
| D.E. Publicado em 24/10/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004060-26.2007.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas por JOAQUIM FERNANDES RIBEIRO e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação na qual se pleiteia a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, mediante reconhecimento de períodos laborados em atividade rural e em condições especiais.
A r. sentença de fls. 57/58 julgou parcialmente procedente o pedido inicial, apenas para reconhecer, como de efetivo trabalho rural, os períodos de 02/05/1979 a 31/01/1982, de 21/10/1989 a 31/05/1990, de 19/05/2000 a 09/09/2001 e 09/01/2002 a 1º/06/2003, determinando ao INSS que proceda à averbação e expedição da respectiva certidão. Fixou a sucumbência recíproca.
Em razões recursais de fls. 65/70, a parte autora pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que as provas trazidas aos autos comprovam o exercício de trabalho rural no período alegado na inicial (05/08/1959 a 10/06/2005). Sustenta, ainda, que o trabalho na condição de rurícola é considerado insalubre, e que faz jus ao acréscimo de tempo de serviço relativo às atividades exercidas em condições especiais, o que lhe garante o direito à percepção do benefício vindicado.
O INSS, por sua vez, nas razões do seu apelo (fls. 73/77), pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que o pedido da parte autora foi reconhecido com base em prova exclusivamente testemunhal, o que seria vedado pelo ordenamento jurídico. Alega ainda que o reconhecimento do tempo de serviço, e expedição da respectiva certidão, dependeria do recolhimento das contribuições previdenciárias.
As partes apresentaram contrarrazões às fls. 83/93 e 94/97.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
A parte autora alega que trabalhou em atividade rural desde 05/08/1959 até 10/06/2005 - com exceção de um breve período compreendido entre 10/09/2001 e 08/01/2002, no qual exerceu atividade urbana - e que mencionado período não é reconhecido pelo INSS para efeito de concessão de aposentadoria por tempo de serviço.
Tenho como provado, em grande parte, o tempo de serviço rural alegado na exordial. Com efeito, os documentos juntados pelo Autor, corroborados pela prova testemunhal, bem demonstram que exerceu atividade rural desde o ano de 1961.
Junta a parte autora: a) cópia da sua certidão de casamento, em 1979, na qual consta registro de sua profissão como lavrador (fls. 21); b) cópia da CTPS, na qual constam registros de atividade rural, nos períodos de 1º/02/1982 a 20/10/1989, de 1°/06/1990 a 18/05/2000 e a partir de 02/06/2003 (fls. 18/19); c) cópia do seu título de eleitor, de 1982, na qual é qualificado como lavrador (fls. 20); d) cópia da certidão de nascimento de sua filha, em 1984, na qual também consta sua condição de trabalhador rural (fls. 22).
Entendo ser prescindível que a documentação apresentada comprove o desempenho da atividade rurícola ano a ano, visto que há presunção da continuidade do exercício da atividade rural.
Neste sentido, a Súmula nº 14 da Colenda Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais, que, embora dispondo sobre aposentadoria por idade, também é aplicável ao caso dos autos:
Além disso, o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Resp nº 1.348.633/SP, apreciado em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva, assentou a possibilidade de reconhecimento da faina rural em período anterior à data do documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, conforme ementa que segue:
Indo adiante, a par da documentação, trazida como início de prova material, foram ouvidas três testemunhas. Os depoimentos foram convincentes quanto ao trabalho do Autor na zona rural no período questionado (fls. 59/62).
Em seu depoimento pessoal, o Autor afirma que sempre trabalhou na roça, tendo iniciado tal atividade aos 10 anos de idade. Aduz ter trabalhado, sem registro, 6 (seis) anos para Venâncio Comar e 2 (dois) anos para Belmiro Savoine.
O depoente Jesus Laercio Crispim disse que conhece o Autor "há 42 anos", que há 3 (três) anos trabalham juntos na roça, e que já foram vizinhos de propriedade rural. Declarou que "desde quando o conhece ele trabalha na roça", e que o Autor trabalhou na fazenda Santa Izabel, Santa Luiza e Monte Alegre.
Hélio Marinho, por sua vez, declarou que conheceu o Autor "há 45 anos", que "desde quando o conhece o autor trabalha na roça", e que já trabalharam juntos na roça há "uns 04 ou 05 anos atrás". Referiu que trabalharam na fazenda Santa Izabel e "também em outras propriedades da região".
