
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0038031-21.2015.4.03.9999/MS
VOTO-VISTA
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO:
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra a r. sentença de fls. 142/147, que julgou procedente o pedido inicial de concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, formulado por IRMA BOGADO ROMEIRO.
O i. Relator deu parcial provimento ao apelo autárquico para reformar a sentença tão somente quanto aos critérios de fixação da correção monetária e juros de mora, mantendo a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, a partir do requerimento administrativo, no que foi acompanhado pelo Desembargador Federal Paulo Domingues.
Pedi vista dos autos para melhor análise da matéria sob julgamento.
Constato que o entendimento esposado pelo nobre Relator, na sessão realizada em 07/11/2016, diverge com o deste julgador.
Tendo implementado a idade mínima de 55 anos em 24 de dezembro de 2012 (fl. 11), deveria a autora comprovar o exercício de atividade rural por 180 (cento e oitenta) meses, ônus do qual não se desincumbiu.
A inicial da presente demanda veio instruída com diversos documentos, dentre os quais considero unicamente como início razoável de prova material do desempenho das lides campesinas a Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS de fl. 12, a qual noticia a existência de um vínculo empregatício de natureza rural exercido pela autora no breve período de 1º de dezembro de 1994 a 28 de maio de 1995, junto à Estância Portal Miranda Agropecuária.
E, nesse particular, abro um parêntese para registrar que as informações extraídas do CNIS, em relação à requerente, não contemplam mencionado vínculo laboral (fl. 97). Por outro lado, o informe do mesmo banco de dados em nome do cônjuge, Ageu Mascena Adolfo, menciona expressamente sua contratação, pela mesma pessoa jurídica, em período muito similar (05 de novembro de 1994 a 28 de maio de 1995 - fl. 103).
Quer me parecer que o casal tenha sido contratado pelo mesmo empregador, mas há que se perquirir o motivo pelo qual este procede ao registro em CTPS de um empregado, mas não do outro, já que contratados simultaneamente.
De qualquer sorte, retomando a análise do acervo probatório, observa-se, claramente, que a prova material mais recente remonta a 1995 e o implemento do requisito etário ocorreu apenas no ano de 2012, ou seja, 17 anos mais tarde.
A despeito da existência de pacífico entendimento jurisprudencial no sentido de que a prova testemunhal possui a capacidade de ampliar o período do labor documentalmente demonstrado, verifica-se que, no presente caso, a prova oral não possui o condão de legitimar a concessão da benesse previdenciária, pois o hiato a ser complementado é de 17 anos.
De outra parte, seria de se supor que neste extenso período a segurada ao menos deveria possuir algum documento relacionado à atividade exercida.
Neste sentido, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e da 3ª Seção desta Corte Regional:
Por fim, a prova oral não se mostrou hábil a reverter o decreto de improcedência do pedido.
Valendo-me de trechos do depoimento contidos na fundamentação da r. sentença de primeiro grau - já que a mídia digital com a respectiva oitiva não acompanhou este feito -, consigno que a única testemunha ouvida em audiência realizada em 10 de março de 2015 afirmou conhecer a autora há 20 anos (desde 1995, portanto), e que, desde então, a mesma trabalhava em uma fazenda no município de Miranda, onde teria permanecido por 15 anos. Prosseguindo, disse também que a requerente, nos últimos 10 anos (desde 2005) labora junto à Fazenda Uberaba, "onde exerce atividade rural para subsistência".
Pois bem.
Da parte inicial do depoimento, não se consegue extrair uma ordem cronológica razoável quanto ao histórico laboral da demandante, quando em cotejo com o registro empregatício constante da CTPS.
É que, se considerarmos os 15 anos de permanência da mesma junto a "uma fazenda do município de Miranda", como situados em período posterior àquele apontado na Carteira de Trabalho (Estância Portal Miranda), o lapso temporal compreenderia de 1995 a 2010, conflitando com a informação subsequente prestada pela testemunha (desde 2005 junto à Fazenda Uberaba).
Por outro lado, também não se cogita de ter referido vínculo empregatício se dado em período anterior a 1995, já que a testemunha não a conhecia.
Indaga-se, então, se o mencionado labor se dera, justamente, na Estância Portal Miranda. A resposta é, a meu julgar, negativa, na medida em que sobredito contrato de trabalho - segundo a CTPS de fl. 12 - perdurou por apenas seis meses, fugindo ao senso comum imaginar-se que uma pessoa prestasse serviço para um mesmo empregador durante quinze anos e, ao fim, tivesse registrados apenas seis meses de atividade.
Para além disso, a parte final do depoimento - cuja credibilidade já se revela comprometida -, consigna ter a autora exercido "atividade rural para subsistência"; o termo pressupõe o desempenho da atividade em regime de economia familiar, situação que, mesmo se comprovada documentalmente - não o fora -, faria ruir a pretensão inicial, na medida em que a mesma é beneficiária de pensão por morte desde 26 de novembro de 2004 (fl. 99), ou seja, possui fonte de renda diversa daquela obtida com a agricultura para consumo próprio e comercialização do excedente, a descaracterizar, portanto, o regime pretendido.
Tudo somado, entendo pela reforma da r. sentença de primeiro grau, com o decreto de improcedência do pedido inicial.
