
| D.E. Publicado em 06/10/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0005445-09.2007.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por SALVADOR SAMPAIO, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, mediante reconhecimento de período laborado em atividade rural e contagem de tempo urbano como especial.
A r. sentença de fls. 52/60 julgou improcedente o pedido inicial, porquanto não comprovado o trabalho rural no período invocado, e condenou a parte autora no pagamento das custas e despesas do processo, além da verba honorária, fixada em 10% sobre o valor da causa, observados os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Em razões recursais de fls. 63/73, a parte autora pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que as provas trazidas aos autos comprovam o exercício de trabalho rural no período compreendido entre abril de 1960 e maio de 1986. Sustenta, ainda, que o período de trabalho urbano, devidamente registrado, somado ao tempo de atividade na lavoura, lhe garante o direito à percepção do benefício vindicado.
O INSS apresentou contrarrazões às fls. 76/80.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
A parte autora alega que trabalhou em atividade rural desde abril de 1960 até maio de 1986, e que mencionado período não é reconhecido pelo INSS para efeito de concessão de aposentadoria por tempo de serviço.
Tenho provado o tempo de serviço rural alegado na exordial. Com efeito, os documentos juntados pelo Autor, corroborados pela prova testemunhal, bem demonstram que exerceu a atividade rural a partir de 1960.
Junta a parte autora: a) cópia da sua certidão de casamento, em 1967, na qual consta registro de sua profissão como lavrador (fls. 21); b) cópia do certificado de dispensa de incorporação, constando sua profissão de lavrador também em 1967 (fls. 22).
Entendo ser prescindível que a documentação apresentada comprove o desempenho da atividade rurícola ano a ano, visto que há presunção da continuidade do exercício da atividade rural.
Neste sentido, a Súmula nº 14 da Colenda Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais, que, embora dispondo sobre aposentadoria por idade, também é aplicável ao caso dos autos:
Além disso, o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Resp nº 1.348.633/SP, apreciado em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva, assentou a possibilidade de reconhecimento da faina rural em período anterior à data do documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, conforme ementa que segue:
Indo adiante, a par da documentação, trazida como início de prova material, foram ouvidas duas testemunhas. Os depoimentos foram convincentes quanto ao trabalho do Autor na zona rural de Taquarituba/SP no período questionado.
O depoente José Pereira de Sales disse que conhece o Autor desde a idade dos 14 anos, pois eram vizinhos. Aduziu que o Demandante trabalhava na lavoura para o proprietário Avelino Roberto. Referiu ainda sobre a mudança de domicílio do Autor, de Taquarituba para Santa Bárbara.
De acordo com as informações contidas no depoimento, a transferência de cidade ocorreu por volta do ano de 1986, o que corresponde ao período no qual o Autor passou a ostentar seu primeiro vínculo empregatício urbano registrado.
Silvério Fernandes Leitão, por sua vez, declarou que conheceu o Autor nos anos de 1976, 1977, quando trabalharam juntos na lavoura, na fazenda do Dr. Nelson Pavan. Segundo seu depoimento, costumavam ir juntos para o trabalho, levados por um "turmeiro".
Os testemunhos são consentâneos com as alegações do Autor e documentos apresentados.
Não se trata, portanto, de prova exclusivamente testemunhal, como quer o INSS. Os depoimentos testemunhais estão confirmados por prova documental, não havendo por que sequer discutir a incidência da ressalva do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91. Aliás, o caso presente enquadra-se, sim, nesse dispositivo, mas na parte em que admite a prova testemunhal "baseada em início de prova material".
A lei processual atribui ao Juiz no nosso sistema judiciário livre convencimento quanto à prova carreada aos autos. Em princípio, penso que poderia essa disposição ser mitigada por dispositivo de igual hierarquia, como é o caso da Lei nº 8.213/91, vedadas constitucionalmente somente as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI). O livre convencimento e a exigência de início de prova material podem, de certa forma, ser tidos como não excludentes; conjugam-se ambas disposições, que se integram e complementam no sentido de que, havendo o resquício de prova documental, há plena aplicação do princípio do livre convencimento quanto à prova testemunhal.
De outra parte, em sendo impossível a produção da prova documental, não há dúvida que deverá ela ser dispensada, porquanto não se admite que não se tenha como provado o fato se for a prova testemunhal a única disponível. Negar essa possibilidade afrontaria até o princípio do acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV e LIII a LV). Até porque o dispositivo em tela dispensa a exigência se for decorrente de "força maior ou caso fortuito", não podendo a Lei e o Judiciário fechar os olhos à realidade de que no meio rural muitas são as limitações ao próprio segurado quanto a documentos comprobatórios de sua atividade.
Nem se olvide que o sentido da mencionada norma não é o de um fim em si mesma. Não pode ser outra a exigência legal de início de prova documental senão impedir que a prova testemunhal possa ser forjada, o que afrontaria até mesmo ao Judiciário. No caso, o conjunto dá plena convicção de que os testemunhos são idôneos, mais uma vez levando à sua admissão.
Tenho como provada, assim, a atividade rural invocada.
