
| D.E. Publicado em 14/06/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora e dar provimento à apelação do INSS, para reformar a r. sentença de 1º grau e julgar improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0025114-04.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e por MARILDA LOURENÇO, representada por sua mãe, Nair Baron Lourenço, em ação objetivando a concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal.
A r. sentença de fls. 101/107 julgou procedente o pedido e condenou o INSS ao pagamento de benefício assistencial a partir da citação. Determinou que as parcelas vencidas fossem corrigidas monetariamente desde cada vencimento, acrescidas de juros de mora, pagas de uma só vez, fixados pelos índices oficiais de remuneração básica da caderneta de popança, nos termos do art. 1º-F, da Lei nº 9.494/97, desde a citação. Condenou, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre a soma das prestações vencidas, incidentes até a data da efetiva liquidação do débito, devidamente atualizadas (Súmula 111).
Em razões recursais de fls. 111/115, o INSS, pugna pelo reexame necessário, nos termos do artigo 10, da Lei nº 9.469/97. Quanto ao mérito, requer a reforma da decisão, alegando não ter sido demonstrado o requisito relativo à hipossuficiência econômica. Por fim, prequestiona a matéria.
A parte autora, em apelação adesiva, de fls. 134/141, pleiteia a fixação do termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo, 12 de maio de 2005, quando já havia implementado todos os requisitos para a concessão do benefício.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal (fls. 148/155), no sentido do desprovimento de ambos os recursos.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, observo que descabida a remessa necessária pleiteada pela autarquia.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 06/05/2013, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, §2º , do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS no pagamento do benefício assistencial de prestação continuada, no valor de um salário mínimo, a partir da data da citação, em 11/05/2012 (fl. 28). Constata-se, portanto, que desde o termo inicial do benefício até a data de prolação da sentença - 06/05/2013 (fl. 107) - passou-se quase 01 (um) ano, totalizando, assim, 12 (doze) prestações no valor de um salário mínimo, que, mesmo que devidamente corrigidas e com a incidência dos juros de mora e verba honorária, se afigura muito inferior ao limite de alçada estabelecido na lei processual.
Passo à análise do mérito.
A República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição Federal, tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José Afonso da Silva, consiste em:
Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração da Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social e o art. 203, que instituiu o benefício do amparo social, com a seguinte redação:
Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada, dependia da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos, qual seja, a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995 e, posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.
O art. 20 da Lei Assistencial, com redação fornecida pela Lei nº 12.435/2011, e o art. 1º de seu decreto regulamentar estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, quais sejam: ser o requerente deficiente ou idoso, com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos foi reduzida para 67 anos, a partir de 1º de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, posteriormente, para 65 anos, através do art. 34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003, mantida, inclusive, por ocasião da edição da Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011.
Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa com deficiência, família e ausência de condições de se manter ou de tê-la provida pela sua família.
Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos (§10º).
A incapacidade exigida, por sua vez, não há que ser entendida como aquela que impeça a execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o auxílio permanente de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do exercício de trabalho ou ocupação remunerada.
Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do Ministro Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377), oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
No que se refere à hipossuficiência econômica, a Medida Provisória nº 1.473-34, de 11.08.97, transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, alterou o conceito de família para considerar o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/11, definiu-se, expressamente para os fins do art. 20, caput, da Lei Assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
O v. acórdão, cuja ementa ora transcrevo, transitou em julgado em 19.09.2013:
Entretanto, interpretando tal decisão, chega-se à conclusão de que a Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova.
Tal entendimento descortina a possibilidade do exame do requisito atinente à hipossuficiência econômica pelos já referidos "outros meios de prova".
A questão, inclusive, levou o Colendo Superior Tribunal de Justiça a sacramentar a discussão por meio da apreciação da matéria em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva assim ementado:
No que pertine à exclusão, da renda do núcleo familiar, do valor do benefício assistencial percebido pelo idoso, conforme disposto no art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03, referido tema revelou-se polêmico, por levantar a discussão acerca do discrímen em se considerar somente o benefício assistencial para a exclusão referida, e não o benefício previdenciário de qualquer natureza, desde que de igual importe; sustentava-se, então, que a ratio legis do artigo em questão dizia respeito à irrelevância do valor para o cálculo referenciado e, bem por isso, não havia justificativa plausível para a discriminação.
