D.E. Publicado em 24/10/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0007736-02.2004.4.03.6114/SP
RELATÓRIO
O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por GERALDO PEREIRA DE OLIVEIRA, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante reconhecimento de período laborado em atividade rural.
A r. sentença de fls. 186/189 julgou procedente o pedido inicial, e condenou o INSS no pagamento do benefício pleiteado, desde 30/04/2003 (data do requerimento administrativo), além de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença. Concedida a antecipação dos efeitos da tutela.
Em razões recursais de fls. 197/208, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que o trabalho rural foi reconhecido com base em prova exclusivamente testemunhal, o que é vedado pelo ordenamento jurídico. Alega ainda que o benefício não pode ser concedido sem que haja o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias. Insurge-se quanto à determinação de cômputo do período de trabalho, exercido após 16/12/1998 (EC nº 20/98), para concessão do benefício mais vantajoso ao segurado. Por fim, requer a inversão do ônus da sucumbência.
A parte autora apresentou contrarrazões às fls. 217/224.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O SENHOR JUIZ FEDERAL CONVOCADO CLAUDIO SANTOS (RELATOR):
A parte autora alega que trabalhou em atividade rural desde 01/01/1970 até 30/09/1980, e que mencionado período não é reconhecido pelo INSS para efeito de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Tenho provado o tempo de serviço rural alegado na exordial. Com efeito, os documentos juntados pelo Autor, corroborados pela prova testemunhal, bem demonstram que exerceu a atividade rural a partir de 1970.
Junta a parte autora: a) cópia da sua certidão de casamento, em 1964, na qual consta registro de sua profissão como agricultor (fls. 28); b) cópia de declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ipubi/PE (fls. 30); c) cópia da certidão de nascimento de seus 5 (cinco) filhos, nascidos em 29/10/1965, 14/05/1968, 05/07/1969, 07/07/1974 e 05/08/1978, constando sua qualificação como agricultor (fls. 31/35); d) cópia do termo de reconhecimento de domínio por usucapião especial, concedido ao seu sogro, também qualificado como agricultor, em 13/03/1985 (fls. 36/39).
Entendo ser prescindível que a documentação apresentada comprove o desempenho da atividade rurícola ano a ano, visto que há presunção da continuidade do exercício da atividade rural.
Neste sentido, a Súmula nº 14 da Colenda Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais, que, embora dispondo sobre aposentadoria por idade, também é aplicável ao caso dos autos:
Além disso, o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Resp nº 1.348.633/SP, apreciado em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva, assentou a possibilidade de reconhecimento da faina rural em período anterior à data do documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, conforme ementa que segue:
Indo adiante, a par da documentação, trazida como início de prova material, foram ouvidas três testemunhas. Os depoimentos foram convincentes quanto ao trabalho do Autor na zona rural de Ipubi/PE no período questionado (fls. 181/184).
Em seu depoimento pessoal (fls.180), o Autor esclarece que nasceu em Flores/PE, e morou em Ipubi/PE desde 1959 até 1980, quando então se mudou para São Paulo. Afirma que, em Ipubi/PE, casou-se e nasceram seus seis filhos. Trabalhava na terra, em um primeiro momento, para o pai da testemunha de nome Francisco, e, depois, em um sítio adquirido juntamente com seu sogro, Sr. Josafá Barbosa. Afirma que os documentos de aquisição do sítio estavam no nome de seu sogro, "que ali morou até falecer"; em seguida, "comprou a parte dos outros e ainda possui o sítio naquela cidade".
O depoente Francisco Antônio Leandro disse que conhece o Autor desde 1960, pois possuíam sítios vizinhos, em Ipubi/PE. Aduziu que o Demandante trabalhou no próprio sítio até 1980, quando se transferiu para São Paulo.
Francisco Aderval Gomes Pereira, por sua vez, declarou que conheceu o Autor no ano de 1960, "quando trabalhava com o pai do depoente, possuía uma propriedade e a arrendava". Alega que em 1978 deixou a zona rural e que "o Autor veio para São Paulo por volta de 1980, mas não sabe a data correta".