Por fim, a testemunha Antonio Carlos Lhobrigat Matheu alegou que conhece o autor "há mais de 30 anos", que "o autor sempre trabalhou como empregado na lavoura", e que já trabalharam juntos, na fazenda Santa Izabel, "há uns 05 ou 06 anos atrás", sendo que, naquele período, "o depoente não era registrado, mas o autor sim". Confirmou que o Requerente também trabalhou para Venâncio Comar.
Os testemunhos são consentâneos com as alegações do Autor e documentos apresentados.
Não se trata, portanto, de prova exclusivamente testemunhal, como quer o INSS. Os depoimentos testemunhais estão confirmados por prova documental, não havendo por que sequer discutir a incidência da ressalva do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91. Aliás, o caso presente enquadra-se, sim, nesse dispositivo, mas na parte em que admite a prova testemunhal "baseada em início de prova material".
A lei processual atribui ao Juiz no nosso sistema judiciário livre convencimento quanto à prova carreada aos autos. Em princípio, penso que poderia essa disposição ser mitigada por dispositivo de igual hierarquia, como é o caso da Lei nº 8.213/91, vedadas constitucionalmente somente as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI). O livre convencimento e a exigência de início de prova material podem, de certa forma, ser tidos como não excludentes; conjugam-se ambas disposições, que se integram e complementam no sentido de que, havendo o resquício de prova documental, há plena aplicação do princípio do livre convencimento quanto à prova testemunhal.
De outra parte, em sendo impossível a produção da prova documental, não há dúvida que deverá ela ser dispensada, porquanto não se admite que não se tenha como provado o fato se for a prova testemunhal a única disponível. Negar essa possibilidade afrontaria até o princípio do acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV e LIII a LV). Até porque o dispositivo em tela dispensa a exigência se for decorrente de "força maior ou caso fortuito", não podendo a Lei e o Judiciário fechar os olhos à realidade de que no meio rural muitas são as limitações ao próprio segurado quanto a documentos comprobatórios de sua atividade.
Nem se olvide que o sentido da mencionada norma não é o de um fim em si mesma. Não pode ser outra a exigência legal de início de prova documental senão impedir que a prova testemunhal possa ser forjada, o que afrontaria até mesmo ao Judiciário. No caso, o conjunto dá plena convicção de que os testemunhos são idôneos, mais uma vez levando à sua admissão.
Tenho como provada, assim, a atividade rural invocada.
Quanto ao termo "a quo", pelo conjunto, não há a menor dúvida quanto ao efetivo trabalho desde praticamente criança, nem à permanência até o início da atividade urbana, como também posteriormente a esta. Pede o Autor reconhecimento desde 1959, quando completou dez anos de idade, ao passo que a legislação trabalhista admitia o trabalho a partir dos doze anos (art. 402, CLT), hoje catorze (nova redação da Lei n° 10.097/2000). No caso, a prova testemunhal confirmou a atividade campesina do Autor a partir dos doze anos (fls. 61), motivo pelo qual entendo comprovado o trabalho como rurícola a partir do ano de 1961.
O fato de o Autor ter exercido atividade urbana em breve lapso temporal (de 10/09/2001 a 08/01/2002 - fls. 19), não é óbice ao reconhecimento do segundo período postulado na exordial (09/01/2002 a 10/06/2005 - fls. 09), visto que o conjunto probatório (início de prova material, em especial documento de fls. 19 e CNIS em anexo, corroborado com a prova testemunhal) demonstrou o retorno dele à atividade campesina.
Tenho como provada, assim, a atividade rural entre 05/08/1961 e 09/09/2001 e 09/01/2002 a 10/06/2005 (consignando que os períodos de 1º/02/1982 a 20/10/1989, de 1º/06/1990 a 18/05/2000, e de 02/06/2003 a 10/06/2005 foram devidamente registrados em CTPS), o que soma 43 anos, 6 meses e 7 dias, na condição de trabalhador rural.
