porque o C. STJ estabeleceu, no julgamento do REsp autuado sob nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, verbis:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.
2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil."
(REsp nº 1.354.908/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, 1ª Seção, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)
Dessa forma, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Fixo o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (11/07/2016).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada moderadamente.
Isento o INSS de custas processuais.
Por derradeiro, a hipótese da ação comporta a outorga de tutela específica nos moldes do art. 497 do Código de Processo Civil. Dessa forma, em atenção a expresso requerimento da parte autora, visando assegurar o resultado concreto buscado na demanda e a eficiência da prestação jurisdicional, independentemente do trânsito em julgado, determino seja enviado e-mail ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, instruído com os documentos da parte autora, a fim de serem adotadas as providências cabíveis ao cumprimento desta decisão, para a implantação do benefício no prazo máximo de 20 (vinte) dias.
Ante o exposto, dou provimento à apelação da autora para reformar a sentença e julgar procedente o pedido, a fim de condenar o INSS na implantação do benefício de aposentadoria por idade, a partir da data do requerimento administrativo, sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora de acordo com o mesmo Manual, observando que a partir da promulgação da EC nº 113/2021 haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente, condenando a Autarquia, ainda, no pagamento dos honorários advocatícios, fixados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença. Concedo a tutela específica. Comunique-se o INSS.
É como voto.
E M E N T A
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEO AOS FATOS ALEGADOS. PROVA TESTEMUNHAL QUE AMPLIA O PERÍODO DE TRABALHO RURAL. ATIVIDADE CAMPESINA NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO DO BENEFÍCIO. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL DO STJ (REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA). COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL NO MOMENTO DA IMPLEMENTAÇÃO DO REQUISITO ETÁRIO. BENEFÍCIO CONCEDIDO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RECURSO DA AUTORA PROVIDO.CONCESSÃO DA TUTELA ESPECÍFICA.
1 - A aposentadoria por idade do trabalhador rural encontra previsão no art. 48, §§1º e 2º, da Lei nº 8.213/91.
2 - Deve a autora comprovar o exercício do labor rural, em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário (2016) por, pelo menos, 180 (cento e oitenta) meses, conforme determinação contida no art. 142 da Lei nº 8.213.
3 - Os documentos acostados aos autos constituem suficiente início de prova material do labor rural.
4 - A prova oral colhida em audiência corroborou, de forma satisfatória, o início de prova material da atividade campesina desempenhada pela requerente, atestando o exercício do trabalho na roça, a um só tempo, pelo período equivalente à carência prevista no art. 142 da Lei de Benefícios, como por ocasião do implemento da idade mínima, inclusive até os dias atuais, a contento da exigência referente à imediatidade.
5 - O C. STJ estabeleceu, no julgamento do REsp autuado sob nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário.
6 - Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo.
7 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
8 - Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
9 - A partir da promulgação da EC nº 113/2021, publicada em 09/12/2021, para fins de atualização monetária e compensação da mora, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
10 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada moderadamente.
11 - Isento o INSS do pagamento de custas processuais.
12 - Apelação da autora provida. Sentença reformada. Pedido inicial julgado procedente. Tutela específica concedida.