Por fim, a testemunha Manoel Barbosa da Silva afirma que "conhece o autor da cidade de Flores, em Pernambuco, desde 1960", e que "nessa época o autor trabalhava na roça". Declara que, após ter morado um ano e meio em São Paulo, o depoente retornou para Flores (1964) e o Autor ainda trabalhava na roça, na propriedade do próprio pai.
As incongruências contidas nos depoimentos no que diz respeito ao período de permanência na cidade de Flores/PE, antes da efetiva transferência para Ipubi/PE, não impedem, no caso, o reconhecimento da atividade rural pleiteada na exordial, na medida em que a mudança de cidade indubitavelmente ocorreu antes de 01/01/1970, termo inicial delimitado no pedido autoral. A corroborar tal afirmação estão os documentos de fls. 31/35, os quais indicam que somente a primeira filha do autor nasceu na cidade de Flores/PE, em 1965, enquanto os demais tiveram nascimento registrado em Ipubi/PE (nos anos de 1968, 1969, 1974 e 1978).
Não se trata, portanto, de prova exclusivamente testemunhal, como quer o INSS. Os depoimentos testemunhais estão confirmados por prova documental, não havendo por que sequer discutir a incidência da ressalva do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91. Aliás, o caso presente enquadra-se, sim, nesse dispositivo, mas na parte em que admite a prova testemunhal "baseada em início de prova material".
A lei processual atribui ao Juiz no nosso sistema judiciário livre convencimento quanto à prova carreada aos autos. Em princípio, penso que poderia essa disposição ser mitigada por dispositivo de igual hierarquia, como é o caso da Lei nº 8.213/91, vedadas constitucionalmente somente as provas obtidas por meios ilícitos (art. 5º, LVI). O livre convencimento e a exigência de início de prova material podem, de certa forma, ser tidos como não excludentes; conjugam-se ambas disposições, que se integram e complementam no sentido de que, havendo o resquício de prova documental, há plena aplicação do princípio do livre convencimento quanto à prova testemunhal.
De outra parte, em sendo impossível a produção da prova documental, não há dúvida que deverá ela ser dispensada, porquanto não se admite que não se tenha como provado o fato se for a prova testemunhal a única disponível. Negar essa possibilidade afrontaria até o princípio do acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV e LIII a LV). Até porque o dispositivo em tela dispensa a exigência se for decorrente de "força maior ou caso fortuito", não podendo a Lei e o Judiciário fechar os olhos à realidade de que no meio rural muitas são as limitações ao próprio segurado quanto a documentos comprobatórios de sua atividade.
Nem se olvide que o sentido da mencionada norma não é o de um fim em si mesma. Não pode ser outra a exigência legal de início de prova documental senão impedir que a prova testemunhal possa ser forjada, o que afrontaria até mesmo ao Judiciário. No caso, o conjunto dá plena convicção de que os testemunhos são idôneos, mais uma vez levando à sua admissão.
Tenho como provada, assim, a atividade rural invocada.
Pelo conjunto, não há a menor dúvida quanto ao efetivo trabalho desde a década de setenta, nem à permanência até o início da atividade com registro em CTPS.
Tenho como provada, assim, a atividade rural entre 1º de janeiro de 1970 e 30 de setembro de 1980, o que soma 10 anos, 8 meses e 30 dias, na condição de trabalhador rural.
Não há impedimento ao reconhecimento desse tempo rural, devendo ser observado apenas o disposto § 2º do art. 55 da Lei nº. 8.213/91, in verbis:
Trata-se, portanto, de expressa disposição legal quanto à possibilidade de reconhecimento do tempo mesmo sem recolhimento. A alteração promovida no dispositivo em questão pela MP nº 1.523-13/97, que obrigava o recolhimento, não foi reeditada após a liminar concedida na ADIn nº 1.664-0 pelo Supremo Tribunal Federal em 13.11.97 (DJU 25.11.97 - p. 61393), que a declarava inconstitucional exatamente porque o rurícola estava antes desobrigado de contribuir.