Pelo conjunto, não há a menor dúvida quanto ao efetivo trabalho desde a década de sessenta, nem à permanência até o início da atividade com registro em CTPS. Pede o Autor reconhecimento desde 1960, quando completou catorze anos de idade, ao passo que a legislação trabalhista admitia o trabalho a partir dos doze anos (art. 402, CLT), hoje catorze (nova redação da Lei n° 10.097/2000).
Quanto ao termo final, também prospera o pedido formulado, visto que coincide com a mudança de domicílio do Autor e início de suas atividades mediante registro em CTPS em 16.06.1986, como motorista da empresa "Terraplanagem e Pavimentadora Americana Ltda". Entretanto, atento aos limites do pedido descrito na exordial, reconheço que o trabalho rural foi exercido até 31.05.1986.
Tenho como provada, assim, a atividade rural entre 24 de abril de 1960 (quando completou 14 anos de idade) e 31 de maio de 1986, o que soma 26 anos, 1 mês e 8 dias, na condição de trabalhador rural.
Não há impedimento ao reconhecimento desse tempo rural, devendo ser observado apenas o disposto § 2º do art. 55 da Lei nº. 8.213/91, in verbis:
Trata-se, portanto, de expressa disposição legal quanto à possibilidade de reconhecimento do tempo mesmo sem recolhimento. A alteração promovida no dispositivo em questão pela MP nº 1.523-13/97, que obrigava o recolhimento, não foi reeditada após a liminar concedida na ADIn nº 1.664-0 pelo Supremo Tribunal Federal em 13.11.97 (DJU 25.11.97 - p. 61393), que a declarava inconstitucional exatamente porque o rurícola estava antes desobrigado de contribuir.
Todavia, esse tempo de serviço rural não tem efeito quanto à carência, de modo que para esta há de existir contribuição, já que os únicos benefícios devidos ao rurícola independentemente de contribuição são os previstos no art. 142 e no art. 39, inc. I, da LBPS, entre os quais não está a aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição.
Aposentadoria por tempo de serviço
O Autor postula a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, a partir do ajuizamento da ação.
A aposentadoria por tempo de serviço, diz o art. 52 e o art. 53 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (LBPS), é devida ao segurado do sexo masculino que completar 30 anos de trabalho, correspondendo a uma renda equivalente a 70% do salário de benefício, mais 6% a cada ano até atingir 100%.
A Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, por sua vez, estabeleceu em seu artigo 3º:
In casu, a cópia da CTPS (fls. 14/17) e os extratos CNIS (em anexo) comprovam o exercício de atividade urbana com registro por: a) 3 anos, 1 mês e 26 dias; b) 3 dias; c) 14 anos, 6 meses e 29 dias.
Somando-se a atividade rural reconhecida na presente demanda ao lapso de atividade profissional incontroversa, verifico que o Autor conta com os seguintes tempos de serviço:
a) 37 anos, 6 meses e 24 dias até 16.12.1998 (EC nº. 20/98) - planilha anexa I
b) 43 anos, 10 meses e 6 dias até 28.03.2005 (data do ajuizamento da ação) - planilha anexa II
No ano de 1998, o prazo de carência para o benefício em questão era de 102 (cento e dois) meses de contribuição (art. 142 da Lei nº 8.213/91), tempo esse de contribuição que o Autor atende integralmente em atividade urbana (consoante planilha anexa).
Assim, tinha o Autor direito, na data da propositura da ação, a aposentadoria integral, com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98.
O valor da aposentadoria por tempo de contribuição consistirá numa renda mensal correspondente a 100% do salário-de-benefício (art. 53, II), a ser calculada nos termos do art. 29 da Lei nº 8.213/91, com redação anterior à Lei nº 9.876/99.
Com isso, resta até mesmo despiciendo perquirir a respeito da caracterização de atividade especial nos períodos de trabalho urbano, porquanto no cálculo do benefício ora reconhecido como devido não incide o fator previdenciário, criado que foi pela norma mencionada, posterior à aquisição do direito à aposentadoria.
Não há notícia nos autos de requerimento administrativo. Assim, o benefício é devido a partir da data da citação (31/10/2005 - fls. 26), quando caracterizada a mora do INSS (art. 219 do CPC/73, e 240 do CPC/15).
Os atrasados sofrerão correção monetária e juros moratórios nos termos do Manual de Orientação de Procedimento para os Cálculos da Justiça Federal vigente por ocasião dos cálculos (Resolução CJF nº 267/2013 e eventuais sucessoras).
Arbitro os honorários advocatícios em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a sentença, uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente.
Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, registrando ser a parte autora beneficiária da gratuidade da justiça.
Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação da parte autora, para declarar como provado o tempo de serviço rural entre 24/04/1960 e 31/05/1986, e condenar o INSS a conceder aposentadoria por tempo de serviço ao Autor, conforme as regras anteriores à EC n° 20/98, correspondente a 100% do salário-de-benefício, com data de início fixada em 31/10/2005 (data da citação).
Na fase de cumprimento do julgado, deverão ser descontadas as parcelas recebidas administrativamente a título de benefício inacumulável, ressalvado o direito do segurado de optar pelo benefício mais vantajoso, sem prejuízo do recebimento das parcelas em atraso.
É como voto.
CLÁUDIO SANTOS
Juiz Federal Convocado
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| Data e Hora: | 29/09/2016 16:14:22 |
