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CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. STF. DECLARA...

Data da publicação: 11/07/2020, 20:19:49

CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. PRECARIEDADE DAS CONDIÇÕES DE MORADIA. RENDA DO NÚCLEO FAMILIAR. INSUFICIÊNCIA DE RECUROS QUE GARANTAM O MÍNIMO EXISTENCIAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO DESPROVIDOS. 1 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo. 3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015. 4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia. 5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. 6 - O estudo social informou ser o núcleo familiar composto pelo autor e por sua genitora, os quais residem em "terreno cedido pela prefeitura de Embu das Artes com infraestrutura urbana". A renda familiar decorre dos proventos auferidos pela mãe do requerente, que "trabalha na informalidade como diarista com renda variável". A assistente social noticiou que "o requerente não frequentou qualquer tipo de escola para que pudessem entender as suas reais necessidades de aprendizado. Nesse sentido não foi possível estimular habilidades que poderiam ajudá-lo a ter uma vida independente". 7 - Informações extraídas do Sistema Único de Benefícios/Dataprev dão conta dos recolhimentos efetuados pela genitora do requerente até o ano de 2008. A inexistência de recolhimentos posteriores à competência 05/2008, bem como de benefícios previdenciários ativos, está a indicar que, de fato, a representante legal do autor, trabalha "na informalidade", "com renda variável", conforme declarado. 8 - A despeito da informação, contida no relatório socioeconômico, de que o autor possui 4 (quatro) irmãos - que possuem o dever de auxiliar no seu sustento - a situação descrita nos autos aponta para a insuficiência de recursos que garantam o mínimo existencial. Com efeito, a precariedade das condições de habitação (terreno cedido pelo município), e o fato de tratar-se de núcleo familiar composto por pessoa com 58 anos de idade na presente data, sem renda fixa, e seu filho, portador de doença mental - patologia que demanda cuidados permanentes - são elementos que militam favoravelmente à existência da condição de miserabilidade. 9 - Dados constantes do Sistema Único de Benefícios/Dataprev informam que o pai do requerente reside no estado do Alagoas, não possui vínculos empregatícios registrados, e requereu, na via administrativa, a concessão de benefícios previdenciário (aposentadoria por idade) e assistencial, tendo obtido resposta negativa em ambos. Não há indícios, portanto, de que possua capacidade financeira para auxiliar no sustento do filho. 10 - Tendo sido constatados, mediante perícia médica e estudo social, o impedimento de longo prazo e o estado de hipossuficiência econômica da parte autora, de rigor o deferimento do pedido. 11 - Termo inicial mantido na data da citação. 12 - Correção monetária e juros de mora devem observar os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Verba honorária mantida. 13 - Remessa necessária e apelação do INSS desprovidas. (TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2102367 - 0014485-12.2010.4.03.6183, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/11/2016 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 09/11/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0014485-12.2010.4.03.6183/SP
2010.61.83.014485-2/SP
RELATOR:Desembargador Federal CARLOS DELGADO
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:SP177388 ROBERTA ROVITO e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):CICERO JOSE GOMES DE LIMA incapaz
ADVOGADO:SP203835 CRISTINA TEIXEIRA DE CARVALHO e outro(a)
REPRESENTANTE:EDILEUZA MARIA GOMES DE LIMA
ADVOGADO:SP203835 CRISTINA TEIXEIRA DE CARVALHO e outro(a)
REMETENTE:JUIZO FEDERAL DA 6 VARA PREVIDENCIARIA DE SAO PAULO SP>1ª SSJ>SP
No. ORIG.:00144851220104036183 6V Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA AO IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. PRECARIEDADE DAS CONDIÇÕES DE MORADIA. RENDA DO NÚCLEO FAMILIAR. INSUFICIÊNCIA DE RECUROS QUE GARANTAM O MÍNIMO EXISTENCIAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO DESPROVIDOS.
1 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
3 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
4 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
5 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
6 - O estudo social informou ser o núcleo familiar composto pelo autor e por sua genitora, os quais residem em "terreno cedido pela prefeitura de Embu das Artes com infraestrutura urbana". A renda familiar decorre dos proventos auferidos pela mãe do requerente, que "trabalha na informalidade como diarista com renda variável". A assistente social noticiou que "o requerente não frequentou qualquer tipo de escola para que pudessem entender as suas reais necessidades de aprendizado. Nesse sentido não foi possível estimular habilidades que poderiam ajudá-lo a ter uma vida independente".
7 - Informações extraídas do Sistema Único de Benefícios/Dataprev dão conta dos recolhimentos efetuados pela genitora do requerente até o ano de 2008. A inexistência de recolhimentos posteriores à competência 05/2008, bem como de benefícios previdenciários ativos, está a indicar que, de fato, a representante legal do autor, trabalha "na informalidade", "com renda variável", conforme declarado.
8 - A despeito da informação, contida no relatório socioeconômico, de que o autor possui 4 (quatro) irmãos - que possuem o dever de auxiliar no seu sustento - a situação descrita nos autos aponta para a insuficiência de recursos que garantam o mínimo existencial. Com efeito, a precariedade das condições de habitação (terreno cedido pelo município), e o fato de tratar-se de núcleo familiar composto por pessoa com 58 anos de idade na presente data, sem renda fixa, e seu filho, portador de doença mental - patologia que demanda cuidados permanentes - são elementos que militam favoravelmente à existência da condição de miserabilidade.
9 - Dados constantes do Sistema Único de Benefícios/Dataprev informam que o pai do requerente reside no estado do Alagoas, não possui vínculos empregatícios registrados, e requereu, na via administrativa, a concessão de benefícios previdenciário (aposentadoria por idade) e assistencial, tendo obtido resposta negativa em ambos. Não há indícios, portanto, de que possua capacidade financeira para auxiliar no sustento do filho.
10 - Tendo sido constatados, mediante perícia médica e estudo social, o impedimento de longo prazo e o estado de hipossuficiência econômica da parte autora, de rigor o deferimento do pedido.
11 - Termo inicial mantido na data da citação.
12 - Correção monetária e juros de mora devem observar os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Verba honorária mantida.
13 - Remessa necessária e apelação do INSS desprovidas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa necessária e à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 24 de outubro de 2016.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): CARLOS EDUARDO DELGADO:10177
Nº de Série do Certificado: 28B53C2E99208A4F
Data e Hora: 25/10/2016 19:29:55



APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0014485-12.2010.4.03.6183/SP
2010.61.83.014485-2/SP
RELATOR:Desembargador Federal CARLOS DELGADO
APELANTE:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
PROCURADOR:SP177388 ROBERTA ROVITO e outro(a)
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
APELADO(A):CICERO JOSE GOMES DE LIMA incapaz
ADVOGADO:SP203835 CRISTINA TEIXEIRA DE CARVALHO e outro(a)
REPRESENTANTE:EDILEUZA MARIA GOMES DE LIMA
ADVOGADO:SP203835 CRISTINA TEIXEIRA DE CARVALHO e outro(a)
REMETENTE:JUIZO FEDERAL DA 6 VARA PREVIDENCIARIA DE SAO PAULO SP>1ª SSJ>SP
No. ORIG.:00144851220104036183 6V Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):


Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por CÍCERO JOSÉ GOMES DE LIMA, incapaz, representado por sua genitora, EDILEUZA MARIA GOMES DE LIMA, objetivando a concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal.


A r. sentença de fls. 192/202 julgou procedente o pedido inicial e condenou o INSS no pagamento do benefício assistencial à parte autora, desde a data da citação, além de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Concedida a antecipação dos efeitos da tutela. Sentença submetida ao reexame necessário.


Em razões recursais de fls. 212/216, o INSS postula o reexame necessário e a modificação dos critérios adotados na fixação dos juros de mora e da correção monetária.


Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

Parecer do Ministério Público Federal (fls. 236/245), no sentido do desprovimento do reexame necessário e do recurso de apelação.


É o relatório.


VOTO

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):


A República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição Federal, tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José Afonso da Silva, consiste em:


"um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.'"
(Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 106-107).

Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração da Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social e o art. 203, que instituiu o benefício do amparo social, com a seguinte redação:


"A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei."

Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada, dependia da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos, qual seja, a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995 e, posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.


O art. 20 da Lei Assistencial, com redação fornecida pela Lei nº 12.435/2011, e o art. 1º de seu decreto regulamentar estabeleceram os requisitos para a concessão do benefício, quais sejam: ser o requerente deficiente ou idoso, com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos foi reduzida para 67 anos, a partir de 1º de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, posteriormente, para 65 anos, através do art. 34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003, mantida, inclusive, por ocasião da edição da Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011.


Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa com deficiência, família e ausência de condições de se manter ou de tê-la provida pela sua família.


Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.


O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos (§10º).


A incapacidade exigida, por sua vez, não há que ser entendida como aquela que impeça a execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o auxílio permanente de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento por meio do exercício de trabalho ou ocupação remunerada.


Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do Ministro Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377), oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".


No que se refere à hipossuficiência econômica, a Medida Provisória nº 1.473-34, de 11.08.97, transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, alterou o conceito de família para considerar o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/11, definiu-se, expressamente para os fins do art. 20, caput, da Lei Assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, §1º).


Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para comprovar a condição de miserabilidade, anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.