Todavia, esse tempo de serviço rural não tem efeito quanto à carência, de modo que para esta há de existir contribuição, já que os únicos benefícios devidos ao rurícola independentemente de contribuição são os previstos no art. 142 e no art. 39, inc. I, da LBPS, entre os quais não está a aposentadoria por tempo de serviço ou contribuição.
Atividade urbana/especial
O Autor comprovou, por meio da documentação acostada às fls. 71/73, que o INSS reconheceu administrativamente os períodos de trabalho urbano, bem como o labor realizado sob condições especiais - com a devida conversão em tempo comum - e apresentou resumo de cálculo, no qual o tempo de contribuição somava, em 30/04/2003, 25 anos e 4 dias. Referido tempo, em nenhum momento, foi contestado pela Autarquia Previdenciária.
Logo, reconheço tal período como incontroverso, para efeitos de contagem de tempo de contribuição e concessão do respectivo benefício previdenciário.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
O Autor postula a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento administrativo.
A aposentadoria por tempo de serviço, diz o art. 52 e o art. 53 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991 (LBPS), é devida ao segurado do sexo masculino que completar 30 anos de trabalho, correspondendo a uma renda equivalente a 70% do salário de benefício, mais 6% a cada ano até atingir 100%.
A Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, por sua vez, estabeleceu em seu artigo 3º:
In casu, somando-se a atividade rural reconhecida na presente demanda ao lapso de atividade profissional incontroversa, verifico que o Autor conta com os seguintes tempos de serviço:
a) 31 anos, 4 meses e 20 dias até 16.12.1998 (EC nº. 20/98) - planilha anexa I
b) 35 anos, 9 meses e 4 dias até 30.04.2003 (data do requerimento administrativo) - planilha anexa II
No ano de 1998, o prazo de carência para o benefício em questão era de 102 (cento e dois) meses de contribuição (art. 142 da Lei nº 8.213/91), tempo esse de contribuição que o Autor atende integralmente em atividade urbana (consoante planilha anexa).
Assim, verifica-se que o Autor completou o tempo exigido para concessão do benefício previdenciário de:
a) aposentadoria por tempo de contribuição com proventos proporcionais em 16.12.1998 (EC nº 20/98);
b) aposentadoria por tempo de contribuição com proventos integrais em 30.04.2003 (data do requerimento administrativo).
O requisito carência (art. 142 da Lei nº. 8.213/91) restou também completado em 2003 (132 meses de contribuição), consoante anotações em CTPS e extratos CNIS (em anexo).
Em resumo, tinha o Autor direito, na data do requerimento administrativo, à aposentadoria proporcional, com base na legislação pretérita à Emenda Constitucional nº 20/98, ou, aposentadoria integral, com base nas novas regras. Cumpre ressaltar que, como o tempo necessário à concessão do benefício previdenciário integral foi completado após a lei 9.876/99, devem ser aplicados os dispositivos dessa lei quanto à forma de cálculo do benefício, inclusive com a aplicação do fator previdenciário.
Portanto, o Autor tem direito à concessão do benefício pela sistemática mais vantajosa, considerando-se os parâmetros acima, devendo o INSS proceder às simulações e conceder o benefício que se afigurar mais benéfico ao segurado a título de RMI e valores em atraso.
Ressalto que a presente decisão não é condicional, haja vista que foi reconhecido o preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral de acordo com os tempos de serviço/contribuição do Autor, relegando-se para a fase de cumprimento da sentença apenas o cálculo da renda mensal inicial (RMI) e dos valores em atraso, a fim de seja implantada a benesse que se afigurar mais vantajosa.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso de apelação do INSS, apenas para explicitar que a aposentadoria por tempo de contribuição, com proventos integrais, deverá ser calculada consoante as regras estabelecidas após a Emenda Constitucional nº 20/98, devendo, entretanto, o INSS proceder às simulações e conceder o benefício que se afigurar mais benéfico ao segurado a título de RMI e parcelas atrasadas. No mais, mantenho a sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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Data e Hora: | 13/10/2016 16:25:17 |