Estabelecido o dissenso inclusive perante o Superior Tribunal de Justiça, o mesmo se resolveu no sentido, enfim, de se excluir do cálculo da renda familiar todo e qualquer benefício de valor mínimo recebido por pessoa maior de 65 anos, em expressa aplicação analógica do contido no art. 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.
Refiro-me, inicialmente, à Petição nº 7203/PE (Incidente de Uniformização de Jurisprudência), apreciada pela 3ª Seção do STJ em 10 de agosto de 2011 (Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura) e, mais recentemente, ao Recurso Especial nº 1.355.052/SP, processado segundo o rito do art. 543-C do CPC/73 e que porta a seguinte ementa:
Pleiteia a autora a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é deficiente e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família.
O exame médico pericial de fls. 69/74, realizado em 17 de dezembro de 2012, concluiu que "a Requerente é portadora de hipotireoidismo congênito, cretinismo (deficiência mental/intelectual grave), nanismo e necessita de auxílio de terceiros para a realização de todas as atividades da vida diária e também incapaz para os atos da vida civil". Encontra-se judicialmente interditada desde 1995 (fl. 14).
Resta analisar a hipossuficiência econômica.
O estudo social de 10 de janeiro de 2013, fls. 77/78, informou ser o núcleo familiar composto pela autora, com 55 anos de idade, e sua mãe Sr.ª Nair Baron Lourenço, com 80 anos. O imóvel, cedido de herdeiros, é composto de seis cômodos, com três quartos, sala, cozinha e banheiro, todos mobiliados.
Segundo o relato da Assistente Social, a autora é deficiente física e intelectual, mede aproximadamente oitenta centímetros, não fica em pé, não fala, e não desenvolve nenhuma atividade sozinha, como se alimentar, tomar banho, etc.
A mãe da autora informou que "sua única renda é a pensão por morte, que recebe no valor de 01 salário mínimo"; benefício este que é partilhado entre ela e a requerente.
Incide, dessa forma, o disposto no art. 20, §4º, da Lei nº 8.742/93, in verbis:
A propósito do tema, já se posicionou esta Eg. 7ª Turma:
Ademais, informações extraídas do Sistema Único de Benefícios - Dataprev, as quais integram o presente voto, revelam que a parte autora, após o óbito de sua genitora, em 08/10/2014, passou a receber integralmente o benefício previdenciário de pensão por morte, no valor atual de R$ 880,00, competência agosto/2016, com DIB em 02/03/1994.
Ressalto que, diante da natureza diversa dos benefícios (previdenciário e assistencial), não é possível que a requerente opte pelo benefício mais vantajoso, conforme sugeriu o parecer ministerial (fls. 148/155).
Ainda que o magistrado sensibilize-se com a situação apresentada pela parte autora, não pode determinar à Seguridade a obrigação de pagamento de benefício, que independe de contribuição, ou seja, cujo custeio sairá da receita do órgão pagador - contribuições previdenciárias e sociais - e cujos requisitos mínimos não foram preenchidos, sob pena de criar perigoso precedente que poderia causar de vez a falência do já cambaleado Instituto Securitário.
Repito que o benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à complementação da renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata tarefa de distinguir faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade precípua prover a subsistência daquele que o requer.
Condeno a autora no ressarcimento de eventuais despesas processuais desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento dos honorários advocatícios, no percentual de 10% sobre o valor atualizado da causa, com supedâneo nos critérios estabelecidos do §3º do art. 20 do CPC/73, reproduzidos no §2º do art. 85 do CPC/2015, cujo dever de satisfação permanece suspenso pelo prazo de 5 (cinco) anos, período no qual sua cobrança somente será permitida mediante demonstração de que deixou de existir a insuficiência de recursos que justificou a gratuidade da justiça, nos termos do art. 12 da Lei nº 1.060/50, repetidos pelos §2º e 3º, do art. 98 do CPC/2015, findo o qual restará prescrita.
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e dou provimento à apelação do INSS, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição, e julgar improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial. Nomeio como curador à lide o advogado DR. ESTEVAN TOZI FERRAZ.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 06/06/2017 20:25:50 |