O v. acórdão, cuja ementa ora transcrevo, transitou em julgado em 19.09.2013:


"Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle de constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963 e 567.985, o Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O STF, no exercício da competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF para exercer o denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A oportunidade de reapreciação das decisões tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo hermenêutico típico da reclamação - no "balançar de olhos" entre objeto e parâmetro da reclamação - que surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle de constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do STF, o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E, inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro da reclamação, se entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a interpretação atual da Constituição. 4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação constitucional julgada improcedente. (Rcl 4374, GILMAR MENDES, STF)"

Entretanto, interpretando tal decisão, chega-se à conclusão de que a Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova.


Tal entendimento descortina a possibilidade do exame do requisito atinente à hipossuficiência econômica pelos já referidos "outros meios de prova".


A questão, inclusive, levou o Colendo Superior Tribunal de Justiça a sacramentar a discussão por meio da apreciação da matéria em âmbito de recurso representativo de controvérsia repetitiva assim ementado:


"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
(...)
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo. 6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido."
(REsp nº 1.112.557/MG, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, DJ 20/11/2009). (grifos nossos)

Pleiteia o autor a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é incapaz e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família.


O laudo pericial de fls. 184/185 diagnosticou o requerente como portador de autismo atípico e retardo mental SOE. Esclareceu ainda que "o paciente apresenta transtorno mentais que o tornam incapaz de assumir ou conduzir os atos da vida civil". Impende salientar que a referida conclusão do profissional médico não diverge daquela assentada no laudo do IMESC ( fls. 52/54), produzido em processo que levou à interdição do autor.


Evidenciado, portanto, o impedimento de longo prazo.


Por sua vez, o estudo social realizado em 05 de dezembro de 2013 (fls. 181/182) informou ser o núcleo familiar composto pelo autor e por sua genitora, os quais residem em "terreno cedido pela prefeitura de Embu das Artes com infraestrutura urbana". Na ocasião, a representante legal do demandante declarou que possui "mais 4 filhos, todos casados, com filhos e vida independente, portanto, não fazem parte de seu núcleo familiar".


A renda familiar decorre dos proventos auferidos pela mãe do requerente, que "trabalha na informalidade como diarista com renda variável". A assistente social noticiou, por fim, que "o requerente não frequentou qualquer tipo de escola para que pudessem entender as suas reais necessidades de aprendizado. Nesse sentido não foi possível estimular habilidades que poderiam ajudá-lo a ter uma vida independente".


Informações extraídas do Sistema Único de Benefícios/Dataprev (fls. 205/207) dão conta dos recolhimentos efetuados pela genitora do requerente até o ano de 2008. A inexistência de recolhimentos posteriores à competência 05/2008, bem como de benefícios previdenciários ativos, está a indicar que, de fato, a representante legal do autor, trabalha atualmente "na informalidade", "com renda variável", conforme declarado.


A despeito da informação, contida no relatório socioeconômico, de que o autor possui 4 (quatro) irmãos - que possuem o dever de auxiliar no seu sustento - a situação descrita nos autos aponta para a insuficiência de recursos que garantam o mínimo existencial. Com efeito, a precariedade das condições de habitação (terreno cedido pelo município), e o fato de tratar-se de núcleo familiar composto por pessoa com 58 anos de idade na presente data, sem renda fixa, e seu filho, portador de doença mental - patologia que demanda cuidados permanentes - são elementos que militam favoravelmente à existência da condição de miserabilidade.


Além disso, dados constantes do Sistema Único de Benefícios/Dataprev, os quais passam a integrar a presente decisão, informam que o pai do requerente reside no estado do Alagoas, não possui vínculos empregatícios registrados, e requereu, na via administrativa, a concessão de benefícios previdenciário (aposentadoria por idade) e assistencial, tendo obtido resposta negativa em ambos. Não há indícios, portanto, de que possua capacidade financeira para auxiliar no sustento do filho.


A análise do conjunto fático probatório, portanto, aponta que o núcleo familiar se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica e vulnerabilidade social, fazendo, portanto, o autor, jus ao benefício pleiteado.


O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da citação (26/07/2011 - fls.103), conforme estabelecido pela r. sentença de 1º grau de jurisdição, em razão da não comprovação da condição de miserabilidade à época do requerimento administrativo (14/03/2007 - fls. 94).


A correção monetária e os juros de mora incidentes sobre as parcelas em atraso deverão observar os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação e Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.


Mantenho os honorários advocatícios em 10% sobre o valor das parcelas devidas até a sentença, uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente.


Isento a Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais, registrando ser a parte autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.


Ante o exposto, nego provimento à remessa necessária e ao recurso de apelação do INSS, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição. Mantenho a tutela específica concedida.


É como voto.


CARLOS DELGADO
Desembargador Federal


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