Ante o exposto, peço licença ao Exmo. Relator para divergir do entendimento esposado por Sua Excelência, de forma a dar provimento ao recurso de apelação do INSS, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar improcedente o pedido. Condeno a autora no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §4º), bem como no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| D.E. Publicado em 07/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, dar provimento ao recurso de apelação do INSS para julgar improcedente o pedido inicial, nos termos do voto-vista do Des. Federal Carlos Delgado, que fica fazendo parte integrante do presente julgado, no que foi acompanhado pelos Des. Federais Paulo Domingues e Newton de Lucca. Vencidos o Relator e o Des. Federal Fausto de Sanctis.
Relator para o acórdão
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0038031-21.2015.4.03.9999/MS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a sentença de primeiro grau, que julgou procedente o pedido inicial para condenar o réu a implantar o benefício de aposentadoria por idade rural em nome da autora, no valor de um salário mínimo, a partir da data do requerimento administrativo (30/08/2013), devendo as prestações vencidas ser atualizadas monetariamente na forma do Manual de Orientações para os Procedimentos de Cálculos na Justiça Federal e acrescidas de juros de mora, a partir da citação, calculados consoante o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97. Condenou, ainda, o réu ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% sobre o valor da soma das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença.
Dispensado o reexame necessário.
Sustenta o apelante, em suas razões recursais, o não preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão do benefício pleiteado. Subsidiariamente, requer a alteração do critério de incidência da correção monetária e dos juros de mora e a redução da verba honorária.
Apresentadas as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o sucinto relatório.
VOTO
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a autora, nascida em 24/12/1957, comprovou o cumprimento do requisito etário no ano de 2012. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão se deu quando já havia encerrado a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessário, após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais, trabalhadores avulsos e diaristas e o cumprimento da carência de 180 meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, existindo a necessidade de comprovação de recolhimentos de contribuições previdenciárias a fim de ser concedido o benefício.
Antes de analisar os requisitos relativos à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência, cumpre salientar que o esgotamento do prazo acima previsto não constitui óbice para a percepção de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, nos termos do disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
No entanto, o exercício de atividades rurais relativo ao período encerrado em 31/12/2010 há de ser comprovado de igual modo, ou seja, bastando a apresentação de início de prova material corroborada por testemunhos. E, quanto ao período posterior, iniciado em 01/01/2011 até 31/12/2015, o labor rural deve ser comprovado por efetiva prova material, não bastando apenas o seu início, correspondendo cada mês comprovado a três meses de carência, limitados a 12 meses dentro do ano civil, conforme as regras introduzidas pela Lei 11.718/08, em seu art. 2º, parágrafo único, e art. 3º, incisos I e II.
Em suma, considera-se que a simples limitação temporal das regras prescritas pelo art. 143 da Lei de Benefícios, por si só, não obsta a comprovação do exercício de atividades rurais nem a percepção do benefício, desde que comprovados os recolhimentos obrigatórios, que passaram a ser exigidos após o advento das novas regras introduzidas pela Lei 11.718/08.
Pois bem. No presente caso, a fim de comprovar o exercício de atividade rural, a autora apresentou sua CTPS contendo um registro de vínculo trabalhista rural no período de 01/12/1994 a 28/05/1995.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que apenas ela não basta para a comprovação da atividade rural, requerendo a existência de início de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula 149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". Em suma, a prova testemunhal deve corroborar a prova material, mas não a substitui e no presente caso, surge em apoio à pretensão inicial, inequívoca em robustecer o princípio de prova material ao confirmar, sob compromisso e inquirição do juiz singular, o desempenho de atividades rurais pela parte autora ao longo da sua vida, inclusive em época próxima ao implemento do requisito etário.
Dessa forma, diante da prova material acostada aos autos, aliada à prova testemunhal, restou configurado o labor rural exercido pela autora até a data do implemento do requisito etário, fazendo, portanto, jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, conforme corretamente determinado pela sentença de primeiro grau.
Corrigem-se as parcelas vencidas na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, ainda, de acordo com os enunciados das Súmulas nºs 148 do STJ e 08 desta Corte, observando-se o quanto decidido pelo STF quando do julgamento da questão de ordem nas ADIs 4357 e 4425.
Quanto aos juros moratórios, incidem de uma única vez e pelo mesmo percentual aplicado à caderneta de poupança (0,5%), consoante o preconizado na Lei 11.960/2009, art. 5º.
Por fim, verifico que a verba honorária foi fixada consoante o entendimento desta Turma, não havendo reparo a ser efetuado também neste ponto.
Por esses fundamentos, dou parcial provimento à apelação do INSS, para fixar os critérios de incidência dos juros de mora e correção monetária, mantendo, no mais, a sentença recorrida.
Independentemente do trânsito em julgado, determino, com fundamento no artigo 497 do novo Código de Processo Civil, a expedição de email ao INSS, instruído com os documentos da segurada IRMA BOGADO ROMEIRO, para que cumpra a obrigação de fazer consistente na imediata implantação do beneficio de aposentadoria por idade rural, com data de início - DIB em 30/08/2013 (data do requerimento administrativo), e renda mensal a ser calculada de acordo com a legislação vigente.
É o voto.
Desembargador Federal
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