De outra parte, não merece prosperar o pedido autoral no que concerne ao reconhecimento do período de atividade rurícola como atividade especial, a ensejar a consequente conversão em tempo comum. Isso porque a jurisprudência, em especial do C. Superior Tribunal de Justiça, firmou-se no sentido de que tal labor não se enquadra no item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64, aplicável, tão somente, à agropecuária. Nesse sentido:
Dentro desse contexto, afastado o enquadramento como atividade especial, deve ser computado como tempo de atividade comum o trabalho rural aqui reconhecido, ou seja, de 05/08/1961 a 09/09/2001 e de 09/01/2002 a 10/06/2005.
Não há impedimento ao reconhecimento desse tempo rural, devendo ser observado apenas o disposto § 2º do art. 55 da Lei nº. 8.213/91, in verbis:
Trata-se, portanto, de expressa disposição legal quanto à possibilidade de reconhecimento do tempo mesmo sem recolhimento. A alteração promovida no dispositivo em questão pela MP nº 1.523-13/97, que obrigava o recolhimento, não foi reeditada após a liminar concedida na ADIn nº 1.664-0 pelo Supremo Tribunal Federal em 13.11.97 (DJU 25.11.97 - p. 61393), que a declarava inconstitucional exatamente porque o rurícola estava antes desobrigado de contribuir.
Todavia, esse tempo de serviço rural não tem efeito quanto à carência, de modo que para esta há de existir contribuição, já que os únicos benefícios devidos ao rurícola independentemente de contribuição são os previstos no art. 142 e no art. 39, inc. I, da LBPS, entre os quais não está a aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição.
Aposentadoria por tempo de serviço
O Autor postula a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, a partir da data da citação.
A aposentadoria por tempo de serviço, diz o art. 52 e o art. 53 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (LBPS), é devida ao segurado do sexo masculino que completar 30 anos de trabalho, correspondendo a uma renda equivalente a 70% do salário de benefício, mais 6% a cada ano até atingir 100%.
A Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, por sua vez, estabeleceu em seu artigo 3º:
In casu, somando-se a atividade rural reconhecida na presente demanda ao lapso de atividade profissional urbana e rural incontroversa, verifico que o Autor conta com os seguintes tempos de serviço:
a) 37 anos, 4 meses e 12 dias até 16/12/1998 (EC nº. 20/98) - planilha anexa I
b) 43 anos, 10 meses e 6 dias até 10/06/2005 (data do ajuizamento da ação) - planilha anexa II
Registre-se, por oportuno, que para os filiados ao RGPS até 24.07.1991, a Lei nº 8.213/91, em seu art. 142, inseriu regra de transição a ser observada na concessão da aposentadoria por tempo de serviço. No caso, tendo sido demonstrado que, em 1996, o autor já contava com 35 anos de atividade laborativa, a carência a ser exigida é equivalente a 90 meses de contribuições, requisito este que foi atendido, integralmente, em atividade rural, com registro em CTPS, antes de 1998.
Assim, tinha o Autor direito, na data da propositura da ação, a aposentadoria integral, com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98.
O valor da aposentadoria por tempo de contribuição consistirá numa renda mensal correspondente a 100% do salário-de-benefício (art. 53, II), a ser calculada nos termos do art. 29 da Lei nº 8.213/91, com redação anterior à Lei nº 9.876/99.
Não há notícia nos autos de requerimento administrativo. Assim, o benefício é devido a partir da data da citação (09/08/2005 - fls. 34-verso), quando caracterizada a mora do INSS (art. 219 do CPC/73, e 240 do CPC/15). Ademais, consta pedido expresso da parte autora nesse sentido (fls. 06).
Os atrasados sofrerão correção monetária e juros moratórios nos termos do Manual de Orientação de Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal.
Arbitro os honorários advocatícios em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a sentença, uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, registrando ser a parte autora beneficiária da gratuidade da justiça.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, e dou parcial provimento à apelação da parte autora, para declarar como provado o trabalho rural exercido de 05/08/1961 a 09/09/2001, e de 09/01/2002 a 10/06/2005, devendo ser computado como tempo de serviço comum, e para condenar o INSS a conceder aposentadoria por tempo de serviço ao Autor, conforme as regras anteriores à EC n° 20/98, correspondente a 100% do salário-de-benefício, com data de início fixada em 09/08/2005 (data da citação).
É como voto.
Juiz Federal Convocado
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| Data e Hora: | 13/10/2016 16:24:58